As contradições da Lei nº 12.010: nova lei antigos problemas

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A nova Lei de Adoção trouxe grande polêmica ao mundo jurídico e frustração para aqueles que buscavam constituir família pela adoção, não solucionou a superlotação dos abrigos e ainda privilegiou a família tradicional consanguínea em detrimento da afetiva.

A chegada da Lei nº 12.010/2009, causou grande polêmica no mundo jurídico e frustração para aqueles que buscavam constituir família pela via da adoção, prima facie, acerca da constitucionalidade da nova Lei, pela infringência a direitos constitucionalmente garantidos, dentre eles, à isonomia, a não discriminação de pessoas por raça, classe ou preferência sexual e aos princípios da proteção integral e da prevalência dos direitos da criança e do adolescente.

O cerne da controvérsia reside no fato de que a referida Lei trouxe em seu bojo, vários artigos com comandos imperativos para a manutenção da criança na família natural/extensa, inclusive, em hipótese de vulnerabilidade social e, excepcionalmente, na família substituta. Nesse sentido, entendeu-se, que a Lei privilegiou a família formada pelo critério consanguíneo em detrimento da família afetiva. Trouxe, ainda, mecanismos que dificultam à inserção da criança na família substituta, como por exemplo, a inscrição prévia dos adotantes, no Cadastro Nacional de Adoção – CNA.

Observa-se, que essa nova sistemática, ensejou em graves prejuízos à clientela infanto-juvenil, pois não raras vezes, essa convivência familiar biológica não prospera, ocasionando novo abrigamento e, consequentemente, à adoção tardia, contrariando, diretamente, o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente.

A Lei 12.010/2009, também apelidada de lei de convivência familiar pelas razões acima citadas, surgiu, segundo os bastidores do anteprojeto da lei, pela necessidade do Brasil, enquanto organismo internacional, solucionar uma questão histórica, concernente a adoção ilegal de crianças, da família natural, em regra pobre, por pessoas abastadas. Nesse sentido, a novel Lei, buscando solucionar essa “problemática”, negativa à imagem do País, partiu de duas conclusões: 1. Que o fator econômico é a principal causa para os conflitos familiares que ocasionam o acolhimento institucional das crianças e 2. Que, inobstante, o motivo da retirada das crianças/adolescentes, da família natural, têm que voltar aquela ambiência, como um pré-requisito para ingressar em família substituta.

A Lei criou mecanismos de incentivo e apoio à família natural, destacando-se os mais populares, sendo o programa bolsa família, bolsa escola, renda para viver melhor, renda mínima, dentre outros, que consistem em incentivos financeiros, destinados ao detentor do poder familiar, para manutenção da prole na família.

Também foram reorganizados os CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social e CRAS – Centro de Referencia de Assistência Social, para acompanhamento psicológico das famílias, todavia, muito pouco se observa de retorno positivo dessas medidas, também denominadas de políticas públicas, tanto pela inoperância desses órgãos, quanto pelo descaso dos envolvidos ou pela própria inaptidão da família natural ao exercício regular do poder familiar, pois, conforme se observa em muitos casos, as crianças retornam à família natural, e, mesmo com os benefícios, permanecem na rua, em situação de risco, são as chamadas “crianças nas ruas” em contraponto às “crianças de rua”, que crescem sem referência de família, pai ou mãe – amparadas, quando são, pelos vizinhos, situação que trás prejuízo irreparável às crianças, que terão que enfrentar a adoção tardia, mais difícil de acontecer, além de toda mazela social.

 De outra via, observa-se, que o legislador, relacionou a falta de recursos materiais à desestruturação familiar, talvez por ser a pobreza considerada como potencial causador das mazelas sociais que afetam e desestabilizam as famílias, conforme enfatizou Pino (1987, p. 42) : GRIFO

 A pobreza extrema encerra, sem dúvida, os germes da desorganização familiar, como negação de uma das condições básicas do modelo da família burguesa: o patrimônio. Isso não significa que pobreza seja sinônimo de irresponsabilidade moral, como riqueza não é o de responsabilidade. Problemas familiares existem em todas as classes sociais, embora eles não tenham a mesma significação e o mesmo impacto social em todas elas. O que para algumas classes sociais é um ‘caso doméstico’, para outras se torna um ‘caso social’. A condição de classe afeta desigualmente a conduta dos indivíduos, conferindo-lhe uma significação social também desigual.

