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Imposto sobre Serviços que incide sobre as empresas que agenciam mão-de-obra temporária exigido com intento confiscatório.

Esta atitude é lícita?

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1. INTRODUÇÃO

Na atividade de agenciamento de mão-de-obra temporária, as empresas agem como intermediária entre a tomadora do serviço e o terceiro a ser contratado.

Assim sendo, as mencionadas empresas encontra-se compulsoriamente obrigadas ao recolhimento do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN, nos termos do item nº 84, da Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei nº 406/1968, com a redação dada pela Lei Complementar nº 56/1987, reproduzido no item nº 83 do artigo 102 do Código Tributário do Município do Recife.

Todavia, a referida tributação não tem representado a essência do ISSQN, isto porque, o que está havendo é uma flagrante violação por parte do §1º do art. 115 do Código Tributário Municipal ao que expõe o art. 9º do Decreto-Lei n.º 406/68, onde o Município está exigindo das empresas agenciadoras de mão-de-obra temporária além do que deveria, posto que a base de cálculo do ISSQN está sendo calculada não só sobre a taxa de agenciamento, como preceitua o art. 9º do Decreto-Lei nº 406/68, mas também, sobre os encargos sociais e as remunerações concernentes aos terceiros/trabalhadores temporários.

Observa-se que a incidência do ISSQN fere o art. 9º do DL nº 406/68, bem como os princípios básicos que norteiam o Direito Tributário, e que são assegurados constitucionalmente a todos os contribuintes, tais como: o Princípio da Capacidade Contributiva (art. 145, §1º, CF/88), o Princípio da Isonomia (Art. 150,II, c/c 5º, I da CF/88) e o Princípio da Vedação ao Confisco (art. 150, IV, CF/88).

Assim, inexiste respaldo legal e constitucional, por parte do fisco municipal para a excessiva cobrança do imposto em comento, devendo as agenciadoras serem tributadas apenas sobre o que é de direito, ou seja, a "taxa de agenciamento", pois é essa a parcela que condiz verdadeiramente com o conceito de serviço descrito no art. 9º do Decreto-Lei n.º 406/68.


B. A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS COMO FATO GERADOR DO ISSQN:

O Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza - ISSQN, de competência tributária dos entes municipais, conforme prescreve a Constituição Federal de 1988 em seu art. 156, III, tem como fato imponível da hipótese de incidência tributária a prestação de serviços a terceiro mediante remuneração, isto é, a transferência onerosa de um bem imaterial a terceiro.

O Imposto em questão surgiu na reforma tributária de 1965, através da Emenda Constitucional nº 18, a qual alterou de sobremaneira o Sistema Tributário da Constituição de 1946. Antes da aludida reforma tributária, os impostos eram indicados através de uma nomenclatura jurídica, sem vinculação com o campo econômico que incidiria.

Ao ser criado, no império do novo sistema tributário, o ISSQN foi classificado no capítulo dos "IMPOSTOS SOBRE A PRODUÇÃO E A CIRCULAÇÃO". Com a instituição do Código Tributário Nacional (CTN), Lei nº 5.172, de 25/10/1966, a classificação econômica dos impostos determinada pela reforma de 1965 foi mantida. Deste modo, o CTN em seus arts. 71 e 73 prescreviam de forma inequívoca quanto ao fato gerador e o contribuinte do ISSQN, respectivamente, in verbis:

"Art. 71. O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço que não configure, por si só, fato gerador de imposto de competência da União ou dos Estados." (grifo nosso)

"Art. 73. Contribuinte do imposto é o prestador do serviço."

(grifo nosso)

Após sucessivas legislações versarem sobre o imposto em comento, a Constituição Federal de 1967 manteve a estrutura do referido imposto. Ademais, o Decreto-lei n.º 406, de 31 de Dezembro de 1968, revogou expressamente as disposições do CTN pertinente a exação em tela, passando a dispor unicamente sobre o ISSQN. Contudo, nada inovou em relação à caracterização do fato gerador, da prestação de serviço e do contribuinte, pessoa que mantém relação pessoal e direta com a execução dos serviços a terceiros, preservando os elementos essenciais da hipótese de incidência tributária.

