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Influência da publicidade na relação de consumo.

Aspectos jurídicos

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PUBLICIDADE ABUSIVA

Como a publicidade enganosa, a publicidade abusiva também esta prevista no Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Seção III, artigo 37, § 2º, que assim prescreve: "É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança."

De acordo com o princípio da correção, estudado anteriormente, a publicidade além de verdadeira tem de ser correta, ou seja, a publicidade tem de respeitar os valores sociais e éticos morais. Segundo Antônio Carlos Alencar, em matéria publicada ao site Jus navegandi:

"O direito, enquanto conjunto de normas destinadas a disciplinar o convívio do homem em sociedade, porque visa ao bem-comum e ao alcance do que é justo e correto, abriga valores fundamentais de eqüidade, de justiça, além de se inspirar nos mais áureos postulados da ética e da moral. É a definição de Celso: "O direito é a realização prática do bem comum e da distribuição igual da justiça": Jus est ars boni et aequi. Conseguintemente, a fonte primária do direito, a lei, é a expressão de valores indisponíveis para a sociedade, como se visualiza no preâmbulo da Constituição Federal. Essa consideração dos ideais consagrados no preâmbulo da Carta Magna deita raízes na própria idéia de poder constituinte (como aquele que registra as regras invioláveis de uma ordenação social) e de Constituição, em sentido material, como a expressão das forças e dos princípios basilares de uma comunidade humana. Os meios de comunicação e a publicidade devem ajustar-se a esses parâmetros superiores, aos valores éticos e sociais da pessoa e da família (art. 221, IV, Constituição Federal de 1988). Assim, fica vedada a difusão de mensagens publicitárias ofensivas a esses cânones. Eis a origem da proibição da publicidade considerada abusiva, que é aquela que incite a violência, a discriminação, a exploração do medo, que corrompa a integridade infantil ou os valores ambientais, ou que ameace a saúde e a segurança (art. 37, § 2o., CDC)" [43].

Deve-se não apenas se preocupar com a mensagem que está sendo transmitida, mais também como está sendo veiculada, isto é, a forma como vai ser passada a publicidade aos consumidores, como a mente deste público alvo vai reagir. É importante que seja lembrado mais uma vez que a publicidade é uma arma perigosa.

Muitas das vezes esta técnica de despertar o lado compulsivo consumista das pessoas, não respeita os valores éticos, morais e culturais para ‘empurrar’ serviços e produtos, e mais grave ainda aproveita da inocência das crianças e de pessoas com baixa capacidade crítica.

A intenção do legislador foi diminuir dentro do possível estas abusividades. Através do código foram elencados determinados valores que de maneira alguma devem ser contrariados, chegando inclusive à esfera criminal se possível.

O que vem mais uma vez a ser discutido é a questão do protecionismo ao consumidor versus a liberdade de comunicação e expressão do pensamento. Em relação a hierarquia de normas todos são previstos na Carta Magna, em prol do consumidor, o artigo 220, II, e § 4º da Constituição Federal Brasileira, trata especificamente da proteção contra a abusividade da publicidade. Ademais, deve-se destacar que não estamos lidando com a liberdade de comunicação e expressão de pensamento, mais sim com uma caracterizada técnica de venda. Paulo Vasconcelos Jacobina quanto ao controle da abusividade da publicidade, acrescenta que:

"O controle da abusividade da publicidade decorre, aliás, de imposição constitucional, constante no artigo 220, II, e § 4º da Lei Maior. Ali, exige-se que a lei estabeleça os meios que garantam a possibilidade, à pessoa e à família, de se defenderem da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meioambiente. Outrossim, o § 4º restringe a propaganda dos produtos ali elencados (tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias) e o art. 221 garante que programação das emissoras de rádio e televisão atenderá ao princípio do respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família. Tudo isso, combinado com o princípio da defesa do consumidor, previsto em diversas passagens da Constituição (ver art. 5º, XXXII, e art. 170, V), dão a necessária fundamentação a tal controle. É preciso lembrar que não existe, no estado de Direito, liberdade fora ou acima do direito. A liberdade é sempre exercida dentro dos limites jurídicos. Se a publicidade não pode se conter dentro dos limites do ordenamento jurídico democrático, há algo errado com a publicidade, não com o ordenamento jurídico". (44)

O que já foi prescrito no código, mas que é gravemente já respaldado na Carta Magna (art. 3º, IV, da Lei Maior, de que é objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, inclusive de cunho religioso, de orientação sexual, política ou profissional), é a condenação a discriminação, que obteve uma ênfase a título de publicidade através do CDC vedando a publicidade que discrimina o ser humano de qualquer modo ou maneira.

