A impossibilidade jurídica da redução da maioridade penal

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25/07/2016 às 21:37
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A redução da idade penal encontra argumentos contra e a favor, os quais na maioria das vezes são falhos e deságuam numa discussão irracional, pois não apresentam verdadeiras perspectivas da realidade social.

Introdução

Atualmente, a sociedade brasileira convive com uma onda de violência que está fugindo do controle do Estado. É neste contexto, que se insere a criminalidade juvenil com crimes bárbaros, os quais são noticiados pela imprensa, o que fomenta ainda mais a insegurança na sociedade. Como exemplo, o caso noticiado amplamente pela mídia em novembro de 2003, em que um menor de dezoito anos confessou que matou dois adolescentes, Felipe Silva Caffé e Liana Friedenbach, quando estes acampavam em um parque florestal do Município de Embu-Guaçu, na Grande São Paulo.

Como é sabido, esse panorama que atinge a sociedade brasileira é muito complexo. Porém, a falta de políticas públicas de inserção social, a má distribuição de renda e a falta de investimentos em educação podem ser apontados com conseqüências do aumento da violência urbana, pois gera miséria, desemprego e falta de oportunidades para os jovens.

Neste contexto de aumento da criminalidade que há, entre estudiosos e na opinião pública, os argumentos para a redução da menoridade penal, como alternativa para reverter esse quadro de violência, como se fosse uma solução mágica capaz de devolver a paz social.

O debate, para a redução da idade penal, encontra argumentos contra e a favor, os quais na maioria das vezes são falhos e deságuam numa discussão irracional, pois não apresentam verdadeiras perspectivas da realidade social. Entre os primeiros, como dito, há como argumento que a redução da idade penal seria uma medida para diminuir os altos índices de violência; já quanto aos argumentos contrários

1 - As propostas de Emenda Constitucional com o propósito de reduzir a maioridade penal

A primeira Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que trata da redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos, é a de nº 171/93, de autoria do então Deputado Federal Benedito Domingos.[1]

O autor da referia PEC se baseia no conceito de imputabilidade. Desse modo, justifica a redução da maioridade penal na crença que a idade cronológica não corresponde à idade mental, sobretudo nos dias de hoje, em que a liberdade de imprensa, ausência de censura, liberação sexual, independência prematura dos filhos, consciência política, etc., acabam por capacitar o jovem para o entendimento do que é correto ou não em matéria penal. Por estes motivos, não poderia equiparar o jovem de 16 anos de hoje com os de 1940, quando da promulgação do Código Penal, que delimitou a idade penal aos 18 anos.

1.1 - Justificativas dos que defendem a redução da maioridade penal

A redução da idade da imputabilidade penal tem dividido as opiniões entre aqueles que concordam com a redução da maioridade penal e os que discordam.

Dentre os doutrinadores que defendem a redução da maioridade penal, destaca-se Péricles Gonçalves argumentando que:

“os adolescentes de dezesseis anos que praticam ações qualificadas como delituosas na lei penal têm pleno discernimento, tal qual um adulto devendo por esta razão estar sujeitos ao julgamento e ao apenamento[2]

Mário Portugal Fernandes compartilha do mesmo entendimento para a redução da maioridade penal, argumentando: “os menores infratores não são inocentes vítimas da sociedade é preciso encará-los com olhos de ver, abolindo pieguices, sem concepções retrogradas e desatualizadas”.[3]

Por fim, expomos a posição de Paulo Lúcio Nogueira que afirma:

De nossa parte, temos defendido a redução da imputabilidade penal para dezesseis anos por diversos motivos, mas principalmente pela necessidade de se ajustar a lei à realidade social, pois a redução não atingirá somente os infratores, mas resolverá vários problemas afetos aos menores, e não apenas o problema da criminalidade juvenil que é mínimo em face do número assustador de menores carentes e abandonados. [4]

 Os argumentos apresentados, pelos que defendem a redução da maioridade penal, são falhos, uma vez que a fixação da imputabilidade penal, a partir dos dezoito anos de idade é, uma mera opção de política criminal.

O criminalista Heleno Fragoso se contrapõe, aos que defendem a idéia de que a menoridade reduzida irá diminuir a criminalidade, com muita propriedade:

A criminalidade aumenta, e provavelmente continuará aumentando, porque está ligada a uma estrutura social profundamente injusta e desigual que marginaliza cada vez mais extensa faixa da população, apresentando quantidade alarmante de menores abandonados ou em estado de carência. Enquanto não se atuar nesse ponto será inútil unir como será inútil para os juristas, a elaboração se seus belos sistemas.  [5]

1.2 - Justificativas dos que discordam da redução da maioridade penal

Neste momento, é oportuno apresentar argumentos de autoridades que são contra a redução da imputabilidade penal.

