Trata-se de uma análise sobre a constitucionalidade do artigo 68 do Código de Processo Penal. Para tanto, será feita a análise de artigos que tratam sobre o tema, além de doutrinas e jurisprudência, onde será exposto, ao final, as conclusões sobre as informação obtidas.
NORMA CONSTITUCIONAL?
O Ordenamento Jurídico brasileiro é composto por uma série de normas jurídicas dispostas de forma hierarquica, dentro de um sistema normativo, onde a Constituição ocupa a mais importante posição. Para que o ordenamento jurídico funcione de forma lógica e eficaz, com o objetivo de atingir a finalidade para qual se destina, se faz necessário que as demais leis, decretos, jurisprudências, atos normartivos ou até mesmo os contratos particulares sejam feitos de acordo com o disposto na Constituição, respeitando o princípio da supremacia da Constituição.
Ocorre que há certos casos em que nos deparamos com normas ou leis infraconstitucionais que não se harmonizam com os dispositivos constitucionais. Nestes casos, podemos dizer que estamos diante uma norma ou lei inconstitucional? Bem, não é tão simples quanto parece. O artigo 68 do Código de Processo Penal é uma dessas normas a qual parece ser inconstitucional, senão vejamos:
“Art. 68. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre, a execução da sentença condenatória ou a ação civil será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público.”
Tal artigo dá disposição diferente do artigo 134 da Constituição Federal:
“Art. 134. A Defensoria Pública é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal.”
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário entendeu:
“enquanto não criada por lei, organizada – e, portanto, preenchidos os cargos próprios, na unidade da Federação – a Defensoria Pública, permanece em vigor o artigo 68 do Código de Processo Penal, estando o Ministério Público legitimado para a ação de ressarcimento nele prevista. Irrelevância de a assistência vir sendo prestada por órgão da Procuradoria Geral do Estado, em face de não lhe competir, constitucionalmente, a defesa daqueles que não possam demandar, contratando diretamente profissional da advocacia, sem prejuízo do próprio sustento" (RE 135328/SP, DJ 20.04.2001).
Com isso, podemos observar que o Supremo Tribunal Federal admitiu a inconstitucionalidade progressiva, ou seja, é reconhecido que paulativamente a lei caminha para a inconstitucionalidade. Isto porque não há ainda Defensoria Pública instalada em todo o país, sendo assim, o Ministério Público é legitimo para promover ação civel “ex declito”. No mesmo sentido, explica Pedro Henrique Demercian e Jorge Assaf Maluly:
“De fato, por essa interpretação, o art. 68 do CPP está em processo de inconstitucionalização progressiva, isto é, com a transferência dessa atribuição do Ministério Público à Defensoria Pública. Mas, como o cidadão não pode ficar sem o amparo jurídico do Estado, mantém-se a legitimidade do parquet para propor a ação civil ex delicto, enquanto não implementada esta substituição [...].” (g.n.)
E ainda Tourinho Filho:
“onde for surgindo a figura do Defensor Público cessará para o Promotor de Justiça aquela atividade que o art. 68 do CPP lhe confere”.
Dianto o exposto, conclui-se que diante da carência da Defensoria Pública em algumas cidades do Brasil, fica impossibilitado o cumprimento do disposto Constitucional, sendo assim, enquanto não houver a acessibilidade da Defensoria Pública para todos, o disposto no artigo 68 do Código de Processo Penal trata-se de norma constitucional, isto porque, se assim não fosse, o prejuízo seria muito maior, uma vez que feriria o artigo 5º, inciso LIV que garante que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 48. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
BRASIL. DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941. Código de Processo Penal. Disponível na Internet via <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3689.htm> Acesso em 16/08/2015.
CAVALCANTI, Lívio Coêlho. Breves linhas sobre a inconstitucionalidade progressiva. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 jun. 2012. Disponivel em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.37754&seo=1>. Acesso em: 14 ago. 2015.
DEMERCIAN, Pedro Henrique; MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
RAMOS, Diego da Silva. Teoria e aplicação da inconstitucionalidade progressiva. Disponível na Internet via <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4426.> Acesso em 14/08/2015.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.