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Tutela provisória e o novo CPC

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Análise das principais inovações trazidas pelo novo CPC no que se refere às tutelas provisórias, de maneira a verificar seus pressupostos, momento de concessão e natureza.

Intróito

No tocante a tutela provisória se formos observar a legislação processual e os seus princípios informativos, iremos perceber a existência de dois princípios cardeais que devem ser harmonizados no tocante a este assunto, o princípio da segurança jurídica e o princípio da efetividade.

Assim, a redação original do Código de Processo Civil de 1973, não previa a possibilidade de concessão de tutela antecipada nos procedimentos ordinários, havendo tão somente esta previsão legal no que se refere a alguns procedimentos especiais, a exemplo das ações possessórias e das ações de depósito.

Ademais, havia a previsão de concessão de liminar nos procedimentos cautelares, previsto no seu art. 804. Isso acabou dando ensejo, na prática, ao que fora denominado cautelares satisfativas, que era quando se pleiteavam em procedimentos cautelares providências de nítido viés satisfativo.

Dessa forma, é possível perceber que o legislador buscava robustecer o princípio da segurança jurídica, no sentido de que somente poderiam ser adotadas medidas de caráter satisfativo após uma decisão judicial transitada em julgado. Anote-se a lição de Luiz Guilherme Marinoni (Curso de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pág195) quanto ao tema:

Houve um momento em que o tempo não era visto como algo importante na vida do processo. Nesse mesmo período, o que interessava para o processualista era encarar o processo por um ângulo estritamente interno de visão, vendo-o tão somente a partir de conceitos processuais e dele expurgando tudo que dissesse respeito ao direito material. A ideologia que estava por detrás dessa atitude do legislador e da doutrina que lhe ofertava sustentação teórica era a da neutralidade científica e do descompromisso do processo civil senão com os seus próprios conceitos – em um frio e indiferentismo purismo metodológico. Interessava ao máximo ao processualista a abstração, o conceitualismo e o sistematicismo da ciência processual civil.

A partir da realização das micro-reformas processuais, foi inserido no art. 273 do CPC de 1973 o instituto da tutela antecipada, em decorrência do qual se possibilita a antecipação dos efeitos da tutela desde que preenchidos os requisitos previstos na legislação vigente, notadamente, a prova inequívoca da verossimilhança da alegação e o receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Com a inserção do instituto da tutela antecipada notava-se um claro movimento do nosso legislador em busca de tentar privilegiar de maneira incisiva o princípio da efetividade.

Assim, partindo de uma premissa de que a realização do devido processo legal exige necessariamente um tempo razoável de duração das demandas, o ônus do tempo deve ser repartido entre as partes, não sendo considerado mais justo que apenas o Autor arque com o ônus temporal. Mais uma vez, registre-se o ensinamento de Luiz Guilherme Marinoni (Curso de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pág.198) sobre a matéria:

Como o tempo é concomitantemente inerente à fisiologia do processo e fonte de dano ao autor que tem razão no seu pleito, é necessário distribuí-lo de acordo com determinados critérios ao longo do seu desenvolvimento. Do contrário, corre-se o risco de o autor ter que invariavelmente pagar pelo tempo do processo – independentemente da urgência na realização da tutela do direito ou da evidência da posição jurídica que defende em juízo -, com evidente violação do princípio da igualdade (art. 5º, I, da CF/1988, e 7º do CPC).

Dessa forma, a possibilidade de concessão de tutela antecipada buscava repartir de maneira equânime o ônus do tempo entre as partes.

Entrementes, é possível se constatar a realização de uma série de reformas nos últimos anos na legislação processual buscando alcançar esse desiderato de efetividade do processo, buscando com isso assegurar a efetividade do acesso à justiça a todos.


            2. Tutela Jurídica

Dessa forma, na medida em que constatamos que a Constituição Federal estabeleceu em seu art. 5º, inc. XXXV, o monopólio do Poder Judiciário, também denominado de inafastabilidade do controle jurisdicional, impõe-se ao Estado-juiz tutelar o direito das partes.

Art. 5º

....

