Aval, garantia solidária e fiança

15/05/2016 às 16:24
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Trata-se de um artigo sobre Aval, Garantia Solidária e Fiança de acordo com os entendimentos do Prof° Waldírio Bulgarelli.

  1. AVAL

O aval uma forma específica de garantia cambial. Por ele o avalista fica obrigado e responsável, pelo pagamento do título, nas mesmas condições do seu avalizado. É uma garantia caracteristicamente cambial, ou seja, é obrigação autônoma e formal, afastando-se totalmente do regime legal da fiança.

            O aval, portanto, é uma declaração cambiária, feita por terceiro, estranho ao título, ou por quem já está obrigado, consiste na assinatura, no próprio título. O aval pode ser simples, consistente apenas na assinatura do avalista, ou precedido de declaração formal. O aval simples poderá indicar o nome do avalizado (em preto) ou omiti-lo (em branco).

            O aval pode ser dado tanto no verso como anverso da letra.

 “Art. 14. O pagamento de uma letra de câmbio, independente do aceite e do endosso, pode ser garantido por aval. Para a validade do aval, é suficiente a simples assinatura do próprio punho do avalista ou do mandatário especial, no verso ou no anverso da letra.”

            Quando simples o aval (constante apenas da assinatura do avalista) e em branco (não designado o nome do avalizado), tem-se de indagar então a natureza da declaração cambial e a extensão da responsabilidade assumida.

            Se não for feita a indicação e constar a assinatura aposta sobre a referência “avalista”, entender-se-á que o aval foi dado como co-garantia, solidariamente com o sacador.

            O avalista assume a condição de coobrigado, solidariamente, mesmo que a obrigação por ele garantida contenha vício de nulidade, por qualquer razão que não seja vício de forma. Se o avalista for obrigado a pagar o valor garantido, ficará ele sub-rogado nos direitos decorrentes da letra, em relação à pessoa com quem, solidariamente, assumiu a obrigação.

“Art. 15. O avalista é equiparado àquele cujo nome indicar; na falta de indicação, àquele abaixo de cuja assinatura lançar a sua; fora destes casos, ao aceitaste e, não estando aceita a letra, ao sacador.”

            Não designado o nome do avalista, considera-se avalizado o da assinatura imediatamente superior à do avalista, e na falta desta, o devedor principal (sacador se ainda não aceita e aceitante se já aceita) é o que dispõe o art. 15 do Decreto n° 2.044/1908.

“Art. 31 - O aval é escrito na própria letra ou numa folha anexa. Exprime-se pelas palavras "bom para aval" ou por qualquer fórmula equivalente; e assinado pelo dador do aval. O aval considera-se como resultante da simples assinatura do dador aposta na face anterior da letra, salvo se se trata das assinaturas do sacado ou do sacador. O aval deve indicar a pessoa por quem se dá. Na falta de indicação entender-se-á ser pelo sacador.”

            O aval deve ser dado antes do vencimento, pois se for posterior ao vencimento não valerá como aval.

            O aval pode também ser dado antecipadamente, ou seja, antes de ser firmado o aceite ou o endosso, e apesar das discussões a respeito, na doutrina brasileira, é inegável a validade desse tipo de aval em face da autonomia das obrigações cambiais. Há, entretanto, que observar que, se a assinatura a que o aval está destinado a garantir não for firmada no título, obviamente não haverá responsabilidade para o avalista, mas somente no caso de aval em preto, pois, se for em branco, dever-se-á aplicar a Lei Uniforme que, como vimos, determina que seja considerado avalizado o sacador.

            Assim, o avalista só se obriga como o avalizado e nos termos deste. O avalista se responsabiliza em relação ao título, sua obrigação é a de pagar o título, e não em relação ao avalizado.

“Art. 32 - O dador de aval é responsável da mesma maneira que a pessoa por ele afiançada. A sua obrigação mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vicio de forma. Se o dador de aval paga a letra, fica sub-rogado nos direitos emergentes da letra contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval e contra os obrigados para com esta em virtude da letra.”

