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Data de ingresso no serviço público ou data de ingresso em cargo efetivo: qual a diferença para fins de enquadramento nas regras de transição?

21/05/2016 às 15:46
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Qual a diferença entre data de ingresso no serviço público e data de ingresso em cargo efetivo para fins de enquadramento nas regras de transição?

No âmbito do serviço público, a reforma da previdência se deu por meio de sucessivas emendas constitucionais que, desde o texto original da CF/88, alteraram significativamente as regras de aposentadoria.

Dentre as novidades nascidas com a reforma, existem as chamadas regras de transição que garantem o direito à integralidade e à paridade aos servidores que implementarem os requisitos.  

E é exatamente dentro deste tema que existe uma questão delicada, complexa e pouco debatida na doutrina e na jurisprudência. Trata-se do real significado e sentido da expressão “serviço público”, contida nos artigos 6º da EC nº 41/2003 e 3º da EC nº 47/2005, que são hoje as principais e mais desejadas regras de transição para a aposentadoria dos servidores públicos.

As regras acima apontadas, por garantirem integralidade e paridade aos que nelas se aposentarem, possuem uma série de rigorosos requisitos a serem implementados cumulativamente.                 

Para bem visualizarmos e individualizarmos estes requisitos, vamos rapidamente elencá-los:

O art. 6º da EC nº 41/2003, possui os seguintes requisitos:

- Haver ingressado no Serviço Público até o dia 31/12/03, data de publicação da EC nº 41;

-  20 anos de efetivo exercício no Serviço Público;

- 10 anos de carreira;

- 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria;

- 60 anos de idade e 35 de contribuição, se homem; 55 anos de idade e 30 de contribuição, se mulher.

Por sua vez, o art. 3º da EC nº 47/2005, obriga o cumprimento dos requisitos abaixo listados:                     

- Haver ingressado no Serviço Público até o dia 16/12/98, data de publicação da EC nº 20;

- 25 anos de efetivo exercício no Serviço Público;

- 15 anos de carreira;

- 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria;

 - 35 de contribuição, se homem e 30, se mulher;

- A cada ano a mais de contribuição que ultrapasse os 35 e 30, diminui-se um na idade limite de 60 e 55 anos, respectivamente para homens e mulheres.

Vejam que, dentre os requisitos perfilhados em ambas as regras, aqueles que, de fato, interessam como objeto de análise do presente trabalho, são os que envolvem o cumprimento de exigências relacionadas ao “serviço público”, dentro de contextos normativos particularizados. Não analisaremos, portanto, para este fim, os demais requisitos contidos nestas normas.

Portanto, percebam que as duas regras exigem que os servidores, para nelas se aposentarem, precisam ter ingressado no “serviço público” até o dia 31/12/2003, aqueles que desejam se aposentar pelo art. 6º da EC nº 41; e até o dia 16/12/1998, aqueles que desejam se aposentar com base no art. 3º da EC nº 47/2005. Além desses requisitos iniciais, os servidores também precisam cumprir um período de efetivo exercício no “serviço público”, respectivamente, de 20 a 25 anos, em cada regra.

A primeira exigência, “data de ingresso no serviço público”, encontra-se no caput de ambos os artigos. E a segunda, “tempo de efetivo exercício no serviço público”, encontra-se, respectivamente, no inciso III, do art. 6º, da EC nº 41/2003 e no inciso II, do art. 3º, da EC nº 47/2005.

Pois bem, indo direto ao ponto, o texto destas normas, interpretado literal e superficialmente, nos faz entender que, em ambas, o servidor precisa comprovar que ingressou no serviço público até a data nelas estipulada. Quem houver ingressado após a data estabelecida, não poderá ser clientela destas regras. Não fará jus a estas regras de transição. Portanto, em uma primeira análise, parece-nos que o ingresso do servidor deve se dar no serviço público, entendendo-se este conceito em sua forma lata.

