A guarda compartilhada como instrumento de combate à alienação parental

04/03/2016 às 19:24
Leia nesta página:

A preocupação básica deste artigo é refletir sobre a prática da alienação parental nas famílias brasileiras e sobre a importância de reconhecê-la e combatê-la.

 

RESUMO

 A preocupação básica deste artigo é refletir sobre a prática da alienação parental nas famílias brasileiras e sobre como combatê-la. Este artigo tem como objetivo analisar a importância do reconhecimento da existência da alienação parental nas relações familiares, bem como suas desastrosas consequências, em especial para as crianças e os adolescentes. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica considerando as contribuições de autores como CABRAL (2015), DIAS (2009), QUINTAS (2009) e a Lei nº 12.318/2010 que regulamenta a Alienação Parental, entre outros, procurando enfatizar que, apesar de ser prática comum, a alienação parental não deve ser considerada como natural. Concluiu-se a importância das decisões dos pais e familiares, assim como do judiciário, para a manutenção do melhor interesse e bem-estar dos filhos na dissolução da sociedade conjugal, ressaltando a relevância da guarda compartilhada como instrumento para manutenção da convivência saudável entre pais e filhos.

Palavras-chave: Divórcio. Alienação parental. Guarda compartilhada. Convivência. Pais. Filhos.

Introdução

O presente artigo tem como tema a importante reflexão sobre a prática da alienação parental na sociedade moderna, bem como a importância da guarda compartilhada como instrumento de controle dessa prática abusiva, que traz inúmeros prejuízos a todos os membros da família envolvidos, em especial para as crianças e para os adolescentes.

Este tema vem ganhando notório espaço no Direito de Família e, nesta perspectiva, algumas questões nortearam o desenvolvimento deste trabalho:

o   O que é a alienação parental?

o   Quais as principais motivações para tal prática?

o   Quais as principais consequências para os envolvidos na alienação parental?

o   E por fim, qual a contribuição da guarda compartilhada nos processos de dissolução da sociedade conjugal?

A Lei nº 12.318/2010 conceitua a alienação parental e alguns autores destacam os desastrosos prejuízos de sua prática, como SANTANA aponta em seu artigo que

o assunto é tão sério que psicólogos, psicanalistas e doutores em direito e medicina tratam o tema como “implantação de falsa memória”. A alienação parental gera, em muitos casos, depressão crônica, incapacidade de adaptação em ambiente psicossocial normal, transtornos de identidade e de imagem, sentimento incontrolável de culpa, isolamento, falta de organização, dupla personalidade e, às vezes, até suicídio.

Considerando que a alienação parental tem se tornado prática comum nos processos de separação conjugal e que tal prática pode trazer sérios problemas comportamentais e psicológicos para os filhos e demais envolvidos, percebe-se a relevância do objetivo deste artigo. No entanto, trata-se de estudo recente, e muito ainda deve ser revelado sobre a alienação parental e suas consequências.

Visando alcançar os objetivos propostos, utilizou-se como método de estudo a pesquisa bibliográfica, realizada a partir da análise de materiais publicados na literatura e artigos científicos divulgados no meio eletrônico.

Por fim, este artigo tem como fundamentação os estudos e concepções de autores como Cabral (2015), Dias (2009), Quintas (2009) e Santana (2012), dentre outros.

Desenvolvimento

 O divórcio tornou-se comum nas famílias brasileiras nas últimas décadas. O rompimento de um casamento acarreta uma série de conflitos. Como ocorre em quase todo processo de separação de forma não amigável, os cônjuges estão magoados e rancorosos um com o outro.

Os conflitos decorrentes de uma separação conjugal não deveriam de forma alguma se estender aos filhos, que frequentemente tornam-se vítimas do processo de separação. Em tese, os pais devem tomar decisões acerca de sua vida conjugal, de modo a não envolver os filhos, garantindo o melhor interesse e o bem-estar da criança ou adolescente.

