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Competência tributária negativa.

As imunidades tributárias

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10/11/2003 às 00:00
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6. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E AS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

Ao teor da brilhante dissertação da professora Costa48 há a conclusão da previsão de 30 situações de imunidades tributárias na Constituição Federal destacadas em 7 hipóteses de imunidades genéricas, relativas somente a impostos e 23 imunidades específicas, sendo 9 referentes a impostos, 12 a taxas e 2 a contribuições.

6.1. Imunidades genéricas

São as insertas no art. 150, VI, e §§ 2º-4º da Carta Política, dedicadas a todas as pessoas políticas e abarcam todos os impostos que incidam sobre o patrimônio, renda e serviços das entidades mencionadas.

a) Imunidade recíproca (art. 150, VI, "a", e §§ 2º e 3º)

É a mais antiga imunidade tributária do nosso ordenamento jurídico. Surgiu na Constituição de 1891.

Dispõe que é vedado às pessoas políticas instituir impostos sobre o patrimônio, rendas e serviços vinculados às suas atividades essenciais ou dela decorrentes, uma das outras, estendida a intributabilidade às fundações e autarquias mantidas pelo Poder Público.

b) Imunidade dos templos (art. 150, VI, "b", e § 4º)

Também prevista desde a Constituição Republicana de 1891 e tem fundamento na separação entre o Estado e Igreja, ungida naquela época de forma a impor o princípio da neutralidade entre o Estado e Igreja. É a densificação do princípio da liberdade de crença religiosa.

Este princípio de inintributabilidade atinge o patrimônio, a renda e os serviços concernentes às finalidades essenciais das entidades beneficiadas.

c) Imunidades dos partidos políticos e suas fundações (art. 150, VI, "c", e § 4º)

Há previsão desta modalidade de norma imunizante deste a Constituição de 194. Tem como fundamento os direitos de liberdade, incluindo os direitos políticos e o pluralismo partidário.

É classificada por Regina Helena Costa como imunidade subjetiva, política e condicionável, visto que se sujeita a eventuais regulamentações de lei complementar.

Os partidos políticos estão imunes ao IPTU sobre os imóveis que ocupam, ao ISS relativo a serviços que prestarem a terceiros, IR sobre os rendimentos auferidos, ao ITBI na aquisição dos bens imóveis, ao IPVA referente aos veículos utilizados para suas finalidades.

d) Entidades sindicais de trabalhadores (art. 150, VI, "c", e § 4º)

Esta modalidade de imunidade é inovação da atual Constituição e visa a liberdade de associação sindical, realçando a importância das entidades sindicais na contemporânea ordem jurídica.

É classificada pela mestra acima mencionada como imunidade subjetiva, política e condicionável aos ditames da legislação infraconstitucional, mormente o art. 14. do CTN.

Há inintributabilidade sobre as exigências do IPTU sobre os imóveis que ocupam, do ISS sobre serviços prestados a terceiros, do IR sobre os rendimentos ganhos, do ITBI na aquisição de imóveis, do IPVA sobre os veículos utilizados para suas finalidades.

a- Entidades de educação e de assistência social (art. 150, VI, "c", e § 4º)

A imunidade tributária subjetiva cotejada a estas entidades surgiu na Constituição de 1946 e foi mantida nas posteriores. Justifica-se pelo propósito de servir à coletividade, colaborando com o Estado no atendimento de atividades essenciais, suprindo lacunas ante as deficiências da atuação estatal.

A educação e assistência social são princípios constitucionais fundamentais.

A educação está capitulada no art. 205. da Carta Magna que estabelece se esta "direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho."

b- Livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão (art. 150, VI, "d")

A imunidade em questão surgiu na Constituição de 1946 e atingia apenas o papel destinado à impressão de jornais, periódicos e livros. A constituição de 1967 estendeu a inintributabilidade aos livros, jornais e periódicos.

Esta imunidade contempla os valores da liberdade de comunicação, da liberdade de manifestação do pensamento, da expressão da atividade intelectual, artística, científica, que visam o acesso à informação e à difusão da cultura e da educação.

6.2. Imunidades específicas

Contata-se na Constituição Federal de 1988 várias imunidades específicas em relação a impostos e taxas e, especificamente sobre contribuições, duas hipóteses.

Como regra geral as imunidades específicas dedicam-se a uma política e são circunscritas a um único tributo, ou seja, imposto, taxa ou contribuição. Justificam-se por aproveitar valores limitados e a conveniências especiais. Tem natureza objetiva porque são outorgadas em função de um bem. Tem caráter político, uma vez que não é considerada a capacidade contributiva dos sujeitos beneficiados.

