A temática da ressocialização e sua aplicabilidade como fator preponderante no controle da reincidência criminal

21/03/2016 às 00:44
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O objetivo deste artigo foi demonstrar a importância da ressocialização no âmbito do Direito Penal como forma de contenção da reincidência.

1 INTRODUÇÃO

O Brasil enfrenta complexa problemática na tentativa de controlar a criminalidade. Em meio ao caos existente no sistema penitenciário, novas alternativas são buscadas a fim de conterem ou amenizarem a violência gerada pelo sistema penal como um todo. Buscam-se cada vez mais alternativas que possam ser trabalhadas e que viabilizem a ressocialização dos presos e a consequente diminuição da reincidência criminal.

O Direito Penal no Brasil é disciplinado por uma gama enorme de leis que se surtissem o efeito desejado, disciplinando e regulamentando no plano fático o que ocorre no teórico, elevaria o país a uma posição de significativa importância, dentre os que apresentam os melhores e mais complexos sistemas carcerários do mundo.

Traça-se aqui um paralelo entre dois institutos de importante valia na contribuição dessa efetividade, sejam eles: a ressocialização e a reincidência penal.

Verifica-se que é preciso um trabalho eficaz no intuito de fazer valer as leis já existentes, a fim de torná-las consolidadas e efetivas, visto que existem excelentes leis, mas infelizmente só funcionam em um plano ideal, pois a real situação prática é de total abandono. Os presídios se encontram superlotados, com péssimas condições de higiene, além de apresentarem problemas com alimentação, medicamentos, uso restrito da água entre tantos outros.

O Estado em conjunto com a sociedade deve visar a ressocialização, porém, o preconceito da sociedade a impede de cooperar com o apenado.

O Poder Estatal que é o responsável por zelar e criar medidas de reinserção social abandonou completamente o sistema prisional, tornando-o um local onde é praticamente impossível haver alguma recuperação dos indivíduos encarcerados.

O presente trabalho tem por objetivo demonstrar que é possível tornar realidade o plano idealizado de controle da reincidência criminal, bem como demonstrar que a inserção de medidas alternativas é crucial para sua efetivação no mundo dos fatos.

2 REINCIDÊNCIA CRIMINAL

2.1 Conceito e finalidade

O Código Penal Brasileiro na visão de Brunoni, não traz a exata definição de reincidência, apenas apresenta os requisitos necessários para sua configuração, sendo estes: cometimento de nova infração depois de transitada em julgado a condenação anterior e lapso temporal inferior a cinco anos (BRUNONI, 2007).

Porém o conceito da reincidência criminal pode ser encontrado no artigo 63 do Código Penal, que assim dispõe: “verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois que transitado em julgado a sentença que, no país ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior” (BRASIL, 1940, p. 242).

O professor Greco (2006, p. 611), após profunda análise do artigo 63 do Código Penal, afirma que são três os fatos indispensáveis para caracterização da reincidência, sendo eles: primeiramente a prática de crime anterior, em segundo, o trânsito em julgado da sentença condenatória e o terceiro, a prática de novo crime, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

A reincidência provoca graves consequências ao apenado, aumentando sua pena, perde-se com inúmeros prejuízos ao mesmo. Yarochewsky (2005, p. 75) descreve: ‘‘a reincidência não é, no ordenamento penal brasileiro, apenas uma circunstância que sempre agrava a pena, mas é considerada o agravante mais importante trazido pelo Código Penal Brasileiro, sendo chamada, por isso, de agravante preponderante”.

A importância desse instituto deve ser compreendida com base em sua finalidade, pois o rigor excessivo com que é tratada se confunde com a própria pena em si, já que aquela é um agravante desta, tendo, ambas, a finalidade de impedir que o réu cause novos danos à sociedade.

Os positivistas entendiam que o tratamento diferenciado destinado ao reincidente se fundamentava na maior periculosidade. Na verdade, seria uma defesa da sociedade perante o reincidente, pois esse em sua repetida atividade criminal demonstra maior periculosidade e temibilidade que a demonstrada por um delinquente primário (YAROCHEWSKY, 2005, p. 80).