            O avalista libera-se da obrigação, nos mesmos casos do avalizado, a saber:

  1. Quando avalista do endossante: libera-se pela prescrição de um ano; libera-se também, pela falta de protesto a tempo certo (em tempo útil, ou da data do vencimento, no caso de letra com a cláusula “sem protesto”);
  2.  Quando o avalista sacador: libera-se pela falta do protesto em tempo útil (art. 32) e pela prescrição de 1 ano;
  3.   Quando avalista do aceitante: não se aproveita da falta de protesto, mas libera-se pela prescrição em 3 anos;
  4. Quando avalista do endossante, relação uns com os outros: libera-se pela prescrição de 6 meses, do dia em que o endossante pagou a letra ou em que foi acionado.

O aval nulo não produz qualquer efeito, mesmo como fiança.

O avalista, que paga o último título, adquire o direito de acionar os subscritores  anteriores e o próprio avalizado. O que implica o problema dos avais sucessivos ou simultâneos, ou cumulativos. Trata-se de distinção que, evidentemente, só interessa aos avalistas entre si e não ao credor, que pode exigir o pagamento de qualquer deles. É o caso de os avais virem superpostos, em branco; neste caso, que gerou várias dúvidas na nossa doutrina, hoje, devem ser considerados como simultâneos e não sucessivos.

Há que se distinguir – quando não sejam em branco os avais – o tipo de obrigação assumida: 1. Se se obrigaram uns pelos outros, tornam-se, pelo pagamento, credores cambiários uns dos outros, na ordem estabelecida; 2. Se se obrigaram direita e conjuntamente em favor do avalizado, não têm entre si relações cambiárias, nem adquirem pelo pagamento nenhum direito cambiário contra seu correspondente. Essas obrigações regulam-se pelo direito comum e ficam dependentes das relações extracambiárias.      

“Art. 898. O aval deve ser dado no verso ou no anverso do próprio título.

§ 1o Para a validade do aval, dado no anverso do título, é suficiente a simples assinatura do avalista.

§ 2o Considera-se não escrito o aval cancelado.

Art. 899. O avalista equipara-se àquele cujo nome indicar; na falta de indicação, ao emitente ou devedor final.

§ 1° Pagando o título, tem o avalista ação de regresso contra o seu avalizado e demais coobrigados anteriores.

§ 2o Subsiste a responsabilidade do avalista, ainda que nula a obrigação daquele a quem se equipara, a menos que a nulidade decorra de vício de forma.

Art. 900. O aval posterior ao vencimento produz os mesmos efeitos do anteriormente dado.”

  1. FIANÇA

O ato civil de garantia que corresponde ao aval é a fiança e são duas as diferenças existentes entre eles. Em primeiro lugar – a mais importante -, o aval é autônomo em relação à obrigação avalizada, ao passo que a fiança é obrigação acessória. Desse modo, se a obrigação do avalizado, por qualquer razão, não puder ser exigida pelo credor, isto não prejudicará os seus direitos em relação ao avalista. Já, se a obrigação afiançada é inexigível, a causa de inexigibilidade macula igualmente a fiança, que, sendo acessória, tem a sorte da principal. Outra consequência da autonomia do aval é a inoponibilidade, pelo avalista, das exceções que aproveitariam ao avalizado, sendo certo que o fiador, em geral, pode alegar contra o credor, as exceções do afiançado.

  

 A segunda diferença diz respeito ao benefício de ordem, que pode ser invocado pelo fiador, mas não pelo avalista. O benefício de ordem é a exoneração da responsabilidade do prestador da garantia suplementar, em razão da prova da solvência do devedor garantido. O avalista, mesmo que o avalizado tenha bens suficientes ao integral cumprimento da obrigação cambiária, deve honrar o título junto ao credor, se acionado, e, depois, cobra-lo em regresso daquele. O fiador, ao contrário, poderá indicar bens do afiançado, situados no mesmo Município, livres, desembaraçados e suficientes à solução da dívida, e, com isto, liberar-se da obrigação assumida. Essa diferença entre o aval e a fiança costuma não apresentar desdobramentos concretos, na medida em que o credor costuma condicionar a aceitação da fiança à renúncia, pelo fiador, do benefício de ordem.