A missão constitucional dos pais, pautada nos deveres de assistir, criar e educar os filhos menores, não se limita a vertences patrimoniais. A essência existencial do poder parental é a mais importante, que coloca em relevo afetividade responsável que liga pais e filhos, propiciada pelo encontro, pelo desvelo, enfim, pela convivência familiar.(DIAS, 2009, p. 388)

No entanto, a separação dos genitores envolve, em grande parte das vezes, tristes histórias de pais e filhos que têm sua convivência interrompida. Como geralmente a genitora é a detentora da guarda do filho durante o processo de separação, restam visitas programadas para os encontros entre filho(s) e pai(s).

Na dissolução da sociedade conjugal, pai e mãe têm os mesmos direitos e deveres em relação a seus filhos. Segundo Quintas (2009, p. 17), “os papéis de pai e mãe continuam a existir, com todos os seus direitos e responsabilidades sobre os filhos, salvo se alguma razão especial dite o contrário em benefício do interesse da criança”.

Infelizmente, no momento do rompimento da relação, a mãe ou o pai pode usar a criança como instrumento para atingir o ex-cônjuge, uma vez que ela é fruto e símbolo da união do casal, ou seja, o elo entre os dois.

Ainda na década de 80, o psiquiatra infantil Richard Gardner tornou-se conhecido por descrever uma síndrome na qual as crianças, principalmente as expostas a disputas judiciais, rejeitavam e hostilizavam exacerbadamente um dos pais, sem justificativa. Percebeu-se que tal comportamento reproduzido pelas crianças era fruto de difamação e manipulação de um genitor contra o outro.

Num contexto de disputa pela guarda dos filhos, não são poucos os casos em que a mãe (que na grande maioria das vezes é a guardiã) dificulta a convivência da criança com o pai e mente a seu respeito, dizendo ao filho, por exemplo, que o pai não o ama, objetivando minar a relação pai e filho, de forma que a criança “tome seu partido” e fique contra o outro genitor no processo de separação.

Essa prática tão conhecida por todos nós, e muitas vezes banalizada, é conceituada como Alienação Parental. A lei nº 12.318 de 26 de agosto de 2010 veio reconhecer e conceituar a Alienação Parental, visando erradicar a referida conduta.

Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie o genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (Lei 12.318/2010)

Por se tratar de legislação recente, muitas pessoas ainda não sabem ao certo como ela funciona ou mesmo desconhecem sua existência.

O objetivo da alienação parental é destruir o vínculo entre um dos genitores e a criança ou adolescente, através de uma campanha difamatória por parte do alienador, plantando realidades inverídicas para que o filho rompa definitivamente os laços com a outra parte.

Apesar da alienação parental ser muito comum nas famílias brasileiras, sua prática não deve ser considerada como algo natural e sim como uma violência, capaz de gerar efeitos devastadores.

As crianças expostas à prática de alienação parental podem apresentar alguns sintomas como difamação, comentários depreciativos sobre um dos genitores, suporte ao genitor alienador, grande resistência às visitações, entre outros.

Conforme descrito por Cabral[2],

se essa prática não for encarada com seriedade e tratada em tempo hábil, pode acarretar à vítima sérios efeitos psicológicos, ao evoluir para uma verdadeira síndrome. Também chamada de “implantação de falsas memórias” (Richard Gardner, americano que primeiro identificou e estudou sistematicamente o assunto), a SAP – Síndrome da Alienação Parental – pode ser considerada um estágio de afastamento avançado, patológico e grave, caracterizado por grande perturbação mental e emocional capaz de provocar medo, ansiedade, náuseas e causar na vítima (o filho) uma verdadeira aversão pelo genitor alienado.

