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A perda do mandato dos parlamentares condenados criminalmente e o esvaimento da representatividade popular

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03/03/2016 às 13:24

Resumo:


  • A perda do mandato parlamentar por condenação criminal transitada em julgado é um tema complexo e controverso no Brasil.

  • Existem duas correntes principais de interpretação da Constituição sobre a perda do mandato de parlamentares condenados criminalmente.

  • A questão da representatividade popular e a incompatibilidade da manutenção de mandatos de parlamentares condenados criminalmente são pontos cruciais a serem considerados nesse debate.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Conclusão:

Resta incontroverso que os parlamentares, para não falar dos demais mandatários do povo, possuem uma procuração, mesmo que fictícia, a qual lhes confere poderes, mas também traz consigo obrigações legais e morais. Quando ocorre desvio de conduta, mais especificamente com o cometimento de crimes, tem-se configurado o abuso dos poderes inerentes à função e a necessidade de que haja a punição do infrator.

No caso em tela, viu-se que os parlamentares, quando condenados por crimes em sentença transitada em julgado, não perdem automaticamente seu mandato, nos termos do art. 55, §2º, da CF/88. Analisaram-se, então, as correntes que apresentam posicionamentos contrários quanto à extensão e aplicação do referido artigo: enquanto uma defende a aplicação a todos os casos, a segunda se posiciona de modo a excluir do seu âmbito de incidência os crimes mais graves, com abuso de poder e contra a Administração Pública.

Percebeu-se que, em caso de conferir total liberdade à respectiva Casa congressual para deliberar sobre a perda ou não do mandato do parlamentar condenado, incorre-se na falta grave de “esvair” de sentido a representação popular, haja vista que não se mostra coerente manter algo contra o qual se agiu, ferindo a própria essência do instituto da representação.

Ademais, não se verificou justificativa plausível que sustentasse a mitigação do princípio da isonomia entre os parlamentares e os demais representantes do povo, que perdem automaticamente seu mandato quando condenados criminalmente, o que sugere que a “procuração” conferida àqueles é mais abrangente que a outorgada a esses – um total despautério.

Em um Estado Democrático de Direito, onde se buscam a efetivação dos princípios constitucionais, com uma maior participação popular e a salvaguarda de seus direitos, é totalmente incompatível conferir a parlamentar, que em tese representa o povo, a possibilidade de continuar exercendo uma função, quando agiu contra àqueles em nome de quem atua.

A solução mais adequada seria a sugerida pela segunda corrente, qual seja, o §2º do art. 55 da CF/88 não precisa ser aplicado em todos os casos nos quais o Deputado ou Senador tenha sido condenado criminalmente, mas apenas nas hipóteses em que a decisão condenatória não tenha decretado a perda do mandato parlamentar por não estarem presentes os requisitos legais do art. 92, I, do CP ou se foi proferida anteriormente à expedição do diploma, com o trânsito em julgado em momento posterior.


Bibliografia:

AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª edição, SP, Ed.Malheiros, 2005.

http://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/representacao-politica-tres-modelos-de-representacao-politica.htm. Acesso em 22/06/2015.

http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/100673874/artigo-prof-luiz-flavio-gomes-perda-de-mandato-vergonha-nacional-corrigivel. Acesso em 23/06/2015.

http://lucianarusso.jusbrasil.com.br/artigos/112220947/perda-do-mandato-dos-deputados-federais-e-senadores-da-republica. Acesso em 20/06/2015.

http://www.conjur.com.br/2013-nov-30/observatorio-constitucional-jurisprudencia-perda-mandato-clara. Acesso em 21/06/2015.

http://www.osconstitucionalistas.com.br/condenacao-causa-perda-automatica-de-mandato. Acesso em 23/06/2015.

http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/artigoBd.asp?item=248. Acesso em 20/06/2015.

LASSALLE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 6ªed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2001.

LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 12ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2013.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, 17º edição, São Paulo, Atlas, 2007.

Salgado, Eneida Desiree. A representação política e sua mitologia. Paraná Eleitoral. v. 1 n. 1 p. 25-40.

TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, 3ª edição, SP, Ed Saraiva, 2006.


Notas

[1] Assim, quando falar-se em votos de Ministros ou afins, tenha-se em mente que os mesmos são referidos no contexto da aludida ação penal, com a ressalva de que, como é cediço, os entendimentos jurisprudenciais são mutáveis e, data venia, nem sempre seguem sua própria lógica quando analisados frente a seus precedentes.

[2] José Afonso da Silva, um dos maiores constitucionalistas brasileiros, é categórico quanto à necessidade da manifestação da Casa a que o parlamentar pertença para a perda de seu mandato. Afirma que “aí se instaura um processo político de apuração das causas que justificam a decretação da perda do mandato. Trata-se de uma decisão constitutiva” (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 540).

[3]Nesse sentido, José Cretella Júnior, que afirma: “[…] A pena de perda do mandato eletivo, porém, não pode ser aplicada, pois a suspensão dos direitos políticos é de natureza constitucional, escapando a incidência da lei ordinária”. 

[4] Toda criação de Direito, ensinava Kelsen, é também aplicação do Direito. O legislador interpretou a Constituição e a aplicou ao aprovar essa nova redação do art. 92, do CP, por meio da Lei 9.268/96.

[5] A representação política apresenta propósitos paradoxais: deve, ao mesmo tempo, dar conta da unidade e da identidade. Como aponta David Ryden, deve ser capaz de gerar um compartilhamento de interesses e valores e dar resposta a demandas específicas, individualizadas (RYDEN, 1996, p. 25-30).

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[6] O relator, em decisão monocrática proferida em 2 de setembro de 2013, concedeu liminar para suspender a deliberação da Câmara dos Deputados que não cassou o parlamentar condenado e preso.

[7] Lassalle procura demonstrar que o poder de intervenção e transformação sobre uma sociedade não pode, de nenhuma maneira, ser conferido à Constituição, pois para ele “os problemas constitucionais não são problemas de direito, mas do poder; a verdadeira Constituição de um país somente tem por base os fatores reais e efetivos do poder que naquele país regem, e as Constituições escritas não têm valor nem são duráveis a não ser que exprimam fielmente os fatores do poder que imperam na realidade social: eis os critérios fundamentais que devemos sempre lembrar” (2001 p.40).

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Sobre o autor
Lucas Leal Sousa

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUSA, Lucas Leal. A perda do mandato dos parlamentares condenados criminalmente e o esvaimento da representatividade popular. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4628, 3 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45917. Acesso em: 23 dez. 2024.

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