O Convênio 42/16: da sua edição à sua inconstitucionalidade

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Objetiva-se nesse artigo analisar a convênio 42/16.

1. Introdução

O presente trabalho fará uma análise do convênio 42/16, examinando, para isso, o que este vem a ser, quais suas disposições e a sua harmonia para com o sistema jurídico brasileiro.

Para o perfeito exame desse convênio, far-se-á necessário examinar as isenções, analisando qual a relação existente entre elas, os incentivos e benefícios fiscais, em especial quando esses dizem respeito ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Por conseguinte, estudar-se-á como as isenções atuam sobre o ICMS, qual o meio competente para outorga-las, no que tange àquele tributo, bem como quais os feitos as isenções provocam nesse imposto quando da sua concessão.

Consolidado todos esses pontos, investigar-se-á se o referido convênio pode ou não impor as alterações por ele propostas, atentando-se, em caso afirmativo, em quais possibilidades isso será possível e a partir de qual momento.

Afora isso, também questionar-se-á sobre a constitucionalidade desse convênio, elencando quais os fundamentos que embasam sua inconstitucionalidade ou não.       

2. Contextualização

Antes da existência dos Estados Modernos eram comuns as cobranças de certos recursos para a manutenção da ordem social. Nesse sentido, pode-se, rapidamente, lembrar dos Feudos, nos quais os suseranos exigiam dos seus vassalos uma série de obrigações, que tinha como fundamento suprir de recursos aquela ordem social vigente.

Hodiernamente, mesmo após o surgimento dos Estados Democráticos de Direito, essa necessidade de recursos não cessou, uma vez que o Estado necessita de capital para perfazer todas as suas obrigações[1].

A grande mudança que ocorreu ao longo do século, na verdade, se deu na forma como sujeito ativo passou a invadir o patrimônio do contribuinte, melhor explicando, se outrora tinha o senhor feudal o direito de cobrar o tributo da forma que melhor lhe convinha, na atualidade essa cobrança se dá com base e uma série de leis, que visam não só assegurar direitos e garantias dos contribuintes, mas também do próprio ente tributante.

É dessa forma que também se comporta o Estado Brasileiro, que em suas quatro figuras (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), utiliza-se da competência traçada no seio da constituição para instituir e cobrar os tributos necessários para a sua subsistência.

Ocorre que, a República Federativa do Brasil é sedenta por recursos, sempre requisitando dos contribuintes mais recursos, seja pela grande gama de direitos garantidos na Carta Magna de 1988, seja pela ineficiência dos gastos públicos, como ocorre atualmente devido, principalmente, à grandes denúncias de corrupção.

Essa sede de recursos é agravada quando da existência de crises, nas quais o Estado, inadmitindo seus erros ou recusando-se a diminuir seus gastos, tende a exigir cada vez mais da sua galinha que põe ovos de ouro, mediante essa realidade, leciona Roberto Quiroga Mosquera[2], que o Estado tende a matar sua preciosa galinha.

É nesse contexto que se enquadra o objeto de estudo do presente trabalho, tendo em vista a atual crise que assola o Brasil[3], bem como a fome de recursos de todos os entes federativos, que buscam a cada dia criarem novas exações, para tentar driblar o déficit fiscal.

Seguindo esse roteiro de como proceder em crises é que os Estados e o Distrito Federal observaram nas isenções, que foram concedidas para o ICMS, como uma boa oportunidade de recomposição de caixa, motivo que levou o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), em um primeiro momento, a publicar o convênio 31/16[4].

Esse convênio impunha como condição para fruição de incentivos e benefícios de ICMS, por parte das empresas, o deposito de, no mínimo, 10% (dez por cento) valor do respectivo incentivo ou benefício.

Não bastasse essa exigência, tal convênio previa como sanção a perda em definitivo do incentivo ou benefício por parte das empresas que não cumprissem aquela diretriz por três messes consecutivos.

Após sua edição, uma parcela considerável da doutrina se insurgiu contra essa medida, apontado em alguns artigos e notícias de jornais[5] as razões pelas quais esse convênio seria inconstitucional.

Não contestes com repercussão negativa do convênio 31, os Estados editaram um novo convênio – denominado convênio 42/16[6] – que apesar de revogar o convênio 31, nada mais fez do que reafirmar as condições e sanções já anteriormente impostas no convênio revogado, visto que:

  1. Autorizou os Estados e o Distrito Federal a condicionar fruição de incentivos e benefícios de ICMS ao pagamento de, no mínimo, 10% (dez por cento) do respectivo incentivo ou benefício;
  2. Determinou que as empresas que descumprirem, por 3 (três) meses, consecutivos ou não, o disposto nesse convênio, perderiam os respectivos incentivos ou benefícios; e
  3.  Previu a instituição de um fundo de equilíbrio fiscal, destinado à manutenção do equilíbrio das finanças públicas, constituídos com recursos oriundos do depósito proveniente da cobrança citada no item “a” supracitado.   

3. Isenções

Primeiramente, deve-se consagrar que as isenções, benefícios e incentivos fiscais são institutos distintos e que não se confundem, sendo que os incentivos e benefícios fiscais remente a outras ciências, conforme doutrina Kiyoshi Harada[7], que determina que os incentivos consistem em:

(...) um conceito da Ciência das Finanças. Situa-se no campo da extrafiscalidade e implica redução da receita pública de natureza compulsória ou a supressão de sua exigibilidade. É um instrumento do dirigismo econômico; visa desenvolver economicamente determinada região ou certo setor de atividade.