Observa-se que desde a reforma tributária de 1965, o ISSQN tem como forma de incidência tributária, isto é, fato gerador, a efetiva prestação de serviços de qualquer natureza a terceiros, pois o contribuinte deve manter relação pessoal com a execução de tais serviços, fazendo nascer a obrigação tributária e o crédito que lhe é inerente em nome do poder tributante municipal.

Através da reforma tributária em análise, os impostos passaram a incidir sobre realidades tributáveis com base numa feição econômica jurídica, até então não existente no Sistema Constitucional Brasileiro.

Desse modo, o ISSQN foi classificado no grupo econômico dos impostos sobre a produção e a circulação, atuando evidentemente na fase de circulação, pois é nesta etapa da atividade econômica que se observa a ocorrência do fato gerador, ou seja, a inequívoca prestação de serviço a terceiros. O simples fornecimento de trabalho, não se encontra na fase de circulação, de modo que não autoriza a incidência do ISSQN, como pode ser observado através da transcrição do parágrafo único do art. 10 do Decreto-Lei n.º 406/68, nestes termos:

"Parágrafo único. Não são contribuintes os que prestem serviços em relação de empregos, os trabalhadores avulsos, os diretores e membros de conselhos consultivos ou fiscal de sociedades."

A Constituição Federal de 1988, da mesma forma que a anterior, manteve a estrutura do ISSQN, dispondo nos termos a seguir:

"Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

(...)

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar."

Devido a sua versatilidade, essência e grau de abrangência, o ISSQN pode ser expresso por várias "modalidades", tendo em todas elas como fato gerador passível de obrigação tributária, a prestação de um determinado serviço, assim sendo, esta dita prestação é que determinará a base de cálculo do imposto, como esclarece o art. 9º do Decreto-lei nº 406/68. Portanto, no cerne da relação tributária entre o Município e as empresas agenciadoras de mão-de-obra temporária há de haver um valor monetário relativo aos serviços prestados.

Quando a Lei Maior outorga aos Municípios a competência para tributar serviços de qualquer natureza, definidos em lei complementar, apenas autoriza a incidência do imposto sobre serviço, ou seja, prestação de serviço a terceiro, conceito de cunho jurídico inafastável, não permitindo que se tribute algo que juridicamente não é serviço, sob pena de negar a Constituição Federal os limites que ela própria delimitou.

Assim sendo, o objeto do presente estudo, tem a pretensão de demonstrar que a atividade desempenhada pelas empresas listadas taxativamente, no item nº 84, anexo da Lei Complementar nº 56/87, está descrita de forma clara, geral e enxuta no art. 9º do Decreto-lei nº 406, de 31.12.68 que " a base de cálculo do imposto é o preço do serviço", e que apresenta como fato gerador do ISSQN apenas os serviços prestados pelas referidas empresas e sobre os quais estas são remuneradas, inexistindo relação jurídica-tributária fática, que as obriguem ao recolhimento de tributo que não consagre diretamente a percepção dos benefícios das mesmas, posto que elas só recebem importâncias por serviços devidamente prestados.

Não obstante, vê-se que alguns Municípios estão compelindo as empresas ao recolhimento de uma indevida exação, que está sendo calculada sobre o total de sua nota fatura. Estando o total desta fatura percebido através da soma: da comissão que as agenciadoras recebem pelo agenciamento, os salários e os encargos sociais incidentes do trabalhador temporário.

Contudo, tais salários e encargos sociais não devem ser tomados como "prestação de serviço", pois as empresas/agenciadoras os repassam ao trabalhador temporário, não devendo então, serem usados na base de cálculo do ISSQN, por não constituírem serviços prestados. Ademais, estas não recebem nenhum tipo de remuneração adicional referente aos já ditos salários e encargos, posto que, neste caso a função que ela desempenha é apenas o repasse desses valores.

Portanto, há inexistência de relação fática completa, quanto à incidência do ISSQN sobre os salários e encargos sociais dos terceiros, pois, evidencia-se que só a taxa de agenciamento consubstancia a prestação de serviço por parte das mencionadas empresas.


