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Elementos para reforma do Código de Processo Civil.

Sugestões dos juízes federais

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7. Mudanças no processo de execução

A execução, sobretudo contra a Fazenda Pública, tem-se tornado o calcanhar de Aquiles do Judiciário brasileiro. É quase unânime a opinião de que a Lei 8.898, de 29/06/94, ao alterar a redação do art. 604, do CPC, eliminando a liquidação da sentença por cálculo do contador, piorou bastante a execução contra a Fazenda Pública, ao transferir a liquidação dos cálculos para os embargos à execução. Não há racionalidade em criar-se um novo processo (os embargos) para solucionar algo que pode, com vantagens, ser resolvido nos autos já formados 14.

As execuções nos feitos coletivos também devem ser simplificadas. Não é razoável que cada pessoa favorecida com a sentença ingresse com uma execução autônoma. O mais racional, para todas as partes, é determinar que o réu da ação coletiva adote, administrativamente, as providências para o cumprimento da decisão, devendo o Judiciário apenas fiscalizar o seu cumprimento. Podem ser feitas, inclusive, audiências públicas para tentar melhor solucionar o problema.

Desse modo, entre as propostas de melhora do processo de execução, citam-se:

a) acabar com a ação de embargos à execução, permitindo que a discussão sobre cálculos de liquidação seja feita no próprio processo principal;

Justificativa: é muito mais prático permitir que a discussão sobre o valor da execução seja feita nos próprios autos principais. Assim, ao invés de ser citado, o devedor seria intimado e, querendo, impugnaria a conta. O juiz decidiria através de decisão interlocutória agravável, prosseguindo-se a execução provisória (e pelo incontroverso) nos autos principais com o juiz de 1º grau 15.

b) limitar a regra de impenhorabilidade de bens do devedor, inclusive o bem de família;

Justificativa: para permitir uma maior efetividade do processo de execução é preciso estipular regras limitando a penhorabilidade de certos bens. Não é justo, por exemplo, que mansões sejam impenhoráveis apenas porque são bens de família. É preciso acabar com as brechas de que se valem os devedores para tornar o processo executivo ineficaz.

c) regulamentar a execução de sentença em ações coletivas pelos substituídos;

Justificativa: caso não seja viável a execução coletiva na via administrativa, seria interessante permitir que cada pessoa favorecida com a sentença coletiva ingressasse com execuções individuais, que seriam distribuídas paritariamente entre os juízes com a mesma competência territorial. Com isso, a execução nos feitos coletivos seria extremamente facilitada.

7.1. A penhora administrativa e a execução fiscal

O Projeto de Lei 608/1999 prevê a penhora administrativa para aperfeiçoar a cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública.

A penhora administrativa seria executada pelas Procuradorias Fiscais ou da Fazenda Nacional da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias (art. 1º).

Os artigos 3º e 5º tratam do processamento dessa nova forma de cobrança:

"Art. 3º. Inscrito o crédito tributário ou não-tributário, a respectiva Procuradoria ou órgão jurídico competente notificará o devedor, para pagá-lo, no prazo de cinco dias, amigavelmente, sob pena de proceder à penhora de seus bens, tantos quantos bastem para garantia da dívida, na forma dos arts. 7º, IV, 8º, 9º, 10 e 11 da Lei n. 6.830, de 1980, no que couber.

Parágrafo único. A penhora será realizada por servidor habilitado, na forma do regulamento.

(...)

Art. 5º. Realizada a penhora, o devedor poderá oferecer embargos, na forma da Lei 6830, de 1980, perante o Juiz competente para a execução judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, o qual requisitará, de ofício, o processo administrativo em que se tiver efetivado a ordem de inscrição e a respectiva penhora administrativa".

É inquestionável que a penhora administrativa, tal como prevista no referido projeto de lei, esvaziará bastante a importância das Varas de Execução Fiscal e, por essa razão, deve merecer atenção especial por parte dos juízes federais.

Do ponto de vista institucional, é ponto pacífico que, ao invés de se cogitar a transferência de parte da execução fiscal para o Executivo, os juízes federais devem defender a ampliação do número de varas federais, bem como um maior aparelhamento das já existentes.


8. Mudanças de mentalidade

De nada adianta mudar as leis, se os juristas não estiverem conscientes de que o processo é apenas um instrumento para a realização da justiça e não um fim em si mesmo. A técnica é importante, mas não se confunde com formalismo estéril.

Seria interessante uma mudança legislativa que já se firmasse como uma verdadeira transformação da mentalidade. Daí a importância de que sejam enunciados expressamente princípios voltados a orientar a mentalidade dos juristas. É necessário que o ordenamento, sobretudo no que se refere às leis processuais, seja menos "enclausurado", permitindo uma maior liberdade para os operadores do direito. Essa abertura somente os princípios podem oferecer, sobretudo em face do incremento da força jurídica que, hoje, se reconhece a essa categoria normativa.

É inegável que a moderna teoria processual reconhece que princípios, como a efetividade, já estão positivados, embora implicitamente. Mesmo assim, a positivação expressa é importante, pois implicará em uma maior aceitação por parte dos operadores jurídicos, além de permitir o desenvolvimento de soluções processuais inteligentes pelos doutrinadores que poderão ser aplicadas imediatamente, independente de regulação legal. Daí, ser importante que se declare expressamente que o processo civil será pautado pelos princípios da efetividade, da simplicidade, da boa-fé, da celeridade, da racionalidade e da democratização processuais.

