A nova Lei Seca (12.760/2012) e alteração do Código de Trânsito Brasileiro.

Impactos e eficácia na caracterização de embriaguez ao volante

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Análise das discussões sobre as seguintes questões: a classificação do crime de embriaguez ao volante; as divergências nas decisões judiciais sobre caracterização da embriaguez ao volante, bem como a impunidade dos condutores.

Resumo: O presente artigo de graduação em Bacharelado em Direito tem por objetivo o estudo e a análise das discussões sobre as seguintes questões: a classificação do crime de embriaguez ao volante; as divergências nas decisões judiciais sobre caracterização da embriaguez ao volante, bem como a impunidade dos condutores apreendidos por consumo de álcool. Através da bibliografia divergente utilizada na elaboração desse trabalho, concordamos com a corrente que classifica o crime de embriaguez ao volante, previsto no art. 306. do Código de Trânsito Brasileiro, como um crime de perigo abstrato cujo conceito se dá segundo Damásio de Jesus (2013) “Crimes de perigo abstrato são aqueles que não exigem a lesão de um bem jurídico ou a colocação deste bem em risco real e concreto. São tipos penais que descrevem apenas um comportamento, uma conduta, sem apontar um resultado específico como elemento expresso do injusto”. Como pacificar o entendimento jurídico brasileiro sobre a embriaguez ao volante?


INTRODUÇÃO

Em 1893, na cidade de São Paulo, que na época era composta com aproximadamente 200.000 habitantes, apresentou-se o primeiro carro á vapor que tinha chaminé, todo aberto e com rodas de borrachas que encantou e assustou os habitantes. Sendo popularizado posteriormente o progresso automotivo após o término da Segunda Guerra Mundial nos países da América latina e inclusive no Brasil.

Com a chegada do automóvel no Brasil e a consequente inserção da indústria automobilística, logo começaram os problemas envolvendo o tráfego destes veículos, ocorrendo no Brasil o primeiro acidente com veículo automotor que se tem registro, tal acidente foi provocado por Olavo Bilac que conduzia o veículo emprestado de José do Patrocínio. (ARAÚJO FARIALEMOS, 1980)

Segundo á Policia Rodoviária Federal, no decorrer de um século de introdução automobilística, os acidentes de trânsito representam a segunda maior causa das mortes entre os brasileiros ficando atrás apenas das doenças do aparelho circulatório, sendo milhares as vidas ceifadas de forma prematura, além dos prejuízos estratosféricos decorrentes de tais acontecimentos.

Sendo que a “Função Principal” de qualquer legislação “Nunca” é punir, mas, sempre, disciplinar, educar e vedar a prática de atos danosos à sociedade Decreto 18.323, de 1928, foi o primeiro estatuto sistematizado no Brasil em matéria de trânsito, possuindo 93 artigos, aprovando um regulamento para a sinalização, dispôs sobre segurança de trânsito e polícia das estradas de rodagem, permanecendo até a edição do primeiro Código Nacional de Trânsito – Decreto-lei 2.994, de 28 de janeiro de 1941, que, em seguida, foi revogado pelo Decreto-lei 3.651, de 25 de setembro de 1941. Este foi substituído pela Lei 5.108, de 21/9/66, o Código Nacional de Trânsito, regulamentado por meio do Decreto 62.127, de 16 de janeiro de 1968.

No entanto, pelo desuso e pela omissão de suas normas que não previam qualquer espécie de crime aos condutores de veículos, já não exercia o poder de limitação ao comportamento do condutor, que, a todo o momento, desrespeitava os ordenamentos legais, pois não havia por parte das autoridades constituídas uma ação efetiva de repressão. O que estimulava o crescimento de acidentes, pois a falta de regulamentação fazia com que os condutores sentissem que eram impunes por estes delitos e infrações e com a preocupação em diminuir a taxa de acidentes trânsito foi instituído o novo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), através da Lei n.º 9.503 de 22 de setembro de 1997.

O CTB com intuito de resolver os problemas causados pela falta de sanções para com condutores infratores e sanar a maior causadora de acidentes que é a embriaguez ao volante passou a vigorar em 1997, pois com o passar do tempo passou a perceber que a perspectiva não havia se concretizado e o número de acidentes passou a aumentar. No decorrer das últimas décadas, o trânsito brasileiro vem sendo palco de inúmeras tragédias. O crescente número de acidentes colaborou diretamente para levar nosso País a figurar entre os campeões mundiais de mortes no trânsito.