 “Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.

Art. 819. A fiança dar-se-á por escrito, e não admite interpretação extensiva.

Art. 820. Pode-se estipular a fiança, ainda que sem consentimento do devedor ou contra a sua vontade.

Art. 821. As dívidas futuras podem ser objeto de fiança; mas o fiador, neste caso, não será demandado senão depois que se fizer certa e líquida a obrigação do principal devedor.

Art. 822. Não sendo limitada, a fiança compreenderá todos os acessórios da dívida principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do fiador.

Art. 823. A fiança pode ser de valor inferior ao da obrigação principal e contraída em condições menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais onerosa que ela, não valerá senão até ao limite da obrigação afiançada.

Art. 824. As obrigações nulas não são suscetíveis de fiança, exceto se a nulidade resultar apenas de incapacidade pessoal do devedor.

Parágrafo único. A exceção estabelecida neste artigo não abrange o caso de mútuo feito a menor.

Art. 825. Quando alguém houver de oferecer fiador, o credor não pode ser obrigado a aceitá-lo se não for pessoa idônea, domiciliada no município onde tenha de prestar a fiança, e não possua bens suficientes para cumprir a obrigação.

Art. 826. Se o fiador se tornar insolvente ou incapaz, poderá o credor exigir que seja substituído.

Art. 827. O fiador demandado pelo pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados os bens do devedor.

Parágrafo único. O fiador que alegar o benefício de ordem, a que se refere este artigo, deve nomear bens do devedor, sitos no mesmo município, livres e desembargados, quantos bastem para solver o débito.

Art. 828. Não aproveita este benefício ao fiador:

I - se ele o renunciou expressamente;

II - se se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário;

III - se o devedor for insolvente, ou falido.

Art. 829. A fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma pessoa importa o compromisso de solidariedade entre elas, se declaradamente não se reservarem o benefício de divisão.

Parágrafo único. Estipulado este benefício, cada fiador responde unicamente pela parte que, em proporção, lhe couber no pagamento.

Art. 830. Cada fiador pode fixar no contrato a parte da dívida que toma sob sua responsabilidade, caso em que não será por mais obrigado.

Art. 831. O fiador que pagar integralmente a dívida fica sub-rogado nos direitos do credor; mas só poderá demandar a cada um dos outros fiadores pela respectiva quota.

Parágrafo único. A parte do fiador insolvente distribuir-se-á pelos outros.

Art. 832. O devedor responde também perante o fiador por todas as perdas e danos que este pagar, e pelos que sofrer em razão da fiança.

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Art. 833. O fiador tem direito aos juros do desembolso pela taxa estipulada na obrigação principal, e, não havendo taxa convencionada, aos juros legais da mora.

Art. 834. Quando o credor, sem justa causa, demorar a execução iniciada contra o devedor, poderá o fiador promover-lhe o andamento.

Art. 835. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante sessenta dias após a notificação do credor.

Art. 836. A obrigação do fiador passa aos herdeiros; mas a responsabilidade da fiança se limita ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças da herança.

Art. 837. O fiador pode opor ao credor as exceções que lhe forem pessoais, e as extintivas da obrigação que competem ao devedor principal, se não provierem simplesmente de incapacidade pessoal, salvo o caso do mútuo feito a pessoa menor.

Art. 838. O fiador, ainda que solidário, ficará desobrigado:

I - se, sem consentimento seu, o credor conceder moratória ao devedor;

II - se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos seus direitos e preferências;

III - se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente do devedor objeto diverso do que este era obrigado a lhe dar, ainda que depois venha a perdê-lo por evicção.

Art. 839. Se for invocado o benefício da excussão e o devedor, retardando-se a execução, cair em insolvência, ficará exonerado o fiador que o invocou, se provar que os bens por ele indicados eram, ao tempo da penhora, suficientes para a solução da dívida afiançada.”.