A criança que tem cerceado o direito à convivência com um de seus genitores, pode sofrer desastrosas consequências emocionais e psicológicas. Ao praticar a alienação parental, o alienador transforma seu filho em um ser humano dependente e oprimido, desenvolvendo sentimentos como insegurança, culpa e ansiedade.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Ademais, Cabral ainda destaca que o alienador comete ato atentatório à dignidade de seu filho ao impedir, ainda que de forma inconsciente, o exercício da convivência familiar indispensável para a formação do indivíduo.

O direito à convivência familiar, mesmo nos casos em que o relacionamento dos pais é rompido, é assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.[...] O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. (Lei 8.069/1990, art. 19)

Neste contexto, a guarda compartilhada passa a ser instrumento essencial do judiciário no sentido de garantir a convivência familiar de forma equilibrada, com pais atuantes em uma convivência harmoniosa, objetivando por um fim na alienação parental.

A Lei nº 11.698 de 13 de junho de 2008 define a guarda compartilhada como “a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns”.

Dessa forma, evidencia-se a importância dos esforços dos genitores, familiares, bem como do judiciário e demais profissionais envolvidos no sentido de inibir a prática da alienação parental, resguardando assim o equilíbrio, a autoestima e a liberdade da criança ou adolescente de relacionar-se com quem deseja.

Conclusão

Diante do exposto, concluiu-se pela importância do reconhecimento da existência da alienação parental na dissolução da sociedade conjugal, de forma a compreender essa realidade e objetivar o melhor interesse da criança ou adolescente.

Percebe-se que o judiciário ainda não está preparado para lidar com as questões advindas da alienação parental, tendo em vista seu recente reconhecimento e a dificuldade em diferenciar uma campanha difamatória da realidade, especialmente quando se tem crianças envolvidas nesse tipo de processo.

Desta forma, fica clara a necessidade de medidas conciliatórias que restabeleçam a igualdade parental e a convivência equilibrada da criança ou adolescente com o pai e a mãe, desde que a convivência com ambos não ofereça qualquer risco a sua saúde física e/ou mental, assegurando assim o seu bem-estar.

Neste contexto, a guarda compartilhada se torna instrumento extremamente eficaz no combate à alienação parental, de forma a minimizar ou até mesmo desfazer os prejuízos decorrentes da alienação à qual a vítima desta prática foi exposta.

 

REFERÊNCIAS

 BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8069.htm. Acesso em 30 de Nov. de 2015.

BRASIL. Lei nº 11.698, de 13 de junho de 2008. Altera artigos do Código Civil que instituem e disciplinam a guarda compartilhada. Disponível em: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11698.htm. Acesso em 25 de Nov. de 2015.

BRASIL. Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12318 .htm. Acesso em 2 de Nov. de 2015.

CABRAL, Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat. Efeitos Psicológicos e Jurídicos da Alienação Parental. Disponível em: http://www.mpce.mp.br/orgaos/CAOCC/dirFamila /artigos/efeitos_psicologicos_e_juridicos_da_alienacao_parental.pdf. Acesso em 30 de Nov. de 2015.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5º ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

QUINTAS, Maria Manoela Rocha de Albuquerque. Guarda Compartilhada. São Paulo: Forense, 2009.

SANTANA, Maraísa. Alienação Parental traz sérios prejuízos ao desenvolvimento. Disponível em: http://ivansilvanoticia.com.br/2012/05/alienacao-parental-traz-serios-prejuizos-ao-desenvolvimento/. Acesso em 28 de Dez. de 2015.


[1] 

[2] CABRAL, Hildeliza Lacerda Tinoco Boechat. Efeitos Psicológicos e Jurídicos da Alienação Parental. Disponível em: http://www.mpce.mp.br/orgaos/CAOCC/dirFamila/artigos/efeitos_psicologicos_e_juridi cos_da_alienacao_parental.pdf. Acesso em 30 de Nov. de 2015.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Rachel Ramos Ibañes

Servidora pública do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, bacharel em Psicologia e pós-graduada em Gestão de Pessoas e Direito de Família.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos