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Comentários à Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011):

a transparência pública como direito fundamental do cidadão

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15/02/2018 às 14:10
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A Lei de Acesso à Informação (LAI) é considerada um divisor de águas em matéria de transparência pública, pois, dentre outros princípios, define que o acesso como regra e o sigilo como exceção.

1.     Introdução.

Este texto possui o humilde objetivo de analisar, de maneira didática, a Lei 12.527/2011, a Lei de Acesso à Informação (LAI). Essa norma dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso às informações previstas na Constituição Federal e nas demais normas do ordenamento jurídico.

A seguir, os fundamentos constitucionais que reclamavam a regulamentação feita pela Lei de Acesso à Informação e que justificam a sua criação:

Artigo 5º – XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

Artigo 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...).

§ 3º – A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente:

II – o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo

Artigo 216 – §2º Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.

1.1.   Informação como Direito humano fundamental.

O acesso à informação é reconhecido como direito humano fundamental por importantes organismos da comunidade internacional. Desde sua origem, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1948, já previa em seu artigo 19:

“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e de expressão; esse direito inclui a liberdade de ter opiniões sem sofrer interferência e de procurar, receber e divulgar informações e ideias por quaisquer meios, sem limite de fronteiras”.

Vários outros atos internacionais ratificados pelo Brasil reafirmaram a importância de garantir e proteger o direito à informação, a exemplo do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966):

“Toda e qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão; esse direito compreende a liberdade de procurar, receber e expandir informações e ideias de toda a espécie, sem consideração de fronteiras, sob forma oral ou escrita, impressa ou artística, ou por qualquer outro meio à sua escolha”.

Declaração Interamericana de Princípios de Liberdade de Expressão (2000):

“O acesso à informação em poder do Estado é um direito fundamental do indivíduo. Os Estados estão obrigados a garantir o exercício desse direito. Este princípio só admite limitações excepcionais que devem estar previamente estabelecidas em lei para o caso de existência de perigo real e iminente que ameace a segurança nacional em sociedades democráticas”.


2. Lei Brasileira de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011).

A Lei de Acesso à Informação (LAI) é considerada um divisor de águas em matéria de transparência pública, pois, dentre outros princípios, define que o acesso à informação é a regra, e o sigilo, a exceção.

Para a LAI, qualquer pessoa, física ou jurídica, poderá solicitar acesso às informações públicas, isto é, aquelas não classificadas como sigilosas, conforme procedimento que observará as regras, prazos, instrumentos de controle e recursos previstos.

É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão. 

O Decreto nº 7.724/12 regulamenta a LAI. Importante lembrar que esse Decreto não abrange toda a Administração Pública, referindo-se somente ao Poder Executivo Federal.

2.1.         Destinatários da Lei.

De acordo com o art. 1º, a LAI deve ser observada por todos os órgãos e entidades da administração direta e indireta, ou seja:

 

Todos os órgãos e entidades

 

 

 

FEDERAIS/ESTADUAIS/MUNICIPAIS/DISTRITAIS

 

Todos os Poderes

 

EXECUTIVO/LEGISLATIVO/JUDICIÁRIO

 

Toda a Administração Pública

 

Direta (órgãos públicos) / Indireta (autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, estados, Distrito Federal e/ou municípios)

 

Além do grupo citado acima, a LAI abarca as entidades privadas sem fins lucrativos que recebam recursos públicos para a realização de ações de interesse público diretamente do orçamento ou mediante subvenções sociais, contrato de gestão, termo de parceria, convênio, acordo, ajustes ou outros instrumentos congêneres.  Nessa situação, a publicidade a que estão submetidas é referente apenas à parcela dos recursos públicos recebidos e à sua destinação.

2.2.     Princípio e Diretrizes da LAI.

A seguir, o rol com os princípios estampados na LAI:

1. Princípio da publicidade máxima: a abrangência do direito a informação deve ser ampla no tocante à quantidade de informações e órgãos envolvidos, bem como quanto aos indivíduos que poderão reivindicar esse direito;

2. Princípio da transparência ativa e a obrigação de publicar: os órgãos públicos têm a obrigação de publicar informações de interesse público sem necessidade de provocação dos interessados.

3. Princípio da abertura de dados: estímulo à disponibilização de dados em formato aberto, utilizado livremente, cujo acesso é facultado a qualquer interessado.

4. Princípio da criação de procedimentos que facilitem o acesso: os pedidos de informação devem ser processados mediante procedimentos ágeis, de forma transparente e em linguagem de fácil compreensão, com a possibilidade de apresentação de recurso em caso de negativa da informação. Para o atendimento de demandas de qualquer pessoa por essas informações, devem ser utilizados os meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação[1].

2.     Espécies de transparência.

2.1.         Transparência ativa.

Conforme já afirmamos, vigora a obrigatoriedade de órgãos e entidades públicas, por iniciativa própria, sem necessidade de provocação, divulgarem informações de interesse geral ou coletivo, salvo aquelas que contenham informações que mereçam especial proteção em razão do seu caráter sigiloso.