Segundo o site do Ministério da Saúde em 2013, as estatísticas estimam que ocorram entre 30 mil e 45 mil mortes por ano, das quais 70% teriam o desenvolvimento do fator álcool. Além disso, seriam aproximadamente 377 mil feridos por ano. Os números são assustadores, porém são o reflexo da realidade brasileira.

A Lei 11.705/08 (Lei Seca) foi sancionada em 16 de junho de 2008 e nela se realizaram modificações significativas em vários dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro que tratam da embriaguez ao volante, tanto no aspecto penal, quanto na esfera administrativa. No entanto, não se obteve o resultado esperado e foi endurecido mais uma vez em 2012 pela Lei 12.760, e tendo ampliada a caracterização do estado de embriaguez ao volante.

Segundo o Deputado Federal Hugo Leal Autor da Lei Seca:

“Quando criei a Lei Seca tinha plena convicção de que a embriaguez (geralmente não admitida por quem diz que “bebeu pouco”) transforma automóveis em armas letais. De lá pra cá, conseguimos sucessivas reduções de mortes, mutilações e ferimentos no trânsito de todo o Brasil, mês a mês, apesar de o numero de veículos em circulação ter obviamente aumentado. Isso significa que mais de 2,3 mil pessoas deixaram de morrer em todo pais, conforme estatísticas apresentadas pelo Ministério da Saúde. Em 17 estado brasileiros houve uma redução nos números de mortos, com destaque para o Rio de Janeiro, cujo o total de óbitos sofreu uma retração de 2.169 para 1.475.” (Leal. Hugo. Autordaleiseca-histórico. 2015)

Ocorre que mesma a constatação por policiais da condição de embriaguez do condutor, e o fato de que a evolução nas ações educadora nas prevenções de acidentes e a fiscalização pelo Departamento de Trânsito, bem como a constatação de alguns motoristas tenham consumido álcool tem deixado que alguns juízes passem a desconsiderar alguns fatores e não se abster somente do bafômetro e do exame de alcoolemia sanguínea e absolvendo alguns condutores o que gera um impasse judicial e assim ferindo o principio da igualdade disposto no art. 5° da CF (RT 2014) “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”.

Sendo assim, cabe a nós analisarmos as ideias das correntes divergentes para que possamos nos familiarizar a uma delas e posteriormente buscar soluções para a solução de conflitos de direitos existentes entre a caracterização da embriaguez ao volante bem como sua apuração e punição judicial.


1. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO E LEI 11.705/08.

Após a promulgação do Código de Transito Brasileiro em 1997 e posteriormente da Lei 11.705/08 ambos com obtivo de fiscalizar e punir condutores que tivessem ingerido bebida alcoólica com a quantidade de 0,1 mg de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões no exame de bafômetro, ou 2 dg de álcool por litro de sangue por condutores de veículos. Bem como a vedação de comercialização de bebidas alcoólicas no domínio de Rodovias Federais ou em terrenos com acesso direto à rodovia, assim criou-se uma expectativa que os condutores do trânsito brasileiro teriam uma maior consciência e evitaria ingerir bebida alcoólica evitando sofrer as sanções previstas no código.

Segundo Damásio de Jesus (2010) os cidadãos passaram a não ter medo das aplicações penais e os acidentes de trânsito estavam aumentando cada vez mais, o que fazia o Brasil campeão mundial em acidentes de trânsito e por sua maioria causados pela embriaguez ao volante e com intuito de reverter esse problema foi criada pela comissão do Congresso Nacional composto por José Eduardo Cardozo, Alexandre Rocha Santos Padilha, Aguinaldo Ribeiro, que com a entrada em vigor da passaria a ser mais severa na condução de veículos sob o efeito de bebida alcoólica e assim teria tolerância zero na sua caracterização através do bafômetro, e passariam a serem admitidos vídeos e outras provas como o depoimento do policial, testes clínicos, e outros testemunhos, para provar a embriaguez do motorista.

A recusa de condutor a se submeter a exames de embriaguez determinado pelo agente da autoridade de trânsito, já ditado pelo CTB, que serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165. deste Código (SARAIVA, 2014) ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo (Acrescido pela lei nº. 11.705, de 19/06/08) (SARAIVA, 2014), apesar do parágrafo enfocado, estabelecer clara e taxativamente que o cidadão é obrigado a colaborar fornecendo sangue para o exame de alcoolemia, o ar dos pulmões para o exame com o etilômetro (“bafômetro”) e colaborar com os demais testes, como o clínico. Por ampla defesa onde corresponde ao direito da parte de se utilizar de todos os meios a seu dispor para alcançar seu direito, seja através de provas ou de recursos. Compreendendo o direito que permite ao acusado dispor de todos os meios, recursos e estratégias para tentar provar sua inocência, ou não deixar provar sua responsabilidade, ou seja, não é obrigatório fazer o teste do bafômetro por ser um meio de defesa do condutor.

