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Competência tributária negativa.

As imunidades tributárias

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10/11/2003 às 00:00
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3. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA E IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

3.1. O Estado e a competência tributária

Infirme-se a distinção entre poder tributário e competência. O poder tributário é o jus imperium do Estado em manifestação de sua soberania e é originalmente ilimitado. Com a organização jurídica do Estado o poder tributário passa a ter limitações vinculadas às normas que definem a sua atuação, surgindo, então, a competência tributária25.

Borges26 leciona que a competência tributária consiste numa autorização e limitação constitucional para o exercício do poder tributário.

Para Geraldo Ataliba e Aires Barreto27 na competência tributária "(...) não há limitação à competência; esta já surge com campo definitivo, demarcado pelos contornos resultantes das ações e reações de outras normas (...). (...) é o resultado de regras positivas e negativas que a delineiam e demarcam."

Afirmam ainda que a competência é a aptidão para legislar sobre tributos, considerando as situações de intributabilidades previstas no texto constitucional, sendo a imunidade, pois, área estranha e alheia à competência. A imunidade é, portanto, o reverso da competência.

A competência tributária apenas pode ser exercida mediante a lei, conforme o princípio da legalidade tributária.

Carraza28 diz que a competência tributária "(...) é a possibilidade de criar, in abstracto, tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas."

Já Borges29 advoga que "A regra jurídica de imunidade insere-se no plano das regras negativas de competência. O setor do social abrangido pela imunidade está fora do âmbito da tributação. Previamente excluído, como vimos, não poderá ser objeto de exploração pelos entes públicos".

Por isso, podemos entender que a imunidade é a competência tributária negativa, prevista na Carta Política como direito inalienável de certas pessoas, conferidos pelo constituinte em razão de sua natureza política ou social.

3.2. Cotejo entre competência e imunidade tributária

Entendidos os conceitos de competência tributária podemos definir as características paralelas desta com a imunidade tributária30.

Enquanto que a competência tributária se caracteriza pela:

a) privatividade ou exclusividade para criação de tributos pela pessoa política legitimada para o tributo correspondente;

b) indelegabilidade, visto que a competência não pode ser transferida para outra pessoa política;

c) incaducabilidade ou imprescribilidade, já que o não exercício da competência não determina a extinção do direito de instituir o tributo;

d) inalterabilidade, posto que a competência tributária da pessoa política é escudada no texto constitucional, não podendo ser modificada pela própria pessoa política que detém a competência;

e) irrenunciabilidade, eis que a pessoa política não pode abrir mão da competência;

f) facultatividade, visto que a oportunidade para o exercício da competência tributária é da pessoa política que a detém.

Costa31 afirma que "(...) a imunidade (...) por constituir norma impeditiva de competência tributária, também desfruta dos mesmos atributos."

Então, seguindo esta orientação pode-se dizer que as características da imunidade, num paralelo com a competência, podem ser assim classificadas:

a) privativa ou exclusiva porque se refere somente às pessoas, bens e situações expressamente indicadas no texto constitucional;

b) indelegável, visto que não pode ser imputada a outrem;

c) incaducável ou imprescritível, porque mesmo que não exercida por longo tempo não impõe a extinção do direito público subjetivo;

d) inalterável, já que a pessoa beneficiada a recebe da constituição e não tem a possibilidade de modificá-la;

e) irrenunciável, visto que a pessoa imune não pode abrir mão da imunidade, mesmo que até pague o tributo imunizado;

f) facultativa, eis que a pessoa beneficiada pode ou não valer-se da norma imunizante.

3.3. Propósitos fundamentais da imunidade tributária

Nos parece que a justificativa para a existência das normas imunizantes estão ligadas a conceitos de natureza política e social de determinada sociedade em dado período histórico, com o escopo de garantir as liberdades individuais via exoneração de tributos para não embaraçar a existência de direitos socialmente relevantes.

Assim as normas de impedimento da competência tributária voltam-se para a liberdade de expressão, o acesso à cultura e à liberdade religiosa, além das atividades desempenhadas pelas instituições de educação e assistência social, sem lucratividade, às entidades sindicais de trabalhadores, partidos políticos e suas fundações.

