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Mudanças de paradigmas na tutela antecipada:

interpretações corretiva e valorativa e o perigo na pressa

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20/01/2004 às 00:00
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3- Perigo na pressa.

O processo visa pacificar, em cada caso concreto, os conflitos de interesses entre as partes litigantes, sendo óbvio que de um a lado está o autor e do outro o réu, porém, muitas vezes, este fato é esquecido pelo julgador.

As últimas inovações processuais trazidas pelas mini-reformas do CPC valorizaram mecanismos de proteção aos direitos dos autores e de certa forma esqueceram o direito de defesa dos réus.

O direito de defesa no nosso ordenamento jurídico não nasceu com a Constituição de 1.998, mas a partir desta foi sobremaneira valorizado.

Prescreve o art. 5º da CF/88, nos seus incisos LIV e LV:

"Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

"LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;"

"LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Geralmente o autor alega que o tempo e a demora processuais podem causar prejuízos ao seu direito, porém, por outro ponto, não pode ser relegado a plano inferior o direito de defesa do réu. Deve o julgador procurar equilibrar as armas processuais das partes, impondo a aplicação material do princípio constitucional da igualdade.

Tão ou mais perigoso quanto o perigo na demora é o perigo na pressa em decidir.

Não são raras as concessões de tutelas de urgência sem ouvir a parte contrária que logo são derrubadas pelos tribunais, deixando grandes rastros de prejuízos irreparáveis para os réus.

Creio que, não deve o julgador conceder toda e qualquer tutela de urgência sem ouvir a parte contrária.

Em cada caso concreto deve o julgador estudar a possibilidade de mitigação do art. 5º, incisos, LIV e LV da CF.

Entendo que, o julgador deve obrigatoriamente garantir, como regra, o contraditório e a ampla defesa ao réu e fixar prazos que possibilitem a manifestação especifica deste sobre a tutela de urgência.

Numa ação sob o rito ordinário, por exemplo, pode o julgador verificando a possibilidade de garantia do contraditório e da ampla defesa deixar para apreciar o pedido de tutela de urgência após o prazo da contestação, ou, por exemplo, após 72 (setenta e duas) horas da intimação do réu para falar sobre a antecipação, restando, neste último caso, assegurada a posterior apresentação de contestação, no prazo legal.

Considero que as garantias do contraditório e da ampla defesa são deveres anexos à concessão de qualquer tutela de urgência, portanto, a regra deve ser a ouvida do réu antes da concessão da antecipação, salvo casos excepcionais devidamente justificados.

Assim, ressalvadas situações devidamente justificadas e comprovadas, ao juiz só é permitido deferir medida cautelar, "sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz" (CPC, art. 804), portanto, por analogia e com base nos princípios do contraditório, ampla defesa, devido processo legal, proporcionalidade e razoabilidade esta regra se aplica também ao mandado de segurança (Lei 1.533/51, art. 7º, II), às antecipações das tutelas (CPC, art. 273 e 461; CDC art. 84, etc..), à ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 12) e as demais tutelas de urgência inscritas no CPC e na legislação extravagante. Ante o exposto, em regra, deve o julgador, por segurança jurídica, apreciar a tutela de urgência requerida, somente depois de ouvir a parte adversa.

Somente quando houver perigo real de lesão a direitos fundamentais ou em casos devidamente justificados pelo julgador poderá ser deferida tutela de urgência sem ouvir a parte contrária.

Vale notar que diversas vantagens processuais podem advir da ouvida da parte contrária, como por exemplo:

a) segurança jurídica;

b) possibilidade de maior conhecimento da demanda;

c) instauração de sumária produção de provas; e,

d) garantia do contraditório e da ampla defesa.

Por todo o exposto, proponho mais uma alteração, qual seja o acréscimo de um parágrafo ao art. 273, do CPC, veja-se:

"§ 8º A

antecipação somente poderá ser concedida depois de possibilitada à manifestação da parte adversa sobre a tutela de urgência, salvo casos excepcionais devidamente justificados pelo julgador".

O perigo na pressa deve ser evitado principalmente quando a lide envolver a dignidade da pessoa humana ou direito da personalidade, veja-se:

"EMENTA: Caso O GLOBO X GAROTINHO. 1. Liminar deferida em primeiro grau e confirmada pelo Tribunal de Justiça, que proíbe empresa jornalística de publicar conversas telefônicas entre o requerente - então Governador de Estado e, ainda hoje, pretendente à presidência da República - e outras pessoas, objeto de interceptação ilícita e gravação por terceiros, a cujo conteúdo teve acesso o jornal. 2. Interposição pela empresa de recurso extraordinário pendente de admissão no Tribunal a quo. 3. Propositura pela recorrente de ação cautelar - que o STF recebe como petição - a pleitear, liminarmente, (1) autorização de publicação imediata da matéria e (2) subida imediata do RE à apreciação do STF, porque inaplicável ao caso o art. 542, § 3º, C.Pr.Civil. 4. Objeções da PGR à admissibilidade (1) de pedido cautelar ao STF, antes de admitido o RE na instância a qua; (b) do próprio RE contra decisão de caráter liminar: razões que aconselham, no caso, fazer abstração delas. 5. Primeiro pedido liminar: natureza de tutela recursal antecipada: exigência de qualificada probabilidade de provimento do recurso extraordinário. 6. Impossibilidade de afirmação no caso de tal pressuposto da tutela recursal antecipada: (a) polêmica - ainda aberta no STF - acerca da viabilidade ou não da tutela jurisdicional preventiva de publicação de matéria jornalística ofensiva a direitos da personalidade; (b) peculiaridade, de extremo relevo, de discutir-se no caso da divulgação jornalística de produto de interceptação ilícita - hoje, criminosa - de comunicação telefônica, que a Constituição protege independentemente do seu conteúdo e, conseqüentemente, do interesse público em seu conhecimento e da notoriedade ou do protagonismo político ou social dos interlocutores. 7. Vedação, de qualquer modo, da antecipação de tutela, quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado (C.Pr.Civ., art. 273, § 2º), que é óbvio, no caso, na perspectiva do requerido, sob a qual deve ser examinado. 8. Deferimento parcial do primeiro pedido para que se processe imediatamente o recurso extraordinário, de retenção incabível nas circunstâncias, quando ambas as partes estão acordes, ainda que sob prismas contrários, em que a execução, ou não, da decisão recorrida lhes afetaria, irreversivelmente as pretensões substanciais conflitantes (Pet 2702 / RJ - RIO DE JANEIRO, PETIÇÃO, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE)."

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4 - Conclusão.

Os requisitos da tutela antecipada não devem ser estudados em si mesmos, porém casados com as normas e princípios constitucionais.

As exigências legais da antecipação da tutela de urgência descritas no art. 273, do CPC, podem ser flexibilizadas com base em interpretações valorativas, corretivas e razoáveis.

Nenhuma tutela de urgência deve ser concedida sem a ouvida da parte contrária

, salvo casos excepcionais devidamente justificados, sob pena de lesão aos princípios do contraditório, ampla defesa, devido processo legal, proporcionalidade, razoabilidade e igualdade processual de armas.

É necessária mudança de paradigma na interpretação dos requisitos da tutela antecipada por meio de comunhão deste instituto com o direito material e principalmente com a Constituição Federal.

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Sobre o autor
Jonny Maikel Santos

advogado em Natal (RN)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Jonny Maikel. Mudanças de paradigmas na tutela antecipada:: interpretações corretiva e valorativa e o perigo na pressa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 198, 20 jan. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4739. Acesso em: 5 nov. 2024.

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