O estupro de vulnerável no atual Código Penal Brasileiro

25/06/2016 às 14:29
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Análise da presunção de violência no estupro de vulnerável no CPB. O posicionamento atual dos Tribunais Superiores é da presunção ser absoluta, entretanto, devido às mudanças sociais, alguns fatores levam a crer que esta presunção deve ser relativa.

 

 

 

 

Resumo

O presente trabalho tem o objetivo de analisar a presunção de violência no estupro de vulnerável na legislação brasileira. Atualmente, o posicionamento dos Tribunais Superiores é da presunção ser absoluta, entretanto, com a evolução da sociedade contemporânea, alguns fatores levam a crer que esta presunção deve ser relativa. Em princípio faz-se uma análise do tipo e suas respectivas alterações legais advindas no ano de 2009, em seguida são expostas as ponderações quanto a presunção absoluta; na sequência vem os contrapontos da presunção ser relativa e ao final, tem-se a opinião do autor sobre a discussão em tela, isso finaliza todo o trabalho.

Palavras-chave: Estupro, vulnerável, violência, presunção, absoluta e relativa.

 

Abstract

The present academic work aims to analyze the presumption of violence in vulnerable rape by Brazilian law. Currently, the positioning of the Superior Courts is the presumption be absolute, however, with the evolution of contemporary society, some factors suggest that this presumption must be relative. In principle it makes an analysis of the type and their resulting legal changes in 2009, then the weights as the absolute presumption are exposed; following is the counterpoints of the presumption be relative and at the end, there is the author's opinion under this discussion, this ends all the work.

Keywords: Rape, vulnerable, violence, presumption, absolute and relative.

 

 

  1. INTRODUÇÃO

 

O tema a ser trabalhado no presente estudo é o Estupro de Vulnerável e visa contribuir com uma discussão acadêmica acerca da presunção da violência neste tipo de crime ser considerada absoluta ou relativa.

O estupro de vulnerável é o nome do crime previsto no art. 217-A do Código Penal Brasileiro, no capítulo II (Dos Crimes Sexuais contra Vulnerável), sob o título VI – Dos Crimes contra a Dignidade Sexual.

A relevância do tema repousa não somente em razão da nova redação deste tipo penal, mas principalmente quanto às ponderações se a presunção de violência no estupro de vulnerável deve ser absoluta ou relativizada. Várias são as decisões que defendem a presunção absoluta, entretanto a temática não está pacificada com excelentes posicionamentos reforçando a presunção ser relativa.

Desta maneira, justifica analisar o tema levando-se em consideração os principais argumentos favoráveis e contrários, com o intuito de buscar um entendimento uníssono e adequado à atual realidade social, que em muito se difere daquela de meados do século XX, quando o Decreto-lei nº 2.848 entrou em vigor.

A metodologia utilizada para o desenvolvimento do presente trabalho foi a pesquisa bibliográfica nas obras de alguns doutrinadores pátrios, conjuntamente à pesquisa nos sites dos tribunais de Justiça Estaduais, Tribunais superiores, em especial as decisões das Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Suprema Corte Brasileira, isto é, o Supremo Tribunal Federal (STF), para verificar, assim, os entendimentos doutrinários e os recentes julgados.

 

 

  1. ALTERAÇÕES E ANÁLISES DO TIPO PENAL

 

Antes de adentrar no tema especificamente, faz-se mister estudar as alterações mais recentes ocorridas no tipo penal, para só então, após estar familiarizado com estas mudanças, poder analisar o tipo de maneira mais detalhada.

Neste diapasão, reportemo-nos ao ano de 2009, mais precisamente com a publicação da lei nº 12.015/2009. Devido a esta lei muitos artigos do antigo Título “Dos crimes contra os costumes” foram modificados, inclusive o próprio título desta parte especial do Código Penal que passou a vigorar desde então como “Dos Crimes contra a Dignidade Sexual”. Tal modificação não se tratou de uma simples mudança textual ou mera vaidade legislativa, mas sim, foi o resultado de um clamor doutrinário e jurisprudencial em face de uma norma penal advinda da década de 40, época da publicação da CPB (Código Penal Brasileiro), que já não se mostrava condizente à realidade social do século XXI.