Contudo, não quer dizer que o condutor embriagado ficará impune, recaindo sobre ele as sanções administrativas. O teste do bafômetro constitui-se apenas em uma, de muitas provas que poderão ser coletadas. Essa forma precisa de verificação do teor alcoólico não transforma este indubitável instrumento em prova única, nem estabelece uma hierarquia entre as provas. Pois existem outros meios probatórios como testemunhas, indícios, fotografias, filme, confissão, exame clínico, que independem da aceitação do condutor, sendo observado o disposto na resolução 206 do CONTRAN do ano de 2006, sendo reforçado pela Lei nº 11705/08.

Após severas críticas em virtude de uma aparente falha na construção legislativa, melhor abordada em tópico adiante, o artigo 306, do CTB foi novamente alterado, dessa vez pela recente Lei Federal nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012, batizada de “Nova Lei Seca”.

1.1. Nova Lei Seca

A Lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012, alterou a Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito Brasileiro. Nascida com objetivo de endurecer as características de um condutor que houvesse ingerido bebida alcoólica e ter sanções mais rígidas. A nova lei abriu a possibilidade de os policiais usarem outras provas contra motoristas embriagados. Caso haja recusa de fazer o teste do bafômetro, os policiais podem coletar imagens, vídeos, testemunhos e outros documentos que comprovem legalmente a condição etílica do condutor. Sendo que, no exame sanguíneo não se pode ter nenhuma quantidade alcoólica no sangue.

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O Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou em 2012 que beber e dirigir é crime, mesmo quando não há dano a terceiros. Uma decisão da Justiça em primeira instância tinha considerado que dirigir embriagado só se torna crime de trânsito quando o ato causa algum dano. O entendimento do Supremo, agora, deve orientar julgamentos futuros casos de embriaguez ao volante.

A redação promovida pela destacada Lei Federal no 12.760/2012 ao delito do artigo 306, caput, do CTB, assim dispõe:

“Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.

As alterações do Código se deram com a multa para quem é flagrado conduzindo sob efeito de álcool ou substâncias psicoativas dobrou de valor, passando de R$ 957,70 para R$ 1.915,40. Caso haja reincidência em menos de um ano, a cobrança passa para R$ 3.830,80. Além da multa o condutor fica retido de dirigir pelo período de 12 meses.

Capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência: Este requisito do tipo cuida da principal inovação trazida pela Lei no 12.760/2012, ao retirar uma concentração etílica taxativa do cerne do tipo penal.

Sob um enfoque etimológico e literal, o termo “psicomotora” deriva da junção do ante positivo “psico” (de origem grega - “psukh”, associado à ideia de atividade mental) com a palavra “motora”, oriunda do termo latino “motorius”, representante da noção de movimento, traduzindo a expressão “capacidade psicomotora” como a habilidade afeta às funções motoras e psíquicas, aos movimentos corporais governados pela mente (HOUAISS, 2001, p.2326).

Para a caracterização do delito basta que a capacidade psicomotora do sujeito esteja alterada, ou seja, encontre-se fora da normalidade, e que tal circunstância seja decorrente do consumo de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, física ou psíquica (MARCÃO, 2013).

Prevalece na doutrina que o delito em estudo seria de perigo abstrato ou presumido (FONSECA, 2013). Há certa divergência quanto a se tratar de crime formal ou de mera conduta. O delito se consuma com a condução do veículo pelo agente com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa, não se exigindo prova de efetivo perigo ao bem jurídico tutelado, consubstanciado na segurança viária, tampouco vinculando o tipo penal a um resultado naturalístico, qual seja, a uma concreta modificação no mundo exterior provocada pela conduta do agente (PORTOCARRERO, 2010, p.260).

A Lei no 12.760/2012 inseriu três parágrafos que veiculam os meios para se aferir a materialidade delitiva, in verbis:

“§ 1º As condutas previstas no caput serão constatadas por:

I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou

II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.

§ 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova.

§ 3º O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo”.

