Os desafios contemporâneos do gerenciamento costeiro nas cidades portuárias

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Os portos são atividades complexas que acentuam os conflitos do gerenciamento costeiro. Conflitos estes que são potencializados pelo Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661/1988) e seus decorrentes, pela Lei dos Portos e pela falta cultura.

1. Introdução:

Partindo dos dados históricos da formação do porto de Santos, podemos entender com clareza a extrema dificuldade de harmonizar as legislações positivadas, e, sobretudo efetivar o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro dentro das Cidades Portuárias.

Em 02 de fevereiro de 1892, a companhia Docas de Santos – concluiu uma área de 260 (duzentos e sessenta metros) de cais numa região chamada Valongo. Foi de Braz Cubas a idéia de transferir o porto da baía de Santos para o seu interior, em águas protegidas, inclusive do ataque de piratas, contumazes visitantes e saqueadores do povoado. Escolhido o sítio denominado Enguaguaçu, no acesso do canal de Bertioga, logo se formou um povoado, motivo para a construção de uma capela e de um hospital, cujas obras se concluíram em 1543. O hospital recebeu o nome de Casa da Misericórdia de Todos os Santos. Em 1546, o povoado foi elevado à condição de Vila do Porto de Santos. Em 1550 instalou-se a Alfândega.

Evidentemente – o Porto é anterior à cidade, e essa, por seu turno, passou a existir única e exclusivamente em função do Porto. Inconteste que a expansão econômica e o desenvolvimento (não gerenciado) gerado pelo Porto eram autopoiéticos, pouco importando o rumo tomado pela polis.

É nesse contexto que é fomentado o presente estudo buscando cotejar a visão legal com a necessidade prática da zona costeira portuária. Sempre buscando enfrentar os desafios contemporâneos da orla marítima e as cidades costeiras.

Para tanto, lançamos uso de uma abordagem hermenêutica da lei, trazendo o viés empírico para validar as constatações extraídas da análise pura do Direito positivado.

Como divisão metodológica buscamos iniciar pela análise do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei 7.661/1988), passando pela Lei Paulista, destrinchando parte de seus instrumentos até desaguar nas legislações municipais. Seguindo no tema passamos ao enfrentamento da Lei dos Portos (Lei nº 12.815/2013) trazendo ao leitor um dos principais desafios das municipalidades portuárias, para a partir disso apresentar os conflitos existentes entre o porto e a cidade, através da busca de conflitos empíricos presentes na realidade atual das polis.

Já chegando o fim do nosso estudo buscamos trazer a luz alguma solução para esses problemas, para ao fim trazermos nossas conclusões.

Neste caminho, forte na ideia de contribuir para o despertar crítico daqueles que acreditam que o Direito não é apenas um emaranhado contraditório de Leis, mas uma verdadeira ciência que amplia os limites do conhecimento ajudando as pessoas a se entenderem melhor, pretende-se buscar o enfrentamento dos desafios contemporâneos do gerenciamento costeiro nas cidades portuárias, buscando ao fim encontrar a luz, deflagrando uma solução utilitarista e principalmente realista na dimensão dos cases práticos.

2. Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e as cidades portuárias:

A partir das primeiras Convenções Internacionais (Estocolmo, 1972), o mundo verificou que era preciso desenvolver, porém de forma sustentável, preservando os recursos para as presentes e futuras gerações.

A partir disso, o Brasil deu inicio a um arcabouço legislativo com o objetivo claro de administrar ordenadamente a Zona Costeira, lhe dando especial atenção, em razão densa ocupação demográfica. No primeiro Projeto n.º 3.759/1984, em seu artigo 2.º, parágrafo único, estabelecia a medida mínima da Zona Costeira, que abrangeria “uma faixa marítima de 12 milhas náuticas de largura e outra, terrestre, de 2 km de largura, que poderá ser ampliada pelo zoneamento”.

