Trabalho terceirizado: corrupção e suas consequências

22/10/2015 às 14:49
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O trabalho terceirizado se desenvolve no Brasil e modifica a estrutura tradicional da relação de trabalho criando um novo modelo trilateral que envolve o trabalhador, o prestador e o tomador. A corrupção da terceirização traz consequências para o Estado.

Sumário: 1. Introdução. 2 Trabalho Terceirizado. 3. Terceirização e suas consequências. 4. Corrupção e reflexões 4.Conclusão 5. Referências

RESUMO

Com a expansão do fenômeno mundial da globalização desenvolve-se no Brasil o traba-lho terceirizado que modifica a estrutura tradicional da relação de trabalho e cria um novo modelo trilateral que envolve o trabalhador, o prestador e o tomador. A terceiriza-ção traz benefícios ao permitir o avanço da economia já que, em tese, possibilita a redu-ção do custo de produção das empresas e um produto final com preços mais acessíveis. No entanto, esta nova modalidade de labor também proporciona maior facilidade para a corrupção, principalmente, na terceirização de serviços públicos. Dessa forma, serão apontadas algumas consequências decorrentes da terceirização como a supressão dos direitos trabalhistas já conquistados e a possibilidade de desvio das verbas públicas do Estado.

Palavras-Chave: Trabalho, Terceirização e Corrupção.

1- INTRODUÇÃO

Com a evolução das relações de trabalho e o fenômeno da terceirização cresce no Brasil novos postos de emprego e oportunidades que, em determinados casos, desafiam os direitos trabalhistas já conquistados durante as últimas décadas.
Observa-se que, ao transferir uma parcela de suas atividades a terceiros, a empresa contratante deixa de realizar gastos com parte de sua estrutura, otimizando tempo, recursos pessoais e financeiros. Isso permitirá que se concentre no foco do seu negócio principal, aproveitando melhor seu processo produtivo, investindo em tecnologia e desenvolvimento de novos produtos, obtendo ao final mais agilidade, flexibilidade e competitividade no mercado.
Inicialmente acreditava-se que a terceirização não traria prejuízos ao trabalhador visto que seus direitos estariam garantidos pela relação de emprego mantida com o ter-ceiro prestador de serviços. Porém a prática trabalhista está demonstrando uma realidade diferenciada.

2 – TRABALHO TERCEIRIZADO

Para a ciência da Administração a terceirização é a transferência de atividades para fornecedores especializados, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais no negócio principal. Esta nova relação desloca o foco da tradicional relação bilateral entre empregador e empregado e cria uma relação trilateral composta pelo trabalhador que mantem vínculo de emprego com prestador de serviços (terceiro), mas disponibiliza o resultado de sua energia de trabalho ao tomador de serviços (empregador real) distinto do seu empregador.
Outros nomes são utilizados para denominar a contratação de terceiros pela empresa para a prestação de serviços ligados à sua atividade-meio. Fala-se em terceirização, subcontratação, terciarização, filialização, reconcentração, desverticalização, exteriorização do emprego, localização, parceira entre outros. Para Sérgio Martins a terceirização consiste:
Na possibilidade de contratar terceiro para a realização de atividades que não constituem o objeto principal da empresa. Essa con-tratação pode envolver tanto a produção de bens, como de serviços, como ocorre na necessidade de contratação de empresa de limpeza, de vigilância ou até para serviços temporários. (MAR-TINS, 2010, p.190).

Para que seja uma ferramenta proveitosa, a terceirização precisa ser enfrentada como uma parceria. As partes envolvidas precisam ter o mesmo objetivo, buscando a excelência na prestação do serviço e visando a satisfação dos seus clientes. Para isso, ambas precisam estar em harmonia pois o sucesso de uma refletirá na atuação da outra. Assim, o papel do terceiro será auxiliar a empresa a aprimorar uma área para que ela pos-sa prestar serviços de qualidade, sem se preocupar em geri-la por seus próprios meios.
Para isso, é essencial que a empresa contratante escolha bem seus parceiros, não levando em consideração apenas o preço ofertado, pois muitas vezes um contrato mal escolhido pode gerar problemas financeiros e também operacionais do negócio.
A terceirização, apesar da ausência legislativa brasileira, não é vedada desde que não configure a relação de emprego entre o tomador e o empregado; o que deve ocorrer é o fornecimento de uma mão de obra especializada ao tomador, que é a terceirização lícita.  Pois quando na intermediação dessa mão de obra se verificar o aluguel de traba-lhadores para o tomador, coisificando o seu labor estaremos diante de uma terceirização ilícita que fere os princípios trabalhistas e as regras da Organização Internacional do Tra-balho.
A terceirização é formalizada geralmente por meio de contrato e deriva de manifestação da vontade das partes envolvidas, ou seja, se os interessados acordam com os termos do contrato, assumem que tem plenas condições de cumpri-las.
Diante desta lacuna existente na legislação trabalhista vigente no Brasil, a Justiça do Trabalho vem aplicando a Súmula Vinculante 331 do Tribunal Superior do Trabalho, publicada em 1994, que consiste num modo de responsabilização do tomador dos servi-ços que passa a atuar como garantidor dos créditos de seus prestadores de serviços.
Faz-se necessário uma breve reflexão sobre as principais consequências da terceirização buscando a melhor solução para o bem comum e o interesse público.

3. TERCEIRIZAÇÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Diversos são os problemas inerentes à terceirização. Entre eles podemos citar a redução do número de empregos, dificuldade de negociação com o empregador, inci-dência de trabalho escravo, fraudes, inexperiência de ambas as partes, aumento do risco de acidente, inadimplemento da contratada, maior facilidade para corrupção e redução da arrecadação do Estado. Um dos aspectos que merece destaque é que com a terceirização da mão de obra dos trabalhadores surge a precarização dos direitos trabalhistas e o rebaixamento de seus salários.
De acordo com o Princípio da Igualdade Salarial, expresso no art. 461/CLT, todo trabalho de igual valor e mesma atribuição, no mesmo local, deve corresponder a igual salário. Existe uma corrente doutrinária minoritária que defende a isonomia entre os trabalhadores terceirizados e os empregados da tomadora de serviços igualmente ao que ocorre com o trabalhador temporário. Por outro lado, existe argumentos de que a lei é omissa no que se refere ao tratamento igualitário entre o trabalhador terceirizado e os empregados da tomadora de serviços.
De modo geral é possível encontrar maior ocorrência de denúncias de discrimina-ção está em setores onde há mais terceirizados, como os de limpeza e vigilância, segundo relatório da Central Única dos Trabalhadores. Com refeitórios, vestiários e uniformes que os diferenciam, incentiva-se a percepção discriminatória de que são trabalhadores de “segunda classe”.
Outro aspecto refere-se ao enfraquecimento do movimento sindical, mediante a dispersão dos trabalhadores em inúmeras empresas pequenas, sem qualquer preocupação com sua integração social.
A terceirização da atividade-fim é condenada pelos sindicalistas com o argumento de que fragilizará a organização dos trabalhadores e, consequentemente, sua força de negociação com as empresas. Terceirizados que trabalham em um mesmo local têm patrões diferentes e são representados por sindicatos de setores distintos. Essa divisão afeta a capacidade de pressionar por benefícios. Isolados, terão mais dificuldades de nego-ciar de forma conjunta ou de fazer ações como greves
Por fim, outro aspecto que pode ser considerado impactante às garantias conquistadas pelos trabalhadores refere-se à possibilidade de transformar celetistas em pessoas jurídicas, conhecida pelo termo pejotização.
O termo refere-se a uma prática comum e bastante atual na esfera trabalhista, trata-se de advento utilizado por empresas no intuito de potencializar lucros e resultados financeiros, livrando-se de encargos decorrentes das relações trabalhistas, e consiste em contratar funcionários que são pessoas físicas através da constituição de Pessoa Jurídica, nesse caso o empregador orienta o fornecedor da mão de obra a constituir uma empresa, este artifício resulta na descaracterização da relação de emprego e a PJ é usada em substituição ao contrato de trabalho.
O Direito do trabalho tutela o empregado, não havendo a possibilidade de uma pessoa jurídica ser trabalhador. O conceito de empregado extraído do artigo 3° da CLT, é claro com relação a essa exigência, além do fato de o contrato ser “intuito personae”, o que quer dizer que é personalíssimo, não podendo ser executado por parte diversa daquela que o pactuou. Visto que o elemento essencial da relação de emprego é que o trabalho seja prestado por pessoa física obedecendo a pessoalidade, intuitu personae, não podendo ser substituído por outro, prevalecendo ainda o Princípio da Primazia da Realidade.
É importante frisar que essa prática constitui uma espécie de fraude à relação de emprego, na qual o empregador acaba se aproveitando da necessidade do trabalhador, para impingir-lhe condições extremamente desfavoráveis, conforme se verifica através do artigo 9º da Consolidação das Leis Trabalhistas.
Em suma, a pejotização é um instituto desfavorável à típica relação de emprego, pois é uma prática, que retira direitos do trabalhador que é o elo mais fraco na relação de emprego normal.