Inicialmente, trazemos a opinião de Antonio Nabor Areias Bulhões[6] que, em depoimento na audiência pública sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, realizada em 10 de novembro de 1999, manifestou-se contrário ao tema da redução da maioridade penal, com distintas palavras:

Sr. Presidente, sras. e srs. Deputados, atenta ao conteúdo da Proposta de Emenda à Constituição nº 171/93 e apensadas, que propõem a redução da maioridade penal para 16 (dezesseis) anos com base no modelo clássico, já superado de discernimento, a Ordem dos Advogados do Brasil manifesta-se pela sua integral rejeição, por inoportunas, inconvenientes, desaconselháveis e, pior colidentes com os princípios a que o Brasil se vincula, nos planos interno e internacional, em tema de responsabilidade e de proteção do adolescente.[7] (grifo nosso)

Destarte, a posição oficial da Ordem dos Advogados do Brasil é de rejeição integral à PEC nº 171/93, pois ela não está de acordo com os princípios a que o Brasil se vincula, nos planos interno e internacional, em tema de responsabilidade e de proteção do adolescente autor de ato infracional.

Fábio Konder Comparato responde de forma coerente quanto à impossibilidade de alteração do art. 228 da Lei Maior:

O menor de 18 anos tem um direito fundamental – e, portanto, irrevogável - a não ser envolvido, como réu, em processos criminais de qualquer espécie, processos esses nos quais o respeito devido à sua condição de hipossuficiência é posto em causa.

Ora, tratando-se como se trata, de um direito fundamental de natureza individual, a sua supressão, ate mesmo por via emenda constitucional, é expressamente vedada pela própria constituição( art. 60, 4, IV). [8](sic) (grifo nosso)

Neste mesmo sentido é a opinião de Dalmo de Abreu Dallari:

Como é evidente, qualquer proposta no sentido de aplicar as leis penais aos menores de 18 anos significará a abolição de seu direito ao tratamento diferenciado, previsto em lei, e por esse motivo será inconstitucional. Essa é a conclusão do ponto de vista jurídico, o que, de certo modo, tornaria desnecessário o exame de outros aspectos.[9] 

Por fim, expomos as palavras de Miguel Reale Júnior, que também é contra a redução da maioridade penal:

Pode-se alterar o Eca, mas sem que se imagine, de forma bastante simples, que a mera redução da imputabilidade penal conduzirá à redução da criminalidade praticada pelo menor. Não é isso. O que ocorrerá é o sacrifício do menor, é sua efetiva degenerescência no meio policial. É isso que vai ocorrer.[10]

Portanto, as Propostas de Emenda Constitucional, que pretendem a redução da maioridade penal, são fruto de equívocos emergentes de movimentos radicais de política criminal, que não vão resolver o problema da delinqüência juvenil.

2 – Argumentos jurídico-constitucionais que impossibilitam a redução da maioridade penal por meio de Emenda Constitucional

2.1 - A extensão dos direitos e garantias individuais conforme a Constituição de 1988

Para que se possa demonstrar as razões de convencimento de que o art. 228, da Constituição Federal de 1988 é uma cláusula pétrea, revela-se conveniente, em primeiro lugar, expor que as garantias individuais não estão apenas elecandas no art 5º da Lei Maior.

Desta forma, tomando como referência o art. 5º, parágrafo 2º da Constituição da República, a qual adota a abertura material dos direitos e garantias individuais[11], constataremos que há previsão de garantia individual expressa no art. 228 da Lei Maior.

A abertura material dos direitos e garantias individuais revela-se através de sua adequação típica constitucional quando:

            a) Decorre do princípio e regimes adotados por nossa Constituição[12];

b) Encontra consonância com Tratados Internacionais de direitos humanos em que o Brasil figura como signatário.[13]

A menoridade penal, conforme se apresenta no art. 228, da Constituição da República, ingressará no elenco dos direitos e garantias individuais, com a imutabilidade constitucional, em obediência ao art. 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Lei Maior, por satisfizer a quaisquer das duas hipóteses trazidas no bojo parágrafo 2º, do art. 5º: A cláusula de abertura material. In verbis:

Art. 5º.

(...)

§ 2º. Os direitos e garantias individuais expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

Assim, este parágrafo nos traz duas certezas. A primeira que a própria Constituição Federal admite que encerra em seu corpo, direitos e garantias individuais e que o rol do art. 5º, não é exaustivo. A segunda, que direitos e garantias concernentes com os princípios da própria Constituição e de Tratados Internacionais firmados pelo Brasil integram o referido rol, mesmo fora de sua lista.