O critério objetivo (matemático) mencionado não foi aproveitado no Projeto 216-A/1987, que se tornou lei; especifica o art. 2.º, parágrafo único, da Lei 7.661/1988: “Considera-se Zona Costeira o espaço geográfico de interação do ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renováveis ou não, abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre, que serão definidas pelo Plano”.

Claramente a legislação não considerou a Zona Costeira como uma área de compartimentos estanques, preferindo o conceito científico para definir esse espaço como sendo um local de interação entre ar, o mar e a terra.

Noutra ponta, a Lei n.º 7.661, de 16 de maio de 1988, instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro. Essa legislação tem conteúdo semântico difuso, em outros termos, é principiológica. A bem da verdade essa legislação não pode ser definida verdadeiramente como um plano, e sim, de diretrizes para elaboração de um Plano que teve sua regulamentação tardia através do Decreto nº 5.300, de 7 de dezembro de 2004.

Neste decreto instituiu diversos instrumentos para efetivação do plano nas várias esferas do governo (Municipal, Estadual e Federal), como por exemplo, Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro – PEGC que implementa a Política Estadual de Gerenciamento Costeiro, que define responsabilidades e procedimentos institucionais para a sua execução, tendo como base o PNGC, previsto no artigo 7, III do Decreto nº 5.300.

Assim, no Estado de São Paulo, exempli gratia, a lei que instituiu o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro[1] previu a constituição de um sistema colegiado de gestão com participação dos governos estadual, municipal e da sociedade civil, consubstanciado no grupo de coordenação estadual ao qual se integram os quatro Grupos Setoriais, correspondentes às diferentes regiões do litoral paulista.

A Lei Paulista estabeleceu os seguintes instrumentos de gerenciamento costeiro: a.) Zoneamento Ecológico-Econômico; b.) Sistema de Informações; c.) Planos de Ação e Gestão e d.) Controle e Monitoramento[2].

Seguindo em nosso recorte metodológico o estudo segue para o Zoneamento Ecológico-Econômico, pois está diretamente ligado a tomada de decisão municipal que vai atingir diretamente as comunidades e o meio ambiente da Zona Costeira.

O Zoneamento Ecológico-Econômico segundo a Lei Paulista é

O conjunto de atividades e procedimentos que, através de instrumentos específicos, permite a gestão dos recursos naturais da Zona Costeira, de forma integrada e participativa, visando a melhoria da qualidade da vida das populações locais, fixas e flutuantes, objetivando o desenvolvimento sustentado da região, adequando as atividades humanas à capacidade de regeneração dos recursos e funções naturais renováveis e ao não comprometimento das funções naturais inerentes aos recursos não renováveis.

O Decreto n.º 5.300 de 07 de dezembro de 2004, repete a redação dada pela Lei Paulista no que tange ao ZEEC, porém não impõe data limite para a instalação, preparação e efetivação desse importante instrumento, tão pouco elenca sanção aos municípios que não implantarem o instrumento.

Hodiernamente, o novo Código Florestal (Lei federal nº 12.651/2012) estabeleceu um prazo de 05 (cinco) anos para que todos os estados elaborem e aprovem seus ZEEs, segundo metodologia unificada estabelecida em norma federal.

Seguindo no recorte metodológico, o Zoneamento Ecológico-Econômico – ZEE da Baixada Santista foi regulamentado pelo Decreto Estadual nº 58.996, de 25 de março de 2013, considerando a necessidade de promover o ordenamento territorial e disciplinar os usos dos recursos naturais, de modo a assegurar a qualidade ambiental, o desenvolvimento sustentável e a melhoria das condições de vida da população.

A política de desenvolvimento urbano a cargo do Poder Público Municipal (Constituição Federal, artigo 182), em que pese ser um mandamento Constitucional, foi revogado (de fato) pelas legislações infraconstitucionais que dão primazia ao desenvolvimento Portuário, ignorando por absoluto o desenvolvimento das cidades portuárias.

Em um cotejo paralelo, a Revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento e Expansão Urbana do Município de Santos apresenta dados que desfigura o comando constitucional retromencionado, pois afastam a efetividade do princípio do desenvolvimento sustentável, destruindo a tese kantiana de ética de meios (a ética aqui é de fins).

