RESUMO
O presente artigo disserta acerca de como União Europeia surgiu e se firmou como bloco econômico através da série de acordos que lentamente conduziu os países europeus a integrar-se por completo e coloca-se em evidência também os aspectos positivos e negativos bem como o impacto no mundo jurídico dos Estados que a integram.
Palavras-chave: direito internacional, público, União Europeia, histórico, processo de formação, tratado.
1. INTRODUÇÃO
Ao fim da Segunda Guerra Mundial a Europa se encontrava temerosa. O nacionalismo exagerado presente há muito tempo no continente e agravado pelos processos de unificação dos países deu origem ao pior conflito armado do mundo despertando a preocupação, após seu término, em relação ao futuro daqueles Estados e em como diminuir as barreiras entre eles. De combatentes da resistência a advogados, incluindo Winston Churchill[1], os líderes visionários que inspiraram a criação da União Europeia juntamente com várias outras pessoas que trabalharam de forma incansável para que o projeto se concretizasse, formavam um grupo diverso de pessoas com o mesmo ideal: construir uma Europa em paz, unida e próspera.
2. PROCESSO DE FORMAÇÃO
O primeiro passo para a integração europeia se deu em 1948 com a criação da BENELUX, uma zona de livre comércio entre Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo. Inicialmente, esse bloco funcionava como uma União Aduaneira com reduções nas tarifas de importações e exportações entre os estados-membros e a adoção de uma Tarifa Externa Comum (TEC). O modelo foi pioneiro e tornou-se o principal modelo dos blocos econômicos que atualmente predominam o bloco econômico mundial.
No entanto, considera-se geralmente como embrião da União Europeia a Comunidade do Carvão e do Aço (CECA), criada em 1952 com os países membros da BENELUX em conjunto com Alemanha Ocidental, França e Itália. O objetivo era estabelecer um mercado siderúrgico comum para integrar a produção industrial e o fornecimento de matérias-primas em todo o agrupamento. O BENELUX continuou existindo inclusive até os dias atuais.
Após a criação e os primeiros anos de sucesso da CECA e BENELUX, despertou-se o interesse de ampliação para os demais países europeus visando maior interação e cooperação entre as nações bem como as vantagens e melhores abrangências econômicas. Com o fim ainda recente da Segunda Guerra o continente se encontrava debilitado em vários setores, especialmente o econômico, de forma a parecer muito adequado o momento para expandir-se mais ainda os limites dos tratados já existentes, sobretudo o da CECA. Assim, em 25 de março de 1957, em Roma, assinou-se o Tratado de Roma dando origem a duas novas comunidades: a Comunidade Econômica Europeia (CEE) e a Comunidade da Energia Atômica (EURATOM). O tratado obteve ratificação de países como França, Bélgica, Alemanha, Países Baixos, Itália e Luxemburgo.
2.1 CONSOLIDAÇÃO E EXPANSÃO DA INTEGRAÇÃO
O Tratado que instituía a CEE afirmava, no seu preâmbulo, que os estados signatários estavam "determinados a estabelecer os fundamentos de uma união sem brechas e mais estreita entre os países europeus". [2] Assim firmavam claramente não apenas um compromisso econômico mas também um de caráter político de integração progressiva entre os países membros, criando-se na prática uma união aduaneira e um acordo de encerrar as fronteiras entre tais países em 12 anos, concretizado em 1968.
De igual importância foram firmadas outras convenções dentre elas a Política Agrícola Comum (PAC), estabelecendo a liberdade de circulação de produtos agrícolas dentro da CEE com medidas protecionistas que garantiam aos agricultores europeus a não concorrência, complementada mais tarde com o Fundo Europeu de Orientação e Garantia (FEOGA) em 1962. O Tratado de Roma também trouxe disposições sobre a proibição de monopólios, políticas comuns dos transportes de concessão e alguns privilégios comerciais aos territórios coloniais dos estados-membros.
A CEE foi a primeira proposta existente de promoção à livre circulação de mercadorias, capitais e, principalmente, de pessoas, integração essa que seria concretizada com o passar dos anos, à medida que as economias dos respectivos países-membros se fortalecessem. Como nova estratégia procurou um processo de integração que fosse afetando pouco a pouco o sistema econômico e consequentemente fosse cedendo as competências econômicas, administrativas e políticas. Neste sentido a CEE passa a ter uma série de instituições: a Comissão, o Conselho, a Assembleia Europeia (chamada, depois, Parlamento Europeu), o Tribunal Europeu e o Comitê Econômico e Social cujas competências se foram alargando e modificando nos diversos acordos e tratados que modificaram, nos anos posteriores, o Tratado de Roma.