C. DO PREÇO DO SERVIÇO CONFORME O ART. 9º DL 406/68

:

O Decreto-Lei n.º 406/68 estabelece normas gerais de Direito Financeiro, aplicável aos impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre serviços de qualquer natureza, com o advento da Lei Maior, este foi recepcionado pelo ordenamento jurídico brasileiro com "status" de Lei Complementar, pois dispõe de questões referentes à competência tributária de atuar, de limitações constitucionais ao poder de tributar e traçar normas gerais dos tributos relativamente ao fato gerador, base de cálculo, contribuintes, obrigação tributária, decadência, prescrição, etc.

O mencionado Decreto-Lei preceitua em seu art.9º, o qual é também reproduzido no caput do art. 115, do CMT do Recife, que " a base de cálculo do imposto é o preço do serviço", sendo certo, portanto, como já fora visto, o ISSQN incide sobre o serviço que se presta.

No caso das empresas agenciadoras de mão-de-obra temporária, elas agenciam, fomentando mão-de-obra temporária, colocando tal mão-de-obra a disposição das tomadoras de serviços, tendo como função regulamentada em "lei específica" remunerar e assistir os trabalhadores por ela agenciados, conforme demonstra o art. 4º da Lei n.º 6.019 de 03 de janeiro de 1974:

"Art. 4º Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos." (grifo nosso)

Assim, este conjunto de atribuições configuram a prestação do serviço que as agenciadoras desempenham. Porém, no que se refere as remunerações e contribuições sociais concernentes aos terceiros vinculados a relação contratual, as referidas empresas não possuem nenhum tipo de participação, pois destes valores não fazem uso, atuando apenas no seu repasse, podendo, em caso de não repassá-los, serem enquadradas penalmente, por crime de apropriação indébita (arts. 168 e 168-A do Código Penal brasileiro). Sendo, desta forma impraticável e inviável a atuação do fisco municipal quanto a incidência do ISSQN sobre os encargos sociais e salários referentes aos terceiros.

A incidência do supracitado imposto, no concernente ao valor total da nota (essa incidência do ISSQN é referente a taxa de agenciamento, encargos sociais e salários dos terceiros/trabalhadores temporários), poderia vir a ocorrer no caso de empresas de prestação de serviços a terceiros/terceirizantes de mão-de-obra, pois independentemente de quem presta o serviço será remunerado, onde o valor adquirido é incorporado ao patrimônio da Empresa, estando a mesma respaldada pelo § 5º, art. 2º da Instrução Normativa n.º 3, do Ministério do Trabalho, de 29 de agosto de 1997, in verbis:

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"considera-se empresa de prestação de serviços a terceiros a pessoa jurídica de direito privado, de natureza comercial, legalmente constituída, que se destina a realizar determinado e específico serviço a outra empresa fora do âmbito das atividades-fim e normais para que se constituiu esta última." (grifo nosso)

Os serviços prestados pelas empresas não se caracterizam como serviços de natureza comum, sendo necessário, portanto, que seja citada a legislação que corresponde e regulamenta este tipo de atividade temporária e sua atuação, como cada agenciadora deve desenvolver, que são: Lei n.º 6.019, de 03 de janeiro de 1974 e o Decreto n.º 73.841, de 13 de março de 1974.

Lei nº 6.019/74

"Art. 2º. Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa para atender a necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços.

(...)

Art. 4º. Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por ela remunerados e assistidos." (grifos nossos)

Decreto nº 73.841/74

"Art. 14. Considera-se empresa tomadora de serviço ou cliente, para os efeitos deste Decreto, a pessoa física ou juridíca que, em virtude de necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou de acréscimo extraordinário de tarefas, contrate locação de mão-de-obra com empresa de trabalho temporário.

(...)

Art. 16. considera-se trabalhador temporário aquele contratado por empresa de trabalho temporário, para prestação de serviço destinado a atender necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou por acréscimo extraordinário de tarefas de outra empresa."

Dando vista aos precedentes legais que regulamentam as atividades de agenciamento de mão-de-obra temporária, fica evidente que a base de cálculo do ISSQN é o preço do serviço, onde este se dá pelo que as agenciadoras recebem por prestar um determinado serviço, ou seja, agenciar mão-de-obra temporária em prol das tomadoras de serviços.

