Ações afirmativas e igualdade no contexto de desigualdades

02/09/2016 às 09:37
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Aborda a problemática das Ações Afirmativas no Brasil e a polêmica que as envolve. Justifica-se pela tensão existente atualmente no debate acerca de questões como privilégio, desigualdade, discriminação, raça e etnia.

INTRODUÇÃO

 

O presente artigo objetiva discorrer sobre o conceito de ações afirmativas, estabelecendo a sua enorme e imprescindível contribuição como política estatal no combate a discriminação, colaborando no resgate daqueles grupos historicamente deixados de lado não só pelo Estado, mas pela maioria das classes sociais.

É de interesse aqui também abordar o direito do indivíduo enquanto ser humano de ser cidadão, de participar ativamente da sociedade.

O presente artigo estabelece o princípio da igualdade como principal fundamento a adoção das ações afirmativas. Outro ponto abordado diz respeito as polêmicas trazidas no tocante as ações afirmativas, porém é de suma importância dizer que as ações afirmativas são medidas legais, legitimas de combate a qualquer tipo de preconceito.

Por fim, o que se pretende aqui é contribuir para a transformação da mentalidade arcaica, intimamente ligada ao período colonial que foi herdada pela sociedade burguesa, desmistificando os preconceitos contrários e se sustenta positivamente todo e qualquer fundamento de defesa para legitimação e implementação das ações afirmativas.

É preciso evoluir, entender que atualmente não é mais concebível ações discriminatórias, e as ações afirmativas se somam de forma a assegurar o respeito aos direitos básicos das minorias.

 

1 CONCEITO DE AÇÕES AFIRMATIVAS

É por demais conhecida a condição diferenciada dos indivíduos na Grécia Antiga, que deu origem à tão comentada cidadania grega, e que, historicamente, demarca a origem desse status social. Constituía-se, na grande maioria, de direitos políticos, estando intimamente ligada à nacionalidade, uma vez que só possuíam direitos os nacionais, estando excluídos igualmente os escravos, as mulheres, crianças e os estrangeiros.

Ao abordar o Império Romano, Luiz Antônio ROLIM (2000) afirma que a rígida divisão de classes era determinada pelo nascimento, fortuna e domicílio da pessoa. Tais estamentos sociais compreendiam: patrícios, clientes, plebeus e escravos.

No entendimento de PINSKY, J.; PINSKY, C. (2003), reproduziu-se na cidadania romana o critério da propriedade, bem como o da exclusão dos plebeus: “camponeses livres, mas de poucas posses, artesão urbanos, comerciantes e descendentes de estrangeiros”.

Os plebeus só vieram a usufruir de certos direitos políticos a partir da Lei das XII Tábuas, que concedeu aos cidadãos romanos o direito civil (ius civile); e aos não cidadãos o direito estrangeiro (ius gentium).

A cidadania é um dos pilares da sociedade, pois está intrinsecamente associada aos conceitos de liberdade, igualdade, democracia e justiça. Por conseguinte é status inalienável do homem moderno, no entanto, para ser efetivada pressupõe a participação popular. Além disso, pressupõe também que cada indivíduo cumpra com seus deveres e que tenha seus direitos assistidos pelo Estado.

Assim, insta indispensável para a concretização da cidadania e, principalmente do Estado Democrático de Direito que se vive, o exercício do Estado no papel de garantidor de direitos fundamentais aos seres humanos. E as normas em comento são direitos sociais (direito à saúde, moradia, lazer, trabalho), posto que, regulamentam e trazem o rol de direitos trabalhistas, de forma a positivar os direitos inerentes aos trabalhadores.

Diante do grande número de migrações cujo destino é o Brasil, evidencia-se, impreterível, o incremento de mecanismos que possibilitem a plenitude de oportunidades e de tratamento aos imigrantes, de forma a permitir sua dignidade enquanto sujeito de direitos, principalmente no que tange ao direito fundamental social ao trabalho.  

