Requisitos caracterizadores da justa causa trabalhista

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O artigo trata dos requisitos ensejadores da justa causa, e tem por objetivo impedir o abuso por parte do empregador quando da aplicação das penalidades aos seus subordinados, assegurando ao empregado penalizado, não permanecer à mercê de seu empregador.

INTRODUÇÃO:

No Direito do Trabalho, o poder disciplinar consiste no conjunto de prerrogativas concentradas ao empregador dirigidas a propiciar a imposição de sanções aos empregados diante do descumprimento por esses, de suas obrigações contratuais sendo poder decorrente do poder diretivo conferido ao empregador pelo artigo 2º da Consolidação das Leis do Trabalho.

A existência de tal princípio tornou-se necessária diante da existência de determinados requisitos quando da aplicação do poder disciplinar do empregador, ou seja, limitações que validam a justa causa aplicada ao empregado.

Assim, os requisitos ensejadores da justa causa, enumerados pela doutrina, tem por objetivo impedir o abuso por parte do empregador quando da aplicação das penalidades aos seus subordinados, assegurando, portanto, ao empregado penalizado, não permanecer à mercê da vontade exclusiva de seu patrão, em virtude do princípio da proteção ao trabalhador.

PALAVRAS CHAVES: Requisitos. Cumprimento. Ensejadores. Justa Causa.

DESENVOLVIMENTO:

A aplicação de punições disciplinares, pelo empregador, ao empregado faltoso deve observar os seguintes requisitos, segundo Vólia Bomfim Cassar (in Direito do Trabalho. Vólia Bomfim Cassar. 8ª ed., São Paulo: Método, 2013, p:1048).

I -      Imediação, imediatidade ou atualidade: A punição deve ser atual, aplicada assim que o empregador tomar conhecimento da prática do ato faltoso, providenciando a aplicação da penalidade, sob pena da configuração do perdão tácito. Todavia, punição atual não significa concomitante, mas, contemporânea, pois deve ser contada a partir da ciência do fato e da autoria do ato inquinado, revelando-se o ideal que a dispensa do empregado ocorra no máximo, no dia seguinte ao do conhecimento da falta pelo empregador, conforme recomendação do Desembargador Sérgio Pinto Martins. (in Manual da Justa Causa. Sérgio Pinto Martins. São Paulo: Atlas, 2005, p. 33). Entretanto, não há óbice para que o empregador investigue antes, a prática da falta, a fim de se certificar acerca da sua autoria e aplicação correta das penalidades (o procedimento de investigação deve ser instaurado de imediato), como é comum nas grandes empresas. Nesse caso, as penalidades devem ser aplicadas logo após a conclusão da investigação.

Vejamos, a propósito, o seguinte julgado:

JUSTA CAUSA. ATO DE IMPROBIDADE. INEXISTÊNCIA DE PERDÃO TÁCITO. Uma vez instaurada sindicância interna, restando assegurados o contraditório e a ampla defesa ao reclamante, justifica-se o lapso temporal entre a apuração dos fatos e a aplicação da demissão, mormente em se tratando de um procedimento investigatório com toda a complexidade em que foi relatado, com a oitiva de todos os envolvidos, para se chegar ao resultado pretendido, além de ser a reclamada uma empresa multinacional de grande porte, inexistindo, portanto, falta de imediatidade. (TRT 2ª R; RO 0302900-38.2009.5.02.0501; Ac. 2012/0343783; Décima Primeira Turma; Relª Desª Fed. Maria José Bighetti Ordono Rebello; DJESP 03/04/2012).

II -      Proporcionalidade entre a falta e a punição: As penalidades deverão ser aplicadas de acordo com a gravidade das faltas cometidas, á despeito da CLT só mencionar as penalidades de suspensão e de dispensa por justa causa, ao passo que a doutrina e a jurisprudência consagram o direito de aplicação também da pena de advertência, podendo ser realizada de forma verbal ou escrita, destinada a punir faltas leves (recomenda-se a utilização desta forma, a escrita). A suspensão, é utilizada para a punição de falta de gravidade média, mas que não justifica a resolução do contrato de trabalho. Já a justa causa, é aplicada à faltas graves que são taxativamente previstas em lei e cuja prática torna insustentável a relação de emprego, em razão da quebra de confiança entre patrão e empregado. Para aplicar a penalidade mais adequada, o empregador deve sopesar o contexto em que ocorreu, o passado funcional do trabalhador, grau de instrução do trabalhador, etc..

Acerca do tema, transcrevamos o seguinte julgado:

RECURSO ORDINÁRIO OBREIRO. JUSTA CAUSA. PROPORCIONALIDADE DA PENA. DESCARACTERIZAÇÃO. A cessação da relação de emprego mediante falta praticada pelo empregado é pena máxima que necessita ser grave a ponto de justificar a dispensa, no que é de fundamental importância que seja levada em consideração a extensão (gravidade) da falta cometida, a ponto de ensejar a resolução do contrato de trabalho. Constatada, na hipótese, que a punição aplicada foi proporcional à gravidade do ato praticado, sendo observada, inclusive, a gradação pedagógica (advertência e suspensão), há de ser mantida a decisão de primeiro que ratificou a justa causa aplicada pelo empregador como motivo da dispensa do reclamante. Apelo desprovido.  (TRT 19ª R; RO 0001308-97.2012.5.19.0260; Primeira Turma; Rel. Des. Antônio Adrualdo Alcoforado Catão; Julg. 21/01/2014; DEJTAL 18/02/2014; Pág. 12).