Já as isenções remetem ao direito tributário, aduzindo Clélio Chiesa[8] que:

O tema das isenções está diretamente relacionado com a competência tributária, pois, conforme a sistemática do direito positivo brasileiro, somente está autorizado a conceder isenções a pessoa que tem a aptidão para instituir tributo. Assim, a Constituição não só repartiu a competência entre pessoas políticas, como também impôs alguns limites ao seu exercício (arts. 151, III; 155, §2º, II e 155, §2º, XII, e e g).

Em que pese essas diferenciações, cabe destacar que para que os incentivos e benefícios ficais sejam concedidos pelo legislador infra legal esses devem ser convertidos da linguagem financeira para a jurídica.

 Esse câmbio se exterioriza no mundo tributário através de isenções, que buscam dar efetividade as extrafiscalidades pensadas pela ciência das finanças, portanto, eis a relação existente entre os institutos acima citados.

Como antes lecionado, as isenções possuem relações com as concessões de incentivos e benéficos, apesar de serem institutos diferentes. Ocorre que tal afinidade mostra-se muito mais evidente no que tange ao ICMS, visto que, por determinação legal, as concessões de incentivos e benefícios para esse tributo devem ser conferidos por meio convênios, como se verá em seguida no item “5”, concessões essas, que no ICMS, normalmente, são feitas por meio de isenções.

Dito isso, cabe a partir de agora examinar o que vem ser o instituto das isenções, apresentando para tanto suas características, seu conceito e como essa atua sobre o chamado Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.

Inicialmente, deve-se ressaltar que as isenções apresentam um efeito prático, que resulta na impossibilidade de cobrança do tributo que seria devido caso da inexistência da lei isentiva.

A esse respeito, salienta José Eduardo Soares de Melo[9], que esse instituto apresenta uma característica extrafiscal, uma vez que busca primordialmente defender valores Constitucionais, tais como “o combate à inflação e ao desemprego”.

Ou seja, as isenções caracterizam-se por serem um meio hábil para dar efetividade aos objetivos traçados no art. 3[10], da Constituição da República[11], especialmente no que tange ao ICMS e a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais e regionais, como salientam, Ives Gandara Martins e Paulo de Barros Carvalho[12].

Consolidada essas breves características a respeito das isenções, cabe agora conceituá-la, contudo, essa tarefa não se manifesta das mais fáceis, visto que a doutrina não é uníssona a esse respeito.

Nesse sentido, leciona Roque Antonio Carrazza[13], que a doutrina, no mínimo, se divide em três correntes para definir o que vem a ser aquele instituto, sendo elas: a) isenções como dispensa do pagamento do tributo; b) como hipótese de não incidência tributária legalmente qualificada; c) como uma norma que suprime um dos critérios da regra matriz de incidência.

Dentre todas as correntes possíveis, nos parece mais adequada a última. Esse conceito foi desenvolvido por Paulo de Barros Carvalho[14], que visualiza a isenção como uma norma de estrutura, que atua sobre “a regra matriz de incidência tributária” de forma a mutilar, parcialmente, um ou mais critérios da norma de incidência.  

Nessa teoria proposta, o que ocorreria, na verdade, seria o encontro de duas normas, situação na qual haveria a prevalência da norma isentava, o que ocasionaria a não incidência da exação.

Mediante tal conceituação, extrai-se que a isenção é uma norma, e, portanto, para que essa possa existir e propagar seus efeitos, necessita de lei. A esse respeito, ensina José Souto Maior Borges[15], que toda a matéria tributária deve ser regulamentada per meio de leis, não se caracterizando-se as isenções como uma exceção a essa regra.

Destarte, elas se encontram submissas não só a lei, mais também ao princípio da legalidade, isto é, para que um sujeito ativo tenha direito à isenção esta deve ser antes prevista em lei.

Essa necessidade é reforçada a partir do art. 97[16], do, CTN[17], que segundo José Souto Maior Borges[18], nada mais faz do que evidenciar o princípio da legalidade, ao estabelecer a necessidade de lei para criar tributos, mais também, exigi-la para: extinção, majoração, redução, definição do fato gerador da obrigação tributária principal, fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, cominação de penalidades para as ações ou omissões contrárias a seus dispositivos, ou para outras infrações nela definidas; e para as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades[19].

Vale lembrar que, ao colocar a necessidade de lei para a exclusão do crédito tributarão, nada mais fez o legislador do que estabelecê-la como um requisito a concessão de isenções, dado que essas são incluídas no art. 175[20], do CTN, como uma causa extintiva do crédito tributário.

Fora isso, deve-se ressaltar que as isenções não devem atender somente ao princípio da legalidade, mas, sim a todo um conjunto de princípios, pois como bem expõe Roque Antonio Carrazza[21], às isenções se aplicam todos aqueles princípios que são imponíveis a instituição de tributos, tais como o da igualdade e segurança jurídica.

 Sendo assim, calha ainda destacar que as isenções, ao serem criadas, não devem se opor a isonomia, a capacidade contributiva, além de necessitar observar, acima de tudo, o interesse público.

3.1 Classificação das isenções

A doutrina costuma classificar as isenções em diferentes formas, que levam em consideração diversos critérios. Nesse trabalho, examinar-se-ão as classificações que dividem as isenções em razão: a) da duração do benefício; b) da imposição de condições.