Nessa vertente, pode-se dizer que as ações afirmativas são políticas públicas cujo objetivo é garantir a igualdade entre os seres humanos, inserindo na sociedade aqueles grupos marginalizados e a garantia ao exercício pleno da cidadania, acesso aos direitos inerentes a todos os seres enquanto pertencentes ao gênero humano. Partindo desse conceito chegamos a seguinte conclusão:

 

Podemos definir as ações afirmativas como conjunto de medidas que prescrevem prerrogativas a certos grupos, por serem vítimas de discriminação ou por se encontrarem em situação que dificulte o acesso a bens e serviços indispensáveis ao pleno gozo do princípio da dignidade humana, visando a acelerar a equiparação, ou melhor, a obtenção de igualdade material e efetivo acesso aos direitos sociais fundamentais, integrantes do mínimo existencial (OLIVEIRA, 2009).

 

Com base no conceito de Ação Afirmativa é certo intuir que é dever não só do Poder Legislativo, mas de todos os indivíduos enquanto integrantes da Sociedade em dirimir qualquer ação preconceituosa, discriminatória. É certo, porém, que compete ao legislador o dever primordial em estabelecer políticas públicas que visem maior inclusão social. De forma que:

 

Embora seja tarefa atribuída a todos os que pretendem concretizar o texto constitucional, há que se realçar o papel do legislador na promoção da igualdade constitucional, pois é o órgão legislativo que compete a importante tarefa de realização da igualdade por intermédio da norma legal (JÚNIOR, 2009).

 

Como se sabe é competência do Estado garantir não só a ordem jurídica e a paz social, mas também meios de efetivação dos direitos humanos. É inconcebível em um Estado Democrático de Direito qualquer forma de discriminação, de exclusão, sendo deveras tarefa estatal discutir e implementar políticas públicas que garantam o ingresso das classes historicamente mais desfavorecidas à sociedade, como forma de garantir a todos o acesso ao bem jurídico indispensável, a cidadania.

 

1.1 Ações Afirmativas e Cidadania

 

A cidadania como se conhece hoje, tem sua base na sociedade grega, porém, a história da civilização começa bem antes.

No Egito, no tempo dos faraós é indispensável afirmar que não havia mobilidade social, o governante era verdadeira divindade, contando com o apoio da Igreja e exploração do trabalho escravo, geralmente negros e estrangeiros.

Na Grécia Antiga, berço da sociedade contemporânea e para a qual cidadão eram aqueles que possuíam gozo dos direitos políticos. Aqui estavam excluídos as mulheres, os estrangeiros e os escravos. De modo que:

 

Na Grécia de Platão e Aristóteles, eram considerados cidadãos todos aqueles que estivessem em condições de opinar sobre os rumos da sociedade. Entre tais condições, estava a de que fosse um homem totalmente livre, isto é, não tivesse a necessidade de trabalhar para sobreviver, uma vez que o envolvimento nos negócios públicos exigia dedicação integral.  Portanto, era pequeno o número de cidadãos, que excluíam além dos homens ocupados (comerciantes, artesãos), as mulheres, os escravos e os estrangeiros. Praticamente apenas os proprietários de terras eram livres para ter o direito de decidir sobre o governo. A cidadania grega era compreendida apenas por direitos políticos, identificados com a participação nas decisões sobre a coletividade (SANTANA, 2009).

 

No Império Romano a sociedade era dividida em classes: patrícios, plebeus e escravos. Patrícios e plebeus eram homens livres, mas apenas os primeiros possuíam privilégios políticos, civis e religiosos o que acarretava em conflitos com os plebeus.

A Lei das Doze Tabuas veio conferir maior inserção dos plebeus na política, aplicando aos cidadãos romanos o direito civil (ius civile) e aos não cidadãos eram aplicado o direito estrangeiro (ius gentium).

 

O Direito Romano, apesar de proteger as liberdades individuais e reconhecer a autonomia da família com o pátrio poder, não assegurava a perfeita igualdade entre os homens, admitindo a escravidão e discriminando os despossuídos. Ao lado da desigualdade extrema entre homens livres e escravos, o Direito Romano admitia a desigualdade entre os próprios indivíduos livres, institucionalizando a exclusão social (SANTANA, 2009).