  1. GARANTIA SOLIDÁRIA

De acordo com o artigo “Garante solidário – uma construção abstrusa?” o Prof° Waldírio Bulgarelli critica uma decisão do STJ, na qual eles dizem que o garante solidário não passa de um devedor, e como tal obrigado, e de forma ainda mais ampla que o fiador, quer por dispensar a anuência do cônjuge, quer por não dispor do benefício de ordem, com o qual é contemplado o fiador por força de lei. Tem-se assim que aquele que firmou a garantia, e portanto, assumiu, não a dívida, mas a responsabilidade como garante transforma-se em devedor.

O prof° Waldírio Bulgarelli enunciou alguns pontos importantes referente à decisão do STJ:

O juiz deve se colocar no lugar de legislador em caso de lacuna.

A execução de títulos de créditos vinculados a contratos e da posição do avalista e ou do fiador em tais casos. E conclui por admitir a possibilidade de execução conjunta.

As leis de circulação dos títulos de créditos – através do endosso – e dos contratos (cessão de contrata e cessão de crédito) que se atribui sobretudo às cambiais o caráter de abstração, enquanto os contratos são naturalmente causais, já que os nossos códigos, comerciais e civis, não acolheram.

Em relação aos garantidores, a execução por título de crédito há de recair no avalista e por contrato no fiador.

No caso do texto em epígrafe, a decisão do STJ demonstra ao menos 2 pontos salientes: 1. Adoção de uma ótica ideológica do tipo dinâmica, voltada para o social e 2. Uma postura psicológica peculiar.

A primeira pode-se constatar pelo intento de renovar e pela confissão feita no contexto do relatório da decisão. Trata-se portanto, de fundamento insuficiente para transformar o garante em devedor. A certeza não é um dogma absoluto, sobretudo no direito anglo-saxonico, em que é tida mais como um ponto de referencia ou um ideal a se alcançar, tem-se, entretanto, a convicção de que a certeza no direito decorre de pelo menos dois elementos essenciais: o da proibição e o de uma lei bem feita e em interpretada.

A segunda, implica em indagar sobre a posição psicológica do juiz perante o feito, levando em conta que já muito antes de Kelsen se admite que o juiz não é um autômato, mas um ser humano, que terá suas aflições, dúvidas, certezas e visão social.

Ficou claro que o julgador quis proteger o credor, eliminado para isso, certos óbices que a figura do fiador oferece, como a autorização marital e o benefício de ordem.

Fica entendida tanto subjetivamente como objetivamente a causa está a demonstrar que o garante não assumiu uma dívida, mas sim uma responsabilidade de garantia. Que a causa aqui atua como essentialia negotii , é indiscutível surgindo coo elemento esclarecedor da vontade e da intenção do agente. No Direito Civil, a “falta causa vicia o ato”, e que o Direito Comercial exige para a avalidade do negócio a menção da causa da obrigação.

Por que proteger o credor que já está sobremaneira protegido de um lado pelo aval lançado na cártula e de outro pela fiança no contrato?

            Só pode ser compreendido no gênero garantidor, e portanto, na espécie de fiador (além de avalista).

            Infelizmente, a conclusão é a de que o julgador acolher uma cláusula no mínimo enganosa, contra a parte mais fraca.

            E tanto assim é que, como garante terá assegurado o direito de regresso contra o devedor, o que é discutível se for considerado apenas devedor solidário.

BIBLIOGRAFIA

  • TEXTO: “GARANTE SOLIDÁRIO – UMA CONSTRUÇÃO ABSTRUSA?” -           Revista dos Tribunais – Vol. 683- p. 49 – Set./92
  • BULGARELLI, Waldirio. TÍTULOS DE CRÉDITO. 14ª Ed. – São Paulo: atlas, 1998.
  • BULGARELLI, Aclibes. TITULOS DE CRÉDITO DE ACORDO COM O O NOVO CÓDIGO CIVIL. São Paulo: editora Jurídica Brasileira – 2002.
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