Capa da publicação O medo como elemento de controle social: Perspectiva analítica do filme “A Vila”

O medo como elemento de controle social: perspectiva analítica do filme “A Vila”

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Analisa-se a construção de um sistema social que tem como um dos seus principais elementos o medo, fazendo associações diversas, e a forma sutil que o referido elemento se insere nas “cadeias sociais”, inclusive no âmbito jurídico.

RESUMO: Este trabalho tem como finalidade abordar a construção de um sistema social que tem como um dos seus principais elementos o medo, fazendo associações diversas, e a forma sutil que o referido elemento se insere nas “cadeias sociais”, inclusive no âmbito jurídico, bem como a necessidade ou não de se utilizar do medo para regular a convivência social dos homens. Ademais, apresentar-se-á estudos da psicologia que justificam o uso muitas vezes indiscriminado do elemento em questão; bem como, a importância de controlarmos o medo, para que os efeitos não sejam demasiadamente limitadores, nos mais diversos aspectos. Desta forma, o presente artigo científico demonstrará a complexidade existente na conjectura do medo, tal como evidenciará as formas de utilização e seus efeitos como elemento de controle social.

Palavras Chave: Medo; Controle Social; Psicologia.


1. Introdução

O medo, de forma implícita ou não, funciona como elemento norteador nas mais diversas sociedades, e desta forma, fomentou a construir as sociedades que vemos hoje, através dos medos comuns aos homens, inserido em vários âmbitos e nas mais diversas formas, merecendo, pois, uma análise minuciosa das fisionomias exteriorizadas do referido elemento[1].

O elemento em questão é definido como uma emoção básica, inerente à natureza humana, e que causa efeitos diversos quando de alguma forma nos sentimos ameaçados, independente do fator que venha causar essa sensação, e da sua abrangência, ocasionando as mais diversas e inimagináveis reações, aborda-se, portanto o tema a partir de observações universais, pois é a natureza humana nosso ponto de partida, não obstante, abordar-se-á o medo conforme seu contexto histórico-cultural, pois o medo é socialmente construído a partir do que é exposto em uma cultura, e ele será diverso quanto as suas regras, padrões e épocas[2].

Esse trabalho acadêmico não visa apenas apresentar o medo como elemento incontestável, pois o senso comum reconhece essa máxima, a principal finalidade do referido artigo, é “pensar” o medo, e a partir de um olhar crítico, percebê-lo nas relações sociais.

Podemos analisar primeiramente, o medo inserido nas relações religiosas, pois o cristianismo não deixa de ser uma instituição que utiliza desse mecanismo para aprisionar mentes. Arriscamos dizer que é quem mais utiliza o medo como elemento de coação[3], o medo sofreu grande processo de internacionalização, processo esse que começou com o cristianismo, quando na ocasião oportuna apresentou a figura do “demônio” aos fiéis, como aponta Suzana Leandro de Melo citando Jean Delumeau[4]:

[...] os homens de Igreja apontaram e desmascararam esse adversário dos homens. Levantaram o inventário dos males que ele é capaz de provocar e a lista de seus agentes: os turcos, os judeus, os heréticos, as mulheres (especialmente as feiticeiras). Partiram à procura do Anticristo, anunciaram o Juízo Final, prova certamente terrível, mas que seria ao mesmo tempo o fim do mal sobre a terra. Uma ameaça global de morte viu-se assim segmentada em medos seguramente temíveis, mas ‘nomeados’ e explicados, porque refletidos e aclarados pelos homens de Igreja.

A teologia na cultura ocidental acaba difundindo o medo como elemento inerente à natureza humana e coloca todo e qualquer ser humano como um agente transmissor do mal, até porque qualquer pessoa estará sujeita a “possessão”, e com isso, aprisionam-se mentes ainda despreparadas para lidar com o “medo do mal”[5].

O medo do inferno, dos castigos de Deus e das consequências de uma vida que não fosse vivida de acordo com preceitos e dogmas religiosos, “a vontade de Deus’, fez com que o ser humano vivesse cada vez mais em uma “redoma” para fugir daquilo que o “corpo pedia”, e passaram a buscar uma introspecção para “se purificar” e combater o pecado. Não obstante, essa internalização se deu de forma paulatina, pois é um campo bem mais amplo do que se imagina, chegando a desencadear sintomas psicológicos tal como a hadefobia[6].