À reincidência incumbe-se a tarefa de tentar impedir a reiteração da conduta criminosa. Por meio da coação, o cidadão que cometesse um crime pensaria duas vezes antes de voltar a reincidir, pois na segunda vez seria agravada sua pena.

Mas será que o agravamento da pena ajudou a combater a criminalidade? Adiante apresentar-se-á um instituto de combate efetivo à criminalidade, que de fato reduz o número de reincidentes, mas que infelizmente existe um plano teórico-ideal.

Vê-se que o principal intuito da reincidência é a prevenção de novos crimes, devendo ser esta a prioridade do legislador, como já ensinava Beccaria (1999, p. 125):

É melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los; e todo legislador sábio deve procurar antes impedir o mal do que repará-lo, pois uma boa legislação não é senão a arte de proporcionar aos homens o maior bem estar possível e preservá-los de todos os sofrimentos que se lhes possam causar, segundo o cálculo dos bens e dos males da vida.

Mas, infelizmente, na prática, essa prevenção não tem surtido o resultado esperado, evidenciando que a reincidência apenas está servindo para agravar a pena. Discute-se aqui sobre a questão ressocializadora das prisões, sob a ótica do fenômeno da reincidência criminal e quais os fatores que a determinam, assim como a respeito da eficácia dos dispositivos alternativos, como forma de superar a crise do sistema prisional brasileiro.

Ocorre que o Sistema Penitenciário Brasileiro encontra-se abandonado, pois é de conhecimento de todos que nossos presídios se encontram superlotados, com péssimas condições de higiene, além de apresentarem problemas com alimentação, medicamentos, uso restrito da água entre tantos outros.

É previsto pela LEP dentre outras garantias básicas, que aos presos devem ser prestadas assistência psicológica, à saúde, à educação, social, religiosa, material e jurídica. Ideologicamente falando, os legisladores trouxeram para o centro dos debates polêmicos em torno da ressocialização, a finalidade conferida à prisão moderna e o fundamento da concepção de execução penal assegurada na LEP. Muito embora haja muita controvérsia sobre o tema, ambas as posições apresentam as sugestões de ações que objetivam causar significantes mudanças nas vidas dos presos.

Miguel Reale expôs em sua obra “Pune-se para prevenir novos crimes, ou para castigo do delinquente? Tem a pena por fim recuperar o criminoso, para devolvê-lo ao convívio social, ou a que deve prevalecer é o objetivo de prevenção social”?

O que fica evidente, é que o Estado apenas se preocupa em punir o infrator, mas não se preocupa em recuperá-lo. Em trabalho de campo, pelo período de um ano exercendo a função de agente de cadeia pública, foi possível constatar as más condições de habitação, má alimentação, falta de água, falta de assistência médica entre outras, tornando impossível ressocializar alguém em tais condições. Atualmente, o papel da reincidência no ordenamento jurídico brasileiro se resume em apenas agravar a pena.

Importantes e numerosas pesquisas têm sido realizadas no intuito de encontrar uma solução para a problemática da reincidência.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Pesquisa e Estatística – IPEA (2015), a população carcerária do Brasil cresceu 83 vezes em setenta anos, conforme mapeamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, com base nos dados publicados no Anuário Estatístico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O total de apenados condenados no sistema prisional passou de 3.866 pessoas em 1938 para 321.014 em 2009. Conforme pesquisas recentes, 38% da população carcerária encontra-se em situação provisória, a realidade adquire contornos ainda mais dramáticos: o Brasil possuía, em 2012, 515.482 pessoas presas para apenas 303.741 vagas, déficit de 211.741 vagas. Hoje o Brasil já é o quarto país que mais encarcera.

