Artigo Destaque dos editores

A corrupção.

Uma visão jurídico-sociológica

Exibindo página 6 de 6
26/05/2004 às 00:00
Leia nesta página:

NOTAS

1 Cf. Improbidade Administrativa, 1ª parte, 1ª ed., 2ª tiragem, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002, p. 131.

2 Cáio Tácito, "Moralidade Administrativa" (RDA 218/2, 1999).

3 A Lei nº 8.429/92, regulamentando o art. 37, § 4º, da Constituição da República, considerou atos de improbidade as condutas praticadas por agente público, no exercício da função, que importem em enriquecimento ilícito, dano ao patrimônio público ou violação aos princípios regentes da atividade estatal. Praticando tais atos, de natureza cível e que serão apreciados por um órgão jurisdicional, estará o agente sujeito às sanções cominadas no art. 12 da denominada Lei de Improbidade: suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, perda dos bens adquiridos ilicitamente, dever de reparar o dano, proibição de contratar com o Poder Público ou receber incentivos fiscais ou creditícios e multa.

4 O regime autocrático se distingue do liberal na medida em que seus lineamentos básicos advém de um grande número de normas, produzidas de forma livre pelo poder político e que regem todos os domínios da esfera social, de modo que os mecanismos de controle da produção normativa e a margem deixada à autonomia, individual ou coletiva, englobando os direitos, liberdades e garantias, são em muito enfraquecidos. Cf. Francis Hamon, Michel Tropper e Georges Burdeau, Droit Constitutionnel, 27ª ed., Paris: Librairie Générale de Droit et de Jurisprudence, 2001, p. 87.

5 Segundo Eduardo A. Fabián Caparrós ("La Corrupción Política y Económica: Anotaciones para el Desarollo de su Estudio", in La Corrupción: Aspectos Jurídicos y Económicos, org. por Eduardo A. Fabián Caparrós, 2000, p. 18), "por todo ello, la dimensión política de la corrupción no cabe resolverla tan sólo desde las garantías formales, sino, sobre todo, desde el fomento entre el cuerpo social de una democracia militante. Recordando a Löwenstein, si no se trasciende desde lo meramente semántico al ámbito de lo normativo, los mecanismos de control carecerán de contenido y, por ello, de eficacia. Frente a esa contracultura, es preciso edificar uma cultura de la participación ciudadana que no se resigne a convivir día a día com el cohecho, favoreciendo la intervención de particulares y colectivos comprometidos en la lucha contra la corrupción".

6 De acordo com o Relatório Nolan, elaborado no Reino Unido a partir de informações colhidas nos anos de 1994 e 1995, em virtude de inúmeros escândalos veiculados pelos meios de comunicação, o paulatino aumento da desconfiança da população nos agentes públicos é um fator de desestabilização do próprio sistema democrático, o que torna imperativo que práticas corruptas sejam severamente perquiridas e punidas.

7 Esse fenômeno, evidentemente, não é setorial. Dworkin (Sovereign Virtue, The Theory and Practice of Equality, 4ª tiragem, London: Harvard University Press, 2002, p. 351), ao discorrer sobre "política americana e o século que termina", não exitou em afirmar que "nossos políticos são uma vergonha, e o dinheiro é a raiz do problema. Nossos políticos precisam, angariam e gastam mais e mais dinheiro em cada ciclo de eleições. O candidato que tenha ou angarie mais dinheiro, como as eleições do período de 1998 demonstraram mais uma vez, quase sempre vence. Funcionários começam a angariar dinheiro para a próxima eleição no dia seguinte à última, e freqüentemente dispensam mais tempo e dedicação a essa tarefa do que àquela para a qual foram eleitos. Além disso, eles gastam a maior parte do dinheiro que arrecadaram com publicidades na televisão, que são normalmente negativas e quase sempre inertes, substituindo slogans e canções como argumento. De mais dinheiro precisam os políticos para serem eleitos, e mais eles precisam de ricos contribuintes, e mais influência cada contribuinte terá sobre suas decisões políticas uma vez eleito".