Percebe-se que o medo está inserido em todas as relações humanas, funcionando como um “freio”, por aqueles que lideram (manipulam) a massa da forma que for conveniente, podemos citar como exemplo para fins didáticos, a discussão em questão com o filme “A vila” (The village, EUA, 2004), que retrata uma sociedade isolada e controlada pelo medo de “monstros”, que na verdade eram criados pelos anciões para servirem de elementos coercitivos naquela estabelecida sociedade, a diante abordaremos a temática em suas minúcias, e de forma analógica iremos contextualizar a problemática, relacionando a temática principal do filme ao cotidiano em suas diversas “ramificações”, questionando a necessidade, e a forma como devemos lidar com o inevitável.

Gustavo Santos[7] assim se posiciona sobre o medo:

As pessoas vivem com medo. Tu tens medo. Todos temos. Uns mais outros menos, uns de uma forma consciente outros de uma forma inconsciente, uns enfrentam-no outros morrem nas suas mãos. O medo, e repito o que já escrevi no “Arrisca-te a Viver”, é a única emoção que não gera ação. Se entrares em pânico foges, se sentires raiva bates ou gritas, se tiveres medo encolhes-te. O medo algema-te, tolda-te as possibilidades e faz de ti seu prisioneiro.  Porque é que achas que o mundo, o país e a tua própria vida se encontram no estado em que estão? Medo. Muito medo. E nesta matéria, permite-me ser assertivo, se tens medo seja do que for de nada te adianta comprar um cão, sabes porquê? Porque vais educá-lo baseado no medo, logo, vais estragar mais uma vida. Não te chegava a tua? Pobre do animal, merecia melhor sorte. Ora bem, uma educação alicerçada no medo fará com que ele viva no próprio medo e tu com medo que ele te desobedeça. É uma desgraça. Serás incapaz de amá-lo, assim como és incapaz de amar seja quem for, muito menos a ti. E se me disseres que não estás de acordo com o que acabei de escrever, permite-me novamente ser assertivo contigo e gritar-te bem nos ouvidos: És um M-E-N-T-I--R-O-S-O. Repito, és um mentiroso com todas as letrinhas. 

Em seguida, será tratada a narrativa do filme “A vila” na perspectiva do medo e da formação social.


2. O medo como controlador do ser humano: “A vila”

No filme “A vila” podemos visualizar claramente como conduzir, por meio do medo, uma sociedade. É mostrada uma realidade em que um grupo de pessoas se isola da sociedade comum e constrói a sua própria, totalmente isolada, sem qualquer contato com pessoas estranhas aquela comunidade.

Ao final é mostrado que uma tragédia comum fez com que os líderes da comunidade quisessem se retirar de uma sociedade violenta e se estabelecerem em uma nova comunidade, fechada apenas a aqueles que se mostrassem adeptos dos dogmas previamente aceitos.

Desta maneira, para proteger (controlar) os seus descendentes, os líderes, chamados “Os anciões” no filme, resolvem se isolar em uma floresta, área de propriedade da família do líder da nova comunidade, e iniciar uma sociedade harmoniosa, de ajuda mútua e sem violência.

Todavia, os próprios líderes sabiam que com o passar do tempo seus filhos iriam desejar conhecer o além da floresta em que vivem. Assim, criaram a história de que na fronteira haviam monstros, chamados de “aqueles de quem não mencionamos” que matariam pessoas da comunidade no caso de alguém invadir o seu espaço. Para dar mais veracidade a esta história criaram fantasias para que fossem vistos tais monstros em algumas ocasiões para legitimar o afastamento daquela comunidade do resto do mundo.

Eis o papel do medo na formação social. A ignorância, somada ao medo, prendeu totalmente aquele povo aquela área.

Ainda no filme, ocorre uma tentativa de assassinato de Lucius Hunt[8] (quem teve a ideia de sair da comunidade para recolher medicamentos na cidade na tentativa de ajudar possíveis enfermos) praticado pelo deficiente mental Noah Percy[9], por ciúmes pelo casamento deste com a protagonista, Ivy Walker[10]. A protagonista, por amor, arrisca-se para ir além da floresta para buscar medicamentos, daí descobrimos todo o enredo e o acobertamento da verdade pelos líderes da comunidade.

