Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o processo administrativo fiscal/tributário foi elevado ao patamar de garantia fundamental. Desta forma, assim como o processo judicial é pautado pelos princípios constitucionais do processo legal, ampla defesa, contraditório e duração razoável de sua tramitação, do mesmo modo se sucederá com o processo administrativo, conforme dispõem os incisos LIV, LV, LXXVIII, todos previstos no art. 5º da Constituição Federal.
As disposições atinentes ao Processo Administrativo Fiscal do Município de Alagoinhas, localizado no Estado da Bahia, estão inseridas em seu Código Tributário Municipal, criado mediante a Lei Complementar nº 005/2001.
Pela análise normativa do referido diploma legal, é de se constatar que o Chefe do Poder Executivo Municipal, quando da sua elaboração, manteve estrita observância às disposições, princípios e normas gerais estabelecidas na Constituição Federal, Constituição Estadual, Lei Orgânica do Município, Leis Complementares e demais disposições legais, em consonância com o princípio da autonomia municipal assegurado no art. 29, caput e art. 30, inciso III da Constituição Federal, que seguem:
“Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado...”
“Art. 30. Compete aos Municípios:
(...)
III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;”
Neste sentido, a Lei Complementar nº 005/2001 trouxe, de forma pormenorizada, informações acerca de fato gerador, base de cálculo, alíquotas, lançamento, pagamento, infrações, penalidades e isenções sobre os impostos de sua competência, quais sejam: Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS; Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU e Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis – ITBI.
Além disso, dispôs sobre taxas e contribuições tributárias, processo administrativo fiscal, isenções municipais, formas de parcelamento do crédito tributário e infrações e penalidades, a fim de que restasse margem para dúvidas ao contribuinte em relação às suas obrigações fazendárias perante a Administração Pública Municipal, em atenção ao princípio da legalidade previsto no art. 37 da Constituição Federal.
As normas gerais relativas ao Processo Administrativo Fiscal do Município de Alagoinhas estão previstas nos arts. 134 a 168 da Lei Complementar nº 005/2001.
Nos termos do art. 134, o legislador delimitou a destinação do processo fiscal para a:
(i) Apuração de infrações à legislação tributária municipal ou, no caso de convênio, à de outros Municípios;
(ii) Consulta para esclarecimento de dúvidas relativas ao entendimento e aplicação da legislação tributária;
(iii) Julgamento de processos e execução administrativa das respetivas decisões, e;
(iv) Outras situações que a lei determinar.
No que tange aos aspectos processuais, o legislador importou muitas características do processo judicial previstas no Código de Processo Civil. Neste sentido, os atos e termos processuais conterão somente o indispensável à sua finalidade, quando a lei não prescrever forma determinada, sendo nítida, portanto, a semelhança deste dispositivo com o art. 154 do Código de Processo Civil.
Por sua vez, os prazos fluirão a partir da data da ciência do contribuinte e serão computados excluindo-se o dia do início e incluindo-se o dia do vencimento.
No processo civil, o réu é obrigatoriamente citado para apresentar defesa à demanda contra ele promovida. Nos processos administrativos, via de regra, não se faz muita distinção pelos termos técnicos intimação/citação, uma vez que os Municípios têm livre autonomia para elaborar seus Códigos Tributários e ainda que geralmente adotem grande parte das disposições contidas no Código de Processo Civil, muitos conceitos basilares são desconsiderados.
No processo fiscal sob comento, o legislador preferiu optar pela terminologia “intimação”, podendo esta ser pessoal, postal ou editalícia.
O processo fiscal no âmbito de atuação do Município de Alagoinhas/BA, terá início com a lavratura do termo de início da fiscalização exarada por servidor fiscal; ou, o primeiro ato de ofício, por escrito, praticado por servidor competente, cientificando o sujeito passivo, seu representante ou preposto, da obrigação tributária ou, a lavratura de termo de mercadorias, notas fiscais, livros ou quaisquer documentos em uso ou já arquivados.
Tendo em vista que nas situações acima a máquina da Administração Pública já foi movimentada, fica excluída eventual espontaneidade do sujeito passivo em relação a obrigações tributárias vencidas. E ainda que haja recolhimento do tributo, o contribuinte ficará obrigado a recolher os acréscimos legais e arcar com a respectiva penalidade.
A exigência do crédito tributário será realizada mediante notificação de lançamento ou auto de infração, pelo órgão competente, distintamente para cada tributo. E ainda, a imposição de penalidades por descumprimento de obrigação acessória, será sempre formalizada por notificação fiscal ou auto de infração.