A fim de robustecer os argumentos da abertura material dos direitos e garantias fundamentais, faz-se mister trazer à colação do posicionamento Ives Gandra Martins:

Os direitos e garantias individuais conformam uma norma pétrea. Não são eles apenas os que estão no art. 5º, mas, como determina o parágrafo 2º do mesmo artigo, incluem outros que se espalham pelo texto constitucional e outros que decorrem de implicitude inequívoca. Trata-se, portanto, de um elenco cuja extensão não se encontra em textos constitucionais anteriores. [14]

2.2 - Art. 228 da Constituição Federal: Uma garantia do indivíduo menor de 18 anos

A inimputabilidade penal dos menores de dezoito anos ganhou status constitucional a partir da Constituição de 1988. Essa proteção, ao limite da idade penal, parece ter surgido para impedir a sua supressão, evitando que este assunto fique submetido ao sabor da emoção e ao casuísmo que, por muitas vezes, condiciona o legislador à criação é à modificação das Leis Penais.[15]

Para que se possa demonstrar que a menoridade penal tem natureza de garantia individual do menor de 18 anos, trazemos, em breves considerações, a lição de Canotilho:

(...) o amplo catálogo de direitos fundamentais não esgota o campo constitucional dos direitos fundamentais. Dispersos ao longo da Constituição existem outros direitos fundamentais, vulgarmente chamados direitos fundamentais formalmente constitucionais, mas fora do catálogo. [16]

Pela doutrina de Canotilho, percebe-se que os direitos e garantias individuais estão esparsos na Constituição e não são apenas aqueles tratados no art. 5º, da Lei Maior.

De fato, a menoridade penal tem natureza de garantia individual do menor de 18 anos de não sofrer a sanção penal, a partir de uma decisão de política criminal, pelo legislador constituinte originário, o que põe o Brasil, de acordo com as normas relativas ao sistema protetivo de direitos humanos.

Portanto, o artigo 228 é a garantia da não-responsabilização criminal da pessoa menor de 18 anos, justamente em razão da sua condição pessoal de estar em desenvolvimento físico, mental, espiritual, emocional e social, sendo que, nada mais justo, que esta garantia se aplique aos adolescentes.

Neste momento, podemos afirmar que o legislador originário quis definir, com clareza, os limites da idade penal, em sede constitucional, da mesma forma como tratou de várias questões penais já no art. 5º, quando dispõe acerca dos direitos e garantias individuais. Portanto, se os direitos e garantias fundamentais estão esparsos pelo corpo da Lei Maior, são também cláusulas pétreas, já que o Art. 60, parágrafo 4º, inciso IV, não faz nenhuma restrição mencionando simplesmente “os direitos e garantias individuais”.

Conclui-se, sem dúvidas, que o art. 228 é uma cláusula pétrea, não podendo ser objeto de deliberação pelo Poder Constituinte Derivado, pois é uma garantia individual aos menores de dezoito anos para ficarem fora do âmbito do Direito Penal, da mesma forma que o art. 5º, no seu inciso XLVIII, garante aos cidadãos que não serão aplicadas penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, de caráter perpétuo, de banimento ou cruéis.

2.3 - Posicionamento do Supremo Tribunal Federal quanto à extensão dos direitos e garantias individuais no corpo da Constituição Federal

No propósito de reconhecer a impossibilidade jurídica de se reduzir à maioridade penal por meio de Emenda Constitucional, passamos à análise do julgado do Supremo Tribunal Federal quando examinou a ADIn 939-7/ DF.[17]

A referida Ação Direta de Inconstitucionalidade tinha por objetivo declarar inconstitucional o art. 2°, parágrafo 2° da EC nº 3/93[18] que dispunha o imposto provisório sobre movimentação financeira (IPMF), instituído pela Emenda Constitucional n° 3, de 17/03/1993, e pela Lei Complementar nº 77/93.[19]

Um dos exames era para verificar a incompatibilidade do comando acima em confronto com o art. 60, parágrafo 4°, inciso IV da Constituição da República, figurando como prejudicial de mérito a admissão de que a limitação ao poder de tributar imposta pelo art. 150, inciso III, “b” (Princípio da Anterioridade Tributária), possuía natureza de garantia do indivíduo-contribuinte.

Cabe ressaltar que no julgamento em tela era a primeira vez que uma Emenda à Constituição teve seu mérito apreciado pelo Supremo Tribunal Federal.[20]

O Ministro Relator Sidney Sanches já vislumbrara, de plano, a possibilidade de que há direitos fundamentais fora do catálogo do art 5º, da Lei Maior:

Agora, já ao ensejo do julgamento do mérito, não estou convencido do contrário, sobretudo, depois da leitura dos votos dos eminentes Ministros ILMAR GALVÃO, MARCO AURÉLIO, CARLOS VELLOSO, CELSO DE MELLO, PAULO BROSSARD e NERI DA SILVEIRA, que, mesmo para efeito de medida cautelar de suspensão de cobrança de tributo, em 1993, não deixaram de vislumbrar, desde logo, a violação, quanto a esse ponto, ao princípio da garantia individual do contribuinte, que nem por Emenda Constitucional se pode afrontar, ainda que temporariamente, em face dos referidos §2° do art. 5°, art. 150, III, “b” e 60, parágrafos 4°, inciso IV da Constituição Federal. (grifo nosso)

No voto do Ministro Ilmar Galvão se verifica, em suas palavras, que as cláusulas pétreas, que tem por fundamento os direitos fundamentais, não são exaustivas:

