Usucapião antecipado por abandono familiar.

O papel político-social do programa Minha Casa Minha Vida no que tange ao direito a moradia

Leia nesta página:

Sabe-se que a usucapião é uma das maneiras de aquisição de propriedade, desde que preenchidos os requisitos necessários para tanto. Entretanto, vale ressaltar que o exercício desta prerrogativa é controverso em certas situações.

INTRODUÇÃO

Tendo em vista que a usucapião familiar é uma forma de proteção dos bens do ex-conjuge e sua respectiva família, em casos de abandono familiar, é de extrema relevância dissertar sobre as possibilidades e impossibilidades do direito em questão. Entretanto, esta 

prerrogativa da mulher ou homem abandonado que detém da posse ininterrupta de 2 (dois) anos de imóvel inferior a 250 metros quadrados, é bastante polêmica, tendo em vista que o prazo de usucapião é consideravelmente inferior do que qualquer outro tratado pelo Código Civil ou até mesmo pela Constituição Federal, quando trata do usucapião urbano (art. 183, CF), no qual detém o prazo de 5 (cinco) anos.

Ademais, é relevante dissertar sobre o resgate histórico do instituto da usucapião e como se dera a sua evolução, ou seja, sua flexibilização na concessão da propriedade imóvel: desde sua origem quando a Lei das XII Tábuas passou a existir entre a sociedade na época, quanto a confusão dos institutos da praescriptio longi com a usucapio. A resolução da questão deu-se na época de Justiniano, no qual juntou os dois institutos, fazendo-os em um só: o instituto da usucapião. Entretanto, os seus requisitos eram diferentes se comparados aos dias de hoje. Uma questão bem diferenciada, era quanto aos sujeitos que poderiam usucapir a coisa, seja ela móvel ou imóvel. Esta questão será dissertada com mais profundidade no tópico referente ao tema. No mais, será dissertado quanto a evolução da nomeclatura do referido instituto, de acordo com a promulgação das leis e da opinião doutrinária, tendo em vista que houvera bastante controvérsia sobre qual gênero que deveria ser falado, “a” usucapião ou “o” usucapião.

 Os requisitos para a obtenção do direito de usucapir o imóvel através do abandono familiar serão dissertados, quais sejam: o tempo de posse, o imóvel que tem que ser urbano e restrito a 250 m², o fato de a propriedade ter sido dividida com ex-cônjuge ou ex-companheiro, bem como a contagem do prazo prescricional, para a partir disso, expor suas características e a sua natureza jurídica. Seguindo nessa esteira, será feita a remissão da perda de propriedade adquirida pelo programa Minha Casa Minha Vida, que será relatado com mais amplitude em tópico próprio, onde será dissertado os requisitos para as famílias adquirirem um imóvel, como também o seu influxo colorário no âmbito político-social.

No mais, o programa Minha casa, Minha vida tem dado oportunidade do direito à moradia a diversas famílias nas quais não possuem renda mensal capaz de adquirir um imóvel. Desta forma, uma vez obtida a propriedade através do referido programa, pretende-se discutir acerca da (im)possibilidade do ex-companheiro ou ex-conjuge de  usucapir o imóvel, por conta do configurado abandono do lar, elencando as ferrenhas críticas feitas pela doutrina sobre o surgimento dessa nova modalidade de usucapião. Deve-se lembrar que os direitos infringidos pela pessoa que abandonou em decorrência da perca de propriedade advinda do usucapião serão diversos, tendo o direito à moradia como exemplo.

1. RESGATE HISTÓRICO DA USUCAPIÃO: Evolução da flexibilização da aquisição da propriedade

Sabe-se que o instituto usucapião é uma forma de aquisição de propriedade através da posse mansa e pacífica por certo período, determinado em lei. Não apenas isto, mas também deverão as circunstâncias desta posse coincidir com os requisitos definido em lei, como por exemplo, o fim que aquela posse tem para o possuidor: seja para moradia, trabalho etc.