Indubitavelmente, tem-se que a situação supracitada, no que pertine ao agenciamento de mão-de-obra temporária, põe-se claramente. Entretanto, abre-se uma celeuma, no momento em que se excede a base de cálculo do imposto, englobando-se nesta além da prestação do serviço, como já é sabido, os encargos sociais e as remunerações concernentes aos terceiros. Daí, conseqüentemente, a iniqüidade opera, gerando um conflito, entre o que se deve e o que não deve adentrar à base de cálculo do ISSQN.


D. DA RECEITA E DO FATURAMENTO SUAS ACEPÇÕES E CONEXÕES QUANTO A INCIDÊNCIA DO ISSQN

:

Explicitar-se-á neste artigo os conceitos concernentes a entrada e a receita, e as coligações entre a receita e o faturamento pela legislação vigente, a fim de dar maior abrangência e a exata compreensão aos referidos conceitos.

D.1. CONFUSÃO ACERCA DOS CONCEITOS RELATIVOS À ENTRADA E RECEITA:

Neste subtópico, pretende-se deixar clara a confusão que alguns Municípios no uso de suas atribuições estão fazendo. Posto que, estes entes excederam-se demasiadamente, onde tal confusão circunda os conceitos relativos a entrada e receita, que hão de ser por agora explanados e suscitados.

Muito se discute sobre a procedência e a maneira que o Direito Financeiro se posiciona entre os diversos ramos do Direito, cogitou-se a possibilidade de este pertencer ao Direito Administrativo, contudo a maior parte dos Doutrinadores já o vêem como ramo autônomo do Direito, tendo em vista que este é dotado de princípios jurídicos próprios, contudo não se pode apartá-lo nem do Direito Administrativo, tão pouco dos demais ramos. Sua autonomia é confirmada no art. 24 da Carta de 1988:

"Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

I-direito tributário, financeiro, penitenciário..."(grifo nosso)

Sendo este ramo autônomo, ele rege as relações condizentes ao Direito Público através da atividade financeira desempenhada pelo Estado. Quanto a esta última, pode encontrar-se subdividida em receita, despesa, orçamento e crédito público. Assim sendo, a referida relação pode ser vista e confirmada pelos ensinamentos do renomado doutrinador Carlos M. Giuliani Fonrouge, ao entender que Direito Financeiro "é o conjunto de normas jurídicas que regula a atividade financeira do estado em seus diferentes aspectos: órgãos que a exercem, meios em que se exterioriza e conteúdo das relações que originam".

Como já fora dito acima, a atividade financeira do Estado que é disciplinada pelo Direito Financeiro se desdobra, e entre estes desdobramentos temos os conceitos que são fundamentais para o desenvolvimento do presente estudo e para a plena compreensão da atitude equivocada dos Municípios para com as empresas agenciadoras de mão-de-obra temporária. Portanto, faz-se necessário visualizar a fundo estes conceitos, suas representações no mundo jurídico e como os mesmos são vistos perante os Doutrinadores.

Conforme assinala Aliomar Baleeiro:

"(...) receita pública é a entrada que, integrando-se no patrimônio público sem quaisquer reservas, condições ou correspondência no passivo, vem acrescer o seu vulto, como elemento novo e positivo;"

Para Sainz de Bujanda:

"(...) receita pública são somas de dinheiro que recebem o Estado e os demais entes públicos para cobrir com elas seus gastos;"

Por fim, Alberto Deodato, preceitua que:

"(...) receita pública é o capital arrecadado, coercitivamente, do povo, tomado por empréstimo ou produzido pela renda dos bens ou pela sua atividade, de que o Estado dispõe para fazer face às despesas públicas."

Neste diapasão faz-se necessário esclarecer que apesar dos conceitos supracitados tratarem-se fundamentalmente de receita pública, por analogia tem-se, como é o caso, a receita do particular, receita privada, ou seja, receita das agenciadoras, nas quais a entrada ou ingresso de valores monetários consubstanciam uma espécie onde o gênero é a receita. Portanto, pode-se paritariamente perceber que toda receita é uma entrada, contudo de cunho patrimonial, permanente. Assim, as entradas podem atuar de forma permanente que é quando as mesmas ocorrem pelo ingresso efetivo de valores monetários que concernem a as referidas empresas, ou seja, a Taxa de Agenciamento que as mesmas percebem pela prestação do serviço. E de forma passageira, que é exatamente no que diz respeito aos rendimentos concernentes as remunerações auferidas pelos terceiros e seus encargos sociais, haja vista que tais valores apenas transitam pelo capital destas, mas a este não se fixa.