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Com efeito, é imperioso afirmar que a tutela jurídica é prestada de diferentes formas.           

Temos a tutela jurídica definitiva que é aquela concedida após uma decisão judicial transitada em julgado.

E temos a tutela jurídica provisória que é aquela concedida sem que exista uma decisão judicial transitada em julgado, em outras palavras, uma tutela concedida durante a pendência de um processo.

Com efeito, é evidente que a forma de cognição a ser exercida pelo magistrado nestas situações terá que ser distinta.

Para que se tenha uma tutela jurídica definitiva, a cognição a ser exercida pelo magistrado deverá ser exauriente, ou seja, pressupõe uma análise aprofunda, robusta, plena, de todos os pressupostos fáticos e jurídicos que lastreiam uma demanda.

Enquanto que para a realização de uma tutela jurídica provisória, a cognição a ser realizada deverá ser sumária, isto é, que não é plena, não é completa, mas apenas com base na análise dos fundamentos fáticos e jurídicos que já foram demonstrados, apresentados. Com efeito, a tutela provisória não é apta a produzir os efeitos da coisa julgada, pois não se pode conceber que uma decisão tomada com base em uma cognição que não é completa, possa se tornar uma decisão imutável.

Dessa maneira, a tutela provisória encontra guarida em um juízo de probabilidade. Sobre o tema, a importante lição de Luiz Guilherme Marinoni (Curso de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pág. 202):

Quer se fundamente na urgência ou da evidência, a técnica antecipatória sempre trabalha nos domínios da “probabilidade do direito” (art. 300) – e, nesse sentido, está comprometida com a prevalência do direito provável ao longo do processo. Qualquer que seja o seu fundamento, a técnica antecipatória tem como pressuposto a probabilidade do direito, isto é, uma convicção judicial formada a partir de uma cognição sumária das alegações da parte.

Assim, vislumbrando-se o processo civil como sendo um meio para tutelar o direito das partes, o direito material subjacente a lide, pode-se identificar basicamente duas formas de tutela processual, a tutela satisfativa e a tutela cautelar.

A tutela satisfativa é aquela na qual se pretende o reconhecimento de um direito da vida ou a sua fruição, o seu gozo.

Na tutela cautelar se busca a proteção de um bem da vida, juízo de referibilidade. Protege-se o bem, acautela-o de maneira a buscar garantir, em última instância, o resultado útil da tutela satisfativa. Por isso, se afirma que a tutela cautelar é um instrumento do instrumento. Pois se processo é um instrumento para a efetivação do direito material das partes. O processo cautelar protegeria o bem a ser discutido em outro processo, assim seria um instrumento do instrumento.


        3. O NOVO CPC E A TUTELA PROVISÓRIA

Firmada estas premissas, impõe-se observar que o novo CPC aboliu o livro que tratava das tutelas cautelares, passando a disciplinar este assunto dentro da tutela provisória.

Dessa forma, o Novo CPC dedica o seu Livro V a tratar da tutela provisória, nos arts. 294 a 311.

Assim, quando analisamos a questão da tutela provisória é possível realizar diversas análises quanto a esta temática.

A primeira que gostaríamos de realizar é verificar o que se concede com a tutela provisória.

Nesse contexto, é possível identificar a concessão de um provimento cautelar e a concessão de um provimento satisfativo. Nesse sentido, dispõe o seu art. 294.

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo Único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

O provimento cautelar, conforme já afirmamos, vai ser marcado por um caráter assecuratório. Ou seja, se pleiteará a proteção de um bem da vida, de modo a se buscar evitar o seu perecimento no curso da demanda. O fito, portanto do Autor, ao pleitear o provimento cautelar não é gozar do bem da vida, mas buscar a sua proteção, de modo a tentar evitar minorar os efeitos do tempo.

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O tutela provisória cautelar detém como característica a temporalidade, o que faz com que os seus efeitos sejam mantidos enquanto houver necessidade de proteção do bem ou do direito tutelado.

De outra banda, temos as tutelas provisórias satisfativas, que são também denominadas pelo Novo CPC, como tutela antecipada.