2.2 Aplicabilidade

Salienta-se que a reincidência provoca graves consequências ao apenado, tornando o cumprimento da pena mais árduo, lento e com inúmeros prejuízos ao mesmo, dentre os quais podemos destacar:

a) agravamento da pena privativa de liberdade em quantidade indeterminada dentro dos limites da cominação pertinente (art. 61, I, do CP);

b) impedimento à concessão da suspensão condicional da execução da pena (sursis) na hipótese de crime doloso (art. 77, I, do CP);

c) impedimento à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos na hipótese de crime doloso (art. 44, II, do CP).

d) impedimento à substituição da pena privativa de liberdade por multa (art. 60, § 2º, e 44, § 2º, do CP);

e) conversão da pena substitutiva em pena privativa de liberdade (art. 45, I, do CP, atual § 5 º do artigo 44);

f) aumento de um terço à metade prazo de efetiva privação da liberdade para a obtenção do livramento condicional, se se tratar de crime doloso (art. 83, II);

g) aumento para dois terços o prazo de efetivo cumprimento da pena privativa de liberdade para a obtenção do livramento condicional, se se tratar de crime hediondo ou equiparado (art. 83, V, primeira parte, do CP);

h) imposição ao agente o regime fechado para início de cumprimento de pena de reclusão (art. 33, § 2º, b e c do CP);

i) imposição ao agente o regime semi-aberto para início de cumprimento de pena de detenção (art. 33, § 2, c, do CP);

j) revogação obrigatória do sursis em condenação por crime doloso (art. 81, I, do CP);

k) revogação obrigatória do livramento condicional, sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade por crime cometido anteriormente à vigência do benefício (art. 86, II, do CP);

l) revogação a reabilitação, quando sobrevier condenação a pena que não seja de multa (art. 95).

Como vimos são inúmeros os prejuízos da reincidência, mas surge uma indagação: todos esses agravantes da pena caracterizam bis in idem? Sobre esse assunto será visto a seguir.

2.3 Princípio non bis in idem

É um princípio jurídico que não está expressamente previsto constitucionalmente, mas exerce um importante papel em nosso ordenamento jurídico, não permitindo que um indivíduo seja punido duas ou mais vezes pelo cometimento de apenas uma infração penal.

Porém a não aplicabilidade do Princípio non bis in idem, em face da reincidência criminal tem causado grande polêmica no ordenamento jurídico brasileiro

A doutrina tem questionado se a reincidência fere o Princípio non bis in idem. Para Alberto Silva Franco, a reincidência fere o princípio do non bis in idem, pois segundo ele:

O fato criminoso que deu origem à primeira condenação não pode, depois, servir de fundamento a uma agravação obrigatória da pena, em relação a outro fato delitivo, a não ser que se admita, num Estado Democrático de Direito, um Direito Penal atado ao tipo de autor (ser reincidente), o que constitui uma verdadeira e manifesta contradição lógica (FRANCO, 1995)

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Para Zaffaroni e Pierangeli (2006, p.79), a violação do bis in idem, afeta o Princípio Processual Constitucional da coisa julgada, visto que a pena maior que se impõe na condenação pelo segundo delito decorre do primeiro ao qual a pessoa já havia sido julgada e condenada.

Porém, todas essas críticas não têm influenciado os nossos tribunais, o Supremo Tribunal Federal que desempenha a importante função de guardião da Constituição Federal reconheceu a constitucionalidade da reincidência como agravante da pena, no recurso ordinário 453000 RS.

O Superior Tribunal de Justiça expôs seu entendimento com o julgado da 6ª Turma – Agravo Regimental no Recurso Especial nº. 916657/RS – Relatora Jane Silva – Acórdão de 15/04/2008).

A não-aplicação da agravante da reincidência evidencia a violação ao artigo 61, I, do Código Penal, pois inexistente a inconstitucionalidade do dispositivo que a prevê. O simples reconhecimento da reincidência não importa em bis in idem, porquanto tão-só visa reconhecer maior censurabilidade à conduta de quem reitera a prática infracional, após o trânsito em julgado da sentença em que anteriormente foi condenado. A pena é agravada ante a dificuldade do agente ativo em aceitar a ordem legal estabelecida, não hesitando em reiterar a prática criminosa e colocar em maior risco a ordem social.