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Também é importante que fique expresso o papel processual do juiz. O magistrado, na condução do processo, deverá buscar o resultado prático equivalente, com o mínimo de atos processuais e com o menor gasto de tempo possível no intuito de otimizar o desempenho do processo. Afinal, foi-se o tempo em que o magistrado era apenas uma figura passiva sem qualquer iniciativa processual. Uma vez proposta a demanda, a inércia do juiz acaba, e ele passa a ser o responsável pelo impulso processual. É preciso reforçar o papel do magistrado na condução do processo, possibilitando o surgimento de um processo "inteligente", onde a criatividade do magistrado deverá suprir as deficiências materiais comumente presentes.


Conclusão

O presente relatório apresentou as diversas sugestões oferecidas pelos juízes federais para a melhora do processo civil brasileiro, entre as quais destacamos as que objetivam racionalizar os chamados feitos "de massa", as que visam desestimular a interposição de recursos, sobretudo quando a decisão recorrida estiver de acordo com a jurisprudência remansosa dos tribunais superiores e do STF, a que propõe o fim do processo cautelar autônomo nos casos em que não há necessidade de instrução processual específica, a que permite o recurso "per saltum", a que pretende suprimir os "penduricalhos" processuais, permitindo que exceções e impugnações diversas sejam manejadas no corpo da própria contestação, as que visam a democratização do processo, com a ampliação do instituto da assistência, para admissão de quem dispuser de interesse não essencialmente jurídico e, finalmente, as que objetivam positivar e incentivar o processamento eletrônico de dados processuais

Algumas propostas são inegavelmente polêmicas e não necessariamente refletem o ideal da magistratura federal como um todo. Outras propostas sequer necessitariam de mudança na lei para serem desde já adotadas. Há ainda algumas propostas que se excluem; outras que se complementam.

O certo é que existe um sentimento geral de inconformismo. Os juízes federais não querem continuar sendo meros carimbadores de toga. O papel que a Constituição lhes conferiu é muito mais nobre.

As soluções oferecidas, obviamente, não são definitivas. São apenas elementos para uma possível melhora das leis processuais civis. Espera-se que tenham alguma utilidade. Se pelo menos uma das dezenas de propostas for aproveitada, o trabalho não terá sido em vão.


Notas

1 O Projeto de Lei n. 2.813/1997 oferece um tratamento bem interessante para esse tipo de causa, a despeito da má-redação e dos problemas de ordem processual que poderia suscitar, ao pretender acrescentar os seguintes parágrafos ao art. 262, do CPC: "§1º. Quando, por sentença transitada em julgado, o Poder Público Federal, Estadual ou Municipal for condenado a devolver quantias cobradas indevidamente, a decisão valerá para todos os que sofrerem desfalque em seu patrimônio, independentemente de ajuizamento de novas ações pelos interessados. §2º. Bastará aos interessados, de que trata o §1º, simples requerimento, com a prova do fato e cópia da sentença irrecorrível, ao órgão que procedeu à cobrança indevida para que este a devolva num prazo máximo de 90 dias".

2 A referida sugestão foi enviada através da Lista da Ajufe, pelo correio eletrônico.

3 Mensagem eletrônica enviada em 2 de abril de 2003.

4 Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

5 Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

6 Mensagem enviada por correio eletrônico em 1o de abril de 2003.

7 Para maiores informações sobre o serviço , vale visitar o site da Justiça Federal de Santa Catarina- https://www.jfsc.gov.br.

8 Mensagem eletrônica enviada em 1o de abril de 2003.

9 Mensagem enviada através de correio eletrônico em 9 de março de 2003.

10 Mensagem eletrônica enviada em 17 de março de 2003.

11 Mensagem enviada pelo Juiz Federal Alessandro Diaferia em 3 de abril de 2002.

12 Mensagem eletrônica enviada em 3 de abril de 2003.

13 Mensagem eletrônica enviada em 3 de abril de 2003.

14 O Projeto de Lei 765/1999 pretende retornar à sistemática anterior nas execuções contra a Fazenda Pública: "art. 604. (...) § 1º. As disposições do caput não se aplicam às execuções movidas contra a Fazenda Pública, que continuam a ser processadas por simples cálculo do contador judicial. §2º. Fica ressalvado ao exeqüente o direito de apresentar o demonstrativo do cálculo, sujeita à conferência do contador".

15 Sugestão enviada pela Juíza Federal Simone Schreiber, através de mensagem eletrônica (1º de abril de 2003).


Comissão de Reforma do CPC - AJUFE:

Relator: George Marmelstein Lima

Membros: Reynaldo Soares da Fonseca, Paulo César Conrado, Marcelo Pereira da Silva, Luis Carlos Castro Lugon

AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil:

Presidente: Paulo Sérgio Domingues

Secretário-Geral: José Antônio Maurique

Diretor de Comissões: Luís Praxedes Vieira da Silva

Diretor de Assuntos Legislativos: Flávio Dino de Castro Costa

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Sobre os autores
George Marmelstein Lima

Juiz Federal em Fortaleza (CE). Professor de Direito Constitucional.

Paulo César Conrado

juiz federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, George Marmelstein ; FONSECA, Reynaldo Soares et al. Elementos para reforma do Código de Processo Civil.: Sugestões dos juízes federais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 190, 8 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4664. Acesso em: 5 dez. 2025.

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