O menos citado dos vários acordos contidos Tratado de Roma foi assinado também em 1957 e deu origem à Comunidade Europeia da Energia Atômica (EURATOM). Ainda sob os efeitos da guerra e o escasso desenvolvimento na área, a energia ainda era um problema e seu fornecimento bastante precário. Os seis estados fundadores então decidiram juntar esforços e financiamentos para investir na energia nuclear de maneira a alcançar a independência energética e evitar seus desvios para fins militares. A estrutura institucional do Tratado EURATOM é na essência igual ao Tratado CEE. As instituições comunitárias são responsáveis pela aplicação do Tratado e pelos dois organismos próprios: a Agência de Aprovisionamento e o Serviço de Salvaguardas, que efetua controlos contabilísticos e materiais em todas as instalações nucleares da Comunidade.
Contrariamente ao Tratado de Roma que criou a CEE, o Tratado EURATOM nunca sofreu grandes alterações e mantém-se em vigor. A Comunidade Europeia da Energia Atómica não foi fundida com a União, mantendo, por conseguinte, uma personalidade jurídica distinta, embora partilhe as mesmas instituições. Seguem as missões da seguinte Comunidade:
- Desenvolver a investigação e assegurar a difusão dos conhecimentos técnicos. A Comissão convida os Estados-Membros, pessoas e empresas a comunicar-lhe os respectivos programas relativos à investigação nuclear.
- Estabelecer normas de segurança uniformes destinadas à proteção sanitária da população e dos trabalhadores e zelar pela sua aplicação.
- Facilitar os investimentos e assegurar, designadamente encorajando as iniciativas das empresas, a criação das instalações essenciais ao desenvolvimento da energia nuclear na UE.
- Velar pelo aprovisionamento regular e equitativo de todos os utilizadores da Comunidade em minérios e combustíveis nucleares.
No entanto, não houve total aceitação e harmonia com o novo modo de integração e organização europeia. A Inglaterra se negou a fazer parte da CEE por julgar mais importante suas relações econômicas, políticas e sociais já resolvidas internamente. Também não concordavam com uma união aduaneira nem concordava em participar de um tratado que, a longo prazo, cessaria as fronteiras dos países em benefício de interesse maior do continente. Por isso, para recusar totalmente sua entrada, criou a Associação Europeia do Comércio Livre (EFTA), a que aderiram a Suécia, a Suíça, a Noruega, a Dinamarca, a Áustria e Portugal. De longe, não apresentava qualquer caráter de integração política, sendo apenas uma zona de livre comércio em que não reconhecia criação de nenhuma fronteira comum. A associação revelou-se um fracasso diante da CEE nos anos 1960 pela grande disparidade entre as taxas de crescimento de cada uma.
O nacionalismo exagerado de algumas nações que relutavam contra a nova proposta resultou na chamada “crise da cadeira vazia” em 1966. Esta crise manteve-se por longos meses e a Comunidade paralisou suas atividades terminando, finalmente, o chamado Compromisso de Luxemburgo. Teve-se de esperar a demissão do líder francês Charles de Gaulle, ferrenho defensor da “Europa das Pátrias”, para que se abrisse porta para a adesão britânica. Mesmo contra a opinião britânica ingressaram ao CEE em 1972 somando-se mais três países em 1973: Reino Unido, Dinamarca e Irlanda. Assim, nascia a “Europa dos Nove”. Na mesma época, a Noruega realizou um referendo sobre participar ou não da CEE. Sendo maioria dos votos negativos, manteve-se a margem da Comunidade.
Em razão da crise do petróleo em 1973, o crescimento significativo que os países europeus vinham enfrentando sofreu decadência brusca durante o restante da década. Mesmo assim, acontecimentos importantes trouxeram avanços tanto no processo de integração dos países quanto no alargamento da Comunidade a constar:
- A partir de 1975, foi institucionalizado o chamado Conselho Europeu, reunião periódica dos chefes de Estado e do Governo, onde se tomam as grandes decisões estratégicas da Comunidade.
- Em 1979, nasceu o Sistema Monetário Europeu, acompanhado da criação do ECU ( European Currency Unit), antecedente direto do Euro. As moedas dos países membros ficavam fixadas numa estreita zona de flutuação do seu valor de câmbio em 2,5% e, além disso, os governos comprometiam-se a coordenar as suas políticas monetárias. Tratava-se do primeiro passo significativo para a unidade monetária.
- Ainda em 1979, tiveram lugar as primeiras eleições, por sufrágio universal, para o Parlamento Europeu.