III -      Non bis in idem (princípio de direito segundo o qual uma pessoa não pode ser punida duas vezes pelo mesmo fato) ou singuralidade da punição: O presente requisito impede a dupla punição do empregado por uma mesma falta, ou seja, caso o empregador puna o empregado com a penalidade de advertência em decorrência de uma determinada falta, não seria possível, posteriormente, pela mesma falta puni-lo com suspensão. Não se considera “bis in idem” descontar do salário os dias de faltas injustificadas daqueles empregados dispensados por desídia ou abandono. Também não configuraria “bis in idem”, a faculdade que o empregador possui em descontar do período de férias as faltas injustas que o empregado teve no período aquisitivo e a demissão do trabalhador por desídia, não se relacionando com as punições disciplinares, o desconto dos dias não trabalhados, o desconto dos danos causados, a redução dos dias de férias, a perda da remuneração do dia de repouso semanal, seja por impontualidade ou faltas, sendo tais faculdades conferidas pelo legislador ao empregador.

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Sobre o princípio, colacionamos o seguinte julgado:

DISPENSA POR JUSTA CAUSA. Impossibilidade de dupla punição. Princípio da singularidade da punição conquanto o direito de aplicar punições seja autorizado pelo poder diretivo do empregador, já que é ele quem responde pelos riscos do negócio (CLT, art. 2º), o seu exercício subordina-se à observância de alguns requisitos, dentre os quais o da singularidade da punição (non bis in idem). Dessa forma, uma vez imposta uma determinada sanção ao empregado faltoso, não poderá o empregador agravá-la com a aplicação de outra mais ou com a sua conversão por alguma mais gravosa. (TRT 12ª R; RO 0003415-13.2013.5.12.0022; Quinta Câmara; Relª Juíza Maria de Lourdes Leiria; DOESC 31/03/2014).

IV -      Não-discriminação ou tratamento igual: esse requisito impede que por um mesmo ato faltoso praticado por dois ou mais empregados, haja punições distintas, de forma que o empregador não pode punir de maneira diversa empregados que praticaram a mesma falta. Não se trata de faltas iguais praticadas por empregados diferentes e em momentos distintos, mas de ato único praticado em co-autoria. No caso de faltas iguais praticadas por empregados distintos e em momentos diferentes, há algumas ressalvas na doutrina, sendo prudente que o empregador que tenha o costume de relevar ou abrandar a punição de determinadas condutas, caso deseje mudar a sua postura diante da mesma falta, comunique, anteriormente, aos empregados acerca da mudança de posicionamento em relação à punição de faltas futuras.

V -     Gravidade da falta e apreciação da gravidade: Ao aplicar uma justa causa, o empregador deverá avaliar cada caso de forma concreta e subjetiva levando em consideração a personalidade do agente, a intencionalidade, os fatos que levaram o empregado à prática do ato, a ficha funcional, os antecedentes, as máculas funcionais anteriores, o grau de instrução ou de cultura, a época do fato, o critério social dentre outros, devendo sua aplicação ser reservada e discreta, apenas para os casos em que é impossível o prosseguimento do contrato de trabalho e desde que haja prova do seu cometimento e autoria. Se não houver prova, a opção deve ser pela dispensa sem justa causa.

VI -       Teoria da vinculação dos fatos ou dos motivos determinantes da punição ou do caráter determinante da falta ou nexo causal: O empregador deve comunicar quais os atos praticados pelo empregado considerados como faltosos e ensejadores da dispensa por justa causa (efeito), sendo tal comunicação necessária para a defesa do empregado e para que o empregador, não inclua ou substitua as faltas que motivaram a dispensa por outras. Portanto, é imprescindível acuidade e descrição do ato faltoso, porque não poderá ser invocado fato diverso para justificar a aplicação da penalidade disciplinar.

Em suma: para a caracterização da justa causa ensejar o rompimento do contrato de trabalho, é indispensável a tipificação da conduta do empregado em uma das hipóteses previstas no art. 482 da CLT, não havendo que se falar em dispensa por justa causa sem tipificação em lei, não podendo o período de suspensão disciplinar ser superior a 30 (trinta) dias consecutivos, sob pena de o contrato de trabalho ser considerado rescindido sem justa causa, em face do que dispõe o art. 474 da CLT.

VII -      A não ocorrência do perdão - expresso ou tácito: O perdão expresso ocorre quando o empregador toma conhecimento do ato faltoso praticado pelo empregado e o desculpa formalmente, não podendo, posteriormente, dispensá-lo alegando uma justa causa pelo ato faltoso perdoado. Já o perdão tácito ocorre quando o empregador, ciente da prática do ato faltoso, realiza algum ato que não condiz com o a vontade de punir o empregado, configurando-se o perdão presumido ou tácito, assim como a demora ou a não punição do empregado, e a concessão do aviso prévio em relação às faltas ainda não punidas.

CONCLUSÃO:

Dessa forma, a aplicação da justa causa depende imprescindivelmente da presença dos requisitos acima mencionados, caso contrário, poderá ser anulada pela Justiça do Trabalho de forma que a existência de tais requisitos ou elementos é primordial para a existência de uma certa limitação ao poder disciplinar do empregador impedindo que o empregado, fique à mercê da vontade exclusiva de seu patrão no que diz respeito à possibilidade de ser penalizado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

DELGADO, Maurício. Godinho Curso de Direito do Trabalho. 2011.

MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 2012.

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Sobre a autora
Lorena Carneiro Vaz de Carvalho Albuquerque

Advogada formada pela PUC/GO, inscrita na OAB/GO desde 2009, especialista pela UNIDERP/LFG em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, especializanda pela Estácio em Direito Civil e Processual Civil, autora do livro: "Manual da Justa Causa Trabalhista - Teoria e Prática".

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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