Vê-se então, quão controvertida está a atuação do ente tributante em causa, o Município, quanto à situação posta. Pois, o mesmo está se valendo das funções desempenhadas pelas agenciadoras, ou seja, agenciamento de mão-de-obra temporária, e o conseqüente repasse dos valores referentes aos salários e os encargos sociais aos terceiros, desvirtuando totalmente o que preceitua o art. 9º do Decreto-lei nº 406/68 " A base de cálculo do imposto é o preço do serviço".

Isto porque, a base de cálculo que está sendo imposta as empresas em comento sobrepõe-se a que realmente deveria ser exigida. A qual está sendo computada a partir dos rendimentos auferidos pelos terceiros, seus encargos sociais, além da comissão recebida da tomadora pela prestação de todo este serviço de recrutamento.

Assim, precipuamente fomenta-se a receita que será englobada ao patrimônio da empresa ora agenciadora de mão-de-obra temporária, a qual deve passar como entrada permanente apenas a remuneração pelo serviço que esta desempenha, consubstanciado pela Taxa de Agenciamento, e não como quer o ente tributante municipal incluir entradas passageiras, que são exatamente os valores concernentes aos encargos sociais e as remunerações dos trabalhadores temporários pois, estes valores são tidos a título de repasse.

Tendo em vista que, a atividade de repasse vem a ser caracterizada como simples forma de execução dos serviços prestados por estas empresas, descritos taxativamente na Legislação que regulamenta as atividades das empresas agenciadoras de mão-de-obra temporária (Lei n.º 6.019/74 e o Decreto n.º 73.841/74), conforme fora acima demonstrado.

Neste estudo pretende-se deixar claro, que a receita imposta para fundamentar a base de cálculo do imposto deve alcançar as entradas que se fixam por meio de cunho patrimonial, ou seja, as que perfazem as remunerações recebidas pelas agenciadoras pelos serviços prestados, enquanto que as entradas passageiras, que somam os encargos sociais e as remunerações concernentes aos terceiros são percebidas a título de reembolso, de redirecionamento, não devendo ser utilizadas no momento do cálculo para a cobrança do ISSQN.

Para tanto, só as receitas que se fixam ao patrimônio das agenciadoras de mão-de-obra temporária é que podem ser tributadas por este imposto, pois estas consubstanciam de fato a base de cálculo do imposto, - o efetivo faturamento destas - ou seja, o valor recebido por ela pelo agenciamento de mão-de-obra temporária.

Ademais, vê-se quão necessária é a dissociação destes conceitos tão lógicos e próximos, mas ao mesmo tempo diversos, que no caso de não serem bem postos, como tem acontecido, podem vir a causar uma tremenda confusão o que gera, conseqüentemente, a cobrança indevida do ISSQN. Posto que, o fisco municipal está considerando como receita das agenciadoras todo tipo de entrada seja ela permanente ou passageira, justificando assim, a cobrança indevida do ISSQN, e conseqüentemente, coagindo-as a pagarem o referido imposto.

D.2. DA RECEITA E DO FATURAMENTO:

Depois de explicitado e distinguidos os conceitos de entrada e receita, faz-se necessário agora explanar a conexão entre receita e faturamento, desta feita, segue-se a explanação.

Os conceitos acerca de receita e faturamento vêm de longa data e por muito tempo foram vistos de maneira dissociativa, todavia com o que prescreveu a lei Complementar n.º 70/91, com a releitura dada ao art. 195, I da Carta Política de 1988, alterado pela Emenda Constitucional nº 20/1998, e o entendimento que o legislador explicitou na Lei nº 9.718/1998 estes conceitos hoje são tidos e vistos uniformemente pelo Direito Tributário.

Quanto à receita, primeiramente, esta esteve atrelada ao comércio marítimo, atuando de forma abrangente e representando tudo aquilo que o capitão recebia. Contudo, este conceito foi de certa forma reformulado, dando a receita um caráter de universalidade de recebimentos. Tendo sido ratificado pelo Decreto-Lei nº 5.844 de 1º de outubro de 1943:

''''Art. 40 -...

