Teorias sobre a natureza jurídica do contrato individual de trabalho

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Sobre a natureza jurídica do contrato de trabalho, existem várias teorias apresentadas pela doutrina que buscam explicar. Teria o contrato de trabalho natureza contratual ou anticontratual?

CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO

De acordo com o art. 442, da CLT: “Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego”.

O ínclito Mauricio Godinho Delgado[1] leciona que definir um fenômeno consiste na atividade intelectual de apreensão e desvelamento dos elementos componentes desse fenômeno e do nexo lógico que os mantém integrados. A definição é, pois, uma declaração da essência e composição de um determinado fenômeno: supõe, desse modo, o enunciado não só de seus elementos integrantes como do vínculo que os mantém unidos.

 DELGADO[2] assevera que a definição do contrato de trabalho não foge a essa regra. Identificados seus elementos componentes e o laço que os mantém integrados, define-se o contrato como o negócio jurídico expresso ou tácito mediante o qual uma pessoa natural obriga-se perante pessoa natural, jurídica ou ente despersonificado a uma prestação pessoal, não eventual, subordinada e onerosa de serviços.

O douto explica ainda que também pode ser definido o contrato empregatício como o acordo de vontades, tácito ou expresso, pelo qual uma pessoa física coloca seus serviços à disposição de outrem, a serem prestados com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação ao tomador. A definição, portanto, constrói-se a partir dos elementos fático-jurídicos componentes da relação empregatícia, deflagrada pelo ajuste tácito ou expresso entre as partes.

NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO DE TRABALHO

Sobre a natureza jurídica do contrato de trabalho, existem várias teorias apresentadas pela doutrina que buscam explicar.  

Nesse passo, é de todo oportuno trazer à baila o entendimento da saudosa Alice Monteiro de Barros[3] que assevera que subdividem-se em teorias contratualistas e anticontratualistas, e ainda há autores que acrescentam as acontratualistas ou paracontratualistas, apresentadas abaixo:  

TEORIAS CONTRATUALISTAS

As teorias contratualistas procuram identificá-lo a um contrato de Direito Civil: ora a uma compra e venda, ora a uma locação, ora a uma sociedade, ora a um mandato. 

Os que atribuíam ao contrato de trabalho a natureza de uma compra e venda afirmavam que o empregado vende a sua força de trabalho em troca de um salário. 

A crítica é a seguinte: trabalho não é mercadoria e salário não é preço.

Os que atribuíam a natureza uma espécie de locação de serviços, defendem que o empregado aluga seu trabalho, assumindo a condição de locador; o empregador o utiliza na condição de locatário e a coisa locada é a força de trabalho. 

A crítica é ao fundamento de que essa teoria implica retrocesso à locatio hominis, por ignorar que a força de trabalho do empregado é inseparável de sua pessoa.

A vertente doutrinária que tenta explicar o contrato de trabalho como um contrato de sociedade, argumenta que tanto o empregado quanto o empregador colocam em comum, respectivamente, trabalho e capital, tendo em vista dividir o benefício que daí se origina. 

A crítica é que não pode ser aceita porque no contrato de trabalho não há a affectio scietatis, ou seja, a comunhão de interesses na proporção existente no contrato de sociedade. 

Entre as teorias contratualistas, existe ainda a vertente que atribui natureza jurídica do contrato de trabalho a um mandato, afirmando que o empregador atua como mandante e o empregado como mandatário. 

A crítica a essa teoria é que essa não pode prosperar, pois, tradicionalmente, o mandato era gratuito, enquanto o contrato de trabalho sempre foi oneroso. 

TEORIAS ANTICONTRATUALISTAS

BARROS ainda leciona que as teorias anticontratualistas, inspiradas nas críticas de Gierke, se opunha ao caráter individualista do contrato, baseado no antigo modelo romano de locacio operarum. O citado autor apresenta como objeção ao materialismo das relações obrigacionais, o espiritualismo da relação de trabalho, fundada na lealdade do trabalhador e na proteção do empresário, unidos por meio de um vínculo quase familiar que evoca os laços da servidão medieval. 

A terceira vertente doutrinária é a teoria acontratualista para explicar a natureza jurídica do contrato de trabalho. Seus adeptos asseveram que a relação de emprego não contrasta com o contrato, mas também não afirmam sua existência.

QUAL A TEORIA QUE DEVE SER APLICADA?