Com o advento da supracitada lei que alterou o Título VI do Código Penal, o artigo referente ao estupro de vulnerável passou a ter a seguinte redação:

 

Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§ 2º (VETADO).

§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4º Se da conduta resulta morte: Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

 

Ao analisar o tipo penal do art. 217-A, alguns pontos já chamam a atenção do leitor mais atento se comparar o verbo do tipo penal do estupro, para com o do estupro de vulnerável. No Crime previsto no art. 213 (estupro) a conduta está baseada no verbo “constranger”, isto é, forçar, coagir com violência ou grave ameaça à vítima a praticar algum tipo de ato libidinoso. Já no estupro de vulnerável, a conduta é simplesmente o “ter”, ou seja, subentende-se que a prática da conjunção carnal ou de qualquer ato libidinoso, não precisa ser necessariamente forçada, basta que o agente apenas tenha a conduta com o menor de 14 anos para que o crime já fique configurado.

Outro ponto se refere ao tipo penal não conter na sua redação do caput a violência ou grave ameaça, que induz a entender que acaso ocorra, haverá um concurso material de crimes do art. 217-A, com o art. 129 (lesões corporais se foi com violência leve), ou ainda, com o art. 146 (Constrangimento ilegal se foi com ameaça).

Quanto aos sujeitos do crime, em relação ao ativo, tem-se um tipo de crime comum, isto é, aquele que pode ser praticado por qualquer pessoa. Não se exigindo nenhum tipo de especificidade quanto ao autor do delito.

Entretanto, no tocante ao sujeito passivo, trata-se de um crime específico, o qual a vítima tem que ser menor de 14 anos (art.217-A, caput), alguém que por enfermidade ou deficiência mental não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou alguém que por qualquer outra causa não possa oferecer resistência (art. 217-A, §1º). Nesta última característica do “não ter como resistir”, prepondera na doutrina que o agente deve ter sido o causador da impossibilidade de oferecer resistência da vítima, para que possa ser penalizado pela conduta.

Ressalte-se que o presente trabalho irá abordar apenas os vulneráveis em razão da idade, isto é, menores de 14 anos.

O tipo possui ainda novos dois parágrafos contendo agravantes, que foram acrescidos pela lei 12.015/2009, quais sejam, o §§ 3º e 4º, que elencam, respectivamente, reclusão de 10 a 20 anos, se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave; e reclusão de 12 a 30 anos, se da conduta resulta a morte da vítima, os quais por serem bastante auto-explicativos, dispensa maiores análises.

 

 

  1. PRESUNÇÃO ABSOLUTA

 

A lei mencionada alhures alterou, como já dito, vários artigos do antigo Título do Código Penal “Dos crimes contra os costumes”, um deles a ser citado nesta oportunidade é o art. 224, que tratava da presunção da violência, vejamos a antiga redação do artigo antes de sua revogação ocorrida em 2009:

 

Art. 224 Presume-se a violência, se a vítima:

Não é maior de catorze anos;

 

Masson, analisando o referido artigo e a lei supracitada, assim aduz:

 

Com as inovações trazidas pela Lei 12.015/2009, a vulnerabilidade da vítima substituiu a presunção de violência (violência ficta ou indutiva), antigamente prevista no art. 224 do CP. Não houve, portanto, abolitio criminis das figuras penais anteriormente cometidas mediante violência presumida. No Capítulo II, o CP tem em vista a integridade de determinados indivíduos, fragilizados em face da pouca idade ou de condições específicas, resguardando-as do início antecipado ou abusivo na vida sexual. Para a caracterização destes crimes é irrelevante o dissenso da vítima. A lei despreza o consentimento dos vulneráveis, pois estabeleceu critérios para concluir pela ausência de vontade penalmente relevante emanada de tais pessoas. O aperfeiçoamento dos delitos independe do emprego de violência, grave ameaça ou fraude. O art. 217-A do CP apresenta os vulneráveis para fins sexuais. (MASSON, 2014)

 

Apesar da transposição normativa, antes localizada no art. 224, alínea “a”, hoje inserida no texto do art. 217-A, vê-se que a ideia da presunção da violência no crime de estupro ser absoluta foi mantida. Isso significa que pouco importa no caso concerto a intenção do agressor, o consenso da vítima ou a situação, que a presunção de violência do crime continuará sendo a mesma. O objetivo do legislador é salvaguardar as chamadas “pessoas em formação”, que naturalmente pela pouca idade, ainda não têm o necessário desenvolvimento físico e mental para ter relações sexuais ou praticar quaisquer atos libidinosos.