“Acrescento, agora, o entendimento de que a emenda constitucional em foco afrontou, ainda, as cláusulas pétreas, as seguradoras do pacto federativo e dos direitos e garantias individuais [...]” (grifo nosso)

O Ministro Marco Aurélio, na época, defendia também de forma clara e com convicção que outros direitos fundamentais estão espalhados pelo corpo da Carta Política:

Senhor Presidente, em primeiro lugar, registro minha convicção firma e categórica de que não temos como garantias constitucionais apenas o rol do art. 5° da Lei Básica de 1988. Em outros artigos da Carta encontramos, também, princípios e garantias do cidadão, nesse embate diário que trava com o Estado, e o objetivo maior da Constituição é justamente proporcionar uma certa igualação das forças envolvidas – as do Estado e as de cada cidadão considerado de per se. (grifo nosso).

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São bastante oportunas as palavras do Ministro Carlos Velloso ao declarar que o Poder Reformador da Constituição não pode suprimir, suspender e afastar uma garantia individual:

É sabido, hoje, que a doutrina dos direitos fundamentais não compreende, apenas, direitos e garantias individuais, mas, também, direitos e garantias sociais, direitos atinentes à nacionalidade, direitos políticos. Este quadro todo compõe a teoria dos direitos fundamentais. Hoje não falamos apenas em direito individuais, assim direitos de primeira geração. Já falamos em direito de primeira, de segunda, de terceira e até de quarta geração.

O mundo evoluiu e assim também o direito.

[...].

É que, assim procedendo, a Emenda suprime, suspende e afasta garantia do contribuinte, assim garantia individual, intangível à mão do constituinte derivado ou de revisão.

O Ministro Celso Mello reconhece também que há limites para o Estado em não suprimir os direitos fundamentais esculpidos na Constituição:

A norma questionada desconsidera – ante o que prescreve cogentemente, o art. 60, § 4°, IV, da Constituição – o fato de que a anterioridade tributária, traduzindo limitação constitucional ao poder impositivo das pessoas políticas, constituem direito público subjetivo oponível ao Estado pelos contribuintes que dela se beneficiam (grifo nosso).

Dentro dessa perspectiva, o ato normativo em causa efetivamente agride e afronta o regime dos direitos fundamentais dos contribuintes [...].

[...].

Essa norma constitucional, derivada do poder de reforma do Congresso Nacional, acarreta a grave possibilidade de se comprometer pela ação tributante do Poder Público, o exercício desses direitos fundamentais, quaisquer que sejam as múltiplas dimensões em que se projeta e desenvolve o regime das liberdades. (grifo nosso)

O Ministro Paulo Brossard arremata o tema afirmando que o sistema constitucional brasileiro é composto de um complexo de garantias individuais que devem ser preservadas sem exceções:

Sr. Presidente, também entendo que o princípio da anterioridade tem relevo especial em todo sistema constitucional brasileiro. Tenho-o como imanente ao sistema e, além disso, constituem uma das garantias do complexo dos direitos e liberdades individuais, de modo que há de ser preservado [...]. Dir-se-á que ele não é absoluto e que a Constituição abre exceções. É verdade. Quando a Constituição o faz, é preciso respeitar o que ela dispôs, mas dar ensejo ao alargamento dessas exceções em matéria tão importante e que direta ou indiretamente repercute no conjunto dos direitos e garantias e liberdades individuais, é que é perigoso. (grifo nosso)

Por fim, o Ministro Néri da Silveira compartilha do entendimento que há cláusulas pétreas fora do rol elencado no art. 5º da Constituição Federal:

No que concerne ao princípio da anterioridade, considerado pelo Tribunal, ao conceder medida cautelar, para que o IPMF não fosse exigido até 31/12/1993, penso que efetivamente, a disposição sua não aplicação à espécie tributária, conforme previsto na Emenda Constitucional n° 3/1993, art. 2°, fere a cláusula pétrea prevista no art. 60, § 4°, inciso IV, da Lei Maior. (grifo nosso)

Neste momento, é oportuno tecer alguns breves comentários a respeito do tema. A partir desta pesquisa jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, podemos afirmar que a imputabilidade penal é uma garantia do indivíduo menor de 18 anos, amparada pelo manto constitucional, com base na cláusula de abertura material esculpida no parágrafo 2º, art.5º da Constituição Federal.

Portanto, qualquer Emenda Constitucional que tenha por objetivo reduzir a maioridade penal a patamar menor que dezoito anos, restará eivada de vício de inconstitucionalidade, por ser o art. 228 da Lei Maior uma garantia fundamental do indivíduo.

2.4 - Os Tratados Internacionais que garantem a manutenção da menoridade penal

A maioridade penal encontra também fundamento em Tratados Internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. Com a ratificação da Convenção sobre os Direitos da Criança e sua transformação em lei interna, esta passa a fazer parte do sistema de direitos e garantias, por força da cláusula de abertura material do parágrafo 2º do art. 5º, da Constituição Federal, que dispõe:

“Os direitos e garantias individuais expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. [21]

Portanto, a Carta Política de 1988 atribui aos direitos humanos, enunciados em Tratados Internacionais em que a República do Brasil seja parte, hierarquia de norma constitucional, incluindo-os no rol dos direitos e garantias constitucionais, os quais têm aplicabilidade imediata[22], conforme consta no parágrafo 1º do art. 5º da Constituição Federal.

Vale ainda destacar que os direitos humanos consagrados em tratados internacionais, quando incorporados ao ordenamento jurídico interno brasileiro, passam a ser cláusulas pétreas, da mesma forma que são os direitos constitucionalmente consagrados. Assim, esses direitos passam a ser intangíveis, conforme a própria constituição estabelece em seu Art. 60, parágrafo 4º, inciso IV. Sobre o tema, Flávia Piovesan posiciona-se neste sentido:

Por força do art. 5º, § § 1º e 2º, a Carta de 1988 atribui aos direitos enunciados em tratados internacionais hierarquia de norma constitucional, incluindo-os no elenco dos direitos constitucionalmente garantidos, que apresentam aplicabilidade imediata.[23]

Ainda, segundo a mesma autora, a nova carta política do Brasil prioriza dignidade da pessoa humana, como princípio intangível dos direitos e garantias individuais.

“A Carta de 1988 é a primeira Constituição brasileira a elencar o princípio da prevalência dos direitos humanos, como princípio fundamental a reger o Estado brasileiro nas relações internacionais [...].”[24]

De fato, através da cláusula de abertura constitucional, os direitos humanos consagrados em Tratados Internacionais sobre Direitos Humanos em que o Brasil seja parte, passam a ser incorporados ao direito interno brasileiro com status de norma constitucional.

Flávia Piovesan, em outro ponto, é mais abrangente e profunda na análise dos Tratados Internacionais sobre direitos humanos:

Com efeito, a busca do texto em resguardar o valor da dignidade humana é redimensionada na medida em quem enfaticamente, privilegia a temática dos direitos fundamentais. Constata-se, assim, uma nova topografia constitucional, na medida em que o texto de 1988, em seus primeiros capítulos, apresenta avançada Carta de direitos e garantias, elevando-os, inclusive, à cláusula pétrea, o que, mais uma vez, revela a vontade constitucional de priorizar os direitos e as garantias fundamentais. [25]

Destarte, a fixação do limite da maioridade penal em 18 anos foi uma opção de nosso legislador constituinte originário que caminhou na direção de acompanhar a regra estabelecida no sistema internacional de proteção dos direitos humanos. É imutável, desse modo, a fixação da menoridade penal, pois, constituem cláusulas pétreas, nos termos do art. 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Constituição Federal, tanto os direitos e garantias individuais consagrados na Constituição quanto aos que constam em Tratados Internacionais de que o Brasil seja parte.

2.4.1 - A normativa internacional incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro que garante ao Art 228 da Constituição Federal o status de cláusula pétrea

Ao romper definitivamente com a doutrina da situação irregular, até então admitida pelo Código de Menores (Lei 6.697/79), e estabelecer a doutrina de proteção integral, o legislador pátrio agiu de forma coerente com o texto constitucional de 1988 e documentos internacionais.[26]

É nesse sentido que a Constituição Federal de 1988, pela primeira vez na história brasileira, aborda a questão da criança e do adolescente como prioridade absoluta, e a sua proteção é dever da família, da sociedade e do Estado.[27]

A garantia da imutabilidade do art.228, da Lei Maior, é também materializada a partir da incorporação de Tratados e Convenções, especialmente nos seguintes documentos: as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude – Regras de Beijing (Res. 40/33 da Assembléia-Geral, de 29.11.85); as Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil – Diretrizes de Riad (Assembléia-Geral da ONU, novembro/90); bem como As Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade (Assembléia-Geral da ONU, novembro/90).[28]

O espírito e a letra desses documentos internacionais constituem importante fonte de interpretação de que o exegeta do novo Direito não pode prescindir. Eles serviram como base de sustentação dos principais dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente e fundamentaram juridicamente a campanha Criança e Constituinte, efervescente mobilização nacional de entidades da sociedade civil e milhões de crianças, com o objetivo de inserir no texto constitucional os princípios da Declaração dos Direitos da Criança.[29]

Portanto, a normativa internacional sobre o direito infanto-juvenil revolucionou completamente em termos sociais e jurídicos o ordenamento jurídico brasileiro. O conteúdo da doutrina da Proteção Integral está consagrada na Constituição Federal de 1988 e regulamentada especificamente no Estatuto da Criança e do Adolescente.

2.4.2 - O Tribunal Penal Internacional

A partir da Emenda Constitucional nº 45/2004, foi acrescido ao art.5º, parágrafo 4º, in verbis: “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”.