Sedimenta-se com a nova legislação o sistema da liberdade na apreciação das provas, consentâneo à “livre convicção motivada” ou “persuasão racional”, segundo a qual há independência no cotejo dos elementos probatórios pelos órgãos estatais julgadores, sem escala de valores entre as provas amealhadas, desde que a decisão seja fundamentada (SOUZA, 2012).

Nesse panorama, a autoridade policial deve se ater aos fatos e seus elementos e não isoladamente à pessoa do investigado, numa conjectura do direito penal do fato desde a fase investigativa. O delegado de polícia não figura como parte na perquirição criminal, ele busca a verdade atingível dos fatos apurados e, somente por via de consequência, esclarecer a autoria delitiva (BARROS FILHO, 2012).

A Resolução nº 432, de 23 de janeiro de 2013, editada pelo Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), foi publicada com o objetivo de regularizar a atuação dos agentes fiscalizadores. Critérios como a aparência, atitude, orientação, memória e capacidade motora e verbal do condutor devem ser, cuidadosamente, avaliados. Verificada a existência de algum elemento caracterizador da ingestão de bebida alcoólica – sonolência, olhos vermelhos, soluços, desordem nas vestes, odor de álcool no hálito, agressividade, arrogância, exaltação, ironia, dispersão, dificuldade no equilíbrio, fala alterada, entre outros – ao motorista são, automaticamente, impostas as sanções previstas na lei.

No que tange à alteração psicomotora decorrente da influência por outra substância psicoativa que determine dependência, com mais razão torna-se aconselhável a requisição de exames ao Instituto Médico Legal, mormente o exame clínico agregado à avaliação neurológica pelo médico legista, sem prejuízo dos exames laboratoriais se houver coleta de materiais como sangue, urina ou saliva para a constatação do uso de drogas pelo motorista investigado.

2. A NOVA LEI SECA SOB O N° 12.760/2012 e ALTERAÇÃO DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO, E SEUS IMPACTOS E EFICÁCIAS E INOVAÇÕES NA CARACTERIZAÇÃO DE EMBRIAGUEZ AO VOLANTE.

A insegurança no trânsito é universal e certamente gera certo inconformismo e até revolta no seio social, de modo que, a coletividade não se sente confortável com estatísticas como estas. Não por outro motivo a Organização das Nações Unidas (ONU) proclamou em Assembleia Geral, realizada no dia 2 de março de 2010 (Resolução A/64/L44 da ONU em 2 de março de 2010), o período de 2011 a 2020 como a Década Mundial de Ações para Segurança no Trânsito. A iniciativa visa estimular esforços para conter e reverter a tendência crescente de fatalidades e ferimentos graves em acidentes no trânsito em todo o mundo.

Como destaca a doutrina:

“O número de acidentes de trânsito em nosso país assume o caráter de verdadeira calamidade pública. Ao cabo das férias escolares, a cada final de semana prolongado, as estatísticas traçam um perfil aterrorizante da situação nas estradas. São milhares de vítimas da imprudência. Mortos e feridos que engrossam melancólica lista, ceifando vidas de inocentes, com prejuízos irreparáveis de ordem emocional e mesmo para o Estado. Os fatores são muitos. Falta de fiscalização, pavimento ruim (fruto também da corrupção e da má qualidade do material empregado), rodovias e ruas mal sinalizadas, motoristas inabilitados em profusão, veículos sem condições de tráfego (de novo a corrupção “ajuda”), imprudência e irresponsabilidade de condutores, combinação mortal de álcool e direção e, por fim, confiança na impunidade, facilitada por leis ruins, doutrina conivente e uma jurisprudência vacilante.”

O Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou em 2012 que beber e dirigir é crime, mesmo quando não há dano a terceiros. Uma decisão da Justiça em primeira instância tinha considerado que dirigir embriagado só se torna crime de trânsito quando o ato causa algum dano. O entendimento do Supremo, agora, deve orientar julgamentos futuros casos de embriaguez ao volante.

Como uma forma de ser mais severo com os condutores que insistem em cometer infrações de trânsito em 2014, através da lei 12.971/2014, modificou-se novamente o Código de Trânsito Brasileiro enrijecendo ainda mais a definição de embriaguez no volante, bem como suas penalidades. Os Artigos 302, § 2º, e 303 paragrafo único e 306, § 2º, são alguns que sofreram modificação como dispõe a seguir:

“Art. 302. (....) § 2º Se o agente conduz veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência ou participa, em via, de corrida, disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente: Penas - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.” (NR)

Art. 306. (....) § 2º A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova. § 3º O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo.” (Lei nº 12.971, de 9 de maio de 2014 )

Incumbe salientar que com a previsão da referida forma qualificada ao homicídio culposo quando o agente conduzir veículo com a capacidade psicomotora alterada sob a influência de álcool ou de outra substância psicoativa ou determine dependência, tornou-se certa a impossibilidade de incidência concomitante do artigo 306 do CTB (que traz a figura típica do crime de embriaguez ao volante).

