CONCLUSÃO
A tomada de consciência sobre a situação dos pacientes de hospitais psiquiátricos impulsionou o movimento da luta antimanicomial no Brasil. Em 1787, em Baurú, no Encontro Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental, surge o Movimento Nacional da Luta Antimanicomial, com o lema “Por Uma Sociedade Sem Manicômios”, que é uma contestação e discussão em torno da qualidade e do modo dos serviços e atenção prestados às pessoas com doenças mentais; enfatiza a necessidade de mudanças do modelo de assistência social de saúde do país.
Quando o manicômio se configura numa estrutura institucional totalizadora, essa estrutura engessa qualquer outra forma de melhoramento ou possibilidades de melhoria. A questão que se levanta é quanto a necessidade desse tipo de instituição, no lugar de mecanismos humanizados de cuidados. Verificou-se, com a política adotada pela Itália, por exemplo, que aboliu os manicômios, níveis deveras significativos de bem estar da população com transtornos mentais.
Esse movimento é uma participação pelo diverso, pela pluralidade, ele é democrático, por isso não é somente daqueles que trabalham com a saúde mental, como psiquiatras, mas é do coletivo; é principalmente daqueles que tem uma ligação efetiva com a problemática, que são os familiares dos pacientes em manicômios, porque é dessa forma, somando forças, que o movimento se engrandeceu e tornou-se bastante expressivo na luta pela humanização e, extinção desse sistema precário. Nesse sentido, Ana Marta Lobosque (2006, p. 103) relata que a Luta Antimanicomial tornou-se
Um movimento social, ou seja, aberto a todos os interessados em repensar as formas e modos de presença da loucura na cidadania; aberto, muito particularmente, aos principais envolvidos, ou seja, aos próprios loucos. Já não se trata de defender o usuário em seu nome, mas de convidá-lo a uma postura ativa de militância; não de lutar por ele, para o seu bem, mas com ele, por uma sociedade diversa, enquanto um bem comum.
Uma das primeiras grandes conquista do Movimento Antimanicomial, que passou a ser uma luta de fato sócia, agindo como ator daquilo que era de seu interesse, como audiências públicas sobre saúde mental e vários outros meios de intervenção, mostrando que são atores sociais, foi a promulgação da Lei 10.216 de 2001 que trata da Psiquiátrica no Brasil:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra.
Art. 2o Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo.
Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental:
I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades;
II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade;
III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração;
IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;
V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária;
VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis;
VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento;
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis;
IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
A Lei 10.216 e a instituição dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) é uma forma de atenção alternativa aos manicômios, hospitais psiquiátricos, que buscam a preferência pelo menor uso de medicamentos possíveis, fortalecendo e preferindo o estímulo ao convívio social. Isso já mostra uma perspectiva de substituição dos hospitais psiquiátricos.
Nota-se, pois, que toda essa luta para extinção desse modelo segragador, é também uma luta pelos Direito Humanos, pelo reconhecimento da dignidade e da diferença. Lutar é a opção que resta e os desafios é força motriz da busca por um país empático e altero, para que se possa enxergar o próximo em plenitude, com todas as suas cores e interpretação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ASSIS, Machado. O alienista. Rio de Janeiro: Três livros e Fascículos, 1984.
ARBEX, Daniela. Holocausto Brasileiro: vida, genocídio e 60 mil mortes no maior hospício do Brasil. São Paulo: Geração Editorial, 2013.
BRASIL, Ministério da saúde. Nise da Silveira: vida e obra. Brasília: editora MS, 2005.
BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Subsecretaria de Assuntos Administrativos. Memória da loucura: apostila de monitoria / Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva, Subsecretaria de Assuntos Administrativos. Brasília: Ministério da Saúde, 2008.
BROLEZZI, Antonio Carlos. Empatia em Vygotsky. Disponível em:<
http://escolastransformadoras.com.br/wp-content/uploads/2015/11/empatiaemvigotski.pdf > Aceso em 16 de julho de 2016.
CÂMARA DOS DEPUTADOS, Coordenação de Publicações, (2002). Seminário Direito à Saúde Mental: regulamentação e aplicação da Lei 10.216 (2001; Brasília).
DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução: Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
FILHO, Correia João. A loucura que nos habita, e a terapia feita de arte e prazer. Disponível em: < http://www.redebrasilatual.com.br/revistas/83/a-loucura-que-nos-habita > Acesso em 16 de julho de 2016.
FOUCAULT, Michel. (1978) História da loucura na Idade Clássica. Trad. de José Teixeira Coelho Netto. São Paulo, Editora Perspectiva.
__________________. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Trad. Lígia M. Ponde Vassalo. Petrópolis: Vozes, 1987.
LOBOSQUE, Ana Marta. Caderno Saúde Mental: a reforma psiquiátrica que queremos, por uma clínica antimanicomial. Belo Horizonte, 2006.