O Tribunal Penal Internacional,[30] que encerra um enorme avanço em defesa dos direitos humanos para processar os grandes crimes contra a humanidade, estabelece a imputabilidade penal, também, em 18 anos, in verbis

Artigo 26
Exclusão da Jurisdição Relativamente a Menores de 18 anos

O Tribunal não terá jurisdição sobre pessoas que, à data da alegada prática do crime, não tenham ainda completado 18 anos de idade.

Se fosse possível admitirmos a redução da menoridade penal para 16 anos, poder-nos - íamos deparar com uma hipótese, no mínimo absurda, de que um jovem brasileiro de 16 anos pudesse receber pena em razão da prática de um pequeno delito, mas esse mesmo jovem se manteria irresponsável junto ao Tribunal Penal Internacional, se fosse o responsável por crime de genocídio.

Vê-se, desta forma, que a fixação da maioridade penal aos 18 anos, encontra abrigo nas próprias vigas mestras de nossa Constituição, ao adotar o Princípio da Prevalência dos Direitos Humanos para reger suas relações internacionais.

3 - A inconstitucionalidade das Propostas de Emenda Constitucional ao art. 228 da Constituição Federal

Após toda a pesquisa realizada, portanto, a questão da maioridade penal está incluída entre os direitos e garantias individuais, uma vez que estes não estão elencados, de forma taxativa, no art. 5º da Carta Magna. Ao contrário, em vários pontos desta Lei Maior, encontramos dispositivos que tratam de direitos e garantias individuais, merecendo, assim, uma interpretação sistemática.

Portanto, já de início, as Propostas de Emenda Constitucional não poderiam ser admitidas, em face da contrariedade ao art. 60, parágrafo 4º, IV, da Constituição Federal, por se tratar a garantia da maioridade penal aos dezoito anos de um direito individual, sendo, pois, uma cláusula pétrea.

Por outro lado, quando falamos em maioridade penal logo lembramos do conceito de imputabilidade e, com isto, chegamos à velha discussão do discernimento que, inclusive, foi incluída entre as justificativas da Proposta em discussão, quando critica o critério puramente biológico para a determinação da maioridade penal.

  Como podemos perceber pelas justificativas do Projeto de Emenda Constitucional, que visa à redução da maioridade penal no Brasil, não encontramos nenhuma motivação jurídico-penal, mas, tão-somente, fatores de política criminal.

Deste modo, as Propostas de Emendas Constitucionais tendentes a reduzir a maioridade penal abaixo dos 18 anos são inconstitucionais, uma vez que não considera a maioridade penal dentre as chamadas cláusulas pétreas, previstas no art. 60, parágrafo 4º, inciso IV, da Constituição Federal, onde estão incluídos direitos e garantias individuais.

Estas são, pois, as críticas de ordem jurídica constitucional e penal que podem ser apontadas nos Projetos de Emenda a Constituição Federal tendentes a redução da maioridade penal.

Os ordenamentos jurídicos, desde os mais primitivos, sempre tiveram dificuldade na fixação do limite da idade da responsabilidade penal. Entretanto, verificamos, através da pesquisa, que ao longo da história existiu um direito do menor, baseado em uma proteção penal especial.

O direito do menor, no ordenamento jurídico brasileiro, passou pelas doutrinas do Direito Penal do Menor, da Situação Irregular e a da Proteção do Integral. A primeira doutrina vigorou no Século XIX, e só havia interesse pelos infantes, a partir do momento que esses praticassem ou sofressem atos passíveis de alcance pelas normas penais; a segunda  doutrina teve vigência, no Brasil, no início do XX, e apresentava um direito especial quando uma criança ou um jovem estivesse em conflito com a lei ou fosse vítima de maus tratos; e por fim, a doutrina da Proteção integral, que vigora desde o ECA, baseia-se na concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos a direitos universalmente reconhecidos, provenientes de sua condição particular de pessoa em desenvolvimento.

Também fizemos uma pesquisa, no direito comparado, para apurar os limites da idade para a responsabilidade penal. Verificamos que o Brasil encontra-se em conformidade com a maioria das legislações do mundo, quanto à fixação da maioridade penal em dezoito anos.

Tratamos, também, acerca de alguns aspetos doutrinários da menoridade penal. Percebemos que a doutrina e a jurisprudência não encontram dificuldades para apreciar o momento em que inicia a maioridade penal. Este ponto é muito importante, uma vez que é o limite para a aplicação da legislação especial ou para as leis penais. Outro aspecto tratado foi quanto à prova da menoridade penal. Através desse estudo, percebemos que são admitidos quaisquer meios de provas para reconhecer a menoridade e, em caso de dúvida, aplica-se o princípio in dubio pro reo

Destacamos que o critério para a estabelecer a imputabilidade penal a partir dos dezoito anos, na legislação pátria, é um critério meramente de política criminal. O legislador brasileiro optou pela presunção absoluta, através do sistema de verificação da inimputabilidade pelo sistema biológico para fixar a irresponsabilidade penal. Este critério gera maior segurança jurídica, pois assegura que toda pessoa até certa idade não ficará submetida à legislação criminal.