No entanto, este instituto nem sempre se apresentou desta maneira. As primeiras aparições do usucapião se dera na Lei das XII Tábuas, 455 a.C., na qual representava uma forma de aquisição de propriedade através da posse continuada de coisas móveis ou imóveis por um período de 1 (um) a 2 (dois) anos (FARIAS, 2011, p. 320). Pedro Avvad (2012, p. 93) afirma que na aquisição de propriedade, a posse da coisa móvel ou imóvel, tanto nos dias de hoje, quanto no período do direito romano, deveria haver a representação não apenas do usus e do capere, mas também do fator tempus, no qual exercia o papel de demonstrar que não bastava apenas o uso da coisa, seja móvel ou imóvel, para adquirir a propriedade, deveria haver um tempo mínimo de uso, no qual era desempenhado com o uso de um a dois anos, como já dito anteriormente.

Não obstante, a Lei das XII Tábuas consagrava a prerrogativa de adquirir a propriedade pela posse continuada das coisas apenas para o cidadão romano – Direito Quiritário –, não podendo ser aplicada para os peregrinos nem aos imóveis provinciais. Desta forma, os romanos podiam reivindicar bens perante os estrangeiros quando bem entendessem (FARIAS, 2011, p. 320). Pedro Avvad (2012, p. 93) explica que com o tempo passara a existir mais um tipo de ação, que posteriormente fora“mais tarde, através de éditos dos Governadores das províncias e do Pretor peregrino, a posse de peregrino ou de imóvel provincial, com justo título e boa-fé, passou a merecer uma ação que foi denominada praescriptio longi temporis […] dando ensejo a surgimento da ação antes mesmo da existência do direito”.

No entanto, com o tempo o instituto da praescriptio longi temporis passou a se confundir com a usucapio. O primeiro deriva de capere (tomar) e de usus (uso), se caracterizando por adquirir a propriedade pelo uso utilizada estritamente para os cidadãos romanos. O último se caracterizava como uma forma de defesa, surgida depois do instituto da usucapio. A pessoa que obtinha um terreno provincial põe certo tempo poderia adquirir a propriedade dele por forma de defesa, em decorrência do seu uso por um tempo determinado  – 10 anos para residentes da mesma cidade e 20 anos para residentes de cidades diferentes –(longi temporis praescriptio), sendo prerrogativa tanto dos cidadãos romanos quanto dos estrangeiros. (VENOSA, 2007, p. 182-183). Em decorrência desta confusão dos institutos, Justiniano, em 528 d.C, fundiu o instituto em apenas um só, o denominando de usucapião.

O gênero do vocábulo bastou-se por ser deveras controverso. A palavra usucapião advém do original latino usucapionem, no qual tem por ser gênero feminino. A legislação do direito Romano (corpus iuris civilis), por exemplo, fora toda publicitada com o instituto no feminino. No mais, todos os idiomas derivados do latim também utilizam tal palavra neste gênero, quais sejam: francês, espanhol, italiano e o próprio português (AVVAD, 2012, p. 94). O Código de 1916 adotara o gênero do instituto na forma masculina, pelo fato do uso da palavra no feminino soar mal ao ouvido e ter sido tornado desprezada (AVVAD, 2012, p. 95). No entanto, no Código de 2002, Pedro Elias Avvad (2012, p. 95), explica:

O novo Código Civil, ao modificar o gênero do vocábulo adotando a forma feminina (Livro III, Título III, Capítulo II, Seção I - Da Usucapião), acabou reavivando o debato, em desafio à vox populi que, pelo menos, no Brasil, consagrou o uso no masculino. Ressalte-se, a bem da verdade, que nesse mister os redatores do novo estatuto não só orientaram-se pelas regras da etimologia da palavra como seguirem a forma utilizada em todos as demais línguas que recepcionaram o termo.

