Uma análise de julgado em concreto

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Análise de caso concreto tendo por base cinco eixos utilizados na decisão pelo desembargador: hermenêutica, legislação, doutrina, jurisprudência e princípios jurídicos.

Processo: 191-62.2015.5.22.0105 RECURSO ORDINÁRIO

EMENTA:

ACIDENTE DE TRABALHO. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. COMPROVADA - DAS INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS, MATERIAIS. No caso, inegável que o reclamante sofreu uma redução da capacidade laborativa, ficando incapacitado para a função que exercia antes do acidente de trabalho. Dispõe o Código Civil, nos art. 944 a 952, a respeito da indenização por danos materiais sofridos em razão de ofensa à saúde, dano físico ou morte, determinando que a indenização será medida pela extensão do dano. E os danos, tanto os de cunho material, quanto os de cunho moral, no presente caso, existem e foram corretamente fixados na d. Sentença a quo, com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

MULTA POR EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANIFESTO INTUITO PROCRASTINATÓRIO. INOCORRÊNCIA. EXCLUSÃO DA EXAÇÃO. Não constitui ato evidentemente protelatório o exercício do direito de defesa por parte do reclamado, quando são utilizados os meios e recursos assegurados por lei, em observância das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV, da Constituição Federal em vigor).

 (RO 191-62.2015.5.22.0105, Rel. Desembargador FRANCISCO METON MARQUES DE LIMA, TRT DA 22ª REGIÃO, TRIBUNAL PLENO, julgado em 30/06/2016, publicado em 05/07/2016, p. null).

DATA DA PUBLICAÇÃO: 05.07.2016


A análise do presente caso concreto terá por base cinco eixos utilizados na decisão pelo desembargador em questão: hermenêutica, legislação, doutrina, jurisprudência e princípios jurídicos.


HERMENÊUTICA UTILIZADA

Tendo-se em vista que ilustríssimo desembargador buscou preservar o lado frágil da relação trabalhista concedendo inclusive a justiça gratuita ao empregado hipossuficiente e observando-se o modo de interpretação ágil com peso das provas testemunhais e não em procedimentos tecnicistas, denota-se que o método hermenêutico utilizado na decisão foi o teleológico.

O Jurista Carlos Maximiliano ensinava que na interpretação teleológica “A norma enfeixa um conjunto de providências, protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exigências econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e assegure plenamente a tutela de interesse para a qual foi regida.” Tal doutrinador relata ainda que com base na técnica de interpretação teleológica a legislação deve ser interpretada de modo que abranja, não só o bem econômico e materializado, mas também outros valores, de ordem psíquica. Protege-se o patrimônio físico e moral do indivíduo, a princípio; da coletividade, acima de tudo.

A interpretação hermenêutica busca, sobretudo, uma interpretação que objetiva os fins sociais.

A concessão de ganho de causa ao trabalhador na concessão de reparação material, moral e estético no julgado, também é forte indicador que na sentença buscou-se a reparação das iniquidades sociais provocadas em decorrência de sequelas do acidente de trabalho, com uma interpretação que vai além de uma aplicação legalista e formal das normas.

Segundo a teoria do fim do direito de Ihering, o método teleológico afirma que no campo do direito o conceito de fim substitui o de valor. Dessa forma, a interpretação finalística ou teleológica aspira compreender o direito do seu ponto de vista funcional, ou seja, a norma jurídica cumpre uma finalidade, que justifica sua existência (WARAT, 1994, p. 82).

O método teleológico torna explícito, neste contexto, a exigência de que a interpretação sobre um texto legal se norteie pelas consequências sociais que procurada ou pelos fins que orientam a norma, ou seja, pelas consequências sociais antecipadamente previstas (WARAT, 1994, p. 82).

Como se depreende do exposto, também o método teleológico pressupõe que a lógica formal não é suficiente para solucionar os problemas do direito, devendo o interprete levar em consideração a realidade concreta, os interesses vitais e os fatos sociais que constituem as fontes da produção jurídica (WARAT, 1994, p. 83).


LEGISLAÇÃO APLICADA

Na presente decisão do caso em concreto utilizaram-se as seguintes legislações: Código Civil nos artigos 944 a 952 e 927; art. 5°, V, X, e LV, e art.114 da CF em vigor; Lei 4.117/ 62; Lei 5.250/67.