Abordamos, em uma análise contextualizada, a teoria do crime para se entender a imputabilidade penal. Neste estudo, descrevemos os conceitos de ato infracional, crime e contravenção, confirmou-se que a diferença entre os eles é apenas terminológica. Também, houve uma pesquisa acerca das teorias da culpabilidade, os conceitos de culpabilidade e imputabilidade e os sistemas de aferição para a imputabilidade penal.

Perquirimos, na seara do direito do menor, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste estudo, apresentamos a necessidade de uma legislação especial para o tratamento diferenciado dos menores em confronto com a lei. Também, discorremos acerca da doutrina da Proteção Integral, a qual estabeleceu com prioridade absoluta a proteção às crianças e adolescentes. Apresentamos as espécies das medidas socioeducativas, estas de caráter essencialmente pedagógico. Cabe ressaltar que os menores, que estão em conflito com a lei, estão isento do jus puniedi do Estado, mas não estão fora do Direito. Ao cometerem atos infracionais serão responsabilizados perante ao ECA,  que prevê inclusive a privação da liberdade.

Por meio da pesquisa jurisprudencial, no julgamento da ADIn 939-7/DF, constatamos que o Supremo Tribunal Federal reconheceu o art. 150, inciso III, letra “b”, da Constituição da República, como autêntico direito e garantia fundamental do cidadão contribuinte. Neste contexto, o órgão guardião da Lei Maior consagrou o Princípio da Abertura Material do catálogo dos direitos fundamentais, que a doutrina já reconhecia. Assim, a abertura da cláusula material, esculpida no art. 5º, parágrafo 2º da Constituição, apontar-nos outros direitos e garantias fundamentais esparsos na Carta Política, dentre os quais a imputabilidade penal para os menores de dezoito anos, firmado no art. 228.

Outro aspecto tratado foi quanto à normativa internacional incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro. Se a própria Constituição assegura o status de direito fundamental aos tratados internacionais, quando incorporados a ordem jurídica, não há mais o que se contestar sobre a impossibilidade jurídica da redução da imputabilidade penal. De fato, a normativa internacional revolucionou o direito infanto-juvenil no Brasil, uma vez que, com a ratificação da Convenção sobre os Direitos da Criança e sua transformação em lei interna, esta passa a fazer parte do sistema de direitos e garantias, por força da cláusula de abertura material do parágrafo 2º do art. 5º, da Constituição Federal.

Diante do exposto, concluímos que a inimputabilidade penal, aos menores de dezoito anos, está ligada estritamente às esferas biológica, psicológica e espiritual do ser humano, o que caracteriza, pois, como um direito ou garantia individual que, na forma do art. 60, parágrafo 4°, inciso. IV, da Lei Maior. Desse modo, é inconstitucional qualquer Emenda Constitucional tendente a modificar, suspender ou abolir o limite de idade da maioridade penal esculpindo no art. 228 da Carta Magna de 1988. Neste contexto, corroborando nossa pretensão, urge ressaltar que a limitação do poder constituinte derivado instituído consiste numa garantia de evitar a destruição ou radical alteração da nossa ordem constitucional.

Cabe também destacar que no Brasil, o sistema protetivo de direitos humanos, que emerge na Carta Política de 1988, encontra-se compromissado com o plano internacional, alçando, a fundamento da República Federativa do Brasil, a “dignidade da pessoa humana” e, elencando, ainda, a prevalência dos direitos humanos como princípio fundamental a reger o Estado Brasileiro nas relações internacionais. De fato, o Estatuto de Roma exclui de sua jurisdição os menores de dezoito anos.

Portanto, podemos concluir que qualquer Proposta de Emenda Constitucional que tenha por escopo a redução da maioridade penal significara abolição de um direito ao tratamento diferenciado, na condição de sujeito especial de direito dotado de dignidade por esse motivo será inconstitucional. Ademais, aqueles que pretendem reduzir a maioridade penal se apegam em argumentos que via resolver o problema da delinqüência juvenil, o que não é verdade com demonstrado, neste trabalho.

Por fim, é difícil, para o senso comum respeitar os diretos humanos e a ideia de cidadania quando estes são voltados para o infrator.  Essa garantia individual está tanto prevista na Lei Maior, como nas normas internacionais incorporadas pelo Estado brasileiro, as quais conferem status de direito fundamental.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os ordenamentos jurídicos, desde os mais primitivos, sempre tiveram dificuldade na fixação do limite da idade da responsabilidade penal. Entretanto, verificamos, através da pesquisa, que ao longo da história existiu um direito do menor, baseado em uma proteção penal especial.