Um outro aspecto é a questão da publicidade que incite à violência. Podemos citar alguns tipos como a violência do homem contra outro homem, homem contra animais e a própria violência do homem contra bens, inclusive públicos. Tem-se violência como agressividade. Diariamente aparecem anúncios publicitários ligados a agressões, lutas, morte e guerra. Fábio Ulhoa cita o exemplo:

"um fabricante de armas não pode promover o seu produto reforçando a ideologia da violência como solução de conflitos sociais, ainda que uma publicidade com esse caráter dirigida a certos segmentos da população pudesse representar, no seu caso específico, uma solução satisfatória do ponto de vista psicológico". (45)

Há ainda previsão quanto às publicidades que exploram o medo e a superstição. É vedado a publicidade que para vender seu produto ou serviço se utilize do medo e da superstição do consumidor. A intenção do legislador foi com a preocupação de que a publicidade veiculada crie um estado de pânico no consumidor para que este num estado de insanidade influenciado pelo anúncio adquira tal produto. Outro aspecto precavido pelo código, é impedir que a publicidade explore algum temor pré-existente, resultante de alguma catástrofe, epidemia natural etc.. Jacobina faz uma ressalva:

"É óbvio, no entanto, que determinados produtos têm, por natureza, a destinação de prevenir ou remediar situações calamitosas ou decorrentes de fenômenos que podem incutir medo. Cintos de segurança, coletes salva-vidas, ou até mesmo preservativos, em tempos de AIDS. Demonstrar os riscos a que estão expostos os consumidores que não utilizam esses produtos não é explorar o medo, desde que não se ultrapasse as fronteiras do educacional". (46)

No que se refere à exploração da superstição, é necessário que o anunciante afirme que o produto/serviço possui algo mágico, miraculoso ou até mesmo sobrenatural, o que não é verdade.

A questão ambiental tão discutida em diversos ramos jurídicos, também está prevista no que concerne à publicidade, sendo considerado abusivo o meio publicitário que de uma forma ou de outra agrida o meio ambiente.

Intrínseco no princípio da não abusividade, há o princípio da não ofensividade da publicidade. Manifestado no final do § 2º do artigo 37 do CDC, é notório que a publicidade capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à saúde ou à segurança, é vedada sendo assim considerada abusiva. Benjamin lembra ainda que o Código de Auto-regulamentação Publicitária traz disposição semelhante em seu art. 33. De extrema relevância afirmar que quando se trata de uma criança vítima de abusividade a gravidade é ainda maior.

Todos somos vulneráveis como consumidor, as crianças além de vulneráveis são hipossuficientes em grau maior. Deve-se estar atento para o fato de que atualmente um dos principais alvos das empresas são as crianças. Os anúncios aproveitam-se da imaturidade, inocência e ignorância das crianças que de modo direto ou indiretamente acabam iludidos pela mensagem publicitária.

Uma das técnicas é a utilização das próprias crianças em comerciais para melhor persuadir, pois estas possuem os mesmos referenciais, a mesma espontaneidade, numa mesma sintonia. Antônio Herman de Vasconcelos Benjamin, se manifesta entendendo que:

"... tal modalidade publicitária não pode exortar diretamente a criança a comprar um produto ou serviço; não deve encorajar a criança a persuadir seus pais ou qualquer outro adulto (...); não pode explorar a confiança especial que a criança tem em seus pais, professores etc.; as crianças que aparecem nos anúncios não podem se comportar de modo inconsistente com o comportamento natural de outras da mesma idade". (47)

A publicidade de cigarros vem sendo a grande causadora de repercussões, em vista da ameaça à saúde pública. Inicialmente foi tentado disciplinar a publicidade tabagista através da Lei Murad, Lei nº 9.294 de 15 de setembro de 1996 (no anexo). A lei teve o intuito de tornar em vigor o art. 220, § 4º, da Constituição Federal. Porém, apesar da intenção a Lei Murad só veio a legalizar os abusos das empresas fabricantes de cigarro, que apenas obtiveram restrição no horário de veiculação de seus anúncios. Estes horários que foram permitidos, com certeza não existiria melhor para atingir os consumidores em potencial, ou seja os jovens. O que é mais reflexo do lobby da indústria do fumo, do que preocupação com o bem-estar da população. Agrava-se mais ainda no caso dos jovens, consumidores em potencial, que são iludidos e estimulados com as belas paisagens e os prazeres de consumir o cigarro, através de anúncios de alto poder persuasivo e de falsidade, desde que sobejamente conhecidos os males causados pelo hábito de fumar.