Tal iniciativa é denominada “Transparência Ativa”. Diz-se que, nesse caso, a transparência é “ativa”, pois parte do órgão público a iniciativa de avaliar e divulgar aquilo que seja de interesse geral.

A LAI estimula exaustivamente a iniciativa de transparência, como nas passagens a seguir:

Art. 3°. Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes diretrizes:

(...)

II - divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações; 

(...)

Art. 8°. É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.

O artigo 8º, além de reafirmar a transparência ativa, determina um bloco de informações mínimas que deverão ser objeto de iniciativa de transparência pública (art. 8º §1º):

I – registro das competências e estrutura organizacional, endereços e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público;

II – registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros;

III – registros das despesas;

IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados;

V – dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos e entidades e;

VI – respostas a perguntas mais frequentes da sociedade.

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O rol acima não é exaustivo, ou seja, não se exaure aqui. Na verdade, a Lei cuidou de trazer apenas um rol mínimo de informações, cabendo ao órgão ou entidade pública definir outras informações que possam ser de interesse coletivo ou geral e que deverão ser objeto de iniciativas de Transparência Ativa.

A LAI definiu a internet como sendo o canal obrigatório para a divulgação das iniciativas de Transparência Ativa, o que não exclui a possibilidade de utilização de outros meios. Tal regra está expressa no § 2º do artigo 8º:

§ 2°. Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores.

Com efeito, os sítios de internet deverão atender a alguns requisitos, estabelecidos no § 3º, do artigo 8º, da LAI, quais sejam:

I - conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão;

II - possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise das informações;

III - possibilitar o acesso automatizado por sistemas externos em formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina;

IV - divulgar em detalhes os formatos utilizados para estruturação da informação;

V - garantir a autenticidade e a integridade das informações disponíveis para acesso;

VI - manter atualizadas as informações disponíveis para acesso;

VII - indicar local e instruções que permitam ao interessado comunicar-se, por via eletrônica ou telefônica, com o órgão ou entidade detentora do sítio e;

VIII - adotar as medidas necessárias para garantir a acessibilidade de conteúdo para pessoas com deficiência, nos termos do art. 17 da Lei n° 10.098, de 19 de dezembro de 2000, e do art. 9° da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pelo Decreto Legislativo n° 186, de 9 de julho de 2008.

Impende mencionar que os Municípios com população de até 10.000 (dez mil) habitantes ficam dispensados da divulgação obrigatória na Internet do chamado “rol mínimo de informações”.


3. Transparência passiva.

A LAI também estabelece procedimentos e ações a serem realizados pelos órgãos e entidades públicas de forma a garantir o atendimento ao princípio da “Transparência Passiva”.

É exatamente o caminho inverso da “ativa”. Ou seja, ocorre quando algum órgão ou ente é provocado pela sociedade a prestar informações. A obrigatoriedade de prestar as informações solicitadas está prevista especificamente no artigo 10 da LAI:

Art. 10. “Qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades referidos no art. 1° desta Lei, por qualquer meio legítimo, devendo o pedido conter a identificação do requerente e a especificação da informação requerida”.

Os pedidos devem ser encaminhados ao serviço de informação do órgão público, inclusive pela internet. Eles devem identificar o requerente, mas sem exigências que inviabilizem a solicitação, e não se podem exigir justificativas para solicitar informações de interesse público.

Uma vez recebido um pedido de informação, o Poder Público deve autorizar ou conceder acesso imediato à informação. Não sendo possível acesso imediato, em até 20 dias, o órgão deve responder o requerente apresentando:

=> Data, local e modo para se realizar o acesso;

=> Razões para se recusar o acesso pretendido, informando sobre os procedimentos de recurso;

=> Comunicado de que não possui a informação ou que encaminhou o pedido ao órgão que realmente detém a informação;

=> Justificativa para prorrogar o pedido por mais 10 dias.

Em caso de pedidos negados, o requerente poderá fazer uso do procedimento estabelecido entre o art. 15 e 20 da LAI, adiante estudado.


4. Procedimento recursal.

O demandante de informação pública pode recorrer em duas situações:

=> Quando há negativa de acesso à informação;

=> Quando não há a motivação obrigatória da negativa de acesso.

A lei detalha de forma minudenciada os procedimentos de recursos apenas no âmbito da administração pública federal. Os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público deverão regulamentar em separado seus procedimentos de recursos. Estados, municípios e Distrito Federal devem estabelecer, em legislação própria, seu sistema de recursos, mas seguindo as normas gerais da lei nacional.

O cidadão tem o direito de obter o inteiro teor da decisão e pode interpor recurso contra a decisão em até 10 dias. Depois disso, a autoridade hierarquicamente superior àquela que negou o acesso deve se manifestar em até 5 dias.

O serviço de busca e fornecimento da informação é gratuito, salvo nas hipóteses de reprodução de documentos pelo órgão ou entidade pública consultada, situação em que poderá ser cobrado exclusivamente o valor necessário ao ressarcimento do custo dos serviços e dos materiais utilizados.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Aristócrates Carvalho. Comentários à Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011):: a transparência pública como direito fundamental do cidadão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5342, 15 fev. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/44963. Acesso em: 19 abr. 2024.

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