Entretanto, a definição da expressão “serviço público” contida no caput das duas regras pode não ser bem o que, aparentemente, compreende-se no primeiro olhar. Pode ter um sentindo bem menos interessante do que a priori se deseja. Aqui, lançando-se um olhar mais apurado, mais comprometido, pode-se descobrir que, em matéria de RPPS, nem tudo que parece, é.

O TCU, por meio da Decisão Plenária TC 025.760/2009-0, bem como o próprio Ministério da Previdência Social, por meio da Orientação Normativa 02/2009, possuem o interessante e, a nosso ver, acertado entendimento de que, na verdade, a expressão “serviço público”, contida no caput do art. 6º da EC nº 41/2003 e do art. 3º da EC nº 47/2005, deve ser interpretada restritivamente, na medida em que estas regras de transição devem ser aplicadas exclusivamente aos servidores que já ocupavam cargos efetivos na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, ao tempo da edição dessas emendas. “Verbis”:

Sumário: REPRESENTAÇÃO. CONCEITO DE SERVIÇO PÚBLICO. ALEGADA CONTROVÉRSIA ENTRE ENTENDIMENTO DESTA CORTE DE CONTAS E ORIENTAÇÃO NORMATIVA DO MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. AUSÊNCIA DA CONTROVÉRSIA SUSCITADA. QUESTÃO JÁ TRATADA, EM SEDE DE CONSULTA, PELO PLENÁRIO DESTE TRIBUNAL. IMPROCEDÊNCIA.

1. O conceito de ‘serviço público’ trazido pelo art. 40, § 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988, pelo inciso III do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, e pelo inciso II do art. 3º da Emenda Constitucional nº 47, de 2005, deve ser entendido de forma ampla, para abranger também as empresas públicas e sociedades de economia mista.

2. Diverso é o conceito de ‘serviço público’ contido no caput do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, e no caput do art. 3º da Emenda Constitucional nº 47, de 2005, que deve ser tomado de forma restrita, uma vez que as regras contidas nesses artigos, ditas de transição, aplicam-se exclusivamente aos servidores ocupantes de cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, ao tempo da edição dessas emendas.

3. A Orientação Normativa MPS/SPS nº 2, de 31 de março de 2009, está em consonância com o entendimento esposado por esta Corte de Contas pelos Acórdãos nº 2636/2008-TCU-Plenário e nº 2229/09-TCU-Plenário.

Portanto, quando se lê a expressão “que tenha ingressado no serviço público até”, contida no caput de ambas as regras, deve-se interpreta-la da seguinte forma: “que tenha ingressado em cargo efetivo até”.

É a titularidade do cargo efetivo que serve como ponto de partida para fins de enquadramento nas regras de transição, pois, conforme assevera o TCU na decisão acima mencionada, ao criarem o novo regramento, as referidas emendas cuidaram não só de tratar da situação daqueles que já tinham adquirido direito até a data da publicação da nova regra, mas também de trazer um alento àqueles que tinham expectativa de direito de se aposentar pelas regras até ali vigentes.

E, por óbvio, podemos concluir que somente os servidores públicos ocupantes de cargos efetivos na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, tinham a expectativa de direito de se aposentarem com base nas regras então em vigor. De outro lado, os empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, por não titularizarem cargos, não poderiam ter este mesmo direito.

Desta forma, a grande premissa da questão é: só faz jus à regra de transição quem tenha a expectativa de direito de se aposentar pelas regras de aposentadoria então em vigor à época da edição das emendas. Só faz jus à regra de transição quem foi prejudicado com a alteração das regras, tanto do ponto de vista dos critérios de elegibilidade quanto nos de cálculo.  

Por certo, somente os servidores que, naquele momento, titularizavam cargo efetivos, poderiam ter suas expectativas frustradas em face do surgimento das Emendas Constitucionais 20/98 e 41/03. Eram eles os segurados do RPPS à época. Em alguns entes federados, os titulares de cargos exclusivamente comissionados até contribuíam para o RPPS, mas passaram a integrar o RGPS, com a edição da EC nº 20/98, permanecendo no RPPS somente os titulares de cargos efetivos e vitalícios.