Assim, destaca o relatório, a atividade portuária garante grande participação na Economia, e no que se refere à movimentação de carga, o Porto de Santos compreende os Estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul – abarcando 49,44% do PIB brasileiro e 48% da balança comercial, possuindo forte prospecção de crescimento, mesmo em cenários pessimistas (cumprimento das legislações, desenvolvimento sustentável, desenvolvimento das cidades portuárias).[3]

Os números demonstram que o Plano Nacional de Gerenciamento da Zona Costeira, especificamente no que toca aos conflitos entre o Porto e as cidades costeiras, é incipiente, seguindo a tradição histórica.

O desafio é inverter a lógica historicamente assentada alterando o paradigma para: “A cidade não existe apenas em razão do Porto”.

3. Lei dos Portos e o município

A lei n.º 12.815, de 5 de junho de 2013 conhecida como Lei dos Portos[4] surgiu como proposta da mágica solução para os investimentos necessários nos gargalos logísticos, ou seja, modernizar novamente os portos, agora sob outro titulo.

Ocorre que para a mágica solução o Estado abriu mão do monopólio estatal, possível pelo artigo 21, XII, “f”, da Carta Política, para entregar nas mãos invisíveis do mercado o farto dos investimentos.

Talvez em uma tentativa frustrada de conter o liberalismo das concessões criou no seio da Lei dos Portos um arcabouço jurídico de regulação do setor que até o presente momento se mostrou ineficiente.

Ineficiência comprovada pelo decurso de mais de ano e dia sem nenhuma obra de infraestrutura, superestrutura ou saneamento logístico foi iniciada, aliás, sequer houve abertura de certame concorrencial amplo para as áreas dos portos brasileiros.

Noutra ponta do problema encontramos as cidades onde se situam os portos, o empreendimento portuário é um empreendimento complexo do ponto de vista ambiental dada às nuances do porto e as externalidades geradas.

Quando falamos de externalidades portuárias encontramos um vasto rol que vai desde impactos na mobilidade urbana a poluição da água e do ar, passando pela oferta de um potencial risco ambiental latente pelo transporte de produtos perigosos necessários à vida contemporânea.

Adicionado a isto, temos nos portos uma porta para o território nacional que oferta além das externalidades já faladas, o risco epidemiológico as cidades. Ofertando, assim, para as cidades um pesado ônus, cujos bônus é colhido pelo Estado como um todo.

Retornando a Lei dos Portos oportuno é o caso da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 316 onde temos a municipalidade de Santos editando normas de interesse local que restringem o uso do Porto.

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Naquele caso, a celeuma versava sobre o edital de lotes que seriam licitados pela União no que tange aos arrendamentos (agora pela nova lei concessões) no Porto de Santos, mostrando o interesse em manter na área portuária um corredor de terminais que operam com graneis sólidos, de grãos de milho e soja. E, operações com tais cargas têm a externalidade de em situações como a de Santos, gerarem farta dispersão de particulados suspensos no ar, ocasionando um infortúnio desagradável aos habitantes da polis, gerando, inclusive, doenças respiratórias.

Insatisfeito com a licitação da União a municipalidade considerando o desenvolvimento do município de Santos, principalmente no bairro da Ponta da Praia[5] onde este se tornou uma zona residencial de alto padrão pressionando a operação portuária.

A Câmara dos Vereadores de Santos editou uma Lei de Uso e Ocupação do Solo, que proíbe tais terminais naquele local desejado pela União.

A resolução da celeuma se deu entorno da Constituição Federal onde há a previsão expressa de competência da União para versar sobre a regulação de portos (artigo 22, X) tendo assim o município invadido a competência da União[6].

O caso de Santos ilustra bem a posição das cidades frente o gerenciamento costeiro portuário, pois inexistem instrumentos legais para o município sobrepor o seu interesse sobre o interesse portuário nacional, inexistindo sequer um dialogo.