Percebemos que o filme é atual. É completamente palpável a utilização do medo em uma sociedade como forma de controle. Vemos isso em alguns países de maneira muito clara, podemos citar a Coréia do Norte e Irã, sociedades fechadas e isoladas. Algumas nações ditas democráticas também praticam a utilização do medo para conduzir sua população.

Mais de onde advém este medo. Eis nossa próxima etapa de estudo.

3. O conceito de medo de acordo com a perspectiva histórica das sociedades

A percepção sobre o medo é uma característica subjetiva do ser humano, podendo ser particularizado ou mesmo coletivo, alcançando épocas distintas, com novas maneiras de convivência, a partir de doenças, revoltas e guerras que faziam parte da desolação de diversas épocas[11].

Dermival Ribeiro Rios[12], medo por ser definido como a “perturbação do ânimo preocupado com a ideia de um perigo real ou aparente”.

A história mundial nos dá inúmeras referências quanto à utilização do medo como ferramenta de manipulação, e de manutenção de governos, religiões e Estados. Não obstante, a Idade Média talvez seja um dos mais marcantes períodos da história humana, no qual, ilusões eram utilizadas para manter sob controle da coroa e da igreja os súditos[13].

Cabendo potencial destaque à Igreja Católica que tinha sob seu controle reis, rainhas e sociedades de diversas partes da Europa. Introduzindo mandamentos religiosos que se bifurcaram com normas sociais. Desta forma, esclarece Gilberto Cotrim[14]:

O cristianismo fundamentou uma série de elementos culturais que marcaram as sociedades europeias da Idade Média: os costumes, as normas éticas, a produção literária, o ideal das figuras heroicas, a criação artística [...] Para combater as heresias, o papa Gregório IX criou, em 1231, os Tribunais da Inquisição, cuja missão era descobrir e julgar hereges. Os condenados pela Inquisição eram "excomungados" (excluídos da comunidade dos católicos) e entregues às autoridades do Estado, que se encarregavam de puni-los.

Ainda esclarecendo sobre essa época, explica Nelson José de Camargo[15]: 

Os ensinamentos da igreja católica passaram a ser considerados a verdade absoluta a partir do reinado do imperador Constantino. Qualquer pensamento ou atitude que contrariasse o que determinava a Igreja era considerado heresia e ofensa ao Estado. [...] Em 1252, o papa Inocêncio IV autorizou que os suspeitos de heresia fossem torturados. As pessoas condenadas por heresia eram queimadas vivas.

A Idade Média ficou conhecida como a “idade das trevas” da história da humanidade, pauta por pestes, guerras e atrocidades. Suas cicatrizes se perduram durante muitos anos, sendo relembrada não somente a título de estudo, mas para fazer-nos lembrar do quão violento foram e podem ser as atitudes humanas[16].

A Igreja Católica foi uma das mais marcantes figuras, a meu ver, a utilizar o medo como condutor de “ordem social”, tendo mais tarde como ferrenho opositor Martinho Lutero[17], que levantou os mais ardentes questionamentos a cerca das atitudes da própria Igreja Católica.

Gilberto Cotrim[18] aponta algumas das teses de Lutero, ao dizer que “estão errados os pregadores de indulgências que dizem que um homem é libertado e salvo de todo castigo dos pecados pelas indulgências papais. Eles pregam que a alma voa para fora do Purgatório tão logo tilinte o dinheiro jogado na caixa”.

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Após tal período, outros se destacaram, tal como as reverberações de novas doutrinas sociais, com novas perspectivas do induzimento das massas, que durante muito tempo esteve de lado oposto à igreja e aos Estados.