Outrossim, deve-se deixar claro que na prática jurídica tanto a nomenclatura na forma masculina quanto feminina mostra-se correta, podendo o jurista ou profissional do direito utilizá-la da forma que achar mais conveniente.

O instituto do usucapião fora designado inicialmente como prescrição aquisitiva, por dar uma prerrogativa a alguém após decorrido certo período de tempo. No entanto, o Brasil adotou a nomenclatura alemã, qual seja em afirmar que o “usucapião é um direito distinto, com características próprias, não se confundindo com o instituto da prescrição” (AVVAD, 2012, p. 94). Logo, não se deve titular usucapião como forma de prescrição, já que tal instituto nada mais é do que uma forma de aquisição de propriedade pela posse ininterrupta, mansa e pacífica, respeitando os requisitos determinados em lei, por um certo período de tempo. Os requisitos gerais e específicos da temática do presente paper serão relatados no próximo tópico com mais ressalvas.

2 USUCAPIÃO POR ABANDONO FAMILIAR: Requisitos, características e natureza jurídica.

É interessante trazer à baila as espécies de usucapião existentes no Código Civil, para só assim entrar no mérito da usucapião por abandono familiar:

O Código Civil, em relação à propriedade imóvel, consagra as seguintes modalidades de usucapião de bem imóvel: a) usucapião ordinária (art. 1.242 do CC); b) usucapião extraordinária (art. 1.238 do CC); c) usucapião especial rural (art. 1.239 do CC, já prevista anteriormente na Constituição Federal); e d) usucapião especial urbana (art. 1.240 do CC, também constante do Texto Maior). Além dessas formas de usucapião, serão analisadas a usucapião indígena (Lei 6.001/1973- Estatuto do Índio) e a usucapião coletiva (Lei 10.257/2001- Estatuto da Cidade). (TARTUCE.2011,p.76)

Segundo o genial doutrinador Flávio Tartuce, a usucapião “garante a estabilidade da propriedade, fixando um prazo, além do qual não se pode mais levantar dúvidas a respeito de ausência ou vícios do título de posse. De certo modo, a função social da propriedade acaba sendo atendida por meio da usucapião”(2011,p.176).

Antes de adentrar nos requisitos da usucapião por abandono familiar, é interessante também expor os requisitos necessários para a usucapião de forma geral, que foram muito bem delineados pelo jurista Silvio Rodrigues:

  1. Res habilis- é mister que se trate de coisa que não esteja fora de comércio e não seja bem público; B) Titulus- a lei condiciona a usucapião ao fato de o possuidor ter justo título, isto é, ser portador de documento capaz de transferir-lhe o domínio, se proviesse do verdadeiro dono; C) Fides- necessário também se faz esteja o prescribente de boa-fé. E ele o está quando ignora o vício, ou obstáculo, que lhe impede a aquisição da coisa ou do direito possuído; D) Possessio- é pressuposto da usucapião a posse mansa e pacífica, pois, de acordo com sua própria definição, trata-se de modo de adquirir o domínio pela posse, ou seja, pela atribuição de juridicidade a uma simples relação de fato; E) Tempus- a usucapião se consuma dentro de um período fixado na lei. E o legislador fixa livremente tal prazo, tendo em vista não só a proteção do interessa particular como a do interesse coletivo; F) Sentença Judicial- determina a lei que o usucapiente, adquirindo o domínio pela posse mansa e pacífica do imóvel, pode requerer ao juiz que assim o declare por sentença.(2003, p.110-113)

Analisando este inovador instituto do direito civil, é possível vislumbrar que sua natureza jurídica está mais ligada ao direito de família do que ao direito imobiliário propriamente dito. Esta nova modalidade de usucapião foi incluída pela Lei nº 12.424, de 2011, prevista no Código Civil no art. 1.240-A, que possui a seguinte redação: “Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural”