Todavia, é fato, que fatores subjetivos, intrínsecos da personalidade, como a predisposição ao afeto e a vocação ao exercício do poder familiar, o desejo de ter filhos, etc., são preponderantes para a estabilidade do lar. A partir dessa compreensão, constata-se que, mesmo superada a questão material, se subsiste a questão psicológica/emocional negativa, a convivência não vai prosperar.

Nesse contexto, observa-se que, em algumas situações, a adoção já é o destino certo das crianças, como, por exemplo, nos casos de abandono, crimes contra a moral, maus tratos e negligência reiterada, porém, é na demora na destituição do poder familiar e o acolhimento institucional da criança, que ensejam na maior ofensa aos princípios estatutários, pois tanto um quanto outro, não representam  reais vantagens para os infantes.

De outra via, os tribunais brasileiros, em feedback, com as expectativas da sociedade, passaram a ter um olhar diferenciado para a nova Lei, relativizando-a em alguns aspectos, dentre eles, a possibilidade de processamento das ações conjuntas de destituição do poder familiar com adoção (e aqui a criança já está na família substituta), dispensa/relativização do cadastro prévio para adoção e a prevalência da afetividade/afinidade sobre a verdade biológica, tornando-se, desta forma, protagonistas de um novo conceito de família – a família sócio afetiva, e estabeleceram por fundamento de suas decisões, o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e a prevalência dos seus interesses, sobre quaisquer outros.

Todavia, inobstante esse avanço, ainda temos abrigos superlotados, crianças esquecidas à espera de uma família e processos emperrados nos juizados de infância, situações que nos levam a refletir sobre esses hiatos que obstruem a adoção, como por exemplo, a própria necessidade/utilidade do cadastro nacional de adoção - que existe para organizar a fila de adotantes e possibilitar adoção a todos os inscritos, então por que, ainda, existem muito mais crianças disponíveis para adoção do que inscritos no cadastro? Talvez a resposta a esta pergunta resida no fato do cadastro não ser o meio adequado para a promoção da convivência familiar, exatamente, por não promover o contato pessoal da criança com a família substituta, no dia-a-dia, que é onde se presume a criação e o fortalecimento de vínculos e, desta forma, evitar as frustrações que ocorrem no primeiro encontro, pela falta de empatia entre adotantes e adotandos.

Nesse sentido, observa-se, que o programa de acolhimento familiar, objeto do Art. 19, § 1º da Lei nº 12.010/09, traz em seu bojo, uma prática americana, não prosperou em vários Estados do Brasil, dentre outros motivos, porque as famílias criavam vínculos com as crianças e não podiam adotá-las, em face da vedação legal, gerando, assim, um contra senso com o quantitativo de crianças abrigadas e a necessidade de se encontrar famílias para essas crianças.

A Lei nº 12.010/09 ensejou muitas dúvidas, levando a crer que a sistemática estabelecida pela novel Lei é falha, possivelmente, por ter sido construída a partir de fundamentos equivocadoss, buscando muito mais satisfazer as expectativas internacionais do que o bem estar de nossas crianças em situação de infortúnio.

É senso comum que o fim do preconceito é a maior dívida a ser quitada para com a sociedade, assim como dar um lar a quem não tem. A adoção é, em regra, a certeza de uma família promissora, dentre outros motivos, pelo planejamento e a satisfação de um desejo que é de formar a prole.

Ademais, a supervalorização da família natural, segundo o modelo historicamente estabelecido pelo critério do sangue, como forma de perpetuação da linhagem, em detrimento da família formada a partir do amor, da afinidade/afetividade, quer nos parecer, verdadeiro descompasso com os novos tempos e novas formas de famílias.

A título de conclusão, propomos uma forma mais aberta de convivência familiar, consistente na promoção de contato mais fraterno entre adotantes e adotandos, aproximação da sociedade e abrigos, através da visitação frequente e de incentivo aos programas de apadrinhamentos afetivos com a finalidade de adoção, uma vez que é exatamente esse o desejo da criança acolhida, e, acaso não seja do visitante/padrinho, em um primeiro momento, com a convivência surgem os laços de afetividade/afinidade.

Convém informar, que em Macapá, assim como em outras cidades do país, grande parte dos processos de adoção, surge da convivência oportunizada pelos programas de apadrinhamento natalino e apadrinhamento social, que além de boas práticas são eficazes no descongestionamento dos abrigos.

É necessário que os operadores jurídicos tenham, sempre, como norte, o melhor interesse da criança, tanto na formulação dos pedidos quanto nas decisões, de modo que, qualquer situação que represente desvantagem social, emocional e psicológica à clientela infanto juvenil, deve ser afastada e não prosperar, para se ter uma sociedade futura mais equilibrada e harmoniosa e uma lei mais próxima da justiça.