8 No direito brasileiro, as exceções certamente existem, mas sua ocorrência é tão insignificante que dispensa comentários que desbordem do mero registro, motivo pelo qual nos limitaremos a ele. Para evitar esses efeitos deletérios, é imprescindível que seja conferida maior efetividade aos mecanismos de proteção à moralidade previstos na legislação eleitoral, os quais, infelizmente, são cuidadosamente preparados para que poucos efeitos possam gerar. Citandose apenas um exemplo, podese mencionar o lapso de três anos de inelegibilidade previsto na Lei Complementar nº 64/90, a que estão sujeitos aqueles que incorrerem em abuso de poder político ou econômico praticado em detrimento do procedimento eletivo. Levandose em conta que as eleições são quadrienais, não são necessárias maiores divagações para se concluir que caso o agente concorra sempre a determinado cargo, a sanção de inelegibilidade nunca será aplicada, pois os três anos começam a fluir a contar da eleição em que o abuso fora praticado, o que torna a aplicação da sanção restrita às situações em que o agente pretenda concorrer a cargo diverso, cuja eleição seja realizada no triênio.

9

No Brasil, país de democracia incipiente e opinião pública embrionária, os desvios da função legislativa ainda são freqüentes. Para citarmos apenas um exemplo, merece ser lembrado o caso do Senador da República que utilizou o serviço gráfico do Senado Federal para confeccionar calendários contendo a sua imagem, com ulterior envio aos cidadãos do Estado no qual possuía domicílio eleitoral, tudo em pleno ano eleitoral. Reconhecido o abuso de autoridade pelo Tribunal Superior Eleitoral (Caso Humberto Lucena, RO nº 12.244, rel. Min. Marco Aurélio, j. em 13/09/1994, RJTSE vol. 7, nº 1, p. 251) e mantida a decisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF, Pleno, RE nº 186.088/DF, rel. Min. Néri da Silveira, j. em 30/11/1994, DJ de 24/02/1995, p. 3696), o Legislativo pouco tardou em praticar um dos mais deploráveis atos surgidos sob a égide da Carta de 1988. Tratase da Lei nº 8.985, de 7 de fevereiro de 1995, diploma que merece ser transcrito por bem representar a degradação moral da classe dominante à época: "Art. 1° É concedida anistia especial aos candidatos às eleições gerais de 1994, processados ou condenados ou com registro cassado e conseqüente declaração de inelegibilidade ou cassação do diploma, pela prática de ilícitos eleitorais previstos na legislação em vigor, que tenham relação com a utilização dos serviços gráficos do Senado Federal, na conformidade de regulamentação interna, arquivandose os respectivos processos e restabelecendose os direitos por eles alcançados. Parágrafo único. Nenhuma outra condenação pela Justiça Eleitoral ou quaisquer outros atos de candidatos considerados infratores da legislação em vigor serão abrangidos por esta lei. Art. 2° Somente poderão beneficiarse do preceituado no caput do artigo precedente os membros do Congresso Nacional que efetuarem o ressarcimento dos serviços individualmente prestados, na conformidade de tabela de preços para reposição de custos aprovada pela Mesa do Senado Federal, excluídas quaisquer cotas de gratuidade ou descontos. Art. 3° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, aplicandose a quaisquer processos decorrentes dos fatos e hipóteses previstos no art. 1° desta lei. Art. 4° Revogamse as disposições em contrário". Um país cuja classe política tem a coragem (ou o desatino!) de idealizar, discutir, votar, aprovar, sancionar e publicar uma lei como essa, certamente ainda tem um longo caminho a percorrer.

10 O CPI (Corruption Perception Index) varia consoante a probabilidade de que os particulares, quando realizem negócios nos países estudados, sejam instados a entregar determinado numerário como suborno, sendo menor a pontuação obtida conforme aumente tal probabilidade.