Quanto a duração, essas podem ser concedidas por prazo certo (determinado) ou por prazo incerto. A respeito dessa classificação Paulo Guilherme Accorsi Lunardelli[22] diz que, na verdade, ela leva em consideração a vigência da regra matriz.

Sendo assim, as isenções a prazo certo seriam aquelas que “apresentam vigência limitada a um determinado período do tempo que, esgotado, retira-lhe capacidade a de juridicizar eventos supervenientes”[23].

Já o conceito daquelas concedidas por prazo incerto pode ser extraído de modo negativo, de forma a delimitá-las como sendo aquelas que o legislador, quando da sua concessão, não determinou o exato momento do exaurimento de sua vigência.

Como ensina José Souto Maior Borges[24], as isenções concedidas por prazo incerto não significam que são eternas. Na verdade, o legislador pode a qualquer momento as revogar, porém, a exigência da exação ao contribuinte somente poderá ser feita após observados os princípios da anterioridade e da anterioridade nonagesimal.

A segunda classificação dividi as isenções em condicionais e incondicionais. De acordo como Roque Antonio Carrazza[25], esse critério leva em consideração se a isenção foi concedida com imposição de algum ônus. Havendo a exigência algum encargo estar-se-á diante de uma isenção condicionada, caso contrário ter-se-á uma isenção incondicionada.

4. Isenções no ICMS

Com base no que fora exposto até aqui a respeito das isenções, torna-se necessário, agora, analisar como essas atuam sobre o ICMS, tendo em vista as particularidades desse tributo.

Por isso posto, deve-se observar que o ICMS se traduz por ser um tributo diferenciado, pois como ensina Paulo de Barros Carvalho[26], o ICMS é o único tributo no qual os sujeitos ativos encontram-se obrigados a criá-lo e cobrá-lo, ou seja, esse imposto caracteriza-se por ser uma exceção a facultatividade da competência tributária, que dá ao ente tributante a facultatividade de instituir ou não o tributo.

Essa obrigatoriedade advém das consequências que as isenções acarretam sobre a não-cumulatividade do ICMS prevista no art. 155, §2º, I, da Lei Maior[27]. A esse respeito, estatui Eliud José Pinto da Costa[28], que a isenções sobre o ICMS apresentam um efeito negativo sobre sua não-cumulatividade, em especial no que tange ao princípio da isonomia, tendo em vista o disposto, no art. 155, §2º, II, da CF.

Tal consequência negativa, advém do fato das concessões de isenções sobre o ICMS ocasionarem a “perda do direito a crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes”, bem como acarretar “a anulação do crédito relativo às operações anteriores”[29].

Assim, devido as consequências traçadas no art. 155, §2º, II, da CR, o princípio da não-cumulatividade para o ICMS, quando da concessão de isenções, fica comprometido, fato esse que exige do legislador maior atenção para as hipóteses em que se pode conceder isenções.

Visando garantir maior controle na concessão de isenções relacionadas ao ICMS, o legislador estabeleceu um procedimento diferenciado para a sua concessão, à medida em que, além de se preocupar com o princípio da legalidade, estabeleceu um “plus” na sistemática autorizativa de benefícios para o ICMS.

Esse método diferenciado, advém, primeiramente, do disposto no art. 155, §2º, XII, “g” da CR88, que elenca a necessidade de lei complementar para “regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.”[30].

Cumprindo-se o disposto nesse artigo, foi editada a lei complementar nº. 24/75[31], na qual se consagrou que: a outorga de isenções, atinentes ao ICMS, só poderiam ser concedidas por meio de convênios, que seriam celebrados em reuniões do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ).

A esse respeito, aduz Luciano Amaro[32], que normalmente os convênios são apenas acordos entre pessoas políticas que visam a “fiscalização ou a arrecadação de tributos, à troca de informações de interesses fiscais”, contudo, quando se fala em convênios de ICMS, esses possuem um outro significado, já que esses inovam em matéria de tributário.

Dessa forma, torna-se inegável que a concessão de isenções para o ICMS se dá de uma forma diferenciada, contudo, isso não significa dizer que no âmbito do ICMS, as isenções não observam ao princípio da legalidade.

Na verdade, a apesar dessa sistemática ser ímpar e muitas vezes criticadas pela doutrina, como faz Paulo de Barros Carvalho que elenca aspectos positivos e negativos a respeito desse tema[33], cremos que ela atende ao princípio da legalidade, uma vez que mesmo após a aprovação dos convênios entre os Estados, torna-se necessária sua ratificação pela assembleia legislativa de cada ente federativo.

Todavia, caso a sistemática acima exposta não seja observada, nos parece evidente que o convênio não guardará consonância com o princípio da legalidade, motivo pelo qual esse será inconstitucional.

Ou seja, nesse ponto entendemos acertada a declaração de Paulo de Barros Carvalho[34] para quem os convênios não podem ser ratificados pelos Secretários de Estado e logo em seguida aprovado pelo governador, sem, contudo, passar por deliberação da assembleia legislativa do respectivo estado.

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Corrobora com esse entendimento a ministra Ellen Gracie, que proferiu no RE 539.130[35], a seguinte decisão:

A Constituição vincula a validade do benefício à concessão por lei. Em sentido discrepante, o benefício fiscal foi concedido por decreto legislativo.

Leio a parte final do artigo, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g., de modo aditivo. Quer dizer, a garantia da regra da legalidade não é excluída imediatamente pela regra que busca assegurar harmonia no âmbito da Federação. O Poder Legislativo não pode delegar ao Executivo, por meio direto ou indireto, a escolha final pela concessão ou não do benefício em matéria de ICMS.