Diante do dispositivo supracitado, cabe elencar os requisitos para a caracterização deste novo modo de aquisição de propriedade. O primeiro seria a respeito do prazo necessário de exercício da posse, que é inferior a “qualquer prazo de prescrição aquisitiva mencionado no Código Civil de 2002. Basta comparar com os prazos de usucapião constitucional, que são os casos de menor prazo de usucapião sobre imóveis e nos quais a prescrição aquisitiva ocorre em 05 anos” (WESENDONCK. s/d, p.6). Um outro requisito seria de que o imóvel precisa ser restrito a um imóvel urbano de até 250 metros quadrados, levando em consideração também que “a lei não contempla as situações de aquisição de imóvel rural e também não excepciona aquelas situações em que um imóvel de 250m² pode ter valor elevado” (WESENDONCK. s/d, p.7). Seguindo nessa esteira temos o terceiro requisito, que determina que a propriedade deve ser dividida com ex-cônjuge ou ex-companheiro, ou seja, é necessário que o imóvel seja de propriedade do casal, portanto “o instituto deve ser analisado com cautela porque ao mesmo tempo em que irá reconhecer a propriedade de um dos cônjuges ou companheiros irá determinar a perda da propriedade do outro num prazo muito curto” (WESENDONCK. s/d,p.8).

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O abandono do lar por parte de um dos conviventes – certamente este é o requisito mais polêmico da usucapião pro-família. Afinal a EC n. 66/10 revogou todas as disposições contidas em normas infraconstitucionais alusivas à separação e às causas da separação, como por exemplo, o artigo 1573 do Código Civil que elencava dentre os motivos caracterizadores da impossibilidade de comunhão de vida, “o abandono voluntário do lar conjugal” (inciso IV). Com a nova redação conferida ao art. 226, par. 6º, da CF – “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”-, não apenas são superados os prazos estabelecidos para o divórcio, como é acolhido o princípio da ruptura em substituição ao princípio da culpa, preservando-se a vida privada do casal. (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p. 465)

 Por fim e não menos importante, temos um requisito que talvez não tenha ficado tão claro, qual seja o início da contagem do prazo prescricional, que se dá a partir do abandono familiar, assim sendo, “o fato que autoriza o reconhecimento de usucapião de bem comum a um dos condôminos é o abandono da posse, porque pode um dos cônjuges se afastar do lar conjugal e continuar exercendo posse, mesmo que indireta sobre o bem.” (WESENDONCK. s/d, p.8). Sintetizando a questão do prazo para dar início a contagem, temos o seguinte entendimento:

O prazo há de iniciar sua contagem sempre após o abandono do lar por um dos consortes, precedida ou coincidente com o fim do relacionamento afetivo. Esta frase não exclui a possibilidade de interrupções do prazo, mas de qualquer forma o prazo só correrá após a separação. É por esta razão que o dispositivo é tão importante para o direito de família, já que seu principal âmbito de discussão será nas ações de partilha de bens vinculados ao divórcio, dissolução de união estável ou herança. Ou seja, a norma há de ser aplicada, mais comumente nas Varas de Família e Sucessões.(AMORIM.s/d, s/p. apud  MARTINS.s/d, p.21)

3 “MINHA CASA MINHA VIDA”: O PROGRAMA E SUA UTILIDADE POLÍTICO-SOCIAL.

O programa “Minha Casa, Minha Vida” é uma oportunidade oferecida pelo governo, por meio de instituições financeiras oficiais federais, em disponibilizar a possibilidade das famílias de baixa renda (com renda mensal até R$ 1.600,00) adquirir um imóvel, seja casa ou apartamento. Tal programa, foi disponibilizado pelo governo a partir do ano de 2009, com o fim de criar mecanismos de incentivo de aquisição de 1 milhão de novas unidades habitacionais para as famílias nas quais possuem uma renda bruta mensal de R$ 5.000,00. (CAIXA, s/d, s/p). O site do governo explica:

O Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV – Recursos FAR é um programa do Governo Federal, gerido pelo Ministério das Cidades e operacionalizado pela CAIXA, que consiste em aquisição de terreno e construção ou requalificação de imóveis contratados como empreendimentos habitacionais em regime de condomínio ou loteamento, consituídos de apartamentos ou casas que depois de concluídos são alienados às famílias que possuem renda familiar mensal de até R$ 1.600,00 (CAIXA, s/d, s/p).