11 Como anota María Victoria Muriel Patino ("Economía, Corrupción y Desarrollo", in La Corrupción: Aspectos Jurídicos y Económicos, org. por Eduardo A. Fabián Caparrós, 2000, pp. 27/28), o índice de percepção da corrupção "se basa en 17 encuestas y estudios diferentes realizados por 10 instituciones independientes, y sólo se incluyen en el índice aquellos países para los que existen datos procedentes de, al menos, 3 fuentes diferentes, razón por la que es posible que los países incluidos en los índices cambien de año en año. En 1999, los 10 países mejor situados fueron Dinamarca com um CPI de 10 Finlandia 9.8, Nueva Zelandia, Suecia ambos 9.4, Canadá, Islandia 9.2, Singapura 9.1., Países Bajos 9.0, Noruega y Suiza 8.9. En el mismo año, los 10 peores resultados fueron para Camerún su CPI fue de 1.5 , Nigeria 1.6, Indonesia, Azerbaiyán ambos 1.7, Uzbekistán, Hunduras 1.8, Tanzania 1.9, Yugoslavia, Paraguay y Kenia 2.0. En el número 22 de la tabla encontraríamos a España con un CPI de 6.6, al igual que Francia, por debajo de Chile en el número 19, con un CPI de 6.9 y por delante de otros países latinoamericanos como Perú número 40, CPI 4.5, Brasil 45 y 4.1, México 61 y 3.4 o Colombia número 72, CPI 2.9".

12 O índice de percepção da corrupção (CPI) relativo ao ano de 2002 apresentou os seguintes resultados: 1º) Finlândia 9.7, 2º) Dinamarca 9.5, 3º) Nova Zelândia 9.5, 4º) Islândia 9.4, 5º) Singapura e Suécia 9.3, 7º) Canadá, Luxemburgo e Holanda 9.0; 10º) Reino Unido 8.7;,(...) 40º) Costa Rica, Jordânia, Maurício e Coréia do Sul 4.5, 44º) Grécia; 45º) Brasil, Bulgária, Jamaica, Perú e Polônia 4.0; 50º) Gana 3.9, 51º) Croácia 3.9, (...) 98º) Angola, Madagascar e Paraguai 1.7, 101º) Nigéria 1.6 e 102º) Bangladesh 1.2.

13 Tomandose como parâmetro o BPI (Bribe Payers Index) de 1999, os países com melhor colocação são os seguintes: Suécia 9.3 pontos, Austrália, Canadá 8.1. para ambos, Áustria 7.8, Suíça 7.7 e Holanda 7.4. Os piores, por sua vez, são China 3.1, Coréia do Sul 3.4, Taiwan 3.5, Itália 3.7, Malásia 3.9 e Japão 5.1. Em 2002, a linha de pesquisa foi ampliada e os índices foram os seguintes: 1º) Austrália 8.5, 2º) Suécia e Suíça 8.4, 4º) Áustria 8.2, 5º) Canadá 8.2, 6º) Holanda e Bélgica 7.8, 8º) Reino Unido 6.9, 9º) Singapura 6.3, 10º) Alemanha 6.3, 11º) Espanha 5.8, 12º) França 5.5, 13º) Estados Unidos 5.3, (...) 20º) China 3.5, e 21º) Rússia 3.2. Quanto às atividades mais propícias à corrupção entre os funcionários públicos, eis os dados de 2002: obras públicas e construção 1.3, armamento e defesa 1.9, petróleo 2.7, área imobiliária 3.5, telecomunicações 3.7, (...) e agricultura 5.9, sendo esta última a que apresenta a menor probabilidade de práticas corruptas.

14 Cf. estudo apresentado no Congresso Nacional de Jovens Lideranças Empresariais, Ética e Transparência para o Aperfeiçoamento Contínuo da Sociedade, apud, Lincoln Magalhães da Rocha, "Probidade Administrativa, Eqüidade, e Responsabilidade Fiscal e Social num Mundo Globalizado", in Revista do Tribunal de Contas da União nº 92/312, 2002.