A chegada da Lei nº 12.010/2009, causou grande polêmica no mundo jurídico e frustração para aqueles que buscavam constituir família pela via da adoção, prima facie, acerca da constitucionalidade da nova Lei, pela infringência a direitos constitucionalmente garantidos, dentre eles, à isonomia, a não discriminação de pessoas por raça, classe ou preferência sexual e aos princípios da proteção integral e da prevalência dos direitos da criança e do adolescente.

O cerne da controvérsia reside no fato de que a referida Lei trouxe em seu bojo, vários artigos com comandos imperativos para a manutenção da criança na família natural/extensa, inclusive, em hipótese de vulnerabilidade social e, excepcionalmente, na família substituta. Nesse sentido, entendeu-se, que a Lei privilegiou a família formada pelo critério consanguíneo em detrimento da família afetiva. Trouxe, ainda, mecanismos que dificultam à inserção da criança na família substituta, como por exemplo, a inscrição prévia dos adotantes, no Cadastro Nacional de Adoção – CNA.

Observa-se, que essa nova sistemática, ensejou em graves prejuízos à clientela infanto-juvenil, pois não raras vezes, essa convivência familiar biológica não prospera, ocasionando novo abrigamento e, consequentemente, à adoção tardia, contrariando, diretamente, o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente.

A Lei 12.010/2009, também apelidada de lei de convivência familiar pelas razões acima citadas, surgiu, segundo os bastidores do anteprojeto da lei, pela necessidade do Brasil, enquanto organismo internacional, solucionar uma questão histórica, concernente a adoção ilegal de crianças, da família natural, em regra pobre, por pessoas abastadas. Nesse sentido, a novel Lei, buscando solucionar essa “problemática”, negativa à imagem do País, partiu de duas conclusões: 1. Que o fator econômico é a principal causa para os conflitos familiares que ocasionam o acolhimento institucional das crianças e 2. Que, inobstante, o motivo da retirada das crianças/adolescentes, da família natural, têm que voltar aquela ambiência, como um pré-requisito para ingressar em família substituta.

A Lei criou mecanismos de incentivo e apoio à família natural, destacando-se os mais populares, sendo o programa bolsa família, bolsa escola, renda para viver melhor, renda mínima, dentre outros, que consistem em incentivos financeiros, destinados ao detentor do poder familiar, para manutenção da prole na família.

Também foram reorganizados os CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social e CRAS – Centro de Referencia de Assistência Social, para acompanhamento psicológico das famílias, todavia, muito pouco se observa de retorno positivo dessas medidas, também denominadas de políticas públicas, tanto pela inoperância desses órgãos, quanto pelo descaso dos envolvidos ou pela própria inaptidão da família natural ao exercício regular do poder familiar, pois, conforme se observa em muitos casos, as crianças retornam à família natural, e, mesmo com os benefícios, permanecem na rua, em situação de risco, são as chamadas “crianças nas ruas” em contraponto às “crianças de rua”, que crescem sem referência de família, pai ou mãe – amparadas, quando são, pelos vizinhos, situação que trás prejuízo irreparável às crianças, que terão que enfrentar a adoção tardia, mais difícil de acontecer, além de toda mazela social.

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 De outra via, observa-se, que o legislador, relacionou a falta de recursos materiais à desestruturação familiar, talvez por ser a pobreza considerada como potencial causador das mazelas sociais que afetam e desestabilizam as famílias, conforme enfatizou Pino (1987, p. 42) : GRIFO

 A pobreza extrema encerra, sem dúvida, os germes da desorganização familiar, como negação de uma das condições básicas do modelo da família burguesa: o patrimônio. Isso não significa que pobreza seja sinônimo de irresponsabilidade moral, como riqueza não é o de responsabilidade. Problemas familiares existem em todas as classes sociais, embora eles não tenham a mesma significação e o mesmo impacto social em todas elas. O que para algumas classes sociais é um ‘caso doméstico’, para outras se torna um ‘caso social’. A condição de classe afeta desigualmente a conduta dos indivíduos, conferindo-lhe uma significação social também desigual.

Todavia, é fato, que fatores subjetivos, intrínsecos da personalidade, como a predisposição ao afeto e a vocação ao exercício do poder familiar, o desejo de ter filhos, etc., são preponderantes para a estabilidade do lar. A partir dessa compreensão, constata-se que, mesmo superada a questão material, se subsiste a questão psicológica/emocional negativa, a convivência não vai prosperar.