 

Na Idade Média a sociedade era dividida em clero, nobreza e servos. O poder era concentrado nas mãos da Igreja Católica, submetendo os indivíduos aos seus dogmas. Aqui vale ressalvar a perseguição aos pobres, às mulheres, a todos aqueles que fossem de encontro às idéias da Igreja. O Cristianismo ditava todas as regras, pregando a primazia da família e a igualdade entre os homens, porém de forma não absoluta, florescendo uma nona concepção de Direito e Estado. A Igreja Católica considerava que sempre existirá desigualdades, o que cabe a cada pessoa é a união em torno do bem comum, florescendo uma nova concepção de Direito e Estado.

Após o declínio do feudalismo (Idade Média), surge os Estados Nacionais, com o rei centralizando o poder em suas mãos legitimado pelo povo. Apoiado pela burguesia industrial o monarca reinava e comandava o Estado Nacional. Apartir da revolta dos camponeses, vários pensadores (Rousseau, Thomas Hobbes, John Locke, dentres outros) começaram a defender a liberdade e igualdade de todos, a descentralização do poder, uma maior participação política. Tais ideais serviram de inicio para a Revolu Uma das inovações importantes, ocorrida algumas décadas antes, foi justamente o uso das palavras cidadão e cidadã, para simbolizar a igualdade de todos. De modo que:

 

Vários escritores políticos vinham defendendo a idéia de que todos os seres vivos nascem livres e são iguais, devendo ter os mesmos direitos. Isso foi defendido pelos burgueses, que desejavam Ter o direito de participar do governo, para não ficarem mais sujeitos a regras que só convinham ao rei e aos nobres. O povo que trabalhava que vivia de salários e que dependia dos mais ricos também queria reconhecimento da igualdade, achando que se todos fossem iguais as pessoas mais humildes também poderiam participar do governo e desse modo as leis seriam mais justas. Revolução Francesa de 1789 (DALLARI, 2009).

 

A Revolução Francesa marca o fim do Absolutismo e o começo de uma nova era, a Idade Contemporânea, ou seja, a sociedade dos dias de hoje.

Após a Revolução Francesa existiram disputas para a concepção dos ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, lema da Revolução.

Como se pode perceber aqui a cidadania como instrumento de consolidação se deu de forma gradativa, com evolução, ao contrário do que aconteceu no Brasil.

É de conhecimento geral que o trabalho escravo presente durante o Império e abolido em 13 de maio de 1888, mas presente assim como o trabalho infantil até os dias atuais. A mulher ainda não detém dos mesmos direitos dos homens, apesar da enorme contribuição de Getúlio Vargas em 1945 com a Consolidação das Leis Trabalhistas.

É através de políticas estatais, ou seja, das ações afirmativas que o significado justo e verdadeiro de cidadania será alcançado, uma vez que só há cidadania com a participação de todos quando houver a soma de todos os esforços sem qualquer discriminação física, cultural, religiosa com o fim de atingir o bem comum. Até porque o intuito das ações afirmativas é assegurar àqueles a sua inserção, a sua inclusão na sociedade fortalecendo a cidadania.

Hordieramente deve-se entender cidadania como não só os direitos políticos, ou seja, direito de votar e ser votado, direito de informação, direito de opinião. Cidadania deve ser entendida como além dos direitos políticos, acima de tudo o direito de cada cidadão de ter seus direitos respeitados, é com base nisso que devemos tomar consciência de que só haverá sociedade efetivamente justa, como formos educados a cumprir nossas obrigações e a respeitar os direitos dos outros, parar com a concepção de competição, de luta, só haverá uma sociedade harmoniosa quando todas as pessoas tiverem a idéia de união, de cooperação. De forma que:

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Podemos definir cidadania como um status jurídico e político mediante o qual o cidadão adquire direitos civis, políticos e sociais; e deveres (pagar impostos, votar, cumprir as leis) relativos a uma coletividade política, além da possibilidade de participar na vida coletiva do Estado. Esta possibilidade surge do princípio democrático da soberania popular (D’URSO, 2009).

 

Como se pode perceber, em síntese, cidadania não está restrita aos direitos políticos (votar e ser votado), mas a ter moradia, educação, lazer, propriedade, liberdade de expressão, opinião, dentre outros direitos, implicando, por conseguinte em deveres, tais como pagar impostos, respeito aos direitos alheios, prestação do serviço militar obrigatório para os homens, ou seja, o Estado Democrático de Direito se consolida tanto com a efetivação dos direitos, como o dever tanto do Estado, como dos indivíduos em respeitar tais garantias.