Em atendimento ao princípio do devido processo legal e contraditório, quando a exigência se der mediante notificação de lançamento, poderá o contribuinte apresentar reclamação (defesa escrita) endereçada à Secretaria Municipal da Fazenda, dentro do prazo de 30 dias a partir do recebimento da notificação. A referida reclamação terá efeito suspensivo em relação aos tributos lançados. A decisão somente poderá ser realizada após a apresentação da contestação (espécie de réplica) do responsável pelo lançamento à reclamação do contribuinte, sob pena de nulidade.
Quanto ao auto de infração, este será, privativamente lavrado por servidor fiscal, cuja cópia será entregue ao autuado, e conterá os seguintes requisitos, conforme dispõe o art. 149 da Lei Complementar nº 005/2001: a qualificação do autuado; o local, a data e a hora da lavratura; a descrição clara e precisa do fato, a disposição legal infringida e a penalidade aplicável; a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de 30 dias; a assinatura do autuante, a indicação do cargo ou função e o número da matrícula.
Eventuais omissões ou irregularidades no auto de infração não importarão em nulidade do processo fiscal quando deste constarem elementos suficientes para determinar, com segurança, a infração e o infrator, e as falhas não constituírem vício insanável. Tal disposição consagra a segurança jurídica inerente a toda e qualquer relação.
Nos termos do art. 152, do auto de infração, poderá o contribuinte apresentar defesa escrita, também no prazo de 30 dias como a reclamação oriundo da notificação fiscal, a contar da data da intimação, que terá efeito suspensivo. Na defesa, o autuado alegará toda a matéria que entender útil, indicando ou requerendo as provas que pretender produzir, juntando desde logo, as que possuir, sob pena de preclusão, caracterizando desta forma, o princípio da eventualidade consagrado no art. 300 do Código de Processo Civil, que segue transcrito:
Art. 300. Compete ao réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito, com que impugna o pedido do autor e especificando as provas que pretende produzir.
Decorrido o prazo supracitado sem que o autuado tenha apresentado defesa prévia, será declarado revel, lavrando-se o respectivo termo.
Apresentada a defesa, terá o autuante o prazo de 30 dias para contestar a defesa do contribuinte, implicando em responsabilidade civil o dano causado à Fazenda Municipal por dolo ou culpa.
Findo o prazo para contestação, os autos serão conclusos à autoridade julgadora que ordenará a produção das provas requeridas por autuante e autuado, exceto aquelas que considere inúteis ou protelatórias, determinando a produção de outras que entender necessárias. Após, os autos serão encaminhados à autoridade julgadora para decisão.
Mais uma vez, vê-se uma correlação da legislação sob análise com o Código de Processo Civil. O legislador municipal consagrou a possibilidade da produção de provas de ofício, assim, a questão de deferimento ou não de uma determinada prova dependerá de avaliação da autoridade julgadora, dentro do quadro probatório existente. Assim, se a autoridade entender ser necessária a produção de determinada prova, pode determinar sua realização de ofício, independentemente de solicitação das partes ou de desistência de pedido anterior.
Com o recebimento dos autos, a autoridade julgadora proferirá decisão dentro do prazo de 60 dias, contados do seu recebimento, ou 90 dias se converter o julgamento em diligência, determinando novas provas se considerar que o processo ainda não se encontra “maduro” para ser decidido. Se estes prazos não forem obedecidos, serão objetos de comunicação ao Secretário Municipal da Fazenda, dentro do prazo de 10 dias e, ainda, poderá o Secretário avocar os processos recebidos.
A decisão será proferida por escrito, concluindo objetivamente pela procedência ou improcedência total ou parcial do pedido contido no processo fiscal, sendo expressamente definidos os seus efeitos em quaisquer casos. A comunicação da decisão ao contribuinte dar-se-á por via postal, bem como será publicada a ementa no Diário Oficial.
O prazo para pagamento da condenação é de 30 dias, a contar da sua publicação no Diário Oficial, findo o prazo, será o débito inscrito em Dívida Ativa, salvo nos casos em que a parte vencida haja interposto recurso para o Conselho Municipal de Contribuintes – CMC, cujas decisões são irrecorríveis.
Por derradeiro, percebe-se que o legislador municipal adotou as regras previstas no Código de Processo Civil, bem como os princípios constitucionais com vistas a uma maior segurança jurídica do administrado.
Referências:
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
BRASIL, Lei Complementar nº 005, de 2001. Código Tributário Municipal. Dispõe sobre o Sistema Tributário Municipal e dá outras providências. Disponível em http://www.alagoinhas.ba.gov.br/jornal/CODIGO_TRIBUTARIO.pdf. Acessado em 23 de outubro de 2015.
COSTA, Nelson Nery. Processo Administrativo e suas Espécies, 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.