Nesse contexto, observa-se que, em algumas situações, a adoção já é o destino certo das crianças, como, por exemplo, nos casos de abandono, crimes contra a moral, maus tratos e negligência reiterada, porém, é na demora na destituição do poder familiar e o acolhimento institucional da criança, que ensejam na maior ofensa aos princípios estatutários, pois tanto um quanto outro, não representam  reais vantagens para os infantes.

De outra via, os tribunais brasileiros, em feedback, com as expectativas da sociedade, passaram a ter um olhar diferenciado para a nova Lei, relativizando-a em alguns aspectos, dentre eles, a possibilidade de processamento das ações conjuntas de destituição do poder familiar com adoção (e aqui a criança já está na família substituta), dispensa/relativização do cadastro prévio para adoção e a prevalência da afetividade/afinidade sobre a verdade biológica, tornando-se, desta forma, protagonistas de um novo conceito de família – a família sócio afetiva, e estabeleceram por fundamento de suas decisões, o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente e a prevalência dos seus interesses, sobre quaisquer outros.

Todavia, inobstante esse avanço, ainda temos abrigos superlotados, crianças esquecidas à espera de uma família e processos emperrados nos juizados de infância, situações que nos levam a refletir sobre esses hiatos que obstruem a adoção, como por exemplo, a própria necessidade/utilidade do cadastro nacional de adoção - que existe para organizar a fila de adotantes e possibilitar adoção a todos os inscritos, então por que, ainda, existem muito mais crianças disponíveis para adoção do que inscritos no cadastro? Talvez a resposta a esta pergunta resida no fato do cadastro não ser o meio adequado para a promoção da convivência familiar, exatamente, por não promover o contato pessoal da criança com a família substituta, no dia-a-dia, que é onde se presume a criação e o fortalecimento de vínculos e, desta forma, evitar as frustrações que ocorrem no primeiro encontro, pela falta de empatia entre adotantes e adotandos.

Nesse sentido, observa-se, que o programa de acolhimento familiar, objeto do Art. 19, § 1º da Lei nº 12.010/09, traz em seu bojo, uma prática americana, não prosperou em vários Estados do Brasil, dentre outros motivos, porque as famílias criavam vínculos com as crianças e não podiam adotá-las, em face da vedação legal, gerando, assim, um contra senso com o quantitativo de crianças abrigadas e a necessidade de se encontrar famílias para essas crianças.

A Lei nº 12.010/09 ensejou muitas dúvidas, levando a crer que a sistemática estabelecida pela novel Lei é falha, possivelmente, por ter sido construída a partir de fundamentos equivocadoss, buscando muito mais satisfazer as expectativas internacionais do que o bem estar de nossas crianças em situação de infortúnio.

É senso comum que o fim do preconceito é a maior dívida a ser quitada para com a sociedade, assim como dar um lar a quem não tem. A adoção é, em regra, a certeza de uma família promissora, dentre outros motivos, pelo planejamento e a satisfação de um desejo que é de formar a prole.

Ademais, a supervalorização da família natural, segundo o modelo historicamente estabelecido pelo critério do sangue, como forma de perpetuação da linhagem, em detrimento da família formada a partir do amor, da afinidade/afetividade, quer nos parecer, verdadeiro descompasso com os novos tempos e novas formas de famílias.

A título de conclusão, propomos uma forma mais aberta de convivência familiar, consistente na promoção de contato mais fraterno entre adotantes e adotandos, aproximação da sociedade e abrigos, através da visitação frequente e de incentivo aos programas de apadrinhamentos afetivos com a finalidade de adoção, uma vez que é exatamente esse o desejo da criança acolhida, e, acaso não seja do visitante/padrinho, em um primeiro momento, com a convivência surgem os laços de afetividade/afinidade.

Convém informar, que em Macapá, assim como em outras cidades do país, grande parte dos processos de adoção, surge da convivência oportunizada pelos programas de apadrinhamento natalino e apadrinhamento social, que além de boas práticas são eficazes no descongestionamento dos abrigos.

É necessário que os operadores jurídicos tenham, sempre, como norte, o melhor interesse da criança, tanto na formulação dos pedidos quanto nas decisões, de modo que, qualquer situação que represente desvantagem social, emocional e psicológica à clientela infanto juvenil, deve ser afastada e não prosperar, para se ter uma sociedade futura mais equilibrada e harmoniosa e uma lei mais próxima da justiça.

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Sobre o autor
Cyranette Miranda Ribeiro Cardoso

Especialista em Direito Constitucional. Assessora Jurídica do TJAP. Membro integrante da Preparação Psicossocial e Jurídica à Adoção da Vara da Infância e Juventude de Macapá.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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