De modo que vários juízes e tribunal estão entendendo que é uma maneira de gerar concurso material de crimes ou formal de crimes, sob pena de haver punição duas vezes pelo mesmo fato, violando o princípio do ne bis in idem (proibição de se punir duas vezes o mesmo fato).

Assim, resta claro que o legislador optou pela absorção do delito de dano. Deste modo, plenamente válidas as lições de Guilherme de Souza Nucci (2013) ainda que anteriores à nova lei no sentido de que:

“não há possibilidade de se considerar que o crime de perigo, existente para evitar a concretização do delito de dano, seja punido quando já se efetivou. Ilustrando, sob outro cenário: se o homicídio for cometido com emprego de arma de fogo e o agente não possuir porte ou registro da arma, será punido somente por homicídio. Não mais interessa a infração referente à arma de fogo, crime de perigo, pois atingido o delito de dano”

Diante disso, torna-se inaplicável qualquer que seja as jurisprudências no sentido de se admitir o referido concurso material ou formal de crimes. Como se expõe a seguir:

PENAL E PROCESSUAL. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ATROPELAMENTO E MORTE EM ACOSTAMENTO. PROVA SATISFATÓRIA DA MATERIALIDADE E AUTORIA. ALEGAÇÃO DE IMPRESTABILIDADE DO TESTE DO ETILÔMETRO E ATIPICIDADE DA CONDUTA. PRETENSÃO À ABSOLVIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA.CONCURSO MATERIAL DE CRIMES. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. O réu foi condenado por infringir o artigo 302 e 306 da lei 9.503 /97, eis que, alcoolizado, conduzia automóvel e tentou ultrapassar outro veículo em condições adversas, resultando na invasão da pista contrária e, em seguida, abalroa outro carro, provocando-lhe descontrole que veio a colher a vitima no acostamento da rodovia, matando-a. 2. O tipo do artigo 306 do código de trânsito brasileiro configura crime de perigo abstrato que se configura quando o agente, conduzindo automóvel com concentração de álcool no sangue superior ao limite da lei, não atentou para as condições de tráfego e provocou a colisão que culminou com a morte de transeunte. a imprudência também ficou caracterizada e o seu resultado lesivo indesejado, configurando o artigo 302 do mesmo diploma legal. 3. Não há concurso formal de crimes quando inexista dois resultados decorrente da mesma ação. a embriaguez ao volante foi consumada quando o motorista, com teor alcoólico superior a 0.6 mg/l, a assumiu o controle do veículo em via pública. a lesão corporal culposa na condução de veículo automotor se consumou quando a vítima foi atingida, em razão de conduta imprudente e autônoma em relação à embriaguez. 4. apelação desprovida.

(TJDF, APR 0002124-32.2010.807.0002, data de publicação: 30/05/2012)

O objetivo de qualquer legislação não é punir, mas, sempre, disciplinar, educar e vedar a prática de atos danosos à sociedade. Agindo dentro da legalidade, sem suspeitas sobre fins políticos ou escusos de medidas fiscalizadoras, ter-se-á, com certeza, a preocupação dos motoristas em cumprirem as regras de trânsito, evitando a ingestão de bebidas alcoólicas ou ingerindo-as comedidamente, para não se sujeitarem aos transtornos policiais e judiciais.

Cabe salientar, que diante de tal evolução os crimes de trânsito passam a ser cada vez mais enrijecidos suas punições e é constante modificação para redução dos acidentes e promovendo uma maior segurança tanto para os demais condutores, como para pedestres e ciclistas e a todos que necessitam circular com um trânsito seguro e equilibrado.

Na parte penal do Código de Trânsito Brasileiro, se obteve significativas alterações foram produzidas nos delitos de trânsito, em especial ás que tratam do homicídio culposo de trânsito e na disputa automobilística não autorizada, inclusive por intermédio da criação de qualificadoras.