Ainda assim, especificamente para a concessão de benefícios relativos ao ICMS, dou à palavra lei interpretação mais ampla, de modo a significar legislação tributária.

Para tanto, observo que a ritualística constitucional e de normas gerais que rege a concessão de tais benefícios é peculiar. De início, devem os estados federados e o Distrito Federal reunirem-se para aquiescer ou rejeitar a proposta para concessão dos benefícios fiscais. Se houver consenso no âmbito do Confaz, composto pelos Secretários de Fazenda ou equivalente, cabe ao estado-membro ratificar o pronunciamento do órgão. Embora a Lei Complementar 24 se refira à publicação de decreto pelo Chefe do Poder Executivo, a disposição não pode prejudicar a atividade do Poder Legislativo local.

Ratificado o convênio, cabe à legislação tributária de cada ente efetivamente conceder o benefício que foi autorizado nos termos de convênio. Preservada a palavra do Legislativo e dado o longo caminho necessário à aprovação do incentivo, descabe impor forma mais rigorosa

Exteriorizado nosso ponto de vista a respeito da observância do princípio da legalidade, no que tange aos convênios de ICMS, cabe aqui indagar qual será a consequência, tanto para o ente tributante como para o contribuinte, quando da inconstitucionalidade do convênio?

A resposta a esse questionamento nos parece depender da conduta do contribuinte, ou seja, se este teve ou não relação com a ilegalidade ou inconstitucionalidade do convênio.

Melhor explicando, nesse ponto cabe analisar se o administrado corroborou de algum modo para com a mácula do convênio, atuando de forma ilegal ou corrupta, para que isenção lhe fosse concedida.

Em caso afirmativo, pensamos que o convênio, deve ser cancelado, perdendo o contribuinte, nesse caso, de pronto, o direito ao benefício, além de dever restituir todos os valores que deixou de pagar desde a concessão da isenção.

Essa posição se deve, pois, como aponta José Souto Maior Borges[36], as isenções devem sempre guarda consonância, acima de tudo, com princípio da supremacia do interesse público, sucede que, quando o sujeito passivo corrobora com a ilegalidade do convênio, o interesse público fica comprometido, causa pela qual o benefício deve ser extinto.

Fora isso, tal macula, além de se opor ao princípio do da supremacia do interesse público, põe em xeque outros princípios que devem ser observados pelas isenções, tais como a isonomia e capacidade contributiva.

Por outro giro, não tendo o contribuinte atuando de forma a gerar o vício do convênio, este não deverá sofrer nenhuma restrição, mesmo que o convênio seja cancelado.

Isso acontece, em primeiro lugar, tendo em vista que o ato administrativo é pautado, como aduz José dos Santos Carvalho Filho[37], pela sua presunção de confiança, fato esse que induz o contribuinte a pensar que, uma vez convalidado um convênio de ICMS, esse encontra-se em perfeita consonância com todas as normas legais.

Supor em sentido contrário, seria ameaçar a segurança jurídica do contribuinte, que pautado em um convênio editado, planeja-se de acordo com tal realidade, apesar disso, vê-se, de uma hora para outra, surpreendido com o possível desaparecimento do benéfico fiscal.

Nessa situação, nos parece correto o posicionamento adotado por Ives Gandara Martins e Paulo de Barros Carvalho[38], que ao analisarem as sanções impostas pelo art. 8º, da lei complementar 24/75[39], aconselham que: “aquele que concedeu o benefício sem observar as condições legais ficaria obrigado a reembolsar o Estado destinatário das mercadorias quanto ao valor correspondente aos créditos indevidamente concedidos”.

Portanto, para nós, nessa segunda hipótese, mesmo que os benefícios sejam declarados inconstitucionais, os contribuintes farão jus as isenções, podendo usufruí-las: a) até o final do prazo acordado, caso essa seja concedida por prazo certo; b) nos casos de isenções concedidas por prazo indeterminado, essas devem ser garantidas até o final do exercício financeiro no qual se tenha declarado sua ilegalidade, observando-se, ainda, os princípios da anterioridade (art. 150, III, “b”) e da anterioridade nonagésimal (art. 150, III, “c”)[40].

5. Convênio 42/16

É chegada a hora de examinar o convênio 42/16 e as consequências das medidas por ele impostas. Porém, antes de analisar suas decorrências, cabe relembrar o que é esse convênio e qual as medidas que ele fixa.

O convênio 42/16 nada mais é, a grosso modo de comparação, do que uma reedição do convênio 31/16, que já havia previsto novas condições para que as empresas fruíssem de incentivos e benefícios fiscais.

Com a edição do convênio 42/16 revogou-se o convênio 31/16, entretanto, esse novo convênio também continuou a prever novas condições para fruição benefícios fiscais já concedidos.

Desse feita, estatui a cláusula primeira do convênio 42/16, que:

Cláusula primeira: Ficam os estados e o Distrito Federal autorizados a condicionar a fruição de incentivos e benefícios fiscais, financeiro-fiscais, financeiros e dos regimes especiais de apuração que resultem em redução do valor ICMS a ser pago, inclusive dos que ainda vierem a ser concedidos, a que as empresas beneficiárias depositem nos fundos de que trata a cláusula segunda o valor equivalente a, no mínimo, dez por cento do respectivo incentivo ou benefício. (grifos nossos)

A leitura desse artigo, por si só, já se mostra controversa, uma vez que ele autoriza aos Estados exigirem das empresas 10% do ICMS que outrora fora isento, cobrança essa que afetará, não só, eventos futuros, mas também, aqueles fatos que já ocorram ou que se iniciaram no passado.