Em seus artigos 944 a 952, o código civil brasileiro em vigor dispõe sobre a quantificação da indenização, em seu artigo 944 a regra é a de que quem estiver obrigado a reparar um dano deve recompor a situação pessoal e patrimonial do lesado ao estado anterior, para torná-la como era antes do evento maléfico não tivesse se verificado, evento esse que impõe ao responsável pelo dano (com ou sem culpa pela sua ocorrência – dependendo da hipótese legal de que se trata) a obrigação de repará-lo.

No artigo 945 temos que o comando legal pressupõe que o autor do dano é o agente que deu causa ao evento danoso, a quem se imputa a responsabilidade pela indenização da vítima. A concorrência de culpa (dele e da vítima) na relação entre a causa do dano e o evento danoso pode apresentar duas vertentes:

a) houve efetiva participação da vítima na causação do episódio que justifica o pedido de indenização, o que autoriza abatimento proporcional da indenização devida pelo autor do dano à vítima ou a seus sucessores;

b) a culpa do indigitado causador do dano é de pequena ou irrelevante proporção, tendo sido a própria vítima a causadora verdadeira do evento que lhe acarretou danos. Nesta hipótese, pode ser desfeito o nexo de causalidade imputado ao indigitado causador do dano, para se reconhecer no ato da vítima potencialidade suficiente para causação exclusiva do dano, não se justificando a indenização pretendida.

É a partir da dosagem da culpa que se mede a responsabilidade do autor do dano e a sua extensão devida pelos danos causados.

Ao abordar o art. 946 e art. 949, observa-se que a intenção do julgador foi à quantificação do tempo futuro que o trabalhador teria para efeito de indenização, não tendo sido possível ao juiz fixar a indenização na sentença proferida no processo de conhecimento, o quantum deverá ser apurado em liquidação por artigos (CPC, art. 475-E), quando o credor tem de alegar e provar fato novo. O objeto da liquidação por artigos é a apuração do quantum constante da condenação e não a existência do dano, que já terá sido afirmado na sentença do processo de conhecimento. Despesas existentes até o fim da convalescença podem ocorrer até depois de proferida a sentença. Elas podem ser objeto da liquidação por artigos.

Em relação a aplicação do art. 927 o julgador aplicou a teoria da responsabilidade subjetiva ao condenar o empregado na reparação de danos ao empregado acidentado.

Houve a utilização do art. 5°, V e X da constituição federal, para a justificativa de indenização por dano material, moral e estético de forma proporcional ao agravo sofrido. No inciso LV do mesmo artigo, tem-se a justificativa para a não punição do empregador por ter postulado embargos declaratórios, visto que o desembargador entendeu ser de direito ao acusado o direito do contraditório e ampla defesa, não entendendo que a objetivação do recurso tenha sido a procrastinação da condenação.

Ao alocar o art. 114 da CF/88 no caso, tem-se a justificação da competência da justiça do trabalho para conhecer e julgar o caso, na medida em que se trata de indenização por dano ou patrimonial decorrentes da relação trabalhista. Na justificação da quantificação de indenização por dano moral, tem-se acertada a inserção das leis:  4.117/ 62 e Lei 5.250/67.


DOUTRINA UTILIZADA

Quanto ao aspecto da doutrina houve a utilização acertada do autor Anderson Schreiber para o margiamento de cálculo do dano moral, pois em seu artigo Arbitramento do dano moral no código civil (Revista Trimestral de Direito Civil: RTDC, v. 3, n. 12, p. 10, out./dez. 2002) o autor descreve aspectos objetivos para o referido cálculo trabalhista utilizando critérios como a extensão do dano, a culpabilidade do ofensor, a eventual culpa concorrente da vítima, a capacidade econômica do ofensor, as condições pessoais da vítima, a função pedagógica da punição e desestimulo para novos atos lesivos e a razoabilidade.

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O excelso desembargador fez ainda o uso condizente da autora Marina Celina Bodin de Morais, que em sua obra Danos a pessoa humana: Uma leitura Civil- Constitucional dos danos morais, Rio de Janeiro: Renovar, 2003. Cap. 4; traz a explanação que a jurisprudência brasileira vem empregando a esteira de antigas leis especiais como a lei da impressa e das telecomunicações no arbitramento do dano moral nos julgados.


JURISPRUDÊNCIA UTILIZADA

Na decisão há o uso de jurisprudências do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Supremo Tribunal Federal (STF) para explanar o motivo pelo qual o benefício social junto ao INSS não deve ser incluído dentro da parcela de pagamento da indenização sofrida por danos materiais sofridos pelo obreiro decorrente da diminuição da renda por conta das lesões sofridas. Cita o nobre julgador as ementas 00484-2004-076-03-00-1-RO, 7ª. t, Rel. Juíza Alice Monteiro de Barros, DJMG de 2.01.2005 e TRT da 22ª Região, RO 080147-64.2014.5.22.0105, 1ª Turma, Relator Des. Arnaldo Boson Paes, julgado em 02.10.2015. Deixando transparecer ainda que é vasta a jurisprudência nacional no sentido de não haver confusão em relação ao pagamento de benefícios sociais com reparação de danos quando da ocorrência de acidentes do trabalho.


PRINCIPIOLOGIA JURÍDICA UTILIZADA

Ao início da sentença, ainda em sua ementa, o próprio julgador revela ter feito uso dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade como basilares na resolução deste caso em concreto.

Segundo Humberto Ávila a razoabilidade estrutura a aplicação de outras normas, princípios e regras, notadamente das regras. A razoabilidade é usada com vários sentidos. Fala-se em razoabilidade de uma alegação, razoabilidade de uma interpretação, razoabilidade de uma restrição, razoabilidade do fim legal, razoabilidade da função legislativa.

A razoabilidade como dever de harmonização do Direito com suas condições externas exige a relação das normas com as condições de aplicação, quer demandando um suporte empírico existente para a adoção de alguma medida quer exigindo uma relação congruente entre o critério de diferenciação escolhido e a medida adotada.

O postulado da proporcionalidade exige que o Poder Legislativo e o Poder Executivo escolham, para a realização de seus fins, meios adequados, necessários e proporcionais. Um meio é adequando quando promove o fim a que se propõe. Um meio é dito necessário se, dentre todos aqueles meios igualmente adequados para promover o fim, for o menos restritivo relativamente aos direitos fundamentais e um meio é proporcional, em sentido estrito, se as vantagens que promove superam as desvantagens que provoca. A aplicação da proporcionalidade exige a relação de causalidade entre meio e fim, de forma que, adotando-se o meio, chega-se ao fim.

Nota-se que em todo o conteúdo do julgado existe a preocupação em quantificar de forma justa proporcional e razoável a indenização a ser paga ao acidentado, existe sempre a observância do razoável ao levar em consideração que existe um limite dentro daquilo que era a remuneração do trabalho e de quanto esse trabalhador traria de frutos remuneratórios ao seio de sua família, a proporcionalidade é também o outro pilar de sustentação da decisão, ao se comprovar que não houve participação de culpa do acidentado no acidente sofrido e proporcionalmente ao dano sofrido, o empregador era o responsável pelo ocorrido devendo arcar com despesas no âmbito das indenizações moral, material e estético.

Certamente o prejuízo sofrido pelo trabalhador e sua família com todas as dores físicas e psicológicas é de cunho incalculável, mas com o bom senso e a boa utilização dos princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade, excelentíssimo julgador chega a um denominador comum na quantificação em dinheiro a ser paga ao obreiro.


CONCLUSÃO:

Conclui-se com a análise do caso em concreto em questão com relação aos aspectos hermenêuticos, jurisprudenciais, doutrinários, principiológicos e legislativos, que o excelso julgador utilizou de forma acertada e condizente todos esses aspectos para um forte embasamento jurídico na resolução do referido caso.


REFERÊNCIAS

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006.

COELHO, Luiz Fernando. Lógica jurídica e interpretação das leis. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981.

FRANÇA, R. Limongi. Hermenêutica jurídica. 9 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

FREIRE, Ricardo Maurício. Curso de introdução ao estudo do direito. Salvador: JusPodivm, 2009.

LIMA, Hermes. Introdução à ciência do direito. 33 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2002.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

MONTORO, André Franco. Introdução à ciência do direito. 25 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

SAMPAIO JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão e dominação. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2001.

SOARES, Ricardo Maurício Freire. Curso de introdução ao estudo do direito. Salvador: JusPodivm, 2009.

WARAT, Luiz Alberto. Introdução geral ao direito. Porto Alegre: 1994.

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