O direito do menor, no ordenamento jurídico brasileiro, passou pelas doutrinas do Direito Penal do Menor, da Situação Irregular e a da Proteção do Integral. A primeira doutrina vigorou no Século XIX, e só havia interesse pelos infantes, a partir do momento que esses praticassem ou sofressem atos passíveis de alcance pelas normas penais; a segunda  doutrina teve vigência, no Brasil, no início do XX, e apresentava um direito especial quando uma criança ou um jovem estivesse em conflito com a lei ou fosse vítima de maus tratos; e por fim, a doutrina da Proteção integral, que vigora desde o ECA, baseia-se na concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos a direitos universalmente reconhecidos, provenientes de sua condição particular de pessoa em desenvolvimento.

Destacamos que o critério para a estabelecer a imputabilidade penal a partir dos dezoito anos, na legislação pátria, é um critério meramente de política criminal. O legislador brasileiro optou pela presunção absoluta, através do sistema de verificação da inimputabilidade pelo sistema biológico para fixar a irresponsabilidade penal. Este critério gera maior segurança jurídica, pois assegura que toda pessoa até certa idade não ficará submetida à legislação criminal.

Por meio da pesquisa jurisprudencial, no julgamento da ADIn 939-7/DF, constatamos que o Supremo Tribunal Federal reconheceu o art. 150, inciso III, letra “b”, da Constituição da República, como autêntico direito e garantia fundamental do cidadão contribuinte. Neste contexto, o órgão guardião da Lei Maior consagrou o Princípio da Abertura Material do catálogo dos direitos fundamentais, que a doutrina já reconhecia. Assim, a abertura da cláusula material, esculpida no art. 5º, parágrafo 2º da Constituição, apontar-nos outros direitos e garantias fundamentais esparsos na Carta Política, dentre os quais a imputabilidade penal para os menores de dezoito anos, firmado no art. 228.

Outro aspecto tratado foi quanto à normativa internacional incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro. Se a própria Constituição assegura o status de direito fundamental aos tratados internacionais, quando incorporados a ordem jurídica, não há mais o que se contestar sobre a impossibilidade jurídica da redução da imputabilidade penal. De fato, a normativa internacional revolucionou o direito infanto-juvenil no Brasil, uma vez que, com a ratificação da Convenção sobre os Direitos da Criança e sua transformação em lei interna, esta passa a fazer parte do sistema de direitos e garantias, por força da cláusula de abertura material do parágrafo 2º do art. 5º, da Constituição Federal.

Diante do exposto, concluímos que a inimputabilidade penal, aos menores de dezoito anos, está ligada estritamente às esferas biológica, psicológica e espiritual do ser humano, o que caracteriza, pois, como um direito ou garantia individual que, na forma do art. 60, parágrafo 4°, inciso. IV, da Lei Maior. Desse modo, é inconstitucional qualquer Emenda Constitucional tendente a modificar, suspender ou abolir o limite de idade da maioridade penal esculpindo no art. 228 da Carta Magna de 1988. Neste contexto, corroborando nossa pretensão, urge ressaltar que a limitação do poder constituinte derivado instituído consiste numa garantia de evitar a destruição ou radical alteração da nossa ordem constitucional.

Cabe também destacar que no Brasil, o sistema protetivo de direitos humanos, que emerge na Carta Política de 1988, encontra-se compromissado com o plano internacional, alçando, a fundamento da República Federativa do Brasil, a “dignidade da pessoa humana” e, elencando, ainda, a prevalência dos direitos humanos como princípio fundamental a reger o Estado Brasileiro nas relações internacionais. De fato, o Estatuto de Roma exclui de sua jurisdição os menores de dezoito anos.

Portanto, podemos concluir que qualquer Proposta de Emenda Constitucional que tenha por escopo a redução da maioridade penal significara abolição de um direito ao tratamento diferenciado, na condição de sujeito especial de direito dotado de dignidade por esse motivo será inconstitucional. Ademais, aqueles que pretendem reduzir a maioridade penal se apegam em argumentos que via resolver o problema da delinqüência juvenil, o que não é verdade com demonstrado, neste trabalho.

Por fim, é difícil, para o senso comum respeitar os diretos humanos e a idéia de cidadania quando estes são voltados para o infrator.  Essa garantia individual está tanto prevista na Lei Maior, como nas normas internacionais incorporadas pelo Estado brasileiro, as quais conferem status de direito fundamental.

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Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível no endereço eletrônico http://www. planalto.gov.br.

Estatuto da criança e do Adolescente. Disponível no endereço eletrônico

http://www. planalto.gov.br.

BRASIL.  Decreto Legislativo nº 112, de 06 de junho de 2002. Aprovou o texto do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Disponível no endereço eletrônico  http://www.mj.gov.br/sal/tpi/decreto.htm.

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Sobre o autor
Alexandre Cesar dos Santos

Delegado de Polícia Civil do Estado de Alagoas. Professor de Direito Penal da Faculdade da Cidade de Maceió (FACIMA) . Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco- UFPE (2006). Pós-graduado em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera-Uniderp - LFG. Especialista em Direitos Humanos e Segurança Pública pela Universidade de Federal de Rondônia/SENASP. (Delegado de Polícia do Estado de Rondônia 2011-2014).

Informações sobre o texto

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