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Embargos de declaração em decisão interlocutória.

Cabimento

03/12/2003 às 00:00
Leia nesta página:

1.Considerações iniciais

Antes de se fazer qualquer abordagem acerca do recurso posto a exame, cumpre trazer à colação, para que se tenha uma idéia mais acurada dessa espécie de figura recursal, o seu conceito e a sua natureza jurídica, a saber:

1.1.Conceito

Embargos de declaração é o meio, pelo qual, uma das partes se utiliza para requerer ao juiz prolator de uma determinada decisão, que a esclareça nos seus pontos obscuros, ou a complete, quando omissa, que lhe repare ou elimine eventuais contradições, por acaso, nela existentes.

1.2. Natureza Jurídica

Os embargos de declaração têm sempre natureza jurídica de recurso (art. 496, IV, CPC), sejam ou não interpostos de decisão interlocutória, sentença ou acórdão e, como tal, estão sujeitos aos requisitos de admissibilidade e a teoria geral dos recursos.

Delimitados, ainda que sucintamente, o conceito e a natureza jurídica dos embargos de declaração, cumpre asseverar que o CPC, ao tratar dos embargos de declaração, no seu artigo 535, I, não contemplou, "expressis verbis", o cabimento dessa figura recursal nas decisões interlocutórias, conforme se verá da sua contextura, ipsis verbis:

Cabem embargos de declaração, quando:

I - houver, na sentença ou acórdão, obscuridade ou contradição (grifamos para destacar);

II - for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal.

Entretanto, este não é o entendimento da doutrina dominante, na qual se perfilham doutrinadores de escol, como PONTES DE MIRANDA, HUMBERTO TEODORO JÚNIOR, JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, ALEXANDRE DE PAULA dentre outros e da jurisprudência assente e iterativa dos nossos tribunais. Se não, vejamos:


2.Entendimento Doutrinário

BARBOSA MOREIRA [1], com a clareza que lhe é peculiar, ao examinar a matéria, assim pontificou "in verbis":

Na realidade, qualquer decisão judicial comporta embargos de declaração, é incabível que fique sem remédio a obscuridade, a contradição ou a omissão existente no pronunciamento, não raro a comprometer a possibilidade prática de cumpri-lo. Não tem a mínima relevância que se trate de decisão de grau inferior ou superior, proferida em processo de cognição (de procedimento comum ou especial), de execução ou cautelar. Tampouco importa que a decisão seja definitiva ou não, final ou interlocutória. Ainda quando o texto legal, "expressis verbis", a qualifique de "irrecorrível", há de entender-se que o faz com a ressalva concernente aos embargos de declaração.(grifos nossos).

São, ainda, do eminente BARBOSA MOREIRA os seguintes esclarecimentos:

Quanto às circunstâncias de serem as decisões interlocutórias impugnáveis por agravo de instrumento, não torna por si só desnecessários os embargos de declaração, pois os dois remédios têm finalidade específica e distinta, não sendo razoável atribuir ao agravo uma função que os embargos declaratórios se mostram capazes de desempenhar com muito mais simplicidade e rapidez (2).

Outro processualista de renome, que se alinha, na mesma corrente citada, é o Professor do Rio Grande do Sul, OVÍDIO BATISTA [3], que ao discorrer sobre a matéria, assim se expressou:

Mas nem só as sentenças e acórdãos podem conter omissões, obscuridades ou contradições que exijam a providência saneadora dos embargos de declaração. Também as decisões interlocutórias poderão conter vícios dessa natureza (grifos nossos).

E traz à colação, para exemplificar:

O caso de haver o magistrado em despacho saneador, omitido pronunciamento sobre uma questão preliminar de mérito que o demandado haja suscitado e capaz de ser decidida independentemente da futura instrução em audiência; ou se fora alegada pelo réu a falta de "legitimatio ad processum", ou qualquer outro vício formal, desse que pode acarretar a extinção do processo sem julgamento de mérito. A solução neste caso seria a interposição de embargos de declaração, se a parte não confiar em simples pedido de reconsideração que, desacolhido pelo magistrado depois de exaurido o prazo recursal, importaria em preclusão para qualquer inconformidade, salvo naturalmente a possibilidade de apreciação posterior pelo magistrado da questão não decidida, caso fosse ela daqueles cujo conhecimento lhe caiba de ofício.


3.Entendimento Judicial

Outro não é o entendimento da jurisprudência remansosa dos nossos tribunais, conforme se infere da ementa do julgado que perfilha essa interpretação, "verbis":

Na verdade, porém, tanto o ato judicial apelável como o agravável comporta embargos de declaração (RT 561/137, em, JTA 66/178, 144/55, 121/5).