Tais teorias surgiram no século XIX, importante século para nós, no que se refere à indústria perseguições de direitos. No entanto, também enfrentou inúmeros problemas, quando se buscou conquistas sociais e melhores condições de vida (Revolução Francesa). Nestes cenários de ideais e de lutas, surgiram o “socialismo” e o “anarquismo”. Conceitua-os Nicola Luiza de Petta, Eduardo Aparício Baez Ojeda e Luciano Delfini[19], como:

Doutrinas socialistas - quando o proletariado já estava consolidado como a mais importante classe trabalhadora dos países industrializados, intensificaram-se as pregações a favor de uma sociedade mais justa, que não se limitavam a reivindicar melhorias para os trabalhadores: queriam uma nova forma de organização da sociedade. As teses que embasavam essa proposta foram denominadas doutrinas ou teorias socialistas. [...] O anarquismo - Também conhecido como comunismo libertário, o anarquismo acredita que a origem das desigualdades sociais está no Estado. Por isso, prevê a organização da sociedade em grupos sob regime de autogestão, sem a presença de um sistema centralizador.

Como se pode ver, com a diminuição do poderio religioso, dos senhores feudais e monárquicos, se elevaram as lutas sociais, não mais se intimidando por velhos estigmas que durante milhares de anos foram disseminados e digeridos pelas sociedades.

 No entanto, nem tudo são flores, pois a intimidação é a mais velha “arma” de qualquer organização para impor os seus ditames, em qualquer continente, em qualquer país. Na América, por sua vez, não foi diferente. Houve momentos de lutas de etnias e classe sob classe. Os Estados Unidos da América ficaram conhecidos como uma potência mundial, mas têm como característica a veemência em perseguir a todo custo território e riquezas para incorporar sua economia interna. Lembra Nicola Luiza de Petta, Eduardo Aparício Baez Ojeda e Luciano Delfini[20]:

Em 1823, usando o lema A América para os americanos, o governo dos Estados Unidos lançou a Doutrina Monroe, que pretendia isolar a América da interferência europeia. O resultado imediato dessa política foi o avanço sobre as terras que pertenciam ao México, seguido de uma grande expansão territorial, conhecida como marcha para o oeste. [...] O domínio sobre tantas terras era justificada pela ideologia do Destino Manifesto, uma teoria segundo a qual "os norte-americanos foram escolhidos para dominar a América".

Desta forma, fica entendido que até a nação dita como mais democrática praticou e pratica o medo.

Na sequência será tratada a presença do medo como condutor da sociedade brasileira contemporânea.

3.1. A presença do medo como condutor das normas da sociedade brasileira contemporânea

Desde os primórdios, o medo tem sido elemento normatizador da sociedade, ditando regras, normas, estabelecendo padrões e controlando uma massa submissa, o medo tem suas variedades e nuances, e vem se transformando a cada dia, e mudando sua “roupagem”, pois os medos já não são os mesmos.

O medo passou por um processo de internalização que pode ser verificado se observarmos com cautela algumas características na conjuntura do elemento em questão; temos o medo patologizado, como ocorre na síndrome do pânico, a busca do prazer tendo como ponto de partida o medo, e cuidados em torno da segurança pessoal. As “modalidades” em questão estão associadas ao conhecido mal-estar contemporâneo, com relação direta a cultura que vivemos e propagamos[21]. 

Em sentido estrito, podemos definir medo como uma emoção devida a uma percepção de perigo que de alguma forma ameaça um indivíduo, e quando “acionado” provoca os mais diversos efeitos no organismo, que naturalmente converte-se em reação de defesa, das mais diversas e inimagináveis, levando sempre em conta o indivíduo e as circunstâncias[22].

Em alguns casos, o medo poderá causar uma pseudoparalisia diante do perigo, é o que denominamos de pânico, podendo, portanto, causar diversas reações[23].

Podemos dizer que o medo humano se aproxima do medo animal quando levamos em conta aspectos fisiológicos, claro que nem de longe podemos comparar a complexidade do medo humano com a do medo animal, compara-se apenas o instinto de reagir a algo que nos causa medo, podemos afirmar com isso, que o medo é universal, e se apresenta nas mais diversas formas de vida[24].

O autor Jean Delumeau[25] faz com que se perceba, porém, a variação que o sentido do termo adquire ao longo da história: não apenas ocorre uma mudança das formas pelas quais o medo se apresenta, como também a própria concepção de medo sofre modificações.

Dessa forma, o medo não é apenas reação emocional, contendo crenças por trás, o medo não implica, portanto, em algo imutável. Trata-se de um sentimento construído historicamente, sendo utilizado e aprendido de formas distintas, dependendo da época.