Não bastassem as condições e cobranças impostas no caput da cláusula primeira do referido convênio, o parágrafo segundo dessa clausula estabelece uma sanção àqueles contribuintes que descumprirem o pagamento da exação.

Assim, impõe o §2º, da clausula primeira, do convênio 42/16 que:

§ 2º: O descumprimento do disposto no caput por 3 (três) meses resultará na perda definitiva do respectivo incentivo ou benefício fiscal, financeiro-fiscal, financeiro ou de regime especial de apuração. (grifos nossos)

Apresentada a referida norma, cabe-nos agora analisar a sua possibilidade de aplicação e constitucionalidade, para alcançar esse objetivo, far-se-á, primeiramente, necessário dividir esta analise em quatro grandes momentos, levando-se em consideração a classificação das isenções, como exposto no item “3.1”.

Desse modo, examinar-se-á o convênio 42/16, levando em consideração as isenções: a) concedidas por prazo certo e em função de determinadas condições; b) concedidas por prazo

Advém, desde logo, fazer uma ressalva, toda análise feita abaixo presume-se e baseia-se na hipótese do administrado não ter contribuído para a inconstitucionalidade, seja do convênio, seja do benefício, ou da isenção, pois como dito e por nós defendido no item “4”, nos casos em que o contribuinte de alguma forma atua para a caracterização da ilegalidade do convênio, incentivo, benefício ou isenção, este perderá de imediato esse direito, independentemente do fato deste ter sido concedido por prazo certo, além do que, deverá ressarcir aos cofres públicos todos os valores que deixou de pagar desde o momento em que passou a gozar da beneficie que lhe foi concedida.

5.1 Isenções concedidas por prazo

Escolheu-se como primeiro ponto de análise as isenções de ICMS que foram concedidas por meio de por prazo

A respeito dessas isenções, a doutrina, via de regra, não costuma discordar de seus efeitos quando da sua revogação[41]. Nesse sentido cabe assinalar os ensinamentos de José Souto Maior Borges[42], que salienta que a concessão de uma isenção não significa que o poder legislativo perdeu a competência para legislar sobre o tema, ou ainda, não tem competência para revogar a lei isentiva.

Percebe-se que o legislador sempre poderá alterar a lei, não obstante essa possibilidade, os direitos do contribuinte ficarão resguardos, visto que a revogação da isenção somente poderá surtir efeitos após decorridos exaurido o prazo pelo o qual a isenção foi concedida.

Coadunando com esse entendimento, o legislador, previu no art. 178[43] do Código Tributário Nacional, que as isenções quando concedidas por prazo certo e com imposição de determinadas condições, deveriam assegurar ao contribuinte o direito a usufruir o benefício legal até o esgotamento do prazo previsto, desde que este continue a cumprir com os encargos a que lhe foram atribuídos.

Sem embargo a afirmação feita acima, assinala-se que caso o administrado deixe de cumprir com os encargos a ele impostos, o direito à isenção perecerá, devendo o contribuinte, em nosso ponto de vista, pagar a exação a partir do momento em que passou a descumprir suas obrigações, contudo, nessa situação, o sujeito passivo não será obrigado a pagar os valores passados – quando ainda fazia jus a isenção – já que cumprira com todos os deveres até determinado período.

Resta agora indagar se pode o legislador alterar as condições impostas, durante a vigência das isenções?  A resposta, pensamos ser negativa, tendo em vista o princípio da segurança e da irretroatividade.

Para Cármen Lúcia Antunes Rocha[44] a segurança jurídica seria:

(..) o direito da pessoa à estabilidade em suas relações jurídicas. Este direto articula-se com a garanta da tranquilidade jurídica que as pessoas querem ter, com sua certeza de que as relações jurídicas não podem ser alteradas numa imprevisibilidade que as deixe invisíveis e inseguras quanto ao seu futuro, quanto ao seu presente e até mesmo quanto ao seu passado.

Dessa definição extrai-se que a segurança jurídica busca estabelecer uma ponte entre o passado e o futuro, mostrando tanto ao contribuinte, quanto ao administrador, como esses devem agir no futuro, característica essa que dá certeza as relações jurídicas.

 Acontece que, a mudança de regras ou de condições impostas ao sujeito passivo, durante o caminhar da relação jurídica, irrompe com a certeza do direito, desestabilizando a relação jurídica, pondo em xeque o princípio da segurança jurídica.

É justamente para evitar essa problemática, que surgi como desdobramento do princípio da segurança jurídica, o princípio da legalidade, que na CF de 88 encontra-se exteriorizado, por exemplo, no art. 5º, XXXVI[45] e no art. 150, III, “a”[46].

A respeito desse princípio, exalta Luciano Amaro[47], que ele traz consigo a ideia de que as leis somente podem propagar seus efeitos para o futuro, já em matéria tributária ele implicaria que novas leis tributárias só seriam aplicáveis aos fatos vindouros.

Utilizando-se desse princípio e o aplicando as isenções tributárias, extrai-se que em relação a isenções já concedidas, as alterações legais promovidas pelo legislador não poderiam surtir efeitos aos fatos ocorridos no passado, ou inda, que se iniciaram antes da edição da lei.