 

 

 

 

1.2 Ações Afirmativas e Igualdade

 

O princípio da igualdade é princípio constitucional, previsto no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, garantindo a todos os seres humanos tratamento isonômico, em outras palavras, proteção contra a discriminação, a distinção entre as pessoas.

O artigo 5º em seu “caput” e inciso I disciplina que:

 

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição

 

Como se pode desprender o princípio da igualdade e as ações afirmativas possuem o mesmo fim, a vontade de proteger e efetivar os direitos das minorias, ou seja, as garantias das classes marginalizadas.

No que tange ao princípio da igualdade é mister destacar que não se deve buscar a mera igualdade formal, consagrada no liberalismo clássico, mas, primordialmente, a igualdade material, tendo em vista, que a lei deve tratar os iguais igualmente, em desigualdade os desiguais, na medida de suas desigualdades (LENZA, 2010)

Cabe aqui diferenciar igualdade formal de igualdade material. “Igualdade formal é aquela de índole negativa, impõe ao Estado o dever de se abster de elaborar ou aplicar leis de modo a criar desigualdades arbitrárias. Era o fim da sociedade de privilégios e o nascimento da sociedade meriocrática” (OLIVEIRA, 2009, P.50).

Ao analisar a igualdade material entendemos que:

 

O projeto de maior adesão foi o do Estado Social, que inaugurou o princípio da igualdade material, o qual visa a assegurar o acesso a condições materiais, permitindo assim uma maior igualdade de resultados, superando a suposta igualdade de chances (OLIVEIRA, 2009, P.51).

 

Por fim, é necessário que o princípio da igualdade caminhe lado a lado com as ações afirmativas de modo a culminar com a participação efetiva de todos os seres humanos na sociedade, é preciso reverter à mentalidade de certas pessoas que ainda não assemelham a vida em cooperação, onde as pessoas possam viver em paz, sem qualquer preconceito.

 

 

2 PRESSUPOSTOS LEGITIMADORES DAS AÇÕES AFIRMATIVAS NO BRASIL

 

Como se sabe com a vinda dos Portugueses ao Brasil instituindo a colonização de exploração foi o marco zero de toda discriminação e preconceito que perdura até hoje.

Primeiramente os portugueses marginalizaram os índios chegando a quase dizimá-los. Posteriormente com o advento do Império e a conseqüente vinda de D. João VI ao Brasil, o trabalho na cana de açúcar e nas plantações de café se dava pelo trabalho escravo, excluindo de qualquer participação tais trabalhadores e as mulheres.

O fim da escravidão se deu em 13 de maio de 1888, porém não foi ai que se pôs fim ao trabalho escravo, uma vez que, tal trabalho se perpetua até hoje.

Com o crescimento industrial ficaram de fora da sociedade além das mulheres, os podres, as crianças e o proletariado, porém com o advento do Estado Novo, governo de Getúlio Vargas se deu o devido valor as mulheres e a classe trabalhadora por meio da Consolidação das Leis do Trabalho.

É de grande valia aludir que as ações afirmativas são mecanismos que o Estado implementa em caráter temporário para assegurar a determinados grupos sua inserção na sociedade, garantindo acesso a bens e serviços antes negados por conta da discriminação, da exclusão. De modo que:

                         

Para definir o que são minorias, esclareça-se desde já que o critério quantitativo é insuficiente, pois, em muitas sociedades, a parcela da população que deve ser favorecida pelas medidas é numericamente a maioria, mas encontra-se à margem do poder e do gozo de direitos básicos (OLIVEIRA, 2009, P.60).

 

Por fim as ações afirmativas estão presentes no ordenamento jurídico pátrio, sob diversas formas. Seja para defender a mulher (Lei Maria da Penha, artigo 373-A da Consolidação das Leis Trabalhistas); o menor (ECA e artigos 403 e 428 da Consolidação das Leis Trabalhistas); deficientes físicos (artigo 428 da Consolidação das Leis Trabalhistas e Lei n.º 8.112/90, artigo 5º, § 2º), porém, o assunto gerador de maior polêmica são as cotas que reservam vagas para negros nas universidades públicas.

