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Agricultura transgênica e o grilo

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18/12/2003 às 00:00
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Mecanismos de autocontrole:

O avanço da ciência e da tecnologia no campo da biologia molecular desvendando mistérios da estrutura genética dos seres vivos através de seqüenciamentos genômicos é uma realidade e uma grande revolução de idéias e conceitos sobre a vida. A possibilidade de manipulações genéticas de toda ordem (clonagem, organismos geneticamente modificados para múltiplas finalidades, fertilização e reprodução artificial, cultura de células embrionárias, etc.) traz profundas alterações nos direitos e liberdades das pessoas, empresas, instituições e governos. É uma nova era, que exige legislações específicas e oportunas, normas claras de biossegurança, limites de bioética, código explícito de bioprospecção, e agências de fiscalização e controle, entre outras instituições e organizações à altura dos desafios dos novos tempos. Particularmente ao setor de agronegócios, o poder econômico das empresas diretamente concernentes com a manipulação genética de plantas constitui fator de incontáveis preocupações. São em reduzidíssimo número (Monsanto, Aventis, Syngenta, principalmente) e atuam tanto na área de genética vegetal, convertendo as plantas-alvos em transgênicos, como na área industrial na produção de defensivos agrícolas específicos. À primeira vista trata-se de um oligopólio dos mais temíveis e com forte poder de subordinação sobre os agricultores e consumidores. Mas será que esse temor existe de fato? A análise histórica de movimentos semelhantes havidos no passado em vários segmentos produtivos é um bom ponto de partida para um correto e ponderado entendimento da questão. De imediato, um aparato jurídico-institucional com leis apropriadas e oportunas e uma instância organizacional ágil e competente de fiscalização e controle constituem providências fundamentais para o estabelecimento de regras mínimas de convivência de interesses. Assim, a reação e o comportamento dos consumidores, dos agricultores e suas organizações, das indústrias processadoras e exportadoras, das instituições de pesquisa e ensino, das associações de classes profissionais e setoriais, das instituições de defesa do consumidor e da concorrência, entre outros, podem, em uma sociedade pluralista e democrática, definir e estabelecer normas claras de conduta para todos os agentes econômicos interessados na questão dos transgênicos. Dessa forma, só haverá concorrência deletéria ou nefasta de setores dominantes na exisrência de omissões, conivências, indiferenças e incompetências da sociedade e do governo. Em uma situação de livre concorrência, de funcionamento adequado das instituições e dos agentes econômicos, de existência de políticas públicas explícitas, e sistemas de cobrança de responsabilidades a tendência é de equilíbrio e plena racionalidade das forças de mercado. Lembra da época do pró-álcool em que se temia que todo o Brasil, principalmente o Estado de São Paulo, se tornasse um imenso canavial em detrimento de culturas tradicionais? E o caso da soja, com a equivocada controvérsia de agricultura de exportação versus agricultura de subsistência, que foi tema de acirrados debates nos quatro cantos do país com o temor que a leguminosa fosse dominar toda a lavoura nacional? E o caso do carro a álcool, que dominava o parque produtivo nacional e dificultava a comercialização de modelos a gasolina? Esses exemplos mostram que em uma economia de livre iniciativa e com abertura razoável de comércio exterior prevalecem mecanismos de autocontrole que tendem a trazer todo o sistema a um equilíbrio. São forças de mercado e da sociedade que se interagem e se ajustam entre si de forma dinâmica, complexa, sistêmica e interdependente. Reações de consumidores e outros produtores concorrentes, fortalecimento de produtores de insumos e matérias-primas, entrada de novos competidores, desenvolvimento de novas tecnologias, alterações fiscais e tributárias, alterações na política de juros e condições de financiamento, mudanças na política cambial e monetária, atuação de sindicatos e movimento de consumidores ou associações de classes, fortalecimento de segmentos profissionais com a maturação de negócios em novas tecnologias, mudanças de comando nas decisões políticas e administrativas, mudanças e exigências de políticas ambientais constituem exemplos de fatores que culminam por influir nos mecanismos de autocontrole ou autoregulação, trazendo todo o sistema econômico envolvido a uma situação de equilíbrio de forças competitivas no mercado. Todos acabam encontrando o seu lugar, o seu nicho no mercado. É por isso que se diz, simplificadamente, que a longo prazo não existem monopólios. O equilíbrio dinâmico, ou menos iníqüo, das forças competitivas em um mercado de livre iniciativa depende do grau de conscientização de todos os agentes econômicos presentes em uma sociedade, como produtores, consumidores, governo e cidadão conscientes.


Conclusão

Com o tema de Agricultura Transgênica e o Grilo, com uma clara alusão à história infantil do Pinóquio, procurou-se mostrar uma faceta de uma mesma realidade dos organismos geneticamente modificados. Todo mundo se preocupa prioritariamente com o poder econômico e o sentido da dominação de algo realmente poderoso no seio dos negócios da biotecnologia, onde estão em jogo bilhões de dólares e muitos interesses. Mas, existe uma característica singular dentro dessa realidade que é povo como consumidor, produtor rural, empresário do agronegócio, político, legislador, jurista ou simples cidadão comum. E é esse povo que se procurou alcançar com o artigo, explorando sentimentos, angústias, emoções, perspectivas, questionamentos e colocações práticas de interesse cotidiano das pessoas. É lógico que não se esgotou o assunto, tão polêmico e abrangente para a própria sustentabilidade do Planeta. Mas foi uma tentativa de reflexão, ponderação e crítica sobre um assunto palpitante, atual e que concerne a todos. Foi também, uma forma de mostrar que a vida é uma eterna encruzilhada, uma escolha entre múltiplas alternativas. Na biologia, depois do seqüenciamento genômico vem a análise proteômica, a análise das proteínas de um ser vivo, abrindo novas linhas de pesquisas, novas e inebriantes perspectivas de entender a complexidade da vida. O caminho dessa nova realidade, além de muita ciência e tecnologia, será trilhado com arte, sabedoria, prudência, ética, solidariedade e muito trabalho.

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Sobre o autor
Alberto Nobuoki Momma

Economista e Engenheiro Agrônomo; Doutor em Desenvolvimento Agrícola

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOMMA, Alberto Nobuoki. Agricultura transgênica e o grilo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 165, 18 dez. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4682. Acesso em: 5 nov. 2024.

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