Neste sentido, mais especificamente quanto à idade, a explicação se encontra abalizada na Exposição de Motivos da Parte Especial do CP, com redução do limite de idade, o Projeto atende a evidência de um fato social contemporâneo, qual seja a precocidade no conhecimento dos fatos sexuais. Vejamos:

 

O fundamento da ficção legal da violência, no caso dos adolescentes, e a innocentia consilii do sujeito passivo, ou seja, a sua completa insciência em relação aos fatos sexuais, de modo que não se pode dar valor algum ao seu consentimento. Ora, na época atual, seria abstrair hipocritamente a realidade o negar-se que uma pessoa de 14(quatorze) anos completos já tem uma noção teórica, bastante exata, dos segredos da vida sexual e do risco que corre se se presta à lascívia de outrem.

 

Como visto na citação acima, o entendimento em defesa da presunção ser absoluta é de que o consentimento do menor para a prática do ato sexual é irrelevante, pois o menor em razão da sua imatura formação, seria uma pessoa desprovida de oferecer resistência, por conseguinte, fácil de ser ludibriada. Assim, não se deve admitir prova em contrário quando se verificar um caso de estupro deste vulnerável em nenhum caso.

Seguindo este claro raciocínio, cita-se o entendimento do STJ:

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a anterior experiência sexual ou o consentimento da vítima menor de 14 (quatorze) anos são irrelevantes para a configuração do delito de estupro, devendo a presunção de violência, antes disciplinada no artigo 224, alínea “a”, do Código Penal, ser considerada de natureza absoluta. (HC 224174, 5ª turma, rel. Jorge Mussi, 18.10.2012, v.u.)

Outro argumento, dos que defendem esta presunção ser absoluta, está vinculada ao sentido inibidor da norma. Neste caso, não seria direcionada à criança e ao adolescente em si, mas precisamente àqueles adultos que de alguma maneira buscam nesse tipo de público satisfazer a sua lascívia.

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Dessa maneira, surge a figura da pedofilia, que apesar de não ser diretamente considerada um crime no Brasil, por ser classificada como uma doença, tem sua repressão em alguns dispositivos legais, tanto do Código Penal, quanto do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, lei 8.069/90. Portar o devido transtorno de preferência sexual não é crime, mas sim, as ações do pedófilo para conseguir o seu intento.

 

  1. PRESUNÇÃO RELATIVA

 

Conforme apresentado no tópico anterior, sendo a presunção de violência absoluta, reduz para os magistrados o poder do livre convencimento, visto que, mesmo que tenham pensamento divergente do analisado nos autos do processo, não poderão aplicar uma medida diferente, pois se assim o fizerem, estarão indo de encontro com a legislação. O atual redação do artigo 217-A não permite qualquer tipo de interpretação teleológica, pois o núcleo do tipo penal é por demais taxativo.

Em excelente artigo publicado no site Âmbito Juídico.com.br, Neemias Moretti, traz o seguinte comentário:

As presunções absolutas (juris et de jure) são aquelas que não admitem prova em contrário e constituem em uma rachadura na regra, indo contra o principio do livre convencimento do juiz. Estas presunções retiram do juiz toda e qualquer possibilidade de valoração da prova, não permitindo o estabelecimento da verdade real, o que se busca no processo. Já as presunções relativas (juris tantum) são aquelas que admitem prova em contrário, ficando ao arbítrio do livre convencimento, para que se cheque a verdade real, ou verdade processualmente valida.

Vejamos o exemplo, consoante o atual dispositivo do Código Penal, deve-se considerar estuprador de vulnerável, tanto o conhecido namorado de uma menina de 13 anos que pratica consensualmente sexo oral nela; quanto um sujeito desconhecido que constrange com violência, uma outra menina de 13 anos,  e pratica conjunção carnal nela. Seria isso justo? Seria essa a intenção do legislador em equiparar tais situações? Certamente que não.

Apesar do atual entendimento dos Tribunais Superiores acerca da presunção do crime de Estupro de Vulnerável ser absoluta, não se pode olvidar os posicionamentos contrários entendendo que aquela presunção de violência pode ser relativa.