Portanto, quando da ocorrência de isenções de ICMS concedidas por prazo certo e sobre certas condições, nos parece inegável, que mesmo tendo o legislador o direito de alterar ou extinguir a lei isentiva, as possíveis mudança que venham surgir após essa mudança não produzirão nenhum efeito para os contribuintes que já gozavam do benefício e cumpriam com os encargos impostos.

Assim sendo, em se tratando de isenções de ICMS, concedidas por prazo certo e em função de determinadas condições, nos parece, inegável serem, inconstitucionais as mudanças e sanções trazidas pelo convênio 42/16, visto que os fatos já tinham ocorridos antes de sua ratificação.

 Sublinha-se que, para nós, essa solução é válida mesmo nas hipóteses em que as isenções foram concedidas unilateralmente pelos Estados, sem observar a necessidade de celebração convênios, pois, como já defendido nessa obra, ao nosso modo de ver, quando as isenções são concedidas em desconformidade com a constituição ou a lei, mas não tendo o contribuinte agido intencionalmente na formação desse vício, deverá o  Estado concedente da isenção arcar com as perdas financeiras provocadas por tal mácula. Tal posição valerá também paras outras situações abaixo, razão pela qual, não voltaremos a repetir esse argumento.

5.2 Isenções concedidas por prazo certo e incondicionadas

Outa situação surgi quando as isenções de ICMS são concedidas por prazo certo, mas o legislador não impõe nenhum ônus para que o contribuinte usufrua do benefício legal.

Essa hipótese, torna-se diferente, justamente pelo fato da isenção ser incondicionada, pois o art. 178, do CTN, em tese, determina que apenas as isenções concedidas por prazo e em função de determinadas condições, não podem ser revogadas ou modificadas por lei.

A esse respeito, aponta José Souto Maior Borges[48], que no passado a redação do art. 178, do CTN, era alternativa, portanto, bastaria que isenção fosse concedida, ou por prazo certo, ou condicionada, para que fosse assegurado, até o prazo estabelecido, o direito ao gozo ao benefício.

Entretanto, a redação do referido artigo foi alterada pela lei complementar 24/75, que passou a exigir simultaneamente os dois requisitos (prazo certo e imposição de condições) para que as isenções fossem irrevogáveis.

 Em que pese a “nova redação” do art. 178, do CTN, ainda nos parece que, as isenções, quando concedidas por prazo certo, mesmo que incondicionadas, não podem sofrer qualquer efeito em razão da ab-rogação ou da derrogação.

A justificativa para tal posicionamento reside no fato de que as isenções não são um favor concedido pelo ente tributante ao contribuinte, na verdade, essas são concedidas visando um interesse público.

Fora isso, destacam Ives Gandara Martins e Paulo de Barros Carvalho[49], que as isenções, muitas das vezes, buscam dar efetividade a objetivos traçados no seio da Constituição, em especial aqueles elencados no art. 3.

Ademais, elenca Paulo Guilherme Accorsi Lunardelli[50], que existiria uma relação intrínseca entre a norma isentiva e o direito adquirido, deste modo, uma vez concretizado o fato jurídico isento, nasceria o direito adquirido do contribuinte, que lhe permitiria se abster do cumprimento da relação jurídica tributária em face do fisco.

Por se tratarem de direito adquirido, essas isenções concedidas por prazo certo devem obedecer ao disposto no art. 5, XXXVI, da Constituição da República que consagra que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”[51].

Desse feito, em nosso modo de pensar, as isenções quando concedidas por prazo certo, caracterizam-se por conceder verdadeiro direito adquirido ao administrado, motivo pelo qual estes farão jus ao benefício até a data acordada.

Além disso, a adoção dessa linha de raciocínio, visa, ainda, resguarda a segurança jurídica do sujeito passivo, que confiando no direito à isenção, se planejou e fez investimentos acreditando que não teria que pagar o tributo até uma determinada data.

Ainda que se neguem as justificativas acimas expostas, deve-se ter em mente que, mesmo que, as isenções que foram concedidas por prazo certo pudessem ser revogadas, a nova lei ou convênio que abaliza a cobrança de tributo, tem como efeito prático a sua majoração, motivo pelo qual a exação só poderá ser cobrada, em via de regra, no próximo exercício financeiro, como se justificará com maiores detalhes no item “5.3”.

Em consequência desses argumentos, concluímos que as alterações trazidas pelo convênio 42/16, bem como as sanções por ele impostas, não podem atingir os contribuintes que já gozavam do direito de isenção antes da edição e publicação da referida norma, outrossim o contribuinte continuará tendo direito ao benefício até a data pré-estabelecida.      

5.3 Isenções concedidas por prazo indeterminado, com e sem imputação de condições

Nesse item serão analisados concomitantemente tanto as isenções concedidas por prazo indeterminado e incondicionadas, quanto aquelas que são concedidas por prazo indeterminado, mas com a imposição de determinados ônus.

O exame simultâneo dessas duas “formas” de isenção se deve ao fato de que, apesar de reconhecermos as diferenças existentes entre elas, os motivos e os argumentos usados para averiguar se existe direto adquirido “ad eternum” aos benefícios, bem como a partir de que momento esses tributos poderiam voltar a serem cobrados, são os mesmos.

Isso posto, relata , que as isenções concedidas por prazo indeterminado, não podem ser entendidas como perpetuas visto que: “É incompatível com o direito brasileiro a instituição de isenções perpetuas e seria ineficaz, quanto a esse ponto, a lei assim dispusesse.”.

