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Inovações da Lei nº 10.748/03:

a possibilidade do trabalho voluntário remunerado

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O intuito do presente artigo é atualizar e/ou complementar o exposto em artigo [1] veiculado no site Jus Navigandi em novembro de 2002, que visou comentar a Lei nº 9.608/98 reguladora do trabalho voluntário no Brasil.

Isto porque em 22 de outubro de 2003, foi publicada a Lei nº 10.748, que além de criar o Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego para os Jovens - PNPE, introduziu o art. 3º - A na já citada Lei nº 9.608/98.

A novidade da nova lei é que agora abre-se a possibilidade do trabalhador voluntário receber uma pequena remuneração que a lei denominou de "auxílio financeiro".

Repare que a situação é diferente da inicialmente prevista no art. 3º da Lei nº 9.608/98. Por este dispositivo legal o trabalho era realmente voluntário havendo apenas a previsão do trabalhador voluntário ser ressarcido pelas despesas comprovadamente realizadas no desempenho das suas atividades, desde que haja a devida autorização da entidade para quem foi prestado o serviço voluntário.

O auxílio financeiro introduzido pela nova lei não tem caráter de ressarcimento devendo, no entanto, ser limitado ao montante de R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais) e a um período máximo de seis meses para cada voluntário. Por certo, o legislador definiu este período máximo de seis meses com intuito não só de permitir que outros voluntários possam usufruir do benefício, como também evitar a perpetuação da remuneração de um trabalhador voluntário o que seria - além de uma contradição terminológica - fraude à legislação trabalhista.

O comentado auxílio financeiro poderá ser pago por órgão, entidade pública ou entidades privadas sem fins lucrativos através do repasse de recursos da União, estipulados mediante convênio. Em relação às entidades privadas sem fins lucrativos, cumpre ressaltar que, para ofertar auxílio financeiro aos seus voluntários, devem estar previamente cadastradas no Ministério do Trabalho e Emprego podendo fazê-lo com recursos próprios, se tiverem condições econômicas para tanto.

A lei ainda sinaliza, orienta (daí a utilização no texto legal da expressão "preferencialmente") que o custeio de auxílio financeiro para os voluntários, através de recursos da União seja destinado:

a)aos jovens egressos de unidades prisionais ou que estejam cumprindo medidas sócio-educativas;

b)a grupos específicos de jovens trabalhadores submetidos a maiores taxas de desemprego.

Por fim, o prestador de serviço voluntário, para fazer jus ao auxílio em comento, deve ainda preencher, concomitantemente, os seguintes requisitos:

c)ter idade entre dezesseis a vinte e quatro anos;

d)ser integrante de família [2] com renda mensal per capita de até meio salário mínimo;

e)não ter nenhum parente até o terceiro grau,consangüíneo ou afim, trabalhando na entidade para a qual prestem serviço voluntário bem como aqueles beneficiados pelo Programa Nacional de Estímulo ao Primeiro Emprego – PNPE.

Estas são, em síntese, as modificações introduzidas pela Lei nº 10.748/03 na regulamentação do trabalho voluntário. Mister ressaltar que o auxílio financeiro acima mencionado, não possui natureza salarial, não caracterizando vínculo empregatício, nem gerando obrigação de cunho previdenciário. Isto, se forem cumpridos, de fato e de direito, os requisitos estipulados pela inovação legal e obedecido os ditames da Lei nº 9.608/98 - notadamente a existência do termo de adesão – sob pena da possibilidade de restar configurado o vínculo empregatício diante do desvirtuamento da relação de trabalho voluntário.

Fora do âmbito jurídico, necessário frisar que a inovação legal pode gerar nos jovens (como visto, o voluntário a ser beneficiado com o auxílio financeiro deve ter, dentre outros requisitos, idade entre dezesseis e vinte e quatro anos) um falso comprometimento com a instituição. De se notar que, em tempos de crise e desemprego, a contrapartida financeira seduz e pode levar o engajamento "voluntário" de pessoas nem tão "voluntárias" assim.

Neste contexto, a fim de resguardar a idéia central do voluntariado; vale dizer: o sentimento de solidariedade e a importância de se sentir socialmente útil independentemente de benefício financeiro, acreditamos que os órgãos e entidades devem não só fazer um trabalho de conscientização, mas também, procurar estabelecer critérios internos a fim de selecionar os beneficiários da ajuda econômica, visando, desta forma, evitar a propagação de voluntários casuísticos identificados com o "auxílio financeiro", porém indiferentes aos objetivos e princípios da instituição.


Notas

1 Trata-se do artigo intitulado: "A regulamentação do trabalho voluntário no Brasil. Breve análise da Lei nº 9.608/98". Jus Navigandi, Teresina, a. 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=3530>.

2 O § 4º do art. 3º-A da Lei no 9.608/98 cuidou de definir família, para os efeitos da referida lei como a unidade nuclear, eventualmente ampliada por outros indivíduos que com ela possuam laços de parentesco, que forme um grupo doméstico, vivendo sob o mesmo teto e mantendo sua economia pela contribuição de seus membros.

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Sobre o autor
Bruno de Aquino Parreira Xavier

advogado e consultor cooperativista no Rio de Janeiro

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

XAVIER, Bruno Aquino Parreira. Inovações da Lei nº 10.748/03:: a possibilidade do trabalho voluntário remunerado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 255, 19 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4973. Acesso em: 16 abr. 2024.

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