4. CONFLITOS PORTO-CIDADE

Em 1991, vinte e cinco por cento da população residia em municípios da Zona Costeira, conforme dado apresentado por Leme (2014, p.1075), citando Carvalho e Rizzo:

A Zona Costeira brasileira corresponde a uma faixa de transição onde interagem dinamicamente três grandes sistemas: oceânico, atmosférico e continental. Possui quase 7.400km de extensão e largura que varia de 70 a 480 km... A parte emersa ocupa uma área de 440.000km2 (pouco mais de 5% do território nacional), abrangendo 512 dos 4.493 Municípios brasileiros, onde se concentram perto de 39 milhões de habitantes (mais de 1/4 da população brasileira pelo Censo de 1991), com uma densidade demográfica de 87 hab./km2 (índice 5 vezes superior ao nacional) (Victor C. Carvalho e Hidely G. A. Rizzo, Zona Costeira: Subsídios para uma avaliação ambiental, Brasília, Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, 1994).

Hoje esse número cresceu para vinte e seis por cento devido a fatores históricos relacionados à ocupação do território brasileiro e seguindo a tendência mundial da população em ocupar predominantemente áreas próximas ao litoral, traduzindo essa porcentagem em número, a população Brasileira que vive em municípios que integram a Zona Costeira é equivalente a 50,7 (cinquenta milhões e setecentos mil) de habitantes.

Parte dessa população está ocupada em atividades, direta ou indiretamente, ligadas ao turismo, produção de petróleo e gás natural, pesca e serviços que atendem à dinâmica econômica gerada por esses municípios e outros próximos (IBGE, 2011).

Na prática, o Zoneamento Econômico-Ecológico não existe, e, cada Estado, e, consequentemente seus municípios exercem (ou não) a gestão da Zona Costeira de forma descentralizada, e, sem qualquer observância legal, colidindo, portanto, com os axiomas apontados nas legislações correlatas.

Como consequência direta da inobservância dos entes do Estado no que tange ao desenvolvimento sustentável da Zona Costeira, se observa cada vez mais conflitos entre homem/natureza, cidade/natureza, porto/natureza.

Assim, ante a ausência de estratégia no planejamento, observa-se o acentuamento do problema de mobilidade urbana nas cidades portuárias agravadas todos os anos na época da safra de grãos onde as cidades de Paranaguá e Santos sofrem com o gargalo logístico existentes.

A síntese do problema está no anacronismo legal e executivo entre as esferas de governo isto ocorre dado às diversas atribuições entre as esferas do governo postas pelas mais esparsas legislações, entre as mais importantes podemos citar o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661/1988), o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) e a nova Lei dos Portos (Lei nº 12.815/2013).

A verdade é que não há a atribuição suprema a um único ente, todas as legislações quando falam de gerenciamento costeiro calcam sua efetividade na integração política entre União, Estados e Municípios.

Neste cenário vemos os conflitos brotarem, como é o caso de Santos onde a União deseja um layout portuário e o município outro[7] ou ainda o caso de Suape onde o desrespeito ao ecossistema marinho na construção do porto elevou os índices de ataques de tubarão na grande Recife[8].

Ou ainda, as alterações ambientais introduzidas pela implementação do Porto de Rio Grande conforme assenta Oliveira et all (2013):

Por sua ocupação urbana ser margeada de ambientes frágeis as intervenções antrópicas tem consequências diretas sobre estes ecossistemas.  Como por exemplo, mudanças no canal de desembocadura do estuário, ocupado pelo Porto, pode induzir mudanças na circulação e na salinidade, que por sua vez geram perda de biodiversidade no ambiente estuarino.  E essa perda de biodiversidade pode se converter em problemas econômicos para os pescadores artesanais que sobrevivem do estuário, além de problemas sociais como a degradação da beleza cênica destes ambientes.

No caso particular de Rio Grande Oliveira et all (2013) pontua que a falta de capacidade de articulação dos atores locais é o fator principal para o agravamento do conflito porto cidade.