A interpretação acima elencada nos parece acertada, pensar em sentido contrário seria admitir o legislador poderia dar um cheque em branco ao contribuinte, no qual se instituiria que o sujeito passivo seria isento para eternidade, mesmo que interesse público, ou ainda, que princípios que devem ser observados, tais como, capacidade contributiva e equidade, não fossem mais resguardados com decorrer dos anos.

Nesse momento, fica claro que o administrado tem sim direito à isenção de fatos pretéritos, entretanto, quando essa é instituída e concedido por tempo indeterminado, não significa dizer que ela nunca poderá ser revogada.

Realça-se que, nesse caso, nem mesmo a imposição de um ônus ou condição para o gozo de tais isenções mostra-se elemento suficiente para alterar a possibilidade de revogação.

Crer em sentido oposto também implicaria que o legislador jamais poderia editar nova norma, que disporia em sentido diverso, ou extinguiria o benefício para fatos futuros.

A grande questão que essa conclusão apresenta é determinar a partir de qual momento essas alterações passariam a surgir efeito para o contribuinte, melhor colocando o problema, em se tratando de isenções concedidas por prazo incerto, tendo o legislador alterado ou extinto o direito à isenção, quando ver-se-ia o sujeito passivo obrigado a pagar a exação?

Quanto a essa indagação, elenca Roque Antonio Carrazza[53], que a revogação de isenção equivale a criação de um novo tributo, por esse motivo, haveria necessidade de observância do princípio da anterioridade.

Isso quer dizer que, uma vez extinta ou diminuída uma isenção, a cobrança da obrigação tributária só poderia ser feita no próximo exercício financeiro. Não obstante esse entendimento, o STF, por meio da súmula 615[54], claramente se opõe a esse posicionamento, especialmente no que tange ao ICM.

Apesar dessa matéria ser sumulada, cabe destacar que existem alguns poucos julgados, nos quais o STF consagrou a necessidade de cumprimento do princípio da anterioridade quando da revogação ou alteração de benefícios fiscais, seja por meio de lei ou por convenio, como se decidiu na ADI 2325/DF[55], bem como no Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 564.225/RS[56] que consagrou:

IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – DECRETOS Nº 39.596 E Nº 39.697, DE 1999, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – REVOGAÇÃO DE BENEFÍCIO FISCAL – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE – DEVER DE OBSERVÂNCIA – PRECEDENTES. Promovido aumento indireto do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS por meio da revogação de benefício fiscal, surge o dever de observância ao princípio da anterioridade, geral e nonagesimal, constante das alíneas “b” e “c” do inciso III do artigo 150, da Carta. Precedente – Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.325/DF, de minha relatoria, julgada em 23 de setembro de 2004.

Em que pese o posicionamento dominante do STF sobre o tema, por meio de súmula, nos parece mais acertada a visão de Roque Antonio Carrazza[57]a respeito do tema, visto que a nova lei que extingue ou reduz uma isenção, acaba inevitavelmente, ou por criar uma nova exação, ou por aumentar a já existente.

Revelado isso, torna-se clara a necessidade de observância do princípio da anterioridade nessas hipóteses, resguardando-se ao contribuinte o dever de pagar o tributo somente no próximo exercício financeiro.

Com base nas afirmações acimas expostas, percebe-se que as alterações traçadas pelo convênio 42 – no que se refere as isenções concedidas por prazo incerto, estando elas vinculadas ou não a determinadas condições – essas somente serão aplicáveis aos administrados no próximo exercício financeiro, ou seja, só no ano de 2017.

6. A inconstitucionalidade do Convênio 42/16

Apesar de tudo até aqui exposto, mesmo assegurando a necessidade de observância de princípios como da anterioridade, legalidade e da irretroatividade, entendemos que o convênio 42/16 não pode aplicado em nenhuma situação.

Isso ocorre, pois, esse convênio padece de grave vicio constitucional, como passaremos a expor logo abaixo, por essa razão, ele não poderia compelir nenhum contribuinte a pagar os 10% exigidos, seja para aquelas já concedidas, muito menos para as novas.

Para justificar esse ponto de vista, primeiramente, deve-se analisar qual a natureza desse valor cobrado aos contribuintes. Uma rápida apreciação da cláusula primeira, do referido convênio, nos permite afirmar que se tem um verdadeiro de tributo, pois aquela cobrança se enquadra perfeitamente no conceito constitucional de tributo, que se encontra exteriorizado, também, no art. 3º da lei 5172/66[58].

Ou seja, a retenção de 10% autorizada pelo convênio 42/16 é um tributo, posto que, uma vez ocorrido o fato gerador da exação, o contribuinte ver-se-á obrigado a pagar, em razão da existência de uma lei ou norma, o valor cobrado pelo sujeito ativo, montante esse, que se exprime em moeda nacional (Reais).

Fora isso, essa exigência é devida sempre que realizado o fato gerador, isto é, ela independe da vontade do sujeito ativo. Destaca-se, ainda, o fato dessa cobrança não decorrer ato ilício.

Admitindo-se que se trata de um tributo, resta agora questionar qual seria sua espécie? Quanto a essa pergunta, a doutrina costuma divergir, pois, alguns como Eduardo Maneira e Marcos Correia Maia[59] o enxergam como um imposto, outros como Eduardo Suessmann[60], veem essa exação como uma contribuição.

Aqueles que enxergam essa cobrança como uma contribuição, defendem que ela não incide sobre a circulação jurídica de mercadoria, pois como justifica Eduardo Suessmann[61]:

(...) o tributo em questão não tem por fundamento a atividade de circulação jurídica de mercadoria, hipótese de incidência do ICMS, mas sim o fato de o contribuinte receber um incentivo fiscal, situação que em nada se compara com o ICMS, evidentemente. Segundo porque o montante arrecadado terá destinação vinculada a um fundo específico.