E para reforçar o presente entendimento, o MPS, por meio da Orientação Normativa nº 02/2009, em seu at. 70, estabeleceu que, na fixação da data de ingresso no serviço público, para fins de verificação do direito de opção pelas regras que tratam os arts. 6º da EC nº 41/03 e 3º da EC nº 47/05, quando o servidor tiver ocupado, sem interrupção, sucessivos cargos na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, em qualquer dos entes federativos, será considerada a data da investidura mais remota dentre as ininterruptas.

Ora, vejam só, a norma é bastante clara em asseverar que, para fins de enquadramento nas regras de transição aqui estudadas, levar-se-á em conta a data de investidura em cargo efetivo. Sempre em cargo efetivo. E dentre todas as investiduras em cargo efetivo, porventura existentes, deve-se adotar a mais remota, a mais distante, caso o servidor tenha exercido vários cargos ininterruptamente.

A conclusão é lógica, é clara. A expressão serviço público, contida no caput das duas regras de transição, deve ser interpretada de forma restrita. Deve ser considerada como ingresso em cargo efetivo, já que este tem definição mais restritiva do que a de serviço público. Este, salvo melhor juízo, foi o objetivo do legislador, no que pese ele ter dificultado nossa vida ao adotar no texto do caput a expressão “serviço público”. Deveria ter feito como fez com o caput do art. 2º da EC nº 41/2003, quando adotou, com todas as tintas, a expressão “ingresso em cargo efetivo”.

Serviço público possui um conceito muito mais amplo do que o de cargo efetivo. No serviço público, lato sensu, seja na administração direta ou indireta, deparamo-nos com os mais variados cargos, das mais variadas atribuições e natureza: cargos efetivos, cargos em comissão, empregos públicos, funções, cargos temporários etc.

E o agravamento deste grande imbróglio tem lugar na confusão hermenêutica que se faz entre as expressões: “serviço público” contida no caput destas regras de transição; e “serviço público” contida nos incisos III e II das mesmas regras.

No caput, indaga-se sobre a data de ingresso no serviço público. Já nos incisos, indaga-se do cumprimento de um período mínimo de efetivo exercício no serviço público. No art. 6º da EC nº 41/03, o inciso III exige que o servidor tenha 20 anos de efetivo exercício no serviço público. Já no art. 3º da EC nº 47/05, o inciso II exige que o servidor tenha cumprido 25 anos de efetivo exercício no serviço público.

O MPS, objetivando pontuar e esclarecer a definição da expressão “efetivo exercício de serviço público”, cujo cumprimento é exigido nos incisos II e III das regras de transição, editou a Orientação Normativa 02/2009, que, em seu art. 2º, VIII, a conceitua da seguinte forma: “tempo de efetivo exercício no serviço público: é o tempo de exercício de cargo, função ou emprego público, ainda que descontínuo, na Administração direta, indireta, autárquica ou fundacional de qualquer dos entes federativos”.

Percebam que aqui, a norma autoriza que, para fins de cumprimento de tempo de efetivo exercício no serviço público, vale qualquer cargo exercido na administração direta ou indireta, seja emprego público, cargo em comissão, cargo temporário, função etc. Aqui, o conceito é mais amplo do que o estabelecido no caput das duas regras de transição ora analisadas.

Destarte, por amor à melhor exegese, é necessário que façamos a distinção entre os dois significados que a expressão “serviço público” tem nas regras de transição dos arts. 6º da EC nº 41/03 e 3º da EC nº 47/05. No caput, serviço público deve ser interpretado restritivamente, como sendo cargo efetivo titularizado na administração direta. Nos incisos, serviço público pode e deve ser interpretado em acepção mais ampla, abrangendo cargos e empregos, seja na administração direta ou indireta.