Assim, os conflitos entre o porto e a cidade situam-se no descompasso entre as perspectivas de desenvolvimento, que pela via legal deveria ser sustentável.

5. Mediação Socioambiental como alternativa a tutela dos conflitos Porto Cidade:

 A solução aos conflitos do gerenciamento costeiro portuário nasce na criação de uma cultura de concessões onde os atores devem ceder para criação de um consenso.

 Hodiernamente a onda verde é uma verdade (in)conveniente, o princípio do desenvolvimento sustentável, pressupõe que os antigos atores (detentores dos meios de produção e não detentores dos meios de produção) e os novos atores (sociedade civil), dialoguem, trabalhando a gestão ambiental também no prisma da mediação.

 Se por um lado a onda verde cresce como paradigma, por outro, não encontra guarida como ideia positivada.

A Lei n.° 12.815, de 05 de junho de 2013, que é a novel legislação acerca de modernização dos Portos, em nenhum dos seus 76 (setenta e seis) artigos fala em Desenvolvimento Sustentável, meio ambiente ecologicamente equilibrado, mediação ou conciliação – afastando-se, portanto, do modo cooperativo.

Ante a dura realidade legislativa que conduz ao ativismo judicial, soluções como a mediação tem se mostrado meio extremamente útil ao tratamento dos conflitos.

Na sociedade de risco, o Direito não pode ser autopoiético, razão pela qual o monopólio judicial a resolução de conflitos é um conceito que deve ser desconstruído, surgindo um novo modelo baseado na educação ambiental e legal.

Sim, pois a execução da sentença, especialmente em matéria ambiental é extremamente difícil e morosa. A judicialização do cases - e a prática cada vez mais comprova essa assertiva, não é o caminho mais sensato, deve funcionar literalmente como ultima ratio.

Dentre os principais mecanismos utilizados para a resolução dos conflitos pela via extrajudicial, pode-se citar a conciliação, a mediação e a arbitragem.

Sobre esses instrumentos, Trentin e Stairn (2012) apontam sua importância prática:

Cabe ressaltar a importância da mediação quanto à celeridade na resolução dos conflitos, uma vez que contribuirá para a prevenção do dano aos recursos naturais e para o desenvolvimento sustentável. Constata-se que tais mecanismos se têm mostrado eficientes não só no Brasil, mas em outros países, em diversas áreas do Direito. Na área ambiental, no entanto, é imprescindível que haja uma mudança de paradigma, ou seja, de postura cultural da sociedade para evitar atribuir somente ao poder Judiciário o caminho para a resolução dos conflitos ambientais.

Nesse contexto, o chamamento dos velhos e novos atores em conflito, para o diálogo, através da mediação, constitui alteração de paradigma, ao passo que, uma vez satisfeitas às partes através do acordo entabulado, altera-se o estereótipo ganhador/perdedor para o de ganhador/ganhador (TRENTIN; STAIRN, 2012).

A mediação consoante destaca Figueiredo (2014) é um meio alternativo (complementar, como preferimos) ou extrajudicial de resolução de disputas (ADR – Alternative Dispute Resolutions). Terminologicamente, é também conhecida dentre os Meios Alternativos de Controvérsias (MASCs) ou Meios Extrajudiciais de Resolução de Controvérsias.

Não obstante as comprovadas vantagens na aplicação da mediação, em matéria de conflitos socioambientais, especialmente nos desafios contemporâneos do gerenciamento costeiro nas cidades portuárias, verifica-se que esse, por vezes, esbarra na problemática da indisponibilidade do bem jurídico tutelado.

A flexibilização do meio ambiente como bem jurídico tutelado indisponível é uma prática que vem sendo aplicada com sucesso no chamado termo de ajustamento de conduta (TAC), que converte-se em título executivo judicial em hipótese de descumprimento.