Embora respeitemos esse ponto de vista, cremos que, na verdade, se tem uma verdadeira cobrança de ICMS, uma vez que o convênio 42 reinstituiu uma parte da exigência do imposto, que outrora era isento, dando a ele uma destinação específica, no caso em tela a um fundo que fora criado.

Trazendo o convênio 42/16 um imposto, sua destinação não poderia ser vinculada a nenhuma atuação estatal, despesa específica ou fundo, pois, como leciona Geraldo Ataliba[62], o imposto é “um tributo não vinculado, ou seja, tributo cuja h.i. consiste na conceituação legal dum fato qualquer que não se constitua a ação estatal (...)”.

Complementa essa ideia de não vinculação de impostos o art. 167, IV, da CF, que expõe:

Art. 167. São vedados: 

IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo;

Da leitura desse artigo, extrai-se que a vedação de vinculação para impostos além de proibir a vinculação do fato gerador a uma atividade estatal especifica, também impede que o produto arrecadado seja destinado a uma despesa específica.

Consequentemente, o convênio 42/16 é claramente inconstitucional, já que destina as receitas arrecadadas com a majoração do imposto (ICMS) a um fundo, como se depreende da litura da clausula segunda do referido convênio, abaixo transcrita:

Cláusula segunda: A unidade federada que optar pelo disposto no inciso I da cláusula primeira instituirá fundo de equilíbrio fiscal, destinado à manutenção do equilíbrio das finanças públicas, constituídos com recursos oriundos do depósito de que trata o inciso I da cláusula primeira e outras fontes definidas no seu ato constitutivo. (grifos nossos).

Mesmo que se admita que esse tributo se trata de uma contribuição, o convênio 42 padeceria de inconstitucionalidade, pois como Leciona Paulo Ayres Barreto[63], a Constituição reservou exclusivamente a união a competência para instituição de contribuições conforme disposto 149, da CF[64], ou seja, não poderiam os Estados, o Distrito, ou o CONFAZ, criarem contribuições, visto que a Constituição não os dotou dessa competência tributária.

Além disso, apresenta Eduardo que:

Como um último argumento, os Estados e o Distrito Federal poderiam alegar que se trata de medida compensatória, em observância ao artigo 14, inciso II da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n. 101/00). Contudo, não parece ser este o caso, pois, além de não ter sido demonstrado que o desequilíbrio das contas públicas é decorrente de benefício fiscais concedidos ou que serão concedidos pelos Estados e o Distrito Federal, a medida prevista para supostamente compensar a renúncia tributária é inconstitucional, conforme demonstrado acima. 

Sem embargo a todos argumentos aqui já apresentados, Gustavo Brigagão[66] ainda indica a inconstitucionalidade da criação dos fundos previstos no referido convênio, dado que esses somente poderiam ser criados por meio de lei complementar, conforme disposto no art. 165, §9, II, da CF[67].

7. Conclusão

Em virtude dos fundamentos expostos nesse trabalho, torna-se evidente que em face da grave crise que assola os Estados brasileiros e o Distrito Federal, esses buscaram novas fontes de arrecadação, ao invés de tentarem diminuir as despesas públicas.

Essas novas fontes de arrecadação advêm, ou da criação de novos tributos, ou da sua majoração, ou ainda da extinção de isenções, benefícios e incentivos fiscais. E é justamente nesse ponto que se enquadra o convênio 42/16.

Ocorre que, em suas voracidades por recursos, esquecem-se os entes tributantes de que essas novas exações devem guardar consonância com princípios, normas e acima de tudo com o texto constitucional.

Essa é, ao nosso ver, a principal mácula do convênio 42/16, que ao visar, acima de tudo, agradar assanha arrecadatória dos Estados, deixou de observar preceitos jurídicos básicos.

Isto é, sustentamos que o convênio 42 é absolutamente inconstitucional, já que criou novo tributo em dissonância com texto da Carta Magna (seja essa exação um imposto ou uma contribuição). Ademais tentou criar fundo, por via diferente de lei complementar, fato esse em desacordo com o disposto no art. 165, §9, II, da CF.

Mesmo que não se concorde com os fundamentos que apontam para a inconstitucionalidade do referido convênio e se aceite sua validade perante o ordenamento jurídico brasileiro, deve-se observar que sua aplicação não se dará de imediato.

Desse modo, entendendo-se pela constitucionalidade do convênio 42, no mínimo se deve observar as constatações feitas nos subitens “5.1”, “5.2” e “5.3” desta obra, em que defendemos que: a) para os casos em que as isenções foram concedidas por prazo certo e sob determinadas condições, o referido convênio não poderia alterar, nem muito mesmos cobrar a exação daqueles contribuintes que já faziam jus ao benefício, devendo a isenção perdurar até a data acordada; b) para aquelas que forma concedidas por prazo certo, mas incondicionadas, também dever-se-ia aguardar o prazo acordado para que houvesse a nova cobrança do tributo, apesar de existir corrente massiva da doutrina que visualiza apenas a necessidade de observância do princípio da anterioridade; c) para aquelas que foram concedidas por prazo incerto, quer pela imposição de determinada condição ou não, pensamos que essas só podem ser cobradas a partir do próximo exercício financeiro, ou seja 2017.

REFERÊNCIAS

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