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Anulação do impeachment é fantasia. As crises derrotaram o governo

12/05/2016 às 15:03
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O mandado de segurança impetrado pela AGU, no STF, pedindo a anulação do processo de impeachment, com fundamento em irregularidade na condução do processo na Câmara, não possui amparo jurídico.

A AGU ingressou com mandado de segurança no STF pedindo a anulação do processo de impeachment, porque teria havido irregularidade na condução do processo na Câmara. Eduardo Cunha teria tido comportamento impróprio, em busca de interesses pessoais espúrios. Teria havido desvio de finalidade e de poder.

Juridicamente falando, a chance de vitória do governo é zero. Pelo que já manifestaram vários ministros (Fux, Fachin, Mendes, Celso de Mello), o tribunal não pretende ingressar no mérito do impeachment, cabendo-lhe agir apenas nos casos absurdos de flagrante ilegalidade.

Dilma (e Lula) foi vencida pelas crises. Quando perdemos e a luta se torna inútil, o melhor é aceitar a derrota. Seus discursos e recursos estão em função tão somente da sua “storytelling”. É assim que serão vistos pela História. Motivos da sua queda amplamente já discutidos: PC4 (deixou faltar Pão, Circo – consumismo -, Confiança, Competência administrativa e, de sobra, conviveu longo período com a Corrupção). Não há governo que resista (no mundo democrático) quando presentes todos os vetores do PC4.

Não havia outra saída para Dilma, que perdeu a capacidade de ação e de governança e, acima de tudo, a audácia e a coragem para promover as duras reformas, a começar pelo campo ético, que o país está necessitando. Está encerrado mais um ciclo político no Brasil, com a eliminação de Dilma, Delcídio, possivelmente, Cunha, Renan etc., embora isso não seja garantia de nenhuma melhora. Muitos outros ciclos já se fecharam e o País continuou sendo um Estado licencioso (nos costumes, nos gastos, na economia, na política, na corrupção, no fisiologismo, no patrimonialismo etc.), de progresso lento e corrupção sistêmica (que agora vem sendo combatida com tenacidade pela Lava Jato e outras operações congêneres).

O presente não tem sido nada magnânimo com o lulopetismo, que a grande maioria da população quer esquecer (ou odiar para sempre). Dilma criou um abismo pessoal e político de teor inigualável. Transformou o Brasil numa nau ingovernável. O impeachment é o preço que está pagando pela seu ensimesmamento, que deixou a nação à deriva. Qualquer adiamento do impeachment significa afundar ainda mais o país na incerteza e no precipício. Nada mais lhe compete fazer (ou desfazer).

Que outros assumam as suas responsabilidades, com todos os riscos e as dificuldades que o cargo impõe. E que as mudanças pedidas pela população desde junho/13 não fiquem esquecidas. De políticos da geração e estirpe de Dilma, Lula, Temer, Sarney, Renan, Cunha, Aécio, Collor, FHC e tantos outros que estão aí o País está exausto (não os admitindo nem em suas manifestações). Está esgotado o prazo de validade do Estado licencioso, que convive com a impunidade dos ladrões do erário e que privilegia determinadas oligarquias dominantes ou reinantes, que, ademais, são ineficientes e nada inovadoras. É hora de os novos empreendedores competitivos (pessoais ou empresariais) assumirem as posições de liderança da nação.

É óbvio que Eduardo Cunha, um dos maiores ladravazes da política brasileira (ao lado dos seus companheiros de partido Renan, Jader, Lobão, Sarney, Henrique Alves, os condenados da Lava Jato etc.), não foi imparcial na condução do processo de impeachment (isso é público e notório), porém, como afirmou o STF em dezembro, a imparcialidade se exige dos juízes, não dos parlamentares, que podem agir de acordo com suas convicções partidárias. Só não podem violar as regras procedimentais fixadas pelo próprio STF.

Logo que determinado o afastamento de Cunha da Câmara, nos meios de comunicação surgiu a estapafúrdia versão de que seria anulado o processo de impeachment da presidenta Dilma porque seriam nulos os atos praticados por Eduardo Cunha desde o dia em que ele se tornou réu no STF – 3/3/16. Tal ilação não tem nenhuma procedência. O STF nada disse sobre a nulidade dos seus atos, sobretudo os praticados no impeachment. Seria um caos para o país a nulidade de todos os atos de Cunha.

Conclusão: os últimos discursos e os recursos, pelos motivos invocados até aqui, não passam de fantasia e a fantasia, como sabemos, não tem limites. Bruxas voam com suas vassouras, criamos Saci Pererê, duendes atravessam paredes, profetas separam as águas do mar, e por aí vai. Com um abra-te-sésamo ou um abracadabra rompemos todos os obstáculos geológicos, cortamos montanhas ao meio, dividimos as águas do mar e tudo o mais que os humanos mágicos são capazes. Que pena que nos perdemos com tantas fantasias, quando uma das melhores coisas da vida é a imaginação.

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Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Luiz Flávio. Anulação do impeachment é fantasia. As crises derrotaram o governo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4698, 12 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/48897. Acesso em: 22 dez. 2024.

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