Por essa quadra, a mediação pode ser utilizada até como mecanismo de prevenção nos chamados compromissos de ajustamento de conduta, consoante destaca Silva (2014) apud Macuso (2004):

Considerando um evento de lesão ou ameaça de lesão aos direitos coletivos lato sensu, e. g. para navio petroleiro trafegando sem equipamentos de contenção contra vazamento de óleo, um acordo, como assumir a obrigação de fazer em instalar os equipamentos obrigatórios, resolveria o dissídio e anteciparia a solução caso a ameaça se tornasse realidade. Registre-se, outrossim, que, nas ações coletivas, em muitas situações não há perdedores ou vencedores, a preservação do interesse objetivado é a melhor tutela para o aspecto difuso questionado, não busca-se “vencer” a causa.

Por derradeiro, após conjugar o contexto histórico, as questões econômicas, a legislação vigente, e, sobretudo a intrincada problemática na sustentabilidade do desenvolvimento da Zona Costeira, em especial, no Porto e nas cidades portuárias, vislumbramos a presente ampliação dos postulados da mediação como alternativa a resolução dos conflitos ambientais com o olhar voltado para o futuro, garantindo, efetivamente, o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

6. CONCLUSÕES:

Emerge em meio ao Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro instrumentos que pela via teórica garantiriam a integração entre as esferas de governo, porém é latente o descompasso dos entes políticos em utilizarem tais instrumentos.

Fato este que é facilmente percebido pelo anacronismo da evolução legal, o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro data de 1988, o Decreto que o regulamenta de 2004, se nos embrenharmos ainda mais na teia legal veremos no Estado de São Paulo uma lei especifica (Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro - Decreto Estadual n.º 47.303/2002) editada antes da lei geral (Decreto 5.300/2004).

Seguindo nesta irregularidade vemos na Baixada Santista o Zoneamento Ecológico-Econômico, outro instrumento de integração e coesão do Gerenciamento Costeiro, somente implantado em 2013 (Decreto Estadual nº 58.996/2013)

Isto tudo em desproporcional necessidade de coesão entre a integração e coesão do Gerenciamento Costeiro Nacional face sua importância, principalmente para atividade portuária que em última instância fixa-se na cidade.

Evoluindo, observamos na Lei dos Portos uma máxima teórica de regulação da atividade portuária que após mais de ano e dia da sua implementação não traz os frutos prometidos acentuado somente os conflitos já existentes.

Assim, após conjugar o contexto histórico, as questões econômicas, a legislação vigente, e, sobretudo a intrincada problemática na sustentabilidade do desenvolvimento na Zona Costeira, em especial, no Porto e nas cidades portuárias, vislumbramos a presente ampliação dos postulados da Mediação como alternativa a resolução dos conflitos ambientais com o olhar voltado para o futuro, garantindo, efetivamente, o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações.

O desafio é inverter a lógica historicamente consolidada há mais de 450 anos (a cidade existe apenas em razão do Porto), trazendo como suporte uma releitura crítica da Constituição Cidadão, firme nos postulados de uma ética de meios, aliando o Desenvolvimento Sustentável a uma efetiva melhoria de vida das pessoas que fazem parte dessa história e da história.

7. REFERÊNCIAS

FIGUEIREDO, Luciana Monduzzi. Mediação Ambiental: o acesso à justiça pelo olhar da extrajudicialidade. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=6822951732be44ed>. Acesso em: 27 set. 2014.

HAZIN, Fábio H. V.; BURGESS, George H.; CARVALHO, Felipe C.. A shark attack outbreak off Recife, Pernambuco, Brazil: 1992–2006. Bulletin Of Marine Science, Miami, v. 2, n. 82, p.199-212, 2008. Disponível em: <http://www.imensidao.net/Downloads/Hazin_etal_2008_A shark_attack.pdf>. Acesso em: 21 set. 2014.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. IBGE em parceria com a Marinha do Brasil lança o Atlas Geográfico das Zonas Costeiras e Oceânicas. 2011. Disponível em: <http://cod.ibge.gov.br/2FN4P>. Acesso em: 21 set. 2014.

MACHADO. Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 22. ed. São Paulo, 2014.

