A evolução da teoria da responsabilidade extracontratual do Estado está inteiramente ligada às transmutações que modificaram efetivamente o arcabouço social e do Estado, consubstanciadas em diversos movimentos teóricos inerentes aos contextos sociais.
I.1. A TEORIA DA IRRESPONSABILIDADE
A Teoria da Irresponsabilidade é peculiar à era dos Estados absolutistas, fundamentados na ideia de soberania, onde o Estado possuía imensuráveis prerrogativas, capazes de torná-lo incontestável em face dos súditos.
Nestas linhas, o interesse público estava contíguo à vontade do rei, que representava a própria lei e, portanto, ao responsabilizar o Estado por qualquer motivo seria colocá-lo no mesmo nível do súdito, o que significaria desrespeito a sua soberania.
A crítica ao supradito movimento teórico, está amparada na percepção de ”injustiça” social, vez que, ao titularizar direitos, inclusive, de maneira arbitrária, não poderia o Estado simplesmente insertar-se de obrigações quando, por ação ou omissão causar danos a terceiros.
I.2. A TEORIA CIVILISTA DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
Com a superação do paradigma da forma governamental absolutista, eclode-se também, uma nova perspectiva no que toca à noção de responsabilidade extracontratual do Estado, inspirada pelo individualismo característico do liberalismo, que tencionou equiparar o Estado ao indivíduo, sendo, portanto, obrigado a indenizar os danos causados aos particulares nas mesmas hipóteses em que tal obrigação existe para os indivíduos.
Ademais, fundava-se a teoria na ideia de que, como o Estado opera mediante seus agentes, apenas existiria a obrigação de indenizar quando estes tivessem agido com culpa ou dolo, potencializando ao particular o ônus de demonstrar a existência dos elementos subjetivos.
Contudo, se critica com intensidade a equiparação do Estado ao indivíduo, olvidando desta forma, o regime jurídico de direito público em referência ao predomínio das normas de Direito Público sobre as regras de Direito Privado na regência das relações entre Poder Público e administrados.
Neste sentido leciona Hely Lopes Meirelles (2013, p. 618):
Realmente, não se pode equiparar o Estado, com seu poder e privilégios administrativos, ao particular, despido de autoridade e de prerrogativas públicas. Tornaram-se, por isso, inaplicáveis em sua pureza os princípios subjetivos da culpa civil para a responsabilização da Administração pelos danos causados aos administrados. Princípios de Direito Público é que devem nortear a fixação dessa responsabilidade.
I.3. DAS TEORIAS PUBLICISTAS DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
Com a consolidação do direito público, diferindo-se didaticamente do direito privado. O surgimento das teses publicitas, encontra precede a jurisprudência francesa de 1873, notadamente, o emblemático o Tribunal de conflitos, e como marco relevante o famoso aresto Blanco.
I.3.1. TEORIA DA CULPA ADMINISTRATIVA OU CULPA DO SERVIÇO
De acordo com a aludida teoria o dever do Estado de indenizar o dano sofrido pelo particular somente existe caso seja comprovada a falta do serviço. Estabeleceu-se, portanto, uma distinção entre a culpa individual do funcionário, pela qual responde pessoalmente, e a culpa anônima do serviço público, onde o agente sequer é identificável. Assim, não se trata de perquirir da culpa subjetiva do agente, mas da ocorrência de falta na prestação do serviço, falta esta objetivamente considerada, gerando a responsabilidade do Estado.
A teoria da culpa administrativa representou o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a responsabilidade objetiva atualmente adotada pela maioria dos países ocidentais.
São pressupostos caracterizadores da culpa administrativa: inexistência do serviço (omissão), mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço. Cabe sempre ao particular prejudicado pela falta comprovar sua ocorrência para fazer jus à indenização.
I.3.2. TEORIA DO RISCO
Outra doutrina, fundada nos preceitos do direito público, também auferiu enormes contribuições para a formação da Teoria moderna da Responsabilidade extracontratual do Estado, qual seja: a teoria do risco.
Segundo a Teoria do risco, também chamada de responsabilidade objetiva, é concernente a reparação do dano sofrido injustamente pelo particular, independente de falta do serviço ou culpa do agente, haja vista, é dispensada a apreciação dos elementos subjetivos da conduta (dolo e culpa), fazendo-se imprescindível, apenas, o liame do fato/conduta com o resultado, nomeadamente, o nexo de causalidade.
A teoria do risco compreende duas vertentes: o risco administrativo e o risco integral.
O risco administrativo torna o Estado responsável pelos riscos decorrentes de sua atividade administrativa, porém é possível que o Estado afaste sua responsabilidade em casos de exclusão do nexo causal, como os casos de fato exclusivos da vítima ou de terceiros, caso fortuito ou força maior.
Sob outra perspectiva, a do risco integral, significa dizer que o agente fica obrigado a reparar o dano, independente de nexo de causalidade, não comportando as excludentes de responsabilização do Estado.
A doutrina pátria estabelece três hipóteses de risco integral em nosso ordenamento: (i) dano ambiental, seguro obrigatório, danos nucleares.
A Constituição Federal de 1988, no seu art. 37, §6º, dispõe da seguinte elocução:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Portanto, como se pode depreender, o sistema jurídico brasileiro admitiu as teorias da responsabilidade objetiva e subjetiva.