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Desta forma, é de crucial importância não confundir estas duas definições, pois este acerto é fundamental para a fixação do direito de aposentadoria por uma das duas regras de transição aqui tratadas.

A celeuma nasce quando o interprete, equivocadamente, compreende que ambas as definições não possuem diferenças. Ele entende que serviço público é serviço público, independente do real sentido que o legislador quis emprestar à norma. E, desta forma, quando se sabe que o MPS definiu a expressão “serviço público” de forma mais ampla, nos incisos III e II das regras de transição, contemplando o efetivo exercício em cargo ou emprego, seja na administração direita ou indireta, tem-se a falsa impressão de que esta definição também pode ser agregada ao caput dos arts. 6º e 3º.

Dessa forma, não há contradição em se interpretar a mesma expressão em sentidos diversos, pois estão topograficamente inseridas no artigo em posições diferentes (caput e incisos) com sentidos e finalidades bem distintas uma da outra.

Como bem assenta o TCU em seu julgado, quando examinados conjuntamente todas as regras aqui apresentadas, elas reproduzem, de maneira inequívoca, o entendimento de que se pode outorgar ao termo “serviço público”’, um sentido amplo ou restrito, a depender da situação de fato e de direito que se examina.

A controvérsia é mais aparente do que real, pois, como bem salienta o TCU nos fundamentos da Decisão Plenária TC 025.760/2009-0, e com a qual concordamos, o conceito de “serviço público” trazido pelos incisos III e II dos artigos 6º da EC nº 41/03 e 3º da EC nº 47/05, deve ser entendido de forma ampla, para abranger também os titulares de empregos públicos em empresas públicas e sociedades de economia mista, diferentemente do conceito de “serviço público” contido no caput do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, e no caput do art. 3º da Emenda Constitucional nº 47, de 2005, que deve ser tomado de forma restrita, para alcançar apenas os que titularizavam cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, à época das mudanças.

É óbvio que o tempo de serviço prestado em empresa pública e sociedade de economia mista de qualquer ente da federação pode ser considerado tanto para efeito de computar tempo de contribuição para fins de aposentadoria, quanto para cumprir a exigência de tempo de efetivo exercício no serviço público contida nos incisos das regras de transição.

Entretanto, o serviço prestado em empresa pública e sociedade de economia mista à época em que o servidor titularizava emprego público ou cargo de natureza precária não pode servir para atender à exigência contida no caput dos artigos 6º e 3º, pois estes, por sua própria natureza e missão, só podem acudir a quem poderia, à época, se aposentar pelas regras até então em vigor.

As regras de transição só podem servir a quem teve frustrada sua expectativa de se aposentar nas regras que existiam no momento anterior à edição das emendas constitucionais que reformaram a aposentadoria do servidor público. Neste caso, estamos nos referindo, exclusivamente, aos servidores que titularizavam cargos efetivos antes destas alterações.

Desta forma, o empregado público de empresa pública ou sociedade de economia mista, que depois passou a tutilarizar um cargo efetivo na administração direita por meio de concurso público, só terá direito às regras de transição dos artigos 6º da EC nº 41/2003 e 3ºda EC nº 47/2005 se a investidura neste cargo efetivo tiver ocorrido, respectivamente, até o dia 31/12/2003 e 16/12/1998. Portanto, a data de ingresso no emprego público, na administração indireta, mesmo que anterior àquelas datas, não tem o condão de assegurar ao servidor o direito de se aposentar com as benesses das regras de transição.

A data de ingresso para fins de enquadramento em regra de transição deve ser no serviço público stricto sensu (cargo efetivo) e não no serviço público lato sensu.

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Sobre o autor
Alex Sertão

Professor de RPPS.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SERTÃO, Alex. Data de ingresso no serviço público ou data de ingresso em cargo efetivo: qual a diferença para fins de enquadramento nas regras de transição?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4707, 21 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/49171. Acesso em: 23 nov. 2024.

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