Aborda-se o medo como algo conhecido, pois todos sabem da existência do referido sentimento ou a sensação de medo, ninguém tem dúvida sobre sentir medo, e poderá se apresentar com uma reação de fuga, negação, precaução, entre outros que fazem parte de um complexo emocional que definimos como medo, mesmo que se apresente em formas diferentes.

A configuração do medo não é simples como nós imaginamos, diferenciando-se em parte do que conhecemos como susto, ou outras emoções parecidas, e não podemos pensar o medo a partir desse olhar, que minimiza a “importância” do medo no aspecto social.

Podemos dizer que o medo se encontra na fronteira entre sensações e sentimentos, sendo quase sempre, elemento de manipulação e controle social estatal, como ferramenta de manter a ordem e também a desordem, e ainda como ressalta Jacques Rancière[26] é “um regime intelectual de pensamento da causalidade a um regime moral de compreensão do bem e do mal”.

Traços da cultura se manifestam na esfera dos comportamentos sociais, por isso as sociedades atuais são constituídas e instituídas pelas crises existenciais, pois a insegurança pessoal vem conquistando território, e isso é feito de forma proposital por aqueles que querem ser sempre controladores de uma massa indecisa e perdida[27].

Os tempos remotos em que vivemos, apresentam um quadro social em constante mudança, onde as garantias inexistem, e, portanto, geram um universo de insegurança e de medo. Podemos dizer que nossa cultura ocidental, onde o individualismo e o consumismo reinam, faz com que o sentimento de desamparo seja ainda mais intenso.

Como consequência, vemos exemplos de casos de defesa pessoal, o que nos mostra que as pessoas se encontram em um sistema de vigilância contínua: condomínios fechados, vigiados, com inúmeros aparelhos de “segurança”; cada vez mais, o indivíduo tenta se “proteger”, fechando vidros de carros, travando portas, assumindo comportamentos defensivos.

Podemos dizer que os medos que afligem a sociedade não são mais os mesmos, pois os tempos mudaram, e a forma de controle é feito diferente, não obstante, alguns desses medos continuam se perpetuando, como é o exemplo do medo do inferno, utilizado líderes religiosos para aprisionar os seus fiéis na sua igreja, ainda hoje ele existe, e sempre existirá, pois percebe-se que o ponto fraco daqueles que ali estão, é o medo do inferno, por isso, esse medo será sempre contemporâneo[28].

Alguns desses medos continuam a existir, e sempre existirão, por que são inerentes a natureza humana, e mesmo que os tempos mudem, eles estarão impregnados a nossa natureza, se manterão também, por que aqueles que conduzem a massa percebem que esses medos são sempre “necessários” para que o sistema continue funcionando da mesma forma, de maneira explícita no sistema ditatorial ou sutil na democracia. Para que essa forma de conduzir as pessoas e a sociedade se perpetuem, e dessa forma, as coisas nunca mudem, pois, a mudança só viria de forma positiva para aqueles que estão sendo comandados e reprimidos de alguma forma, se essa “cadeia” fosse quebrada, mesmo que de forma imperceptível[29].                     

O medo contemporâneo afeta toda a humanidade, não há como fugir de algo que nos cerca a todo o momento, sem nem percebermos, a todo momento, e de várias formas, a massa é conduzida a fazer aquilo que é vontade de uma minoria controladora, e claro, para que isso seja feito, deve-se imperar o medo.

Quando analisamos o filme “A vila” (The village), percebemos que existe um controle sob aqueles sujeitos ao poderio dos anciões, são controlados por meio do medo, que nos apresenta um dilema atual, pois o medo de alguma forma, ainda nos controla, e sempre nos controlará.

Podemos fazer analogias também ao “mito da caverna de Platão”[30], que relata a história de pessoas que não conheciam sequer a luz do sol, pois viviam aprisionados em uma caverna por medo do que era desconhecido, e no dia que um deles resolveu sair, percebeu o mundo realmente da forma que “é”, ali chegou a conclusão que o que viviam era ilusão, contudo, quando resolveu voltar a caverna e contar aos outros o que tinha visto, foi morto pelos colegas, por que acreditavam que ele estava louco, com isso se chega a conclusão, que muitas vezes, aqueles que nós enxergamos como loucos, são os que podem ter uma melhor percepção do que nos cerca.