 

3 A IMPORTÂNCIA DA LEGISLAÇÃO E DE POLÍTICAS EFETIVAS DE INCLUSÃO SOCIO-RACIAL NO BRASIL

 

Legislação é o conjunto de leis, aqui abrangendo não só a Constituição, mas também Leis Complementares, Leis Ordinárias, Decretos etc.

Inclusão Social deve ser entendida como a igualdade material, ou seja, a igualdade de oportunidades não só ao abastado, aos que têm boas condições de vida, mas especialmente aos carentes, aos portadores de deficiência, enfim a todos os que sofrem com qualquer tipo de preconceito. A definição abaixo melhor esclarece:

 

Inclusão social é uma ação que combate a exclusão social geralmente ligada a pessoas de classe social, nível educacional, portadoras de deficiência física e mental, idosas ou minorias raciais entre outras que não têm acesso a várias oportunidades, ou seja, Inclusão Social é oferecer aos mais necessitados oportunidades de participarem da distribuição de renda do País, dentro de um sistema que beneficie a todos e não somente uma camada da sociedade (FREITAS, 2011).

 

As Ações Afirmativas por serem políticas públicas que tem o intuito de efetivar a inclusão social, não só dos afro-descendentes, mas sim de todos aqueles grupos vítimas de preconceito e de discriminação. Porém tais políticas públicas não são perpétuas, são algo temporário, perdurando enquanto vingar a discriminação.

No que tange às políticas públicas vale destacar que por serem temporárias, para uma real efetivação dos direitos daquela classe social, tais políticas devem vir acompanhadas de investimentos naquela área, pois, não é suficiente garantir educação aos carentes através das cotas nas Universidades e não investir em Educação.

A Legislação deve ser utilizada como forma de assegurar aos grupos sociais discriminados, os direitos violados assegurados na própria Constituição. É por meio de leis que vemos as políticas públicas de inclusão socio-racial surtirem efeitos, como forma de eliminar todo e qualquer meio de preconceito, pois é necessário não só por meio de leis, mas também incutir na mente das pessoas que vivemos em um mundo, em uma sociedade miscigenada, que precisamos respeitar as diferenças.

Assim, sem políticas públicas fundamentadas legalmente, o simples voluntarismo de alguns grupos solidários não resolve o problema, como destaca a seguir:

 

Sobretudo, a inclusão social é uma questão de políticas públicas, pois cada política pública foi formulada e basicamente executada por decretos e leis, assim como em declarações e recomendações de âmbito internacional (como o Tratado de Madrid). A inclusão social, é um processo para a construção de um novo tipo de sociedade, através de transformações, pequenas e grandes, nos ambientes físicos (espaços internos e externos, equipamentos, aparelhos e utensílios mobiliário e meios de transporte) e na mentalidade de todas as pessoas, e portanto, também do próprio portador de necessidades especiais (FREITAS, 2011).

 

Cabe destacar que somente leis não são suficientes para asseverar tais direitos aos grupos de minorias, é necessário muito mais, é indispensável investimentos em educação, em saúde, em lazer, em distribuição de renda e além disso, é muito mais importante criar a ideia, acabando com o dogma de que tais pessoas não merecem a proteção do Estado. De maneira que, FREITAS (2011) afirma:

 

É necessário mudar o prisma pelo qual são observados os direitos já ordenados e os que precisam ser acrescentados, substituindo totalmente o paradigma que até então é utilizado, até mesmo inconscientemente, em debates e deliberações(...)Quanto mais sistemas comuns da sociedade adotarem a inclusão mais cedo se completará a construção de uma verdadeira sociedade para todos – a sociedade inclusiva.

 

A elaboração da legislação por si só, já colabora com o esclarecimento do problema, haja vista gerar a polêmica e, por conseguinte, a discussão na sociedade, ainda que haja rejeição, possibilita o esclarecimento e a conscientização de muitos segmentos sociais.

No Estado Democrático de Direito instituído no Brasil é mais que necessário mudar a mentalidade e construir um novo ideal, o ideal de união, de colaboração de solidariedade, afinal o afro-descendente, o carente, o deficiente é tão capaz, habilitado e principalmente ser humano como todos os outros.