Para justificar a necessária existência das normas imunizantes, Costa32 invoca a teoria da densificação das normas constitucionais concebida por Canotilho, entendendo que as normas imunizantes densificam princípios estruturantes no sentido jurídico-constitucional e político-constitucional.

Portanto:

"(...) os princípios federativo e da autonomia municipal são densificados pela imunidade recíproca; que o princípio da isonomia é densificado pela imunidade conferida às instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos; que o princípio do pluralismo partidário é densificado pela imunidade outorgada aos partidos políticos; que a liberdade de expressão e o livre acesso à cultura são densificados pela imunidade referente aos livros; que a liberdade de culto é densificada pela imunidade dos templos – e assim por diante."

Pode-se entender, então, que as imunidades são meios de realização de extrafiscalidade na seara constitucional.

Neste sentido o magistério de Ataliba33 nos diz que a extrafiscalidade "(...) consiste no uso de instrumentos tributários para obtenção de finalidades não-arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados."

Então, pode-se afirmar que os princípios mais valorosos insertos na Constituição, tais como a segurança jurídica, a justiça e o bem comum, relacionados aos direitos fundamentais, estão presentes essencialmente na imunidade tributária, cuja natureza é extrafiscal.

As imunidades tributárias são normas de proteção de outros direitos fundamentais e constituem, ao mesmo tempo, direitos e garantias de outros direitos e firmam-se com o teor do art. XIX da Declaração Universal dos Direitos Humanos assim disposto34: "Toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências , ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras".


4. EFICÁCIA DA NORMA DE ININTRIBUTABILIDADE

4.1. Eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais

Na percuciente lição de Silva35 as normas constitucionais são classificadas:

a) normas de eficácia plena e aplicabilidade imediata;

b) normas de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas passíveis de restrições;

c) normas de eficácia limitada ou reduzida que compreendem:

c.1) normas de eficácia limitada definidores de princípio institutivo;

c.2) normas de eficácia limitada definidoras de princípio programático.

4.1.1. Eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais imunizantes

Sustenta Carvalho que as imunidades relacionam-se a "(...) situações específicas e suficientemente caracterizadas."

Diante desta afirmação pode-se concluir que as normas constitucionais imunizantes são de eficácia plena e aplicabilidade imediata ou de eficácia contida e aplicabilidade imediata. Isto porque está realçado no art. 5º, § 1º, da Carta Maior que "as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais tem aplicação imediata".

4.2. Normas de inintributabilidade de eficácia plena e de eficácia contida

Leciona Silva36 que as normas constitucionais que estabelecem proibições ou vedações tem eficácia plena, exceto quando a própria Constituição infirma a edição de lei complementar para restringir ou implementar comando normativo.

Quando a Constituição não direcionar, expressamente, a lei complementar para regulamentar a limitação ao poder de tributar, a regulamentação é facultativa, conforme entendimento da melhor doutrina.

Em outras situações de imunidades ao legislador infraconstitucional compete complementação do preceito constitucional, estabelecendo os requisitos necessários para o gozo do benefício. Nessa casuística a norma terá eficácia plena até o ato normativo redutor de sua eficácia, concluindo que será norma de eficácia contida.

4.3. Imunidades tributárias e as leis

A lei complementar, formalmente, prevista no art. 69. da Carta Maior precisa de aprovação por maioria absoluta nas duas Casas do Congresso Nacional e disciplina matérias expressas ou implícitas imputadas pela Constituição.

A norma imunizante, quando prescindível de regulamentação, impõe que seja por meio de lei complementar, conforme o art. 146, II, da Carta Política.

A distinção básica entre lei complementar e lei ordinária reside no critério de ordem material, que consiste no quorum qualificado para aprovação, e outro critério de caráter material, relacionando às matérias especialmente indicadas no seu circuito.

A lei complementar é o instrumento para complementar e funcionar a própria Constituição.

Não há hierarquia entre os dois tipos legislativos, eis que ambos infirmam-se no seu contexto da validade no próprio texto constitucional.

Porém, no aspecto formal, considerando o preceito disposto no art. 59, parágrafo único, da Constituição Federal, segundo o qual "lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis" há superioridade hierárquica dessa espécie legislativa, como sustenta Carvalho apud Costa37.

No aspecto material a lei complementar poderá ou não ocupar posição hierárquica superior em relação à lei ordinária, a depender da ocorrência ou não de vinculação do conteúdo da norma inferior.