São as seguintes imunidades específicas presentes no texto constitucional.

Em relação a impostos:

a) Imunidade dos rendimentos provenientes de aposentadoria e pensão pagos a pessoa maior de 65 anos cuja renda total seja constituída, exclusivamente de rendimentos de trabalho, ao Imposto de Renda (art. 153, § 2 º, II).

Trata-se de imunidade subjetiva, de natureza política, que densifica o preceito de amparo ao idoso pelo Estado, nos termos do art. 230. da Carta Magna.

A EC/20, de 15/12/98, através do seu art. 17. revogou o inciso II do § 2º do art. 153, e conforme entendimento de Costa49 esta revogação é inconstitucional porque as normas de imunidade tributária são cláusulas pétreas, não podendo ser alteradas por meio de emenda constitucional, como reza o art. 60, § 4º, IV.

b) Imunidade ao Imposto sobre Produtos Industrializados de produtos destinados ao exterior (art. 153, § 3º, III).

Refere-se a imunidade objetiva e política que tem o fito de estimular as exportações de produtos industrializados e encerra a afirmação de que deve-se exportar produtos e não tributos.

c) Imunidade de pequenas glebas rurais ao Imposto Territorial Rural (art. 153, § 4º).

Visa a aplicação do princípio da função social da propriedade estatuído nos art. 5º, XXIII, 170, e 186 e o objetivo programático da República inserto no art. 3º, II, e 170, VII, qual seja o da erradicação da pobreza e marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais.

Para Luciano Amaro50 esta inintributabilidade fundamenta-se na incapacidade contributiva dos proprietários de pequenas propriedades rurais, qualificada como imunidade ontológica, enquanto Costa51 entende que se refere a imunidade de natureza política, independentemente da capacidade contributiva dos beneficiários.

Concordamos com a idéia da renomada professora mencionada posto que não há uma presunção absoluta de capacidade contributiva já que o pequeno proprietário de gleba rural pode ter ou não capacidade para contribuir.

d) Imunidade ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias sobre produtos industrializados, excluídos os semi-elaborados, destinados a exploração (art. 155, § 2º, X, "a").

Esta imunidade tem natureza objetiva e política, e similarmente à exoneração do IPI, tem como finalidade incentivar as exportações.

e) Imunidade ao ICMS das operações que se destinam a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica (art. 155, § 2º, X, "b").

Também esta imunidade tem natureza objetiva e política e conduz-se no sentido de diminuir os custos desses produtos e daqueles que utilizem esses insumos, já que são essenciais ao país.

Visa também evitar prejuízos dos Estados que não detêm produção ou refino de petróleo ou geração de energia elétrica.

f) Imunidade em relação ao IOF do outro quando definido como ativo financeiro ou instrumento cambial (art. 155, § 2º, X, "c").

Constitui imunidade objetiva e política, surgindo como o advento da atual Constituição, e não exclui a incidência tributária nas operações de outro como mercadoria.

g) Imunidade em relação a qualquer outro tributo exceto ao ICMS, ISS e Imposto de Exportação nas operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do país (art. 155, § 3º).

Refere-se a norma imunizante de caráter objetivo e político, sendo incisiva, ou seja, a previsão constitucional é que a incidência tributária é de apenas alguns impostos, excluindo quaisquer outros tributos.

h) Imunidade dos direitos reais de garantia ao Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis (art. 156, II).

Esta norma de inintributabilidade também de natureza objetiva e política, que tem o fim de não onerar ainda mais o sujeito passivo, atinge apenas os casos previstos nos art. 805. e 809 do Código Civil, ou seja, anticrese e hipoteca.

i) Imunidade em relação ao Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital e da transmissão de bens ou direitos decorrentes da fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica (art. 156, § 2º, I).

Refere-se a normas imunizantes de caráter objetivo e político e não se aplicam quando a atividade preponderante do adquirente for de compra e venda ou locação dos bens ou direitos relacionados.

A justificativa dessa imunidade é dita por Coelho52 "(...) colima facilitar a mobilização dos bens de raiz e a sua posterior desmobilização, de modo a facilitar a formação, a transformação, a fusão, a cisão e a extinção de sociedades civis e comerciais, não embaraçando com o ITBI a movimentação dos imóveis, quando comprometidos com tais situações".

j) Imunidade em relação a impostos federais, estaduais e municipais nas operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária (art. 184, § 5º).

Também configura norma imunizante de natureza objetiva e política. Embora o texto constitucional refira-se a isenção, na verdade trata-se de imunidade, visto que a exoneração tributária tratada no plano constitucional sempre será imunitória.