Esta relatividade acima defendida, mesmo após a entrada em vigor da lei 12.015/2009, não deve ser entendida como mero posicionamento antagônico, isto é, ser contra sem fundamentos, mas sim, perceber que com a natural evolução da sociedade, não se deve analisar que o mesmo adolescente de hoje tem o mesmo perfil sexual daquele de 2009, e menos ainda, daquele da década de 40.

Mas porque o adolescente de hoje é tão diferente daquele de outrora? Várias são as razões que podem ser elencadas para embasar essa diferença, no tocante ao cunho sexual que é relacionado ao tema do presente trabalho, vejamos as principais delas: novas tecnologias, influência da mídia, desestruturação familiar e aparência física.

As novas tecnologias, de maneira inconteste, alteram a vida das pessoas de diversas formas, sejam na comunicação, no transporte, na convivência social e, inclusive, nos relacionamentos íntimos. A Internet é a força motriz para várias mudanças, dentro dessa ideia de novas tecnologias. Nesse raciocínio temos os Smartphones, laptops, Tablets, juntamente com os mais variados softwares, tais como: Whatsapp, Facebook, Instagram, dentre outros.

Essas novas tecnologias facilitam a disseminação do apelo sexual através de vídeos, textos, fotos, áudios, pois tramitam de maneira fácil, livre e aberta para qualquer pessoa na Rede. É muito comum encontrar crianças e adolescentes com um celular, e pelo que já foi explicitado, fica claro que eles estão sendo atingidos, ou pelo menos, tendo acesso a todas as formas de apelos sexuais. Esse acesso precoce, e desorientado muitas vezes, atiça a sensualidade e estimulam à prática do sexo antecipadamente.

A influência da mídia, com destaque para a Televisão, atua diretamente na mudança comportamental das crianças e adolescentes frente ao tema: sexo. E o pior, de maneira prejudicial a estas pessoas que se encontram na fase inicial de personalidade. Não é difícil visualizar em novelas, filmes e programas de auditório a banalidade do sexo, sem haver o menor filtro quanto aos dias e horários da transmissão. Muito recorrentes são as cenas de programas televisivos trazendo prostituição, exposição de partes íntimas dos atores, relações homossexuais etc.

A desestruturação familiar, juntamente a ideia das novas famílias, também influenciam para esse contato antecipado por parte dos menores de 14 anos com a temática sexual. As exigências da vida moderna quanto ao trabalho, estudo e diversas outras atribuições na busca para manter o sustento familiar, têm feito com que os pais, de maneira geral, fiquem menos tempo com os seus filhos, em consequência, acaba prejudicado o acompanhamento educacional, inclusive, quanto à educação sexual.

Essa “ausência” educacional dos pais para com os filhos, abre espaço para que outros meios de informação sexual sejam procurados nessa falta de orientação parental. Neste aspecto, as naturais curiosidades sexuais são supridas pelos sites eróticos, salas virtuais de bate-papo, como também pela escola, colegas, televisão, mensagens pelo celular etc.

Ainda na esfera das novas famílias, tem-se percebido o aumento nas relações homoafetivas, o que desencadeia em mais apelos sexuais para os menores de 14 anos, desta feita com caráter homoxessual. O elevado número de relacionamentos de casais do mesmo sexo, juntamente com protestos para a legalização destas uniões em diversos países, passeatas de “orgulho gay” etc, são uma prova desta mudança comportamental da sociedade.

Por fim, temos a questão da compleição e aparência física. É inegável e visível que os menores de 14 anos de hoje são bem diferentes daqueles de décadas atrás. A feição destes adolescentes com aparência de pessoas mais velhas pode ser justificada por alguns fatores:

  • A prática mais disseminada de esportes e acesso fácil a academias de musculação;
  • A ingestão de mais produtos químicos, como anabolizantes, fortificantes, vacinas e hormônios que estimulam o crescimento;
  • A amplitude de tratamentos estéticos tais como implantes de próteses de silicone, prolongamento capilar, cirurgias plásticas, maquiagens etc;
  • A vestimenta indistinta das dos adultos;
  • O acesso desacompanhado dos pais e/ou responsáveis a lugares que servem bebidas alcóolicas como bares, shows e boates.