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná acrescenta que a não agravação da pena em face da reincidência constitui:

Ofensa aos princípios constitucionais da isonomia e da individualização da pena, pois se estaria igualando réus com situações pessoais desiguais, ou seja, criminoso contumaz (que possui condenação transitada em julgado), ao criminoso primário (que nunca delinquiu), privilegiando, em consequência, o reincidente (3ª Câmara Criminal – (Apelação n.º 343.548-5 – Relator Rogério Coelho – Acórdão publicado em 06/06/2008).

Verifica-se que o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça do Paraná, utilizam como argumento da agravação da pena, a suposição que o indivíduo que reitera a prática criminal, leva maior perigo à sociedade, sendo sua atitude mais reprovável, pois o mesmo apresentou desprezo da pena anterior a ele imposta e voltou a delinquir.

Apresenta ainda o argumento que seria uma afronta aos princípios da isonomia e da individualização da pena se o reincidente fosse tratado como réu primário, porém os mesmos tribunais não mencionam em nenhum ponto a violação do direito desses mesmos indivíduos no cumprimento da suas penas, sendo eles amontoados em celas minúsculas como animais.

O direito de punir é “aquele que se exercita de forma mais violenta e direta sobre as pessoas, e no qual se manifesta de forma mais conflitante o relacionamento entre o Estado e o cidadão, entre autoridade e liberdade, entre segurança social e direito individual” (FERRAJOLI, 2010, p.15).

Percebe-se que nossos tribunais estão mais interessados em punir, e deixar o maior tempo possível esses indivíduos encarcerados, e afastados da sociedade, do que ressocializá-los.

Seria o agravamento da pena gerado pela reincidência a solução para os problemas de violência no Brasil?

Não, pelo contrário, segundo estudo realizado pelo Instituto Avante Brasil (2014) entre 1940 a 2013 foram feitas 150 novas leis penais, estas cada vez mais severas, sendo 72% de agravamento do castigo penal e de nada adiantaram, apenas colaborou para o Brasil chegar aonde se encontra hoje, como um dos países mais violentos do planeta.

Mas, se o agravamento da pena não resolveu o problema da violência, qual será a solução para combater efetivamente a criminalidade?

3 RESSOCIALIZAÇÃO

3.1 Conceito

Descreve Baratta (1991, p. 151), que ressocialização quer significar "reintegração social", já que esta condiz com um processo de comunicação e interação entre o cárcere e a sociedade, devendo, portanto, existir uma profunda transformação nesta, pois é o lugar decisivo para se buscar a solução do problema carcerário. Baratta destaca um importante aspecto para haver possível avanços na ressocialização que seria a conscientização da sociedade

Ressocializar é dar ao preso o suporte necessário para reintegrá-lo à sociedade, é buscar compreender os motivos que o levaram a praticar tais delitos, é dar a ele assistência para superar tais dificuldades, oportunizando-o de ter um futuro melhor independente daquilo que aconteceu no passado.

Mas, infelizmente, o que se vê é a impossibilidade de dar suporte, na atual situação que se encontram as cadeias, prisões e penitenciárias brasileiras, em meio ao caos predominante no sistema prisional.

Para ressocialização, Barata (1991) aponta duas posições para que se compreenda o conceito, uma visão idealista e outra realista. A primeira encara a prisão positivamente como forma de reintegração social do indivíduo enquanto a segunda, realista, defende a tese de que a prisão é incapaz de ressocializar o indivíduo, mas apenas o neutraliza. Para o autor mais correto seria denominar “reintegração social”, o fenômeno pelo qual se almeja reintegrar o preso em sociedade, encarando a reinserção do apenado como tarefa precípua do Estado, que (re)inclui socialmente aquele que foi por ela anteriormente excluído, encarando-os como sujeitos de direitos e não meramente como objetos de assistência.