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário / Édis Milaré; prefácio Ada Pellegrini Grinover. – 6.° ed. rev., atual e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009

OLIVEIRA, D. S.; DOMINGUES, M. V. D. R.; ASMUS, M. L. e ABDALLAH, P. R.. Expansão Portuária, Desenvolvimento Municipal e Alterações Ambientais no Brasil: Desafios para a gestão costeira. RGCI [online]. 2013, vol.13, n.1, pp. 79-87. Disponível em: <http://www.aprh.pt/rgci/rgci356.html>. Acesso em: 21 set. 2014.

RANNY, Tawan. Plano Diretor nas Cidades Portuárias: A ausência de participação popular nas políticas públicas de desenvolvimento portuário. Revista Eletrônica da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, 2014. Aceito para publicação em 13.05.2014, porém ainda não publicado.

São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Coordenadoria de Planejamento Ambiental Estratégico e Educação Ambiental. Zoneamento Ecológico-Econômico - Litoral Norte São Paulo / Secretaria de Estado do Meio Ambiente. Coordenadoria de Planejamento Ambiental Estratégico e Educação Ambiental. - São Paulo: SMA/CPLEA, 2005. 56p. 29,7x21cm Disponível em: <http://www.ambiente.sp.gov.br/cpla/files/2011/05/Zoneamento-Ecologico-Economico_Litoral-Norte.pdf>. Acesso em: 27 set. 2014.

SILVA, Jorge Victor Cunha Barretto da. A Tutela Jurídica Ambiental por Intermédio dos Compromissos de Ajustamento de Conduta:: Aspectos delicados sobre a efetividade deste instrumento para a proteção dos recursos naturais. In: FREITAS, Gilberto Passos de; GRANZIERA, Maria Luiza Machado (Org.). Sobre a Efetividade da Tutela Ambiental. São Paulo: Millennium, 2014. p. 1-139. (978-85-7625-304-4).

TRENTIN, Taise Rabelo Dutra; PIRES, Nara Suzana Stairn. Mediação Socioambiental: Uma nova alternativa para a gestão ambiental. Disponível em: <https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/viewFile/501/469>. Acesso em: 27 set. 2014.


[1]              Decreto Estadual n.º 47.303, de 07 de novembro de 2002. Observe-se aqui que embora a lei paulista seja anterior a própria regulação pelo Decreto 5300/2004 há um silogismo legal que se encaixa harmonicamente no plano das normas.

[2]              Lei Estadual n.º 10.019, de 03 de julho de 1998, que instituiu o Plano Estadual de Gerenciamento Costeiro.

[3] http://www.santos.sp.gov.br/sites/default/files/conteudo/Diagn%C3%B3stico%20Consolidado%20Revis%C3%A3o%20Plano%20Diretor%20Santos.pdf – acesso dia 26/09/2014

[4]              A Lei 12.815/2013 revogou expressamente a Lei 8630/93 até então Lei de Modernização dos Portos.

[5]              Local onde se manteria os terminais de graneis, antigamente conhecido como o sovaco da mula.

[6]              A bem da verdade legal é previsto no artigo 14 da Lei dos Portos a consulta ao poder público municipal fato que no caso de Santos inexistiu, porém caso existisse pelas ações políticas do governo federal o local não seria diferente, seja pela consulta não ter poder vinculante ou de veto, seja pelo interesse da União em não onerar mais o particular que se tivesse de adaptar o local a outra atividade mais despediria em um ponto que não é gargalo

[7]              Caso da ADPF 316 citado alhures.

[8]              Vide os estudos de Fabio Hassin (2008) para maiores detalhes

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Sobre os autores
Henrique Perez Esteves

Advogado Criminalista com atuação no Tribunal do Júri. Mestre em Direito Público, Pós-graduado em Processo em Processo Penal. Professor de Direito Penal, Processo Penal e Prática Penal Advogado.

Tawan Ranny Sanches Eusébio Ferreira

Mestrando em Direito Ambiental pela Universidade Católica de Santos, Advogado, Técnico de Segurança do Trabalho da Companhia Docas do Estado de São Paulo.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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