Na tutela provisória satisfativa o que se pretende é antecipar os efeitos da tutela definitiva, de modo a possibilitar ao Autor a fruição imediata do seu direito. Daí se afirmar, que será característica da tutela provisória satisfativa a provisoriedade da sua decisão, uma vez que esta necessariamente será substituída pela decisão final (tutela definitiva).

Assim, diante de uma situação fática envolvendo a discussão sobre a propriedade de uma obra de arte. É possível o Autor postular uma tutela provisória cautelar na qual o bem discutido seja colocado sob a responsabilidade de um depositário enquanto perdurar a demanda, de modo a evitar o perecimento ou a deterioração do bem durante o litígio. Trata-se de um provimento temporário que se pleiteia, pois na tutela definitiva a pretensão certamente será outra, a transferência da posse e o reconhecimento da propriedade cumulada com uma indenização por danos morais, por exemplo.

Na tutela provisória satisfativa, o que se pleiteia é a antecipação dos efeitos da tutela definitiva. Assim, diante de uma negativa de autorização por um plano de saúde para cobrir um determinado procedimento cirúrgico, ingressa-se com uma ação judicial requerendo a concessão de uma tutela antecipada (ou seja, de uma tutela provisória satisfativa), em decorrência da qual seja determinado a realização imediata do procedimento.

Dessa forma, é possível se constatar que ontologicamente tutela cautelar e tutela satisfativa são provimentos distintos, bem como, que ambas poderão ser concedidas sob a forma de tutela provisória.


4. PRESSUPOSTOS DA TUTELA PROVISÓRIA

No tocante aos pressupostos da tutela provisória, ou seja, o que justifica a concessão do provimento, é possível se constatar que esta poderá ser concedida em face de uma situação de urgência ou em razão de uma situação de evidência.

Assim, podemos falar em tutela provisória de urgência e em tutela provisória de evidência.

A tutela provisória de urgência poderá ser de caráter cautelar ou de caráter satisfativo.

Dessa maneira, disciplinando a matéria, dispõe o art. 300 do Novo CPC sobre os requisitos autorizadores da tutela de urgência:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferece-la.

§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.

Nesse diapasão, é possível se verificar que houve uma uniformização dos requisitos necessários para a concessão da tutela provisória satisfativa e cautelar, não havendo mais como no CPC de 1973 requisitos distintos. Sobre esta matéria, assim se manifesta Guilherme Rizzo Amaral (Comentários às Alterações do Novo CPC. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pág. 400):

A doutrina, na vigência do CPC/1973, via diferenças entre o requisito do fumus boni juris para a concessão da tutela cautelar, e o da verossimilhança fundada em prova inequívoca da tutela antecipatória. Este supunha “cognição em nível mais aprofundado”.  Apesar da controvérsia existente em torno do conceito de “prova inequívoca”, entendemos que, pela sistemática do CPC revogado, a tutela cautelar poderia ser concedida com base na verossimilhança das afirmações do requerente da medida, enquanto que a tutela antecipatória e satisfativa, salvo nas hipóteses de dispensabilidade da prova (ex. questão unicamente de direito), fazia-se necessária a presença de prova capaz de convencer o juiz da verossimilhança das afirmações do requerente.

De outra banda, é mister afirmar que a tutela provisória de evidência apenas poderá ser de natureza satisfativa, o que podemos denominar, repito, de tutela antecipada.

A tutela de evidência lastreia-se em uma defesa que é considerada inconsistente, tal qual preconizado no art. 311 do novo CPC:

Art. 311. A tutela de evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quanto:

I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;

II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmulas vinculantes;

III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;

IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.

Enquanto regra geral a tutela provisória satisfativa de evidência pressupõe a prévia realização do direito ao contraditório. Apenas, nas hipóteses previstas nos incisos II e III do art. 311 é que se torna possível a concessão de provimento liminar.

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Sobre o autor
Erick Menezes de Oliveira Junior

Advogado. Procurador Jurídico do Município de Vitória da Conquista. Professor de Direito Internacional Público e Privado da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA JUNIOR, Erick Menezes. Tutela provisória e o novo CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4758, 11 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/44363. Acesso em: 22 nov. 2024.

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