O artigo 302 dispõe como Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. No entanto resta claro que esta é uma evolução, mas que poderia ter se endurecido e implantada com relação á morte da vitima se caso o condutor embriagado atropelar e matar uma pessoa não poderá responder dolosamente pelo art. 302. do CTB. Todavia, limitou-se a citar a particularidade que qualifica o crime.

Fácil reconhecer que, nesse particular, houve uma flagrante violação ao postulado da proporcionalidade, no seu aspecto de proibição de proteção deficiente:

Como decorrência lógica da função de imperativo de tutela que colore os direitos fundamentais, avulta a necessidade de que uma tal proteção há de se realizar de modo a satisfazer exigências mínimas de tutela. Afinal, como pontua Capez (2012), um dever de tomar medidas ineficazes não teria qualquer sentido. Entra em questão, aqui, a proibição de proteção deficiente (Untermassverbot), categoria que encerra uma aptidão operacional que permite ao intérprete determinar se um ato estatal – eventualmente retratado em uma omissão, total ou parcial – vulnera um direito fundamental

A novidade trazida pela lei 12.971/14 diz respeito também ao § 2º do artigo 306, que inseriu a possibilidade de verificação de influência de outra substância psicoativa por meio do exame toxicológico (que não era antes previsto).

De forma pacificar uma discussão jurídica sobre os outros meios de prova onde se era reafirmado o princípio da liberdade da prova, com importante ressalva quanto ao direito à contraprova onde ser era aceito não tão claramente e enquadrando taxativamente o exame toxicológico. De toda forma, o legislador temeroso pelo “jeitinho brasileiro” de tentar arrumar “manobras jurídicas”.

O legislador deixou claro o meio de prova caso o investigado consinta em participar ativamente da produção probatória, sem que isso signifique desprezo pela garantia contra a autoincriminação (nemo tenetur se detegere). Inclusive pois são vários os meios de prova aptos a comprovar a materialidade delitiva, que independem de participação do suspeito. Isto é, o exame pericial não é o único hábil a comprovar a materialidade delitiva.

No que concerne à prova da materialidade, a ebriedade pode ser evidenciada por meio da concentração de álcool no organismo. Essa demonstração é mais comumente feita com o uso do etilômetro, aparelho que mede o teor alcoólico no ar alveolar. Porém, esta prova não é constatada exclusivamente dessa forma, aceitando-se também a constatação de sinais indicadores da embriaguez, como exame clínico, perícia, vídeo e prova testemunhal (art. 306, §§ 2º e 3º do CTB e Resolução CONTRAN 432/13).

No § 3º do artigo 306, também se inseriu a expressão “toxicológicos”, harmonizando com o § 2º do artigo 306 (agora a pouco estudado), trazendo que o COTRAN disporá também com relação aos distintos testes toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado no artigo 306, caput do CTB.

Como o crime se perfaz não somente pelo uso de álcool associado à direção, mas também pela condução de veículo automotor sob efeito de drogas, o exame toxicológico possui igual relevância como fonte de prova para essa espécie delitiva.

Além disso, convém negritar que a discussão sobre a suposta insuficiência do teste de bafômetro perdeu sentido quando a ação nuclear deixou de exigir necessariamente certa quantidade de álcool por litro de sangue para que o crime se consumasse. A exigência legal atual é que o motorista esteja com a capacidade psicomotora alterada, seja qual for o grau etílico que apresente, inclusive porque o organismo de cada ser humano responde de forma distinta à intoxicação pelo álcool, a depender de fatores como genética, sexo, idade, altura e peso.

A de Salientar, que as campanhas para a educação no trânsito e a forte fiscalização vêm contribuindo para tornar as ruas e estradas mais seguras. Além de maior consciência em relação aos malefícios do álcool na direção, a Lei Seca também permitiu que os agentes de trânsito fiscalizassem de forma mais eficaz as condições em que os veículos trafegam pelo País, obrigando os condutores a circularem com seus carros vistoriados e com todos os equipamentos de segurança em boas condições de uso.

A decisão do governo de tornar obrigatória a instalação de freios ABS e airbag em todos os carros, a partir de janeiro de 2014, colabora para diminuir a gravidade dos acidentes. Os efeitos dessas medidas já são sentidos e passarão a ficar mais evidentes ao longo dos próximos anos.

Toda iniciativa legislativa em se conferir um tratamento mais rigoroso para situações em que a irresponsabilidade no trânsito ofende a integridade física e a vida de outrem merece aplausos. Cumpre analisar pormenorizadamente o modo com que o legislador se livrou dessa incumbência, desafio que constitui a pretensão deste artigo.

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