1º Constitui receita bruta a soma das operações realizadas por conta própria e das remunerações recebidas como preço de serviços prestados.

§2º Incluem-se na receita bruta as receitas totais de transações alheias ao objeto do negócio."

Já quanto ao faturamento, este derivaria da receita, e se consubstânciaria pela emissão de notas ou faturas, propriamente ditas. Entretanto, estas faturas decorreriam de vendas a prazo, que é exatamente quando elas são exigidas. Por causa da exigência acerca da emissão das notas fiscais/faturas, o faturamento atuaria auxiliando o "animus" tributário do Estado, quanto às contribuições sociais, de forma singela, discreta, isto porque as faturas só seriam emitidas nas vendas a prazo.

Portanto, fez-se necessário dar maior abrangência ao sentido de faturamento para que este pudesse atuar significativamente quanto as Contribuições Sociais. Foi então que gradativamente as legislações pertinentes foram surgindo para regulamentar tal matéria. Um dos claros exemplos veio com a edição a Lei Complementar 70, de 30 de dezembro de 1991, que em seus artigos 1º e 2º deram uma nova modelagem a referido instituto, como está abaixo demonstrado:

Art.1º - Sem prejuízo da cobrança das contribuições para o Programa de Integração Social – PIS e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – Pasep, fica instituída contribuição social para financiamento da Seguridade Social, nos termos do inciso I do Art 195 da Constituição Federal, devida pelas pessoas jurídicas, inclusive as a elas equiparadas pela legislação do Imposto sobre a Renda, destinadas exclusivamente às despesas com atividades – fins das áreas de saúde, previdência e assistência social.

Art. 2º - A contribuição de que trata o artigo anterior será de dois por cento e incidirá sobre o faturamento mensal, assim considerado a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviços de qualquer natureza." (grifos nossos)

E assim, foram editadas diversas legislações visando assegurar o Direito do Estado de tributar tomando por base a receita e o faturamento.

Um dos mais claros e precisos exemplos veio depois da Lei Complementar 70/91, com a edição da Medida Provisória nº 1.724/98, que fixou-se plenamente ao ordenamento jurídico brasileiro quando fora convertida na Lei nº 9.718/1998, e que deu uma nova desenvoltura ao faturamento e a receita, equiparando-os:

"Art. 2º - As contribuições para o PIS/Pasep e a Cofins, devidas pelas pessoas jurídicas de direito privado, serão calculadas com base no seu faturamento, observadas a legislação vigente e as alterações introduzidas por esta Lei.

Art. 3º - O faturamento a que se refere o artigo anterior corresponde à receita bruta da pessoa jurídica.(grifos nossos)

§1º Entende – se por receita bruta a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas.

§2º Para fins de determinação da base de cálculo das contribuições a que se refere o artigo 2º, excluem-se da receita bruta:

III - os valores que, computados como receita, tenham sido transferidos para outra pessoa jurídica, observadas normas regulamentadoras expedidas pelo Poder Executivo.

Diante disso, surgiu a segurança constitucional convalidada por meio da nova redação atribuída ao art. 195, I da Carta Política de 1988, pela EC nº 20/98, conforme segue-se:

"Art. 195 – A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I -...

b) a receita ou faturamento;" (grifos nossos)

Além das legislações referentes à matéria tratada neste artigo e do aditamento constitucional dado pela EC nº 20/98, dão entendimento a cerca da equiparação entre a receita e o faturamento o Supremo Tribunal Federal, através do voto de alguns de seus Ministros, como:

RE 150.764-1, Pleno, Relator Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 02/04/1993: "De outra parte, o DL 2.397/87, que alterou o DL 1.904/82, em seu artigo 22, já havia conceituado a receita bruta do artigo 1º, §1º, do mencionado diploma legal como ''receita bruta das vendas de mercadorias e mercadorias e serviços'', conceito esse que coincide com o de faturamento, que, para efeitos fiscais, foi sempre entendido como o produto de todas as vendas, e não apenas das vendas acompanhadas de fatura, formalidade exigida tão-somente nas vendas a prazo (art. 1º da Lei nº 187/36)."