4.Efeito Suspensivo dos EDcl 

Outro ponto importante que merece ser destacado é o que diz respeito ao efeito suspensivo dos Embargos de Declaração. Assim, interposto o recurso de embargos de declaração a eficácia da decisão embargada fica suspensa, mesmo que o recurso dela cabível não tenha efeito suspensivo. A lei silencia que ao recurso de embargos deve ser conferido o efeito suspensivo. E no silêncio da lei, deve se conferir o efeito suspensivo aos embargos de declaração. Com efeito, expendidas estas considerações, afigura-se-nos algumas hipóteses que poderão ocorrer na interposição dos embargos de declaração de decisão interlocutória. Assim, é de se indagar: se interpostos e admitidos os embargos de declaração, o prazo para a interposição do agravo de instrumento fica interrompido? E se, por acaso, o juiz que prolatou a decisão conhecer do recurso apresentado e não der provimento, mantendo a decisão embargada inalterada, pode a parte que se sentir prejudicada agravar? Nesse caso, seria o recurso tempestivo?. A resposta a todas estas indagações é pela afirmativa. Assim, interpostos os embargos de declaração de decisão interlocutória e se cabíveis, o prazo para a interposição do agravo de instrumento se interrompe, desde a apresentação dos embargos, até a data da intimação das partes da decisão que os julgou, começando a fluir de novo, por inteiro, o prazo, que é de dez dias, para a interposição do agravo de instrumento. Destarte, esse entendimento se harmoniza com a jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal, que no julgamento do acórdão, cuja ementa se transcreve, se manifestou sobre o tema, deixando registrado, "ipsis verbis": DECISÃO INTERLOCUTÓRIA - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - AGRAVO - CABIMENTO.

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Os embargos declaratórios são cabíveis contra qualquer decisão judicial e, uma vez interpostos, interrompem o prazo recursal. A interpretação meramente literal do art. 535, do CPC, atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual.

5.Omissão e prequestionamento

Ressalte-se, por oportuno, que os embargos de declaração servem, também, de pré-questionamento para o cabimento dos recursos extraordinário e especial, quando for omitido, na decisão, ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juízo a quo ou o tribunal.

Outro não é o escólio do E. Supremo Tribunal Federal, consoante se depreende da súmula 356, que vale, igualmente, para o recurso especial, cujo texto está assentado na seguinte redação:

SÚMULA 356 – O ponto omisso da decisão sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário por faltar o requisito do pré-questionamento.


6.Considerações Finais

Como visto acima, o CPC não contemplou, "expressis verbis", no dispositivo supra enfocado, o cabimento dos embargos de declaração nas decisões interlocutórias. E, como é cediço, alguns magistrados interpretam o dispositivo posto a comentário com literalidade absoluta, "Ipsis verbis", submetendo-se, de maneira sistemática, á letra fria da lei. Destarte, em que pesem

tais entendimentos, discordo, com a devida venia, da opinião em contrário dos que se apegam à literalidade da lei, visto que, como acontece, no dia-a-dia do foro, nem só as sentenças e acórdãos, como bem enfatizou OVÍDIO BATISTA, "podem conter omissões, obscuridades ou contradições que exijam providência saneadora dosembargos de declaração, da mesma forma as decisões interlocutórias poderão conter vícios dessa natureza".

Por outro lado, além da rapidez e da simplicidade dos embargos de declaração, a sua função é esclarecer, em determinada decisão, os pontos obscuros ou a completar, em caso de omissão, ou reparar ou eliminar eventuais contradições, por ventura, nela existentes, o que não acontece com o agravo de instrumento. Por estas razões, alinhar-me-ei, também, nesta esteira de entendimento e, ainda, por entender que sobre a lei recai a maior atividade investigadora do exegeta. E no dizer de CARLOS MAXIMILIANO [4], "o intérprete é o renovador inteligente e cauto, o sociólogo do Direito. O seu trabalho rejuvenesce e fecunda a fórmula prematuramente decrépita, e atua como elemento integrador e complementar da própria lei escrita. Esta é a estática, e a função interpretativa, a dinâmica do Direito". É o que se tinha para discorrer, a meu juízo, sobre o cabimento do recurso de embargos de declaração em decisão interlocutória.


Notas

01. BARBOSA MOREIRA, JOSÉ CARLOS - Comentários ao Código de Processo Civil, 6ª ed. vol. V, p. 498, Ed. Forense : Rio de Janeiro, 1994

02. op. cit. p. 498.

03. SILVA, OVÍDIO A BAPTISTA DA - Curso de Processo Civil, 2ª ed. vol. I, p. 381, Ed. Safe : Porto Alegre, 1991.

04. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª ed., p. 12, Rio de Janeiro : Forense, 1979

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Sobre o autor
Adenor José da Cruz

advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil, vice-diretor da Escola Superior de Advocacia Prof. Amilton de Castro (ESAD), em Ilhéus (BA)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Adenor José. Embargos de declaração em decisão interlocutória.: Cabimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 150, 3 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4569. Acesso em: 19 abr. 2024.

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