- A queda das ditaduras militares na Grécia (1974), Portugal (1974) e Espanha (morte de Franco em 1975) propiciaram a adesão destes países. A Grécia em 1981, a Espanha e Portugal, em 1986, tornaram-se membros da CEE. A comunidade estendeu-se até à Europa mediterrânica e a Espanha conseguiu realizar uma antiga aspiração.
Em 1984 apresentou-se ao Parlamento o “Projeto do Tratado da União Europeia” propondo um novo tratado em substituição ao de Roma e que, em princípio, avançaria a integração europeia. Não foi aprovado porém inseriu o debate sobre o futuro da Comunidade, antecipando avanços que ocorreriam mais tarde. Em 1985, os três países do BENELUX assinaram o acordo de Schengen que ganhou outros membros mais tarde. Esse documento continha a ambiciosa iniciativa que garantia a livre circulação das pessoas e a gradual supressão de fronteiras entre os estados. Diante dos dois dispositivos a segunda metade da década de 1980 deu impulso a um grande alargamento político com os processos implantados e em 1986 foi aprovado o Ato Único Europeu.
A década de 1990 começou com a consagração do nome “União Europeia” através da assinatura do Tratado de Maastricht em 1992. O termo União usa-se desde o início do tratado para representar o avanço num projeto histórico. Assim, o articulado no artigo 2o do Tratado da União Europeia diz o seguinte: “O presente Tratado constitui uma nova etapa no processo criador de uma União cada vez mais estreita entre os povos da Europa…” [3]. Além disso, o tratado tem uma estrutura baseada em três pilares formado pelas suas instituições com competências supranacionais e as instituições de cooperação entre os governos chamados de Política Exterior e Segurança Comum (PESC) e a Justiça e Assuntos de Interior (JAI). Nos pilares de cooperação entre os governos, as decisões foram combinadas de tomar-se por consenso e as competências da Comissão, o Parlamento Europeu e o Tribunal de Justiça são escassas. No pilar comunitário, as decisões tomam-se cada vez mais por maioria e o papel das instituições comunitárias é essencial.
Também chamado de Tratado da União Europeia, traz consigo finalmente um projeto possível de concretização da integração entre os países-membros desta vez propondo mudanças em todos os campos administrativos e políticos e garantindo assim novos direitos e possibilidades na vida de tais nações. As mais importantes sem dúvida foram as relacionadas à criação de uma cidadania europeia com passaporte unificado e livre circulação de pessoas entre os países e a união econômica monetária que mais tarde, em 1995, propôs-se o euro como moeda oficial de circulação dentro do bloco. O uso exclusivo da moeda se deu em três atos que atingiu sua meta em 2002, com exceção do Reino Unido e da Dinamarca, formando a chamada “zona do euro”. No que se refere às instituições, o Tratado introduz novidades importantes: o Parlamento aumenta os seus poderes, o Conselho de Ministros passa a denominar-se Conselho da União Europeia, a Comissão recebe o nome oficial de “Comissão das Comunidades Europeias”, o Tribunal da Justiça, o Tribunal de Contas e o Comité Económico e Social reforçam as suas competências, cria-se o Comité das Regiões, de carácter consultivo e prevê-se a criação do Banco Central Europeu, ao iniciar-se a terceira fase da União Económica e Monetária.
3. ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS
A União Europeia é hoje o bloco político e econômico mais influente no mundo, formado pela maioria dos países do continente europeu totalizando 28 Estados-membros: Alemanha, Áustria, Bélgica, Bulgária, Chipre, Croácia, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos, Polónia, Portugal, República Checa, Roménia, Suécia e Reino Unido. Apesar dos problemas de integração encontrados durante e após a assinatura do Tratado de Roma, a União Europeia é referencia como bloco econômico por ter conseguido cumprir todas as fases de integração, especialmente a última referente a livre circulação de bens e pessoas.