Voto do Ministro Ilmar Galvão no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 1 – DF: "De efeito, o conceito de ''receita bruta'' não discrepa do de ''faturamento'', na acepção que este termo é utilizado para efeitos fiscais, seja, o que corresponde ao produto de todas as vendas, não havendo qualquer razão para que lhe seja restringida a compreensão, estreitando – o nos limites do significado que o termo possui em direito comercial...".(grifos nossos)

Além do Supremo Tribunal Federal outros tribunais pronunciaram-se acerca do tema. Um exemplo é o julgamento unânime datado de 11 de abril de 2000, da Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 2º Região, na Apelação em Mandado de Segurança nº 2000.02.01.003616-3-RJ, que teve como Relatora a Desembargadora Julieta Lídia Lunz, publicado no Diário de Justiça em 30.05.2000, conforme segue a ementa:

"Tributário-Cofins-Base de Cálculo-Lei 9718/98.

(...)

III-Entretanto, fato é que a Emenda Constitucional 20/98 inclui na base de cálculo da Cofins a receita, vocábulo abrangente do faturamento e das demais operações efetuadas pela empresa e que tenham reflexos positivos em seu movimento de caixa. O faturamento desta forma seria espécie do gênero receita no qual se contém toda e qualquer movimentação financeira da empresa."

Tem-se então, que os conceitos de faturamento e receita são tomados igualmente, sem dar margem para outros tipos de interpretações que desvirtuem o seu valor, desconsiderando para efeitos tributários o entendimento do direito privado de que o faturamento está atrelado a emissão das notas fiscais/faturas referentes a vendas a prazo, estando hodiernamente estes adstritos aos recebimentos totais, ou seja, tudo o que vem a integrar o patrimônio da empresa agenciadora de mão-de-obra temporária.

Não obstante, clarevidencia-se que o único rendimento que pode vir a integrar o patrimônio das referidas empresas/agenciadoras, como seu faturamento, é a comissão que estas recebem ao agenciar mão-de-obra temporária, excluindo os salários e os encargos sociais que não fixam-se ao patrimônio das mesmas, conforme cita-se:

"Receita bruta é o preço do serviço, vale dizer, as quantias que a fornecedora de mão de obra recebe para realizar tal mister, nela não podendo ser incluídos os salários e encargos sociais pagos às pessoas recrutadas, que não integram o preço dos serviços contratados." (Ac. da 1ª Câmara do 1" TAC de São Paulo, Ap. n° 611.43970, Relator designado Juiz Elliot Akel).

"ISS – Base Imponível" – Estudos e Pareceres de Direito Tributário, l vol., Ed. Revista dos Tribunais, São Paulo. 1978, p. 85 e 91:

(...)

Tomar por base imponível o total da fatura é violar os princípios legais assinalados e violar os cânones regulamentares expressos, produzindo ato nulo, lançamento ineficaz.

Para ser regular e válido, o lançamento (seja por homologação, seja de oficio) deve separar os itens da fatura, para cingir-se à base de cálculo legalmente disposta, que é só e exclusivamente o preço do serviço."

Indubitavelmente, a base de cálculo do ISSQN não possui respaldo na legislação para ser calculada de acordo com o total da fatura, mas tão somente com o que enseja o serviço devidamente prestado. Devendo por conseguinte, o ISSQN incidir sobre a comissão/taxa de agenciamento que as agenciadoras recebem, o que representa apenas uma parte da fatura, e que consubstancia o seu faturamento/receita bruta, ou seja, do que estas recebem pela prestação do serviço. Além de que, os encargos e salários não são auferidos pelas agenciadoras, mas sim pelos terceiros a elas vinculados.

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Sobre as autoras
Cinthia Filizola

Consultora Jurídica do Escritório Audiplan – Advocacia de Empresas Manuel Cavalcante & Rita Cavalcante S/C

Paula Vilela

Consultora Jurídica do Escritório Audiplan – Advocacia de Empresas Manuel Cavalcante & Rita Cavalcante S/C

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FILIZOLA, Cinthia ; VILELA, Paula. Imposto sobre Serviços que incide sobre as empresas que agenciam mão-de-obra temporária exigido com intento confiscatório.: Esta atitude é lícita?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 181, 3 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4630. Acesso em: 29 mar. 2024.

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