A previdência constitucional do Brasil: aspectos constitucionais e questões atuais
1. Definindo Previdência Social: aspectos, alcance, funcionamento
Elencada como um dos direitos sociais, conforme o artigo 6º da Constituição Federal, a previdência social é definida pela nossa carta constitucional como um "conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social" (CF, art. 194, "caput").
Trata-se de um sistema de proteção social que faz parte do que determinamos seguridade social, que também envolve a assistência social e a saúde.
Carlos Alberto Pereira de Castro (2006, 84) a define como sendo "o sistema pelo qual, mediante contribuição, as pessoas vinculadas a algum tipo de atividade laborativa e seus dependentes ficam resguardadas quanto a eventos de infortunística (morte, invalidez, idade avançada, doença, acidente do trabalho, desemprego involuntário), ou outros que a lei considera que exijam um amparo financeiro ao indivíduo (maternidade, prole, reclusão), mediante prestações pecuniárias (benefícios previdenciários) ou serviços."
Restringe-se, nos seus objetivos, a resguardar cidadãos que contribuiram para o sistema em casos de contingências na qual a capacidade de auto-sustento seja reduzida. Estas ocorrem por causas físicas, como doença, invalidez, idade avançada ou morte (CF, art. 201, I, V), ou em eventos específicos, como gravidez (CF, art. 201, II) ou perda do emprego (CF, art. 201, III).
Também é situações nas quais se necessite do auxílio para sustento de seus dependentes, seja a dependência presumida por lei (cônjuges, filhos menores ou incapazes) ou comprovada de forma concreta (pais que dependem economicamente de filho que venha a falecer), conforme definição do artigo 16 da Lei 8213/91.
É, por natureza, instituto restrito, previsto para os trabalhadores e seus dependentes, definidos na legislação previdenciária. Conforme Rocha Dias (2008, 32), “o só estado de necessidade advindo de uma contingência social não dá direito à proteção previdenciária. Requer-se que a pessoa atingida pela contingência social tenha a qualidade, o “status” de contribuinte do sistema de previdência social”.
Nesta definição, ainda, encontra-se outra característica dos regimes previdenciários: a necessidade de uma contribuição para manter o sistema, que ocorre pela necessidade de se manter um fundo para custear a concessão e manutenção dos benefícios.
O regime jurídico da Previdência Social, como um todo, parte da premissa de que o segurado deve contribuir para o sistema. Todo cidadão que exercer atividade laborativa remunerada deve, obrigatoriamente, contribuir para a Previdência Social, seja ele empregado ou profissional liberal, a não ser que contribua para regimes próprios de previdência, como os planos de seguridade social dos servidores públicos, previstos na Lei 8112/90.
Mesmo aqueles que não exercem atividade laborativa poderão contribuir, sendo admitidos como segurados. Atendem, assim, ao princípio da universalidade de atendimento, possibilitando a esses cidadãos usufruirem de um direito que não lhes seria dado caso não pudessem contribuir. Observa-se, todavia, que a contribuição dá direito a uma gama restrita de benefícios, devido à sua categoria especial.
Finalmente, é necessário ressaltar que a previdência social tem caráter legal, não sendo oriunda de contrato. Não sendo fruto de vontades, não pode ser suprimida ou modificada, em suas diversas características: espécies de benefícios a serem concedidos, requisitos para a concessão de benefícios, rol de dependentes econômicos do segurado, valor da contribuição previdenciária, vinculação à previdência social, entre outros.
Em um país com índices elevados de pobreza e crescente aumento da população idosa (cerca de 7%) é extremamente importante que se discutam questões relativas à seguridade social, a fim de equalizar de forma eficiente a relação entre os valores apurados e os objetivos perseguidos pela efetivação de tais políticas.
2. Importância e relevância da seguridade social
Nossa Constituição conceitua a seguridade social, que engloba a previdência, como “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (CF, art. 194). Diversos autores atestam a relevância da previdência, seja incorporado ao guarda-chuva da seguridade social, ou de forma direta e específica.
Esta se demonstra por citações como a de Miguel Horvath Júnior, para o qual “qualquer que seja a posição que se adota em relação ao conceito da Seguridade Social deve-se sempre entendê-lo como fenômeno social fundamental, como fundamental é a própria evolução das sociedades”, ou em definições como a de Wladmir Novaes Martinez, que define a seguridade como "(...) técnica de proteção social, custeada solidariamente por toda a sociedade segundo o potencial de cada um, propiciando universalmente a todos o bem-estar das ações de saúde e dos serviços assistenciários em nível mutável, conforme a realidade sócio-econômica, e os das prestações previdenciárias”.
3. O modelo contributivo da previdência e a solidariedade social
Há um grande diferencial entre os modelos previdenciário e das demais esferas da seguridade social: a forma pelo qual este se financia.
Enquanto a saúde e a assistência social são demandas atendidas diretamente pelo orçamento governamental, inclusive com obrigações definidas pela carta constitucional (no caso da saúde) a previdência é financiada por aqueles que contribuem para tal instituto, sendo dependente dos valores enviados por seus “consorciados”, em última instância. Este “dilema” estatal torna-se mais evidente quando nos lembramos do princípio da solidariedade social.
O princípio da solidariedade social, não declarado expressamente na Constituição, declara que “toda a sociedade, indistintamente, deve contribuir para a Seguridade Social, independentemente de se beneficiar de todos os serviços disponibilizados”. (Fillipo, 2007). Considerando-se que a natureza contributiva do sistema de previdência social é, por si só, um limitador para os benefícios previdenciários, esta entra em choque com as bases que sustentam o sistema de seguridade, já que é, ao mesmo tempo, um sistema que deveria garantir dignidade a quem recebe, mas que não pode, por definição constitucional, ser financiado pelo orçamento público da administração direta.
4. Conclusão
O sistema de previdência social brasileiro tem sofrido mudanças constantes, visto que o modelo não se sustenta sem o aumento da base contributiva. A princípio pontuais, e limitadas a setores que estão fora do Regime Geral, estas se tornaram freqüentes; cada vez mais se ouve comentários de que é necessária, e urgente, uma “Reforma da Previdência” ampla e irrestrita, que amplie as receitas do sistema - embora poucos consigam definir com clareza como conciliar as demandas financeiras com as exigências impostas pela solidariedade social.
Garantir efetiva prestação de serviços previdenciários à população que dela necessite, equilibrando as contas públicas e garantindo efetividade no uso de um sistema cuja base aumenta a cada dia, é um desafio à altura da grandeza do que a Constituição Federal de 1988 impôs ao governo e à sociedade quando de sua promulgação.
Não é um desafio fácil. Todavia, é imperativo resolvê-lo.
BIBLIOGRAFIA
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CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 2004, p. 65.
Eduardo Rocha Dias; José Leandro Monteiro de Macêdo, in Curso de Direito Previdenciário, Editora Método, 2008, p. 32
FILIPPO, Filipe de. Os princípios e objetivos da Seguridade Social, à luz da Constituição Federal. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 43, jul 2007. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2012>. Acesso em set 2015.
MARTINEZ, Wladimir Novaes – Princípios do Direito Previdenciário, LTR, 5ª edição;
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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