A precariedade das condições carcerárias é um dos fatores que dificultam a reintegração social, posto que condições desumanas tendam a tornar o encarcerado cada vez menos humano.

O Brasil, desde 1948, é signatário, no âmbito das Nações Unidas – ONU, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e, no âmbito da Organização dos Estados Americanos – OEA, da Declaração Americana de Direitos Humanos, o que significa que tem por obrigação tratar o mais humanamente possível seus encarcerados.

3.2 Sistema penitenciário

A atual situação é caótica, como demonstra o estudo realizado pelo Instituto Avante Brasil (2015), com dados disponibilizados pelo INFOPEN. O crescimento da população carcerária nos últimos 23 anos (1990-2013) chegou a 507% (de 90 mil presos passamos para 574.027). A população brasileira (nos anos indicados) cresceu 36%. Só nos últimos 10 anos (2003-2013), o aumento foi de 86% (a população brasileira no período cresceu menos de 15%). Em junho de 2013 a taxa de presos era de 300,96 por 100 mil habitantes, de acordo com o DEPEN.

Em pesquisa ainda mais recente o Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2014) divulga que a população carcerária brasileira é de 711.463 presos. Os números apresentados pelo CNJ a representantes dos Tribunais de Justiça Brasileiros, na quarta-feira (04/06/2014), levam em conta as 147.937 pessoas em prisão domiciliar. Para realizar o levantamento inédito, o CNJ consultou os juízes responsáveis pelo monitoramento do sistema carcerário dos 26 estados e do Distrito Federal.

A superlotação carcerária está presente não somente nas penitenciárias e cadeias públicas, mas sim no sistema como um todo.

Essa superlotação dos estabelecimentos prisionais gera um sentimento de revolta nos presos, pois os mesmos são colocados em locais que as condições são análogas a verdadeiros calabouços medievais, dificultando ainda mais a ressocialização.

A superlotação é reflexo da morosidade do judiciário no julgamento dos processos, da pequena quantidade de progressão das penas, da falta de aplicação de penas alternativas e principalmente do descaso da sociedade e do Estado na implantação de medidas que auxiliem a reintegração do preso na sociedade.

3.3 Participação da sociedade

A participação da sociedade na reintegração do preso ao convívio social é um fator essencial para que a ressocialização surta efeitos positivos. Sendo considerado um dever da sociedade, como está previsto no item 64 da parte II das Regras Mínimas da ONU, que trata das relações sociais e assistência pós-prisional, respectivamente: “O dever da sociedade não termina com a libertação do preso. Deve-se dispor, por conseguinte, dos serviços de organismos governamentais ou privados, capazes de prestar à pessoa solta uma ajuda pós penitenciária eficaz, que tenda a diminuir preconceitos para com ela e permita sua readaptação à comunidade”.

Mas infelizmente, na prática é bem diferente quem nunca ouviu as famosas frases: “Bandido bom é bandido morto”, “Tá com pena dele? leva pra sua casa”, “Não tem que construir mais cadeias! Têm que construir mais cemitérios”, essas frases refletem o pensamento da sociedade preconceituosa em que vivemos.

Os obstáculos enfrentados pelos detentos após adquirirem liberdade ainda são muitos. Infelizmente, vê-se que a sociedade, diante da violência e criminalidade, se deixa levar pelo sensacionalismo e preconceito criado pelos diversos meios de comunicação, e acaba adotando uma postura nada humanista em relação àqueles que acabaram de sair das prisões e procuram seguir uma vida longe do crime.

Descreve Rogério Greco, “parece que a sociedade não concorda, infelizmente, pelo menos à primeira vista, com a ressocialização do condenado. O estigma da condenação, carregado pelo egresso, o impede de retornar ao normal convívio na coletividade”. O retorno desse indivíduo para a sociedade se torna algo impossível, pois é nela que vivemos, é altamente preconceituosa, preconceito tal, que ultrapassa a pessoa do condenado, chegando até seus familiares.