De acordo com a lei 12.424/11, as famílias poderão adquirir o imóvel oferecido pelo programa desde que preencham os seguintes requisitos:

Art. 1º  O Programa Minha Casa, Minha Vida - PMCMV tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais).  Art. 3º  Para a indicação dos beneficiários do PMCMV, deverão ser observados os seguintes requisitos: I - comprovação de que o interessado integra família com renda mensal de até R$ 4.650,00 (quatro mil, seiscentos e cinquenta reais); II - faixas de renda definidas pelo Poder Executivo federal para cada uma das modalidades de operações; III - prioridade de atendimento às famílias residentes em áreas de risco ou insalubres ou que tenham sido desabrigadas; IV - prioridade de atendimento às famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; e V - prioridade de atendimento às famílias de que façam parte pessoas com deficiência. (grifos nossos).

O programa funciona da seguinte maneira: o governo Estadual ou Municipal assina o termo de adesão junto à Caixa Econômica Federal. A partir desse momento, esta instituição financeira passa a receber propostas de aquisição de terreno, produção ou reconstrução de empreendimentos para análise juntamente com a documentação necessária, presente no documento de “ relação de documentos e formulários jurídicos”. Após esta análise, se procedente, a Caixa Econômica Federal contrata a operação de obras e acompanha a execução das obras pela Construtora. Deve-se deixar claro que os termos de adesão assinados pelo governo tem prqazo de validade e que, caso a construção não seja realizada a tempo, deverá ser feito outro, seguindo todo processo novamente (CAIXA, s/d, s/p)

Sobre a questão do valor da construção dos imóveis que são oferecidos no programa, estes são estabelecidos na portaria nº 168 de 2013. O valor irá depender ao tipo do imóvel: casa ou apartamento; no mais, irá depender também do número de habitantes da região, sendo o valor diferenciado para cada Estado no qual a cobertura é estabelecida. O Estado do Maranhão por exemplo, bem como o Estado de Alagoas e de Pernambuco, a construção dos imóveis para apartamento na capital ou na respectiva região metropolitana é de R$ 50.000,00, quanto para a construção de casas é de R$ 49.000,00. Entretanto, nos municípios com a população maior ou igual a 50 mil habitantes, a situação orçamentária apresenta-se de maneira diferente: a construção tanto de apartamento quanto casas é no teto de R$ 45.000,00. Por fim, nos municípios com população menor do que 50 mil habitantes, a construção deverá se limitar ao valor de R$ 43.000,00 para casas, visto que a construção de apartamentos não se aplica. (BRASIL. Portaria 168/13)

A função político social do “Minha Casa, Minha Vida” é percebida nas diretrizes gerais, presentes na protaria de nº 168, do ano de 2013. Este programa tem por suas diretrizes gerais em promover a melhoria da qualidade de vida das famílias beneficiadas; fazer uma provisão habitacional em consonância com os planos diretores munucipais, fazendo a garantia da sustentabilidade social, economica e ambiental aos projetos de maneira integrada a outras intervenções e programas da União e demais esferas de governo; ademais, tem por diretriz a criaçpão de novos postos de trabalho diretos e indiretos, visto que o programa os oferece na construções civis dos imóveis; além disso, fazer promoção de condições de acessibilidade a todas as áreas públicas de uso comum, fazendo uma mobilidade para pessoas que possuem deficiencia, bem como para os idosos (art. 73 da lei 11.977/09) (BRASIL. Portaria 168/13).