A saudosa Doutrinadora concluiu que prevalece no Brasil, como regra geral, a forma livre de celebração do contrato, que pode assumir o caráter expresso (verbal ou escrito) ou tácito (art. 442 e 443 da CLT). Explica ainda que, infere-se do art. 468 da CLT que a legislação brasileira adota a corrente contratualista, mas os arts. 2º, 503 e 766 da CLT enquadram-se na corrente institucionalista, confundindo empregador com empresa. Daí sustentam alguns autores o perfil eclético da nossa legislação brasileira. 

No entendimento de BARROS, predomina a teoria contratualista, não nos moldes das teorias civilistas clássicas, mas considerando a vontade como elemento indispensável à configuração do contrato. 

Nesse raciocínio, o douto Mauricio Godinho Delgado, ao lecionar sobre os elementos dos contratos empregatícios, assevera que estes não diferem, em geral, daqueles já identificados pela teoria civilista clássica: trata-se dos elementos essenciais, naturais e acidentais do contrato.  

 O ínclito Professor preleciona que os elementos essenciais, ou jurídico-formais, do contrato de trabalho são aqueles enunciados pelo Direito Civil: capacidade das partes; licitude do objeto; forma prescrita ou não vedada por lei (art. 104, I a III, CCB/2002). A esses três acolhidos, soma-se a higidez da manifestação da vontade (ou consenso válido). O Professor explica que esses elementos estruturantes comparecem ao Direito do Trabalho, obviamente, com as adequações próprias a esse ramo jurídico especializado.  

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Segundo Washington de Barros Monteiro citado por Delgado, capacidade, como se sabe, “é a aptidão para exercer, por si ou por outrem, atos da vida civil”. Capacidade trabalhista é a aptidão reconhecida pelo Direito do Trabalho para o exercício de atos da vida laborativa.  

Concernente ao empregador, o Direito do Trabalho não introduziu inovações, mas no tocante à figura do empregado há especificidades normativas trabalhistas. Como exemplo podemos observar que a capacidade plena para atos da vida trabalhista inicia-se aos 18 anos (art. 402, da CLT).  

Existem atos trabalhistas vedados ao trabalhador menor de 18 anos, ainda que relativamente capaz: é o que se passa, por exemplo, com a prestação laboral em período noturno ou em circunstâncias perigosas ou insalubres (art. 7º, XXXIII, CF/88 — o texto constitucional anterior reportava-se apenas à indústria insalubre) . 

Sobre a licitude do objeto, segundo o art. 166, II, do CCB/2002, somente é conferido validade ao contrato que tenha objeto lícito. Em relação a forma regular ou não proibida, o contrato de trabalho é pacto não solene; é, portanto, contrato do tipo informal, consensual, podendo ser licitamente ajustado ou até mesmo de modo apenas tácito, conforme caput dos arts. 442 e 443 da CLT.  

Por fim, sobre a higidez de manifestação de vontade, DELGADO aduz que a ordem jurídica exige ocorrência de livre e regular manifestação de vontade, pelas partes contratuais, para que o pacto se considere válido. Nessa linha, a higidez de manifestação de vontade (ou consenso livre de vícios) seria elemento essencial aos contratos celebrados.  

Para concluir, importante trazer à baila os ensinamentos de DELGADO sobre os elementos naturais e acidentais do contrato de forma sucinta. 

O douto explica que os elementos naturais do contrato são aqueles que, embora não se caracterizando como imprescindíveis à própria formação do tipo contratual examinado, tendem a comparecer recorrentemente em sua estrutura e dinâmica concretas.  

Os elementos acidentais do contrato são aqueles que, embora circunstanciais e episódicos no contexto dos pactos celebrados, alteram-lhes significativamente a estrutura e efeitos, caso inseridos em seu conteúdo. Os elementos acidentais classicamente enfatizados pela doutrina civilista são o termo e a condição.  

LEITE[4] assevera que os elementos acidentais são facultativos, pois são cláusulas que podem existir ou não nos contratos. Condição e termo são elementos acidentais do contrato de trabalho, porque subordinam a sua validade a evento futuro. O encargo também é elemento acidental, porque pode existir apenas nos contratos a título gratuito.


[1] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: LTr, 2016, p. 559.

[2] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 15ª ed. São Paulo: LTr, 2016, p. 559..

[3] BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 10ª ed. São Paulo: LTr, 2016.

[4] LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

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