Esse desrespeito é uma verdadeira afronta ao Princípio constitucional denominado Intranscendência penal descrito no art. 5º, XLV da Constituição Federal.

3.4 O princípio da intranscendência penal

Importante conquista dos indivíduos, na luta pelos direitos fundamentais, o Princípio da intranscendência da pena, também denominado Princípio da personalidade, ou da pessoalidade. Tem como fundamento impedir que o Estado aplique penas que ultrapassem a pessoa do condenado, devendo penalizar somente a pessoa do criminoso.

O princípio está previsto no art. 5º, XLV, da Constituição Federal que descreve que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens serem, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido."

Para Eugênio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli (2006, p. 154) “a pena é uma medida de caráter estritamente pessoal, em virtude de consistir numa ingerência ressocializadora sobre o apenado”. Pela opinião dos citados doutrinadores, fica claro todo o caráter pessoal que deve revestir a aplicação da pena.

A pena deve atingir apenas aquele que praticou o crime gerador da mesma, não podendo prejudicar outros indivíduos pelo simples fato de ser parente do autor do delito. Mas na sociedade preconceituosa em que vivemos, a família do apenado sofre inúmeras consequências, apenas por ter ligação com um apenado.

A família do apenado além de tem que conviver com o drama de ver seu ente querido encarcerado em péssimas condições, perde poder econômico, sofre com o desprezo da sociedade, sendo muitas vezes taxados como pessoas de mau caráter, sendo agravados esses efeitos quando o apenado é solto e volta a reincidir, pois a sociedade julga que é dever da família restaurar o apenado, entretanto a sociedade e o Estado não cooperam em nenhum ponto para essa restauração.

3.5 Participação do estado

Como visto anteriormente, a pena atinge o apenado e toda a sua família, sendo pelo preconceito ou ainda com a perda econômica.

Para tentar amenizar essa situação, o Estado tem tomado algumas atitudes, entre elas, uma ganhou destaque o Auxílio Reclusão.

Tal auxílio é assegurado pela Previdência Social aos dependentes do apenado recluso, com o objetivo de assegurá-los um sustento, pois os que dependiam diretamente da renda do agora apenado, não mais podem contar com a renda mínima imprescindível para o sustento, uma vez que o mesmo se encontra preso.

Lembrando que o processo para obter o auxílio reclusão é extremamente rigoroso, tendo o apenado que ter exercido atividade regulamentada e contribuído ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), tendo ainda a família de o apenado apresentar trimestralmente ao INSS atestado de permanência do apenado no sistema prisional.

Se os dependentes do condenado fossem deixados à própria sorte, estariam sofrendo uma punição por um crime que não cometeram.

A criação do auxílio reclusão pode ser considerada uma grande conquista do Estado Democrático de Direito, uma verdadeira representação prática do princípio da instranscedência penal.

Outra grande iniciativa foi o Projeto “Começar de Novo” que buscou sensibilizar entidades públicas e privadas para promover a ressocialização dos presos, por meio de propostas de trabalho e de cursos de capacitação profissional para presos e egressos do sistema carcerário, de modo a concretizar ações de cidadania e promover redução da reincidência.

Conforme dispõe o artigo 1º da Lei nº 7.210/84, a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

Dessa forma, para haver eficácia prática do dispositivo acima mencionado é preciso repensar a execução penal e o papel do Poder Judiciário como órgão responsável pelo cumprimento da lei, com medidas de reinserção social.

Destaca-se nesse projeto, a preocupação de seus propositores na formação profissional dos apenados, oportunizando-os a participarem de cursos que realmente vai qualificá-los para o mercado de trabalho, além de os encaminharem para vagas de empregos disponíveis.

Mas, os projetos aqui apresentados são exceções no atual sistema prisional brasileiro, onde predomina total abandono por parte do Estado deixando a desejar em muito na assistência ao apenado.