A imunidade é justificada diante do fato de ser a reforma agrária meio para a realização do princípio da função social da propriedade e o objetivo programático da República de erradicar a pobreza e as desigualdades sociais e regionais.

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Portanto, ficam exonerados de qualquer imposto os proprietários de imóveis destinados à reforma agrária quando da transferência da propriedade para essa finalidade.

Em relação a taxas a doutrina diverge quanto às imunidades relativas a essas.

Carraza53 entende que as imunidades atingem somente impostos, não alcançando taxas e contribuições.

Amaro54 advoga que as proibições constitucionais à exigência de taxas representam imunidades.

Carvalho55 ensina que as normas imunizantes atingem não só impostos, mas também taxas e contribuições.

Costa56 leciona, concordando com os dois últimos autores acima mencionados, que "(…) as normas imunizantes não se referem apenas a impostos, podendo reportar-se também a tributos vinculados a uma atuação estatal, sendo suficiente, para que tal ocorra, seja esse o desejo constitucional".

Comungamos das lições daqueles que defendem a existência de imunidades também referentes a taxas e contribuições, desde que expressamente previstas no texto constitucional, não comportando interpretações extensivas para atingir determinadas situações de pessoas já beneficiadas pela inimponibilidade no tangente a impostos. Por isso, para que essas pessoas possam auferir imunidades relativamente a taxas tal condição obrigatoriamente tem que estar no texto da regra matriz, como nas situações que trataremos em linhas posteriores.

A preclara professora Regina Helena Costa afirma existirem na Constituição Federal nada menos que 12 hipóteses de imunidades relativas a taxas, advertindo que nem sempre o texto constitucional menciona a exoneração de forma expressa, por vezes utiliza expressões como "isenção" ou "gratuidade" em relação à prestação de serviços públicos específicos e divisíveis e especialmente vinculadas ao exercício da cidadania, tendo natureza objetiva e política.

Tais imunidades podem ser observadas nos seguintes dispositivos constitucionais:

a) Art. 5º, XXXIV, "a" e "b" – São a todos assegurados, independentemente de pagamento de taxas:

a – o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

b – a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal.

b) Art. 5º, LXXIII – Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência".

c) Art. 5º, LXXIV – O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos.

d) Art. 5º, LXXVI – São gratuitos, para os reconhecidamente pobres, na forma da lei:

a – o registro de nascimento;

b – a certidão de óbito.

e) Art. 5º, LXXVII – São gratuitos as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.

f) Art. 208, I – O poder do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria.

Observa-se que esta norma imunizante densifica o direito à educação, dever do Estado e da família, conforme o art. 205, e está ligada com à imunidade deferida às instituições privadas, sem fins lucrativos, que prestam serviços de educação, nos termos do art. 150, VI, "c", e § 3º.

g) Art. 226, § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.

Justifica-se pelo fato de que a família tem proteção especial do Estado, conforme os art. 226/230.

h) Art. 230, § 2º - Aos maiores de 65 anos é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos.

Tem natureza mista, de caráter político, objetivo e subjetivo, e vem corporificar o direito ao amparo dos idosos, como dever da família, da sociedade e do Estado (art. 230, caput).

6.2.1. Em relação a contribuições

Da mesma forma que as relacionadas a taxas as imunidades relativas a contribuições são específicas, referindo-se apenas às expressamente indicadas. Tem natureza subjetiva e ontológica, vez que requer a indicação e constatação da ausência de capacidade contributiva do ente beneficiado.

No texto constitucional estão elencadas:

A) Art. 195, § 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

b) Art. 203, caput – A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social (...).

O texto constitucional veda a exigência de contribuição para a seguridade social daqueles que necessitam de assistência social oficial, que é serviço público específico e divisível.

Tem esta imunidade caráter subjetivo e ontológico e, ressalte-se, é diferente daquela prevista nos art. 149, parágrafo único e 201, caput, onde há exoneração contributiva para as entidades que prestam serviços de assistência social, sem finalidade lucrativa.

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Sobre o autor
João Bosco Peres

advogado e professor em Goiânia (GO)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PERES, João Bosco. Competência tributária negativa.: As imunidades tributárias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 131, 10 nov. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4478. Acesso em: 24 dez. 2024.

Mais informações

Trabalho elaborado no Curso de Especialização em Direito Tributário pelo Instituto Goiano de Direito Tributário em convênio com a Universidade Católica de Goiás, transcorrido no biênio 2002/2003. Orientador: professor Octávio Campos Fischer, mestre em direito tributário e docente da PUC Paraná, em Curitiba.

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