Gustavo Santos[31] assevera:

O medo e o amor são caminhos paralelos, como tal, nunca se tocam e tu só podes escolher um. Qual tens escolhido até hoje? Em qual desejas permanecer para sempre só dependes de ti, sabes disso? Este livro, tal como todos os outros que já escrevi, estão escritos para te encher de poder pessoal, para que te faças valer e, finalmente, comeces a contar contigo. Tu dependes de ti. Só dependes de ti. E se só dependes de ti, os poucos medos que consciente ou inconsciente te possam assombrar a vida são automaticamente enfrentados e ultrapassados quando os identificas. É assim que faço. Só as pessoas que dependem de si querem o melhor para si. As outras nem ideia fazem do que querem. Andam por aqui a fingir-se felizes quando nem imaginam o que é a felicidade e a mostrar-se quando nem imaginam quem são. Sozinhas, quando ninguém as vê, tornam-se humanas e desfalecem.

O medo sempre existirá, e isso é inevitável, o que deve ser feito é aprendermos a lidar com ele, e saber identificar quais limitações nos é imposta pelo medo de algo ou de alguém, por que o maior problema do medo, é fazer com que aquele que está sendo controlado, deixe de enxergar novos horizontes, como foi o caso dos moradores da vila mostrada no filme, como foi o caso dos que estavam na caverna no mito de Platão, como é o caso dos religiosos que estão dentro de uma igreja sendo comandados muitas vezes por líderes que se aproveitam da situação para tirar proveito, e tantas outras situações que poderíamos falar a título de exemplo.

Se for feita uma análise minuciosa do que nos cerca, iremos perceber que o medo e sua cultura está impregnado na natureza humana, portanto, estará impregnada em todas as gerações futuras, talvez com uma nova roupagem, mas sempre existente, pois os tempos mudam, e os medos também, mas nunca deixam de nos acompanhar.

Com isso verificasse que o medo é atemporal, pois sempre existira, e incidirá em diferentes níveis sobre as pessoas, alguns se permitem serem menos controlados, outros simplesmente aceitam ser conduzidos e se permitem ser controlados psicologicamente por aqueles que sabem que o poder sobre o homem, entre outras coisas, está no poder de entender os seus medos e suas respectivas consequências.

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Sobre os autores
Leonardo Barreto Ferraz Gominho

Graduado em Direito pela Faculdade de Alagoas (2007); Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2010); Especialista e Mestre em Psicanálise Aplicada à Educação e a Saúde pela UNIDERC/Anchieta (2013); Mestre em Ciências da Educação pela Universidad de Desarrollo Sustentable (2017); Foi Assessor de Juiz da Vara Cível / Sucessões da Comarca de Maceió/AL - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Foi Assessor do Juiz da Vara Agrária de Alagoas - Tribunal de Justiça de Alagoas, por sete anos, de 2009 até janeiro de 2015; Conciliador do Tribunal de Justiça de Alagoas. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito das Obrigações, das Famílias, das Sucessões, além de dominar Conciliações e Mediações. Advogado. Professor da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Professor e Orientador do Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF -, desde agosto de 2014. Responsável pelo quadro de estagiários vinculados ao Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF - CCMA/FACESF, em Floresta/PE, nos anos de 2015 e 2016. Responsável pelo Projeto de Extensão Cine Jurídico da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF, desde 2015. Chefe da Assessoria Jurídica do Município de Floresta/PE. Coautor do livro "Direito das Sucessões e Conciliação: teoria e prática da sucessão hereditária a partir do princípio da pluralidade das famílias". Maceió: EDUFAL, 2010. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico I: discutindo o direito por meio do cinema”. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821832; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito civil e direito processual civil”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821749; Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 01. São Paulo: Editora Lexia, 2017. ISBN: 9788581821856. Coordenador e Coautor do livro “Coletânea de artigos relevantes ao estudo jurídico: direito das famílias e direito das sucessões”. Volume 02. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558019. Coordenador e Coautor do livro “Cine Jurídico II: discutindo o direito por meio do cinema”. Belém do São Francisco: Editora FACESF, 2018. ISBN: 9788545558002.

Wesley Clistenes da Silva Vargas

Acadêmico de Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Exatas do Sertão do São Francisco - FACESF.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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