4 CONCLUSÃO

Ficou demonstrado o total descaso com os apenados no Brasil, tendo diariamente seus direitos violados, sendo amontoados em celas que mais parecem calabouços medievais, sofrendo com péssimas condições de higiene, má alimentação, falta de medicamentos, de assistência médica, sendo totalmente abandonados.

Essas condições dificultam o inicio de um projeto para a ressocialização do apenado, os deixando a mercê da própria sorte, motivando por consequência alta taxa de reincidência criminal em nosso sistema prisional, ocasionando a superlotação em nossos presídios.

Superlotação que ficou explicita com os dados apresentados, comprovando total desrespeito aos direitos do encarcerado.

Ficou evidente, o abandono do sistema prisional brasileiro, que se encontra em péssimas condições de higiene e moradia colocando em risco a vida dos apenados, afirmando assim a ideia de que o Estado está apenas preocupado em punir o infrator.

Foi atestado, que o apenado além de sofrer com o cumprimento da pena, tem seu sofrimento prolongado após sua volta à sociedade, sofrendo preconceito de várias maneiras, tendo ainda esse preconceito passado aos seus familiares.

Verificou-se o desinteresse da sociedade em acolher o apenado, tratando-o com desprezo e preconceito, excluindo-o assim da sociedade, não lhe deixando outra escolha senão a reincidência.

Ficou evidente, o abandono do sistema prisional brasileiro, que se encontra em péssimas condições de higiene e moradia colocando em risco a vida dos apenados, afirmando assim a ideia de que o Estado está preocupado em punir o infrator.

5. REFERÊNCIAS

BARATTA, A. Resocialización o control social – por um concepto crítico de reintegración social del condenado. México: Siglo Veintiuno, 1991.

BECARRIA, C. Dos Delitos e das Penas . 13. ed. Rio De Janeiro: Ediouro, 1999.

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Vade mecum. São Paulo: Saraiva, 2012.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

BRASIL. Lei n.º 7.210, de 11 de julho de 1984. Lei de Execução Penal. Brasília: Senado Federal, 1988.

BRUNONI, N. Ilegitimidade do direito penal de autor à luz do princípio de culpabilidade. Revista doutrina TRF4. ed. 21, 2007.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Dados sobre nova população carcerária brasileira. 2014. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/component/acymailing/archive /view/listid-4-boletim-do-magistrado/mailid-5632-boletim-do-magistrado-09062014>. Acesso em: 09 set. 2015.

FRANCO, A. S. Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

GRECO, R. Direitos Humanos: Sistema Prisional e Alternativa à Privação de Liberdade. São Paulo: Saraiva, 2011.

GRECO, R. Curso de Direito Penal. 7. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006.

IPEA (Brasil). Relatório de Reincidência Criminal 2015. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/destaques/arquivo/2015/07/9273eaea20159abdadb8bb43a3530f49.pdf>. Acesso em: 10 set. 2015.

INSTITUTO AVANTE BRASIL (Brasil). Brasil: Reincidência de até 70%. 2014. Disponível em: http://institutoavantebrasil.com.br/brasil-reincidencia-de-ate-70/. Acesso em: 11 set. 2015.

INSTITUTO AVANTE BRASIL Colapso do sistema penitenciario: tragedias anunciadas. 2015. Disponível em: <http://institutoavantebrasil.com.br/colapso-do-sistema-penitenciario-tragedias-anunciadas/>. Acesso em: 09 set. 2015.

FERRAJOLI, L. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução de Ana Paula Zomer, Fauzi Hassan Choukr, Juarez Tavares e Luiz Flávio Gomes. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, 3 edição revista.

REALE, M. Liçoes Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva, 2002.

YAROCHEWSKY, L. I. Da Reincidência Criminal. Belo Horizonte: Mandamentos, 2005.

ZAFFARONI, E R; PIERANGELI, J H. Manual de direito penal brasileiro. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2006.

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