Depois de tantas polêmicas devido à Lei Murad, em 27 de setembro de 2000, o Congresso Nacional aprovou a Lei 10.167(no anexo), a Lei Serra. Apesar de muitas resistências dos mais variados tipos a Lei veio para limitar as excessivas liberdades que a Lei Murad permitia, especificamente os artigos 2º, 3º e 9º, acrescentando ainda um novo artigo o 3º - B.

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Nos estudos de Antônio Herman Benjamin:

"... a nova redação do art. 9º da Lei Murad, o anunciante sujeita-se a triplo regime jurídico de proteção do interesse público. São três óticas diferenciadas, mas relacionadas, que levam em conta a existência de bens jurídicos distintos":

-como o consumidor, real ou potencial, do produto (CDC);

-como usuário do espaço público (legislação de telecomunicações);

-como pessoa humana e família (Lei nº9.294/96).

ou seja, um anúncio, ainda que em conformidade com os parâmetros da Lei nº 9.294/96, pode a vir ser considerado enganoso ou abusivo, por desrespeito ao CDC e ao espírito da norma constitucional. De outra parte, o dispositivo legal quer dizer que uma conduta ilícita pode dar ensejo a mais de uma atuação do poder de polícia, tantos quantos forem às esferas de valores jurídicos legalmente tutelados. Por um mesmo ato, o infrator pode ser punido por violação dos deveres do CDC, na legislação de telecomunicações e da Lei Murad, nem caracterize bis in idem" [48].

A publicidade é uma arma que tem o poder de influenciar pensamentos, valores, comportamentos e modificar condutas. Deve ser controlada quanto ao seu eventual caráter abusivo, sob pena de ameaça à própria sociedade e aos valores que são o alicerce dela, aos quais os anunciantes devem respeitar, em nome da própria estabilidade jurídico-social vigente, tutelada pela Lei Maior, sob pena de responsabilidade.


PUBLICIDADE COMPARATIVA

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor não tratou da Publicidade Comparativa, isto é, o código não vedou este tipo de publicidade tão utilizada no Estados Unidos da América. Apenas trata de forma genérica a publicidade, que seja qual for o modo, tem que respeitar seus princípios, principalmente o da veracidade e o da não-abusividade.

A Publicidade Comparativa é a publicidade na qual os anunciantes comparam seus produtos. Estas comparações devem ser feitas através dos elementos essenciais e verificáveis do produto ou serviço, ou seja, o conteúdo desta forma de publicidade tem de ser absolutamente objetivo, não se admitindo a comparação que seja excessivamente geral. [49]

Há uma tendência na admissão da Publicidade Comparativa de forma objetiva, como já afirmado. Sendo inadmissível a abusividade e enganosidade, mais principalmente a publicidade comparativa sobre características subjetivas.

O CONAR, em sua autoregulamentação prever a publicidade comparativa através de seu artigo 32, este artigo dispõe das condições que devem ser observadas para que se possa utilizar a comparação entre características objetivas dos serviços e produtos a serem anunciados, como já mencionado. Os princípios e limites são osseguintes:

"a. seu objetivo maior seja o esclarecimento, se não mesmo a defesa do consumidor;

b. tenha por princípio básico a objetividade na comparação, posto que dados subjetivos, de fundo psicológico ou emocional, não constituem uma base válida de comparação perante o consumidorconsumidor;

c. a comparação alegada ou realizada seja passível de comprovação;

d. em se tratando de bens de consumo a comparação seja feita com modelos fabricados no mesmo ano, sendo condenável o confronto entre produtos de épocas diferentes, a menos que se trate de referência para demonstrar evolução, o que, nesse caso, deve sercaracterizado;

e. não se estabeleça confusão entre produtos e marcasconcorrentes;

f. não se caracterize concorrência desleal, denegrimento à imagem do produto ou à marca de outra empresa;

g. não se utilize injustificadamente a imagem corporativa ou o prestígio de terceiros;

h. quando se fizer uma comparação entre produtos cujo preço não é de igual nível, tal circunstância deve ser claramente indicada peloanúncio". (50)

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Sobre o autor
Marcus Vinicius Fernandes Andrade da Silva

advogado em São Paulo (SP), mestrando em Direitos Difusos e Coletivos pela PUC/SP, especialista em Direito das Relações de Consumo pela PUC/SP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade. Influência da publicidade na relação de consumo.: Aspectos jurídicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 261, 25 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4982. Acesso em: 29 mar. 2024.

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