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4.CORRUPÇÃO E REFLEXÕES

A corrupção é um fenômeno de difícil definição e compreensão por se basear em diversos fundamentos e ser objeto do estudo de várias ciências como a economia, sociologia, ciência política, direito, etc.
É possível constituir um conceito amplo de corrupção que de modo geral, repre-senta a apropriação ilícita da riqueza coletiva para beneficiar indevidamente um ou pou-cos integrantes da sociedade. Significa uma ação ou efeito de corromper, de fazer degenerar; depravação levando alguém a afastar-se da retidão; suborno.
No que se refere ao Direito do Trabalho os casos de corrupção geralmente estão envolvidos com a terceirização de serviços públicos. Em diversos casos, esses contratos de terceirização são fraudulentos e tem por finalidade o desvio de dinheiro do Estado.
Esse mecanismo de corrupção inicia-se, em geral, com a contratação emergencial, com dispensa de licitação, de empresas prestadoras de serviços terceirizados ou de falsas Organizações sem fins lucrativos, que superfaturam os preços dos contratos de prestação de serviços e servem, ainda, aos interesses econômicos e eleitorais de diversos políticos.
Além do valor contratual superfaturado a ser rateado entre as empresas e os administradores públicos, há ainda o ganho eleitoral dos políticos, que contratam cabos eleitorais como empregados da empresa terceirizada, em burla ao concurso público e ao princípio da impessoalidade da Administração Pública.
Está em debate na Câmara o Projeto de lei nº 4330/2004 que dispõe sobre o contrato de prestação de serviço a terceiros e as relações de trabalho dele decorrentes. Caso esta proposta seja aprovada e se transforme em lei, estará legalizando a terceirização da atividade fim, o que poderá ocasionar uma potencialização da corrupção no setor público. 
Atualmente a contratação realizada pela Administração Pública, ao contrário do que ocorre no setor privado, prevê que a investidura em cargo ou emprego público depende obrigatoriamente de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal.
Dessa forma a Constituição deve prevalecer sobre a Consolidação das Leis do Trabalho e os princípios do Direito do Trabalho, assim o princípio da primazia da realidade, nesse caso, não pode se sobrepor à norma constitucional. Portanto, não há que se falar em formação de vínculo de emprego com a Administração Pública sem a realização prévia de concurso público (MARTINS, 2005, p.148).

5.CONCLUSÃO

Com o que foi exposto nesse artigo, fica evidente que a realidade da terceirização deve ser muito bem analisada pelo cidadão, para que seja crítico em relação ao discurso das contratações, pois terceirizar poderá sair muito caro para o Estado brasileiro. De modo ilícito está havendo um superfaturamento nos preços contratados seguido da dissolução irregular dessas empresas.  Dessa forma, deve-se ter em mente que a legalização da terceirização deve provocar uma sobrecarga ao Estado pois este irá arrecadar menos impostos para setores fundamentais como saúde, educação e segurança, além de arcar com a responsabilidade financeira sobre débitos trabalhistas de empresas que abandonaram os seus empregados terceirizados.

REFERÊNCIAS

MARTINS, S.P. Direito do Trabalho. 26ª ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2010.

MOTTA, F. Formalismos em contratos administrativos incentivam corrupção. Dis-ponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-abr-30/interesse-publico-formalismos-contratos-administrativos-incentivam-corrupcao2> Acesso em: 22 de outubro de 2015.

MOUSINHO, I. N. Artigo: Terceirização e Corrupção. Disponível em: <http://www.prt3.mpt.mp.br/informe-se/noticias-do-mpt-mg/255-terceirizacao-e-corrupcao> Acesso em: 22 de outubro de 2015

PIOVESAN, E. Câmara aprova projeto que permite terceirização da atividade-fim de empresa. Disponível em: <http://www2.Camara.Leg.Br/Camaranoticias/Noticias/Trabalho-e-previdencia/486413-camara-aprova-projeto-que-permite-terceirizacao-da-atividade-fim-de-empresa.html> Acesso em: 22 de outubro de 2015

RAMOS, D. O. Terceirização na Administração Pública. São Paulo: Ltr, 2001. p.25. VALE, Regina; EJNISMAN, Marcela.

RESENDE, R. Direito do Trabalho Esquematizado, 4ª. ed rev., atual. e ampl -. São Paulo: Editora Método, 2014.

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Sobre o autor
Helder Correia Nepomuceno

Acadêmico de Direito da Fanese

Informações sobre o texto

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