Soma-se isso à isenção de tarifas alfandegárias e o uso de moeda única que proporcionaram um crescimento igualitário adicionando mais qualidade de vida para as populações dos países-membros evitando assim problemas de migração em larga escala entre os mesmos assim como falta de condições e serviços, como por exemplo na educação e profissionalização, que em certo nível foram acordadas nos tratados a fim de levar igualdade para todos do bloco. Por outro lado, os países que desfrutam do crescimento e benefícios do bloco como um todo equiparavelmente também sofrem as consequências quando um membro entra em crise gerando um efeito dominó, como ocorreu na crise de 2008 e na crise da Grécia. Nesta última, um dos empréstimos cedidos pela União Europeia foi de 7 bilhões de euros. [4]
4. IMPACTO NO MUNDO JURÍDICO
Mudanças significativas também foram realizadas no mundo jurídico com a criação da União Europeia. Instituiu-se um quadro único de direito comunitário decorrente de uma soberania partilhada, constituídos de normas que saem da esfera do direito nacional e em muitos casos colocam o direito comunitário acima do direito interno. No modelo comunitário, a relação se sustenta em bases verticais, no qual os Estados partilham sua soberania que assegura o processo de integração, a ordem jurídica comunitária e o poder supranacional. O direito comunitário nasce desce modelo, vinculando os países-membros, as pessoas físicas e jurídicas no âmbito de cada Estado. A União Europeia não compõe uma federação, uma vez que os estados-membros preservam a individualidade enquanto sujeitos do Direito das Gentes, exceto no que se refere a competência transferida para as Comunidades. No entanto, possui personalidade jurídica através de seus tratados, sendo exercida através de seus órgãos, patrimônios e recursos.
5. CONCLUSÃO
A União Europeia é resultado de um ideal somado à necessidade diante do fim da Segunda Guerra de reconstruir e reerguer um continente de maneira distinta, procurando cessar os conflitos ligados ao nacionalismo radical e unir os países a fim de promover o crescimento econômico e a tolerância entre os mesmos.
Para tanto, firmaram-se ao longo de 67 anos vários tratados que aos poucos foram abrangendo mais países e, com resultados positivos e reais benefícios, provaram que a integração era o melhor caminho para os países alavancarem suas economias. Como consequência, mesmo os países que se encontravam relutantes e ainda presos na antiga mentalidade de total soberania cederam ao novo e se enquadraram nos moldes de união dando novo alcance e importância aos tratados, que passaram a contar com as mais ricas e importantes nações europeias.
A partir de então os avanços e desenvolvimentos se deram rapidamente e os planos de integração tornaram-se mais complexos levando à assinatura do Tratado de Maastricht em 1992, oficializando a criação da União Europeia que já contava com órgãos comuns, interesse e ação de todos os Estados-membros que trabalharam constantemente para garantir que todos os projetos e dispositivos se aplicassem em seus territórios visando a ratificação do tratado e a harmonia entre todos os participantes, sempre com a intenção de obter visibilidade e harmonia em vários setores, em especial o econômico.
A União Europeia hoje constitui, portanto, bloco econômico de maior relevância do mundo com o melhor exemplo de integração de poderes e sistemas, não alcançado ainda por nenhum outro no mundo. No entanto, apesar do processo de integração estar totalmente concluído por conta da abertura de fronteiras e circulação livre de pessoas e bens, ainda há muitos desafios para manter-se todo sistema funcionando somados aos problemas e crises sempre ameaçadoras e exigentes de decisões imediatas que sempre são decisivas para o futuro do bloco.
6. REFERÊNCIAS
OCAÑA, Juan Carlos. União Europeia: O Processo de Integração e a Cidadania Europeia - O Tratado de Roma e a evolução da CEE (1957-1986). Disponível em: <http://www.historiasiglo20.org/europortug/troma.htm.
JESUS, Alfredo Sousa de. Tratados de Roma (1957). Disponível em: <http://euroogle.com/dicionario.asp?definition=915.
OCAÑA, Juan Carlos. A União Europeia: O Processo de Integracão e a Cidadania Europeia - O Tratado da União Europeia ou de Maastricht (1992). Disponível em: <http://www.historiasiglo20.org/europortug/maastricht.htm#O%20desenvolvimento%20da%20Uni%C3%A3o%20Europeia.
MARTINS, Eliane Maria Octaviano Martins. O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO ECONÔMICA DA UNIÃO EUROPÉIA. Disponível em: <http://laginski.adv.br/artigos/Eliane/integracao_economica_ue.htm.
[1] A história da União Europeia – Fundadores da UE. Disponível em: < http://europa.eu/about-eu/eu-history/index_pt.htm.
[2] OCAÑA, Juan Carlos. União Europeia: O Processo de Integração e a Cidadania Europeia - O Tratado de Roma e a evolução da CEE (1957-1986). Disponível em: <http://www.historiasiglo20.org/europortug/troma.htm.
[3] OCAÑA, Juan Carlos. A União Europeia: O Processo de Integracão e a Cidadania Europeia - O Tratado da União Europeia ou de Maastricht (1992). Disponível em: <http://www.historiasiglo20.org/europortug/maastricht.htm#O%20desenvolvimento%20da%20Uni%C3%A3o%20Europeia.
[4] LAGARDE, Christine. União Europeia libera empréstimo de 7 bilhões de euros à Grécia. Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/07/ue-concede-financiamento-ponte-de-7-bi-de-euros-grecia.html