4 A (IM)POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO FAMILIAR: Casos de propriedades adquiridas pelo programa “Minha Casa, Minha Vida”.

Como já é sabido, o usucapião por abandono familiar foi implementado no ordenamento jurídico por meio da Lei 12.424, que por sua vez, também regula o programa Minha Casa Minha Vida, elaborado pelo Governo Federal, no intuito de garantir o direito à moradia de pessoas que atendam a determinados requisitos que já foram supra delineados. Entretanto, aqui reside uma problemática, qual seja o fato da referida lei ter se originado a partir da conversão da Medida Provisória nº 514/10.

Cabe enfatizar que as medidas provisórias podem ser adotadas pelo Presidente da República deste que atendidos os requisitos de relevância e urgência para a criação da mesma. Diante disso, “contesta-se, justamente, a urgência e a relevância da criação de mais uma modalidade de usucapião; se questiona se a usucapião familiar não deveria ter sido submetida ao Congresso Nacional pelo procedimento legislativo ordinário”. (MARTINS. s/d,p.23).

De acordo com Helena Azeredo Orselli, a medida provisória não é um instrumento ideal para a criação da nova modalidade da usucapião. A autora expõe ainda outra crítica em relação à criação do instituto, alegando que:

[...] critica-se o fato de uma lei, que regulamenta um programa de incentivo à construção e aquisição de imóvel habitacional por pessoas de determinada renda mensal, ser o instrumento para o estabelecimento de uma nova modalidade de usucapião, escondida em meio a muitos artigos de leis que tratam da regulamentação fundiária e de referido programa habitacional. Isso porque, como se sabe, as medidas provisórias trancam a pauta das Casas Legislativas que compõem o Congresso Nacional, de modo que a sua conversão em lei ocorre usualmente sob muita pressão e sem muita discussão. Será que houve a atenção devida por parte dos legisladores para o fato de que ali se criava uma nova forma de usucapir?(ORSELI.2011/2012, p.129-138 apud  MARTINS.s/d, p.23).

Assim sendo, talvez não tenha sido uma decisão razoável, ter instituído uma nova modalidade de usucapião, que sem dúvida, criaria consequências diretas para milhares de famílias brasileiras que se encaixam nessas características. Na realidade, parece ter sido uma tentativa de implementar, sob qualquer argumento, um novo tipo de usucapião, sem ter instrumentos técnicos e jurídicos para vislumbrar que a conversão em lei da referida medida provisória, poderia acarretar efeitos irreversíveis. Seguindo nessa esteira, “seria possível arguir vício de constitucionalidade formal já que o acréscimo do artigo 1.240-A do Código Civil é proveniente de medida provisória sem sequer indício de urgência ou relevância” (AMORIM. s/d, s/p. apud MARTINS. s/d, p.21).

Além da crítica a respeito da eventual inconstitucionalidade da lei, a criação desse novo instituto é vista com maus olhos por boa parte da doutrina, haja vista que a mesma funciona como uma sanção a ser aplicada contra aquele que não quer mais dar continuidade a relação afetiva, sem sequer analisar o motivo do abandono do lar, ou seja:

Seria, assim, uma forma de pressionar a pessoa que não mais reside no lar a realizar a partilha dos bens adquiridos na constância matrimonial. Com isso, tal instituto acaba por reabrir, em campo diverso (às vezes apresentam-se em vara cível matérias de competência de vara de família), como matéria incidental dos autos da usucapião, a discussão dos motivos da dissolução da entidade familiar, o que se mostraria como um retrocesso ante a Emenda Constitucional n 66/10. (SOUZA, Marcelo Agamenon Goes de; MANOEL, Vinicius. Usucapião “familiar” ou usucapião especial urbana por abandono de lar. Consulex, 2012, n. 373, p. 55).