O Código Tributário Nacional tem natureza de lei complementar em sentido material ao estabelecer normas gerais em matéria de direito tributário (art. 146, III, da CF). Portanto, as leis ordinárias das pessoas políticas devem reportar-se subordinadamente a ele quando tratarem de conflitos de competência em matéria tributária.


5. CLASSIFICAÇÃO DAS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

5.1. Imunidades genéricas e tópicas

As normas imunizantes, quanto ao seu alcance, ligam-se a valores constitucionalmente protegidos e ao grau de intensidade e amplitude dessa proteção.

O art. 150, IV, da CF contempla as imunidades genéricas ou gerais, conduzindo vedações a todas as pessoas políticas e abarca todo e qualquer imposto que venha a recair sobre o patrimônio, renda e serviços das entidades beneficiadas. Os valores protegidos pela Constituição, contendo forte axiologia, são de liberdade política, religiosa, de informação, etc.

Quanto às imunidades tópicas ou específicas são limitadas geralmente a um único tributo, podendo ser imposto, taxa ou contribuição e servindo a valores limitados ou convenientes. Direcionam-se a determinada pessoa política e pode ser exemplificado pela disposição do art.153, § 3º, III, da CF, que exonera de IPI os produtos exportados.

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5.2. Imunidades excludentes e incisivas

As imunidades tributárias também podem ser classificadas conforme a abrangência da vedação.

A classificação em imunidades excludentes está reservada a tributação por um tipo de imposto e exclusão de outros. Como exemplo temos a imunidade prevista no art. 153, § 5º, que determina a incidência de Imposto sobre Operações Financeiras sobre o ouro quando definido como ativo financeiro ou cambial e exonera da incidência do ICMS.

A imunidade incisiva prevê determinada situação que só pode haver incidência de algum imposto, excluindo os demais. O exemplo é o disposto no art. 155, § 3º, que diz que "à exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e o art. 153, I e II, nenhum outro tributo poderá incidir sobre telecomunicações, derivados de petróleo, combustível e minerais dos país".

5.3. Imunidades subjetivas, objetivas e mistas

Outra classificação das normas imunizantes está voltada para a forma de previsão ou maneira de sua incidência.

Como entende Carraza38 a imunidade tributária é sempre subjetiva, porque beneficia pessoas.

Na teoria clássica as imunidades tributárias subjetivas ou pessoais são aquelas conferidas de acordo com a condição de determinada pessoa, atribuída a sujeitos, em função da presença de elementos objetivos como o patrimônio, renda ou serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades beneficiadas ou dela oriundas, conforme prevê o art. 150, §§ 2º e 4º, da CF.

A imunidade subjetiva é atributo de personalidade jurídica de certos entes.39 As pessoas atingidas pelo direito da imunidade tributária subjetiva não tem capacidade tributária para figurar no pólo passivo do vínculo obrigacional decorrente de aplicações fiscais abrangidas pela norma vedante.

Como exemplo de imunidades subjetivas temos a imunidade recíproca das pessoas políticas, autarquias e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, a imunidade dos templos, das entidades sindicais de trabalhadores, dos partidos políticos e suas fundações, das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos.

Por seu turno, as imunidades objetivas ou reais estão relacionadas a determinados fatos, bens ou situações e versam sobre coisas, embora também beneficiem pessoas.

Exemplificadamente temos a imunidade tributária sobre livros, jornais e periódicos, e sobre o papel destinado à sua impressão, de acordo com a disposição do art. 150, VI, "d", da Carta Política.

Carraza40 pende para uma terceira classificação, a imunidade mista, que alcança a pessoa em função de sua natureza jurídica e relacionada a determinados fatos bens ou situações.

O exemplo de imunidade mista é a casuística prevista no art. 153, § 4º, da CF, que exonera o Imposto Territorial Rural para "pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore, só ou com sua família, o proprietário que não possua outro imóvel".

Torres41 afirma que as imunidades subjetivas reportam-se aos impostos diretos e as imunidades objetivas aos impostos indiretos.