 

CONCLUSÃO

 

Diante do que foi exposto, pode-se auferir que as ações afirmativas desempenham seu papel de harmonizar interesses e de corrigir imperfeições mantidas com o tempo, ou seja, o intuito das ações afirmativas é meramente garantir a inclusão social das classes menos favorecidas como forma de garantir a tais pessoas direitos fundamentais, garantias a elas inerentes enquanto ser humano.

Como forma de garantir a inserção dos indivíduos pertencentes a essas classes historicamente excluídas é que o princípio da igualdade, seja ela formal ou material se soma as ações afirmativas como forma de dar um basta a qualquer forma de preconceito ou discriminação ainda existente, corroborando para a formação da sociedade justa, da ordem jurídica “perfeita”, ou seja, de colaboração entre os povos.

Muito já se foi feito, mas muito ainda se tem a fazer, é de fácil percepção que contemporaneamente ainda há discriminação dos homossexuais, das mulheres, dos afro-descendentes.

No que se refere às políticas de cotas, apesar de toda a polêmica existente é de grande valia tais políticas públicas porque é necessário corrigir as distorções construídas por todos os anos de marginalização, de sofrimento e angústia vividas e ainda presentes no cotidiano da sociedade brasileira.

Conclui-se afirmando que as políticas de cotas é ação afirmativa que visa garantir a entrada nas universidades dos negros e dos mais pobres, como forma de incluir na sociedade essas classes de indivíduos tão frágeis e tão discriminados pela classe dominante.

Entretanto o maior empecilho ainda é a falta de compreensão e conscientização da população acerca das ações afirmativas que não aceita as cotas por vários motivos que pairam sobre seu imaginário, já que provêm do senso comum. Alguns não aceitam porque confundem ações afirmativas com privilégios e ainda procuram legitimar sua posição “elitista” questionando os critérios adotados; outros por pura indiferença que resulta na falta de solidariedade para com as populações excluídas, e aqueles que alienados pela profusão esmagadora da sociedade de consumo e individualista, não admitem ceder seus lugares “cativos” nos melhores estratos sociais da sociedade burguesa.

 É certo também que tal política governamental não é inconstitucional e só tem a acrescentar e a colaborar com a igualdade plena entre as pessoas e a construir uma sociedade com cidadãos plenos, efetivos.

 

REFERÊNCIAS

 

DALLARI, Dalmo. A cidadania e sua história. CEFETSP, São Paulo. Disponível em: <http://www.cefetsp.br/edu/eso/cidadania/cidadaniahistoriadallari.html>.

 

D’URSO, Luiz Flávio Borges. A Construção da cidadania. OABSP, São Paulo, 2005. Disponível em: <http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/88/>.

 

FREITAS, Roseane Cavalcante de. O que é Inclusão Social. RosinhadaAdefal. Disponível em:<http://www.rosinhadaadefal.com.br/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&id=61&Itemid=111>.

 

JÚNIOR, José Armando Ponte Dias. Igualdade Material e os aspectos sociais e constitucionais da Lei Maria da Penha. In: MATIAS, João Luis Nogueira (Coord.). Neoconstitucionalismo e Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2009.

 

LENZA, PEDRO. Direito Constitucional Esquematizado. 14 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva 2010.

 

OLIVEIRA, Fernanda Maria Diógenes de Menezes. A discriminação enquanto fundamento do tratamento isonômico e as ações afirmativas. In: MATIAS, João Luis Nogueira (Coord.). Neoconstitucionalismo e Direitos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 2009.

 

SANTANA, Marcos Silvio de. O que é cidadania. Direito Positivo. Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/fadipa/marcossilviodesantana/cidadania.htm. Acesso em: 24 ago. 2009.

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Sobre o autor
Henrique Vasconcelos

Advogado, inscrito na OAB-CE nº 24.697. Mestrando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Especialista em Direito do Trabalho e Processo Trabalhista pelo Centro Universitário Christus (UniChristus). Graduado em Direito pela Faculdade Christus. Atualmente, é membro da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CEDEF). Já atuou na área de assessoria jurídica popular no Grupo Solidários. Atua como advogado, com ênfase em Direito do Trabalho e Previdenciário. Autor do livro Cidadania, Políticas Públicas e Acesso à Justiça: a proteção do trabalhador migrante na perspectiva do princípio contramajoritário, publicado pela Nova Edições Acadêmicas, ISBN: 978-3-330-74366-3.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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