 

 

  1. CONCLUSÃO

 

Ante todo o exposto é notório que a sociedade contemporânea está bem diferente daquela da década de 40. Por sua vez, as crianças e adolescentes inseridos nesta moderna sociedade também são distintos daqueles de outrora, então, porque o direito penal brasileiro não acompanhar esta evolução?

Apesar do presente entendimento do Superior Tribunal de Justiça, muitas decisões judiciais vêm adotando posições mais coerentes com a realidade social moderna e evitando que pessoas sem índole criminosa sejam presas e tratadas de maneira igual a verdadeiros estupradores e/ou pedófilos. Até porque, como demonstrado alhures em razão do mais antecipado contato com sexo entre as crianças e adolescentes atualmente, muitos desses casos são consensuais, sem qualquer violência, física ou moral.

Como exemplo de decisão judicial, cita-se a ementa da Apelação Crime nº70050072925, Sétima câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Conrado Kurtz de Souza, Julgado em 29/11/2012, que diz:

 

APELAÇÃO. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO de vulnerável. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. MENOR DE 14 ANOS. PRESUNÇÃO RELATIVA.ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA DO RÉU COM BASE NO ART.397, INC. III, DO CPP. INCONFORMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

Caso em que, não obstante a vítima possuísse menos de 14 anos de idade na data dos fatos, revelam os elementos colhidos aos autos a sua evidente maturidade sexual e a liberdade de escolha, razão pela qual, sob os auspícios do princípio da razoabilidade, de assento constitucional, impõe-se a flexibilização do rigor legal, afastando-se a tipicidade da conduta do réu.

APELAÇÃO DESPROVIDA. POR MAIORIA. 

 

É evidente que a intenção do legislador com a redação do atual artigo 217-A do CPB foi salvaguardar aquelas pessoas imaturas em virtude da sua pouca idade e, por muitas vezes, indefesas contra possíveis abusos sexuais que possam vir a sofrer. Entretanto, não podemos olvidar a mudança comportamental e o contato sexual precoce de muitos adolescentes, principalmente,  entre si.

A pedofilia, em todo caso, por ser um transtorno de adultos de ter preferência sexual por aqueles considerados púberes, deve ser penalizada com todos os rigores da lei, inclusive com a presunção de violência absoluta no tocante ao estupro de vulnerável, pois o pedófilo não incorre em erro ao procurar as suas vítimas. Entretanto, não considero equiparável a um adulto pedófilo, um adolescente que pratica sexo consensual com sua namorada, e assim ser representado por estupro de vulnerável. Tampouco um adulto que, incorrendo em erro, acredita estar tendo relações com uma pessoa acima de 14 anos e só depois descobre que a mesma possuía menos idade. Nesta última situação, não nos parece estar presente nem a figura do estuprador, nem a de pedófilo.

Esse é o pensamento que faz suscitar a relativização quanto à presunção de violência no crime de estupro de vulnerável em determinados casos, visto a presunção absoluta não ser a mais adequada em algumas ações judiciais relacionadas ao tema. Deve-se observar cada caso concreto, para não incorrer no risco de generalizar os fatos que poderiam, e devem, ser relativizados quanto à presunção da violência.

Não há se falar, a contrário senso, em relativizar a presunção de violência em todos os casos envolvendo o estupro de vulneráveis, o que também seria um pensamento insensato. A medida mais adequada para por fim a essa celeuma jurídica, em nosso entendimento, seria a tipificação da pedofilia, além de uma nova redação ao art. 217-A, incluindo a consciência do autor da condição de vulnerabilidade da vítima.

 

  1. REFERÊNCIAS

http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/112485661/apelacao-crime-acr-70050072925-rs/inteiro-teor-112485671. Acessado em 21 de outubro de 2015.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acessado em 16 setembro de 2015.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l12015.htm. Acessado em 02 de setembro de 2015.

MASSON, Cleber. Código Penal Comentado. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014.

MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal, Volume 2. 29 ed. São Paulo: Atlas, 2012.

RODRIGUES, Cristiano. Direito Penal – Coleção Saberes do Direito - Parte especial II. São Paulo: Saraiva, 2012.

www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1700. Acessado em 02 de setembro de 2015.

 

 


             

 

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Sobre o autor
Danilo Buarque Couto

Graduando do curso de Direito.

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