Ademais, “no atual estágio evolutivo do direito de família, com menores intervenções obrigatórias do Estado nas relações afetivas, a lei 14.424/2011 promove verdadeiro retrocesso acerca do debate da causa, ou dos motivos, do fim do relacionamento[...]”(BORGES.2011,s/p).

CONCLUSÃO

Levando em consideração a função social da propriedade, é notório que o usucapião é um importantíssimo meio de aquisição de propriedade, e isso, como fora explanado no primeiro tópico, não é de hoje, uma vez que desde a Lei das XII Tábuas, até hoje o usucapião exerceu papel fundamental no que diz respeito ao direito fundamental à moradia (art. 6º da Constituição Federal). Seguindo nessa esteira se mostrou imprescindível delinear os requisitos necessários para aplicação deste instituto, visto que caso não estejam satisfeitos os referidos requisitos, não seria possível usucapir um imóvel. Ato contínuo, temos a extrema relevância político-social do programa “Minha Casa Minha Vida”, que assegura o direito a propriedade daqueles que se encaixam no perfil das pessoas que estão aptas a receber o imóvel do governo. Diante do que fora supracitado, é evidente que não seria adequado a aplicação deste instituto nos casos de propriedades adquiridas por meio do programa “Minha Casa Minha Vida”, haja vista que seria uma injustiça retirar a propriedade daquele que foi sorteado para receber o imóvel e que atendeu todos os requisitos necessários, pelo simples fato deste ter decidido abandonar o lar por algum motivo, motivo este que só diz respeito a ele e mais ninguém.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Novo Código Civil. Lei nº 10.403 de 10 de janeiro de 2002. Aprova o novo código civil brasileiro. Brasília, DF, 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 29/10/13

BRASIL. Lei nº  12.424, de 16 de junho de 2011. Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 jun. 2011. Seção 1, Página 2.

BRASIL. Portaria nº 168, de 12 de abril de 2013. Dispõe sobre as diretrizes gerais para aquisição e alienação de imóveis com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial - FAR, no âmbito do Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU, integrante do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV.

BRASIL. Emenda Constitucional n.o 66, de 13 de julho de 2010. Dá nova redação ao §6o do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 de jul. de 2010. Mesa da Câmara dos Deputados. Mesa do Senado Federal.

CAIXA. Minha Casa, Minha Vida: Saiba mais. Disponível em: <http://www1.caixa.gov.br/gov/gov_social/municipal/programas_habitacao/pmcmv/saiba_mais.asp>. Acesso em 02 de nov. De 2013.

BORGES NETO, Arnaldo de Lima. A nova usucapião e o abandono do lar. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 94, nov 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10749&revista_caderno=14.> Acesso em 29/10/13.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: reais, 8. ed. Salvador: Juspodvm, 2011.

ORSELLI, Helena Azeredo. Análise Crítica da Usucapião Especial Urbana por Abandono. Revista Síntese de Direito de Família. v. 13, n. 69, p. 129-138, dez./jan. 2011/2012.

RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Direito das coisas. Vol. 5, 28 ed. Rev e atual. De acordo com o novo Código Civil – São Paulo: Saraiva, 2003.

SILVA MARTINS, Fernanda da. A usucapião especial urbana por abandono do lar conjugal: a volta da culpa?. Disponível em: http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2012_1/fernanda_martins.pdf  Acesso em: 29/10/13

SOUZA, Marcelo Agamenon Goes de ; MANOEL,Vinicius. Usucapião “familiar” ou usucapião especial urbana por abandono de lar. Consulex, Brasília, DF, ano XVI, n. 373, p. 54-57, ago. 2012

TARTUCE, Fávio. Manual de direito civil: volume único. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2011.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: direitos reais. 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007.

WESENDONCK, Tula. Usucapião familiar: uma forma de solução de conflitos no Direito de Família ou (re)criação de outros? Disponível em: <http://www.idb-fdul.com/uploaded/files/RIDB_001_0573_0604.pdf> Acesso em 29/10/13

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Mayara Fanjas Colares

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