5.4. Imunidades ontológicas e políticas

No dizer de Costa42 as imunidades ontológicas são reconhecidas de jure como resultado de um princípio constitucional, tendo a isonomia em suas variadas manifestações a ligação que identifica as imunidades de natureza ontológica. Seja diante do princípio da capacidade contributiva ou, com efeito, do princípio da autonomia das pessoas políticas.

A professora Derzi43 ensina que é imunidade ontológica a conferida às instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos. A imunidade é decorrente do relevante serviço público prestado e a ausência de capacidade contributiva de tais instituições, pois devem canalizar seus parcos recursos para a atividade fim.

Também a mestra Costa44 comunga da mesma idéia, acrescentando que pode ter o ente beneficiado capacidade econômica, mas não ter capacidade contributiva.

Nos posicionamos na mesma direção das renomadas autoras acima mencionadas porque não pode haver entendimento que a capacidade contributiva está diretamente relacionada à capacidade econômica. No caso específico das entidades de educação e de assistência social sem fins de lucro, suas atividades estão voltadas para o atendimento de serviço público de alto alcance e relevo social, e mesmo que seu patrimônio ou renda tenha valores pecuniários consideráveis do ponto de vista econômico, isto não induz à capacidade contributiva, devendo ser considerado para efeito das imunidades tributárias o papel de caráter público desempenhado pelas instituições beneficiadas.

Quanto às imunidades políticas estas são conferidas para prestigiar outros princípios constitucionais e podem beneficiar pessoas que tem capacidade contributiva.

Como exemplo temos as imunidades dos templos, das entidades sindicais de trabalhadores, dos partidos políticos e suas fundações, dos jornais, periódicos e do papel destinado à sua impressão.

5.5. Imunidade explícitas e implícitas

A regra geral do nosso ordenamento jurídico é a existência de normas exonerativas da incidência tributária de forma explícita, perfeitamente identificáveis no texto constitucional. As imunidades políticas, destacadas em linhas volvidas, são exemplos.

Quanto às imunidades implícitas, mesmo diante da inexistência de normas expressas que as alberguem, são buscadas de princípios do nosso sistema jurídico.

Exemplificadamente temos as imunidades recíprocas, que derivam da incapacidade contributiva das pessoas políticas e dos princípios federativo e autonomia municipal. Ainda as imunidades cotejadas às entidades de educação e de assistência social sem fins lucrativos, também norteadas na incapacidade contributiva e no princípio da isonomia.

Na lição de Torres45 há conclusão de que o elenco da imunidades aos tributos é aberto e incompleto, sendo as imunidades implícitas as relativas à profissão, à família, ao acesso à Justiça e à personalidade do cidadão.

Costa46 invoca o denominado princípio da não-obstância do exercício de direitos fundamentais por via de tributação, discordando do autor acima mencionado, dizendo que o elenco das imunidades não é aberto e incompleto, mas taxativo. Que o mencionado princípio tem sua abrangência não tão só sobre as situações de intributabilidades (imunidades e isenções), mas centrados em outros princípios constitucionais como a proibição de utilizar o tributo com efeito confiscatório, da função social da propriedade e da liberdade de profissão.

5.6. Imunidades incondicionadas e condicionáveis

A professora Costa47 inova ao propor esta modalidade de classificação das normas imunizantes. Afirma que se a norma constitucional imunizante tem eficácia plena e aplicabilidade imediata a imunidade é incondicionada. Como exemplo cita as imunidades recíprocas das pessoas políticas.

Caso a norma constitucional que alberga a imunidade seja de eficácia contida e aplicabilidade imediata, com restrições, temos a imunidade condicionável, sendo sua fruição ser estatuída ou não pelo legislador infraconstitucional. Temos como exemplo as imunidades das instituições de educação e assistência social sem lucratividade que, para auferirem o benefício, devem atender requisitos da lei complementar.

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Sobre o autor
João Bosco Peres

advogado e professor em Goiânia (GO)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PERES, João Bosco. Competência tributária negativa.: As imunidades tributárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 131, 10 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4478. Acesso em: 23 dez. 2024.

Mais informações

Trabalho elaborado no Curso de Especialização em Direito Tributário pelo Instituto Goiano de Direito Tributário em convênio com a Universidade Católica de Goiás, transcorrido no biênio 2002/2003. Orientador: professor Octávio Campos Fischer, mestre em direito tributário e docente da PUC Paraná, em Curitiba.

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