15 Uma valoração responsável do comportamento do agente público exige breves reflexões em torno da noção de moral crítica. Enquanto a moral comum apresenta dissonâncias compatíveis com uma sociedade pluralista, não sendo divisada, em linha de princípio, qualquer compromisso com a justificação de seus conceitos, a moral crítica resulta de um iter procedimental destinado a conferir racionalidade às conclusões que dela defluam. Para maior desenvolvimento do tema, vide H. L. A. Hart, Law, Liberty and Morality, Stanford: Stanford University, 1997.

16 Nas palavras de Konrad Hesse (in Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, 1998, p. 133), "em tudo, democracia é, segundo seu princípio fundamental, um assunto de cidadãos emancipados, informados, não de uma massa ignorante, apática, dirigida apenas por emoções e desejos irracionais que, por governantes bemintencionados ou malintencionados, sobre a questão do próprio destino, é deixada na obscuridade".

17 Conforme conclusões exaradas em estudo realizado pelo Banco Mundial, publicado na Revista Veja nº 1.491, de 14/03/2001, acaso diminuídos os níveis de corrupção pela metade, acarretariam eles a redução dos seguintes fatores de arrefecimento social: a) mortalidade infantil 51%; b) desigualdade na distribuição de renda 54% e c) porcentagem da população que vive com menos de dois dólares por dia 45%. Além disso, ressalta que "a diferença básica entre os países não é a existência da corrupção, mas a forma de punila. Há, neste particular, diferenças culturais. No Japão, país opaco, políticos e empresários que são flagrados recebendo regalos em troca de benefícios se matam de vergonha. Na Itália, perdem o poder. Na Arábia Saudita, perdem a mão. Em Cingapura, paraíso da transparência, são condenados à morte."

18 Cf. Agostin Gordillo, "Un Corte Transversal al Derecho Administrativo: La Convención Interamericana Contra la Corrupción", in LL 1997E, p. 1.091.

19 Vide Ernest W. Böckenförde, Los Derechos Fundamentales Sociales en la Estructura de la Constitución, in Escritos sobre Derechos Fundamentales, trad. de Juan Luis Requejo Pagés, BadenBaden: Nomos, 1993, p. 72 e ss.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

20 Como lembra María Victoria Muriel Patino ("Economía, Corrupción y Desarrollo", in La Corrupción: Aspectos Jurídicos y Económicos, org. por Eduardo A. Fabián Caparrós, 2000, pp. 27/28), alguns sustentam a existência de aspectos positivos nas práticas corruptas: "Hay que destacar que no todos los analistas concluyen que la corrupción produce efectos indiscutiblemente negativos sobre la economía, si bien la postura que defiende que los efectos netos son positivos es cada vez más minoritaria. En este sentido, algunos autores señalan que la corrupción em ocasiones mitiga aunque no elimina el problema de la pobreza, al permitir que algunos ciudadanos escapen a legislaciones demasiado restrictivas que les impedirían todo acceso a determinados bienes y actividades economía sumergida, construcción ilegal de vivendas... que proporcionan un cierto bienestar. También se argumenta que la corrupción puede incluso dar lugar a un mayor crecimiento económico, dado que los individuos corruptos generalmente disponen de mayor renta y, por tanto, de mayor capacidad para realizar inversión productiva. En cualquier caso, no puede pasarse por alto el hecho de que ambos argumentos únicamente tienen um sentido parcial, no generalizable. Incluso aceptando que pequeños actos de corrupción puedan mejorar puntualmente el bienestar de algunos de los individuos más pobres, no cabe duda de que existen numerosas formas de afrontar el problema subyacente de distribuición de la renta más adecuadas que la tolerancia de la corrupción."

21 No Brasil, a Lei nº 8.730/93 que dispõe sobre a obrigatoriedade de apresentação da declaração de bens e rendas para o exercício, no âmbito da União, de cargos nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como no Ministério Público prevê, em seu art. 1º, § 2º, IV, que o Tribunal de Contas publicará, "periodicamente, no Diário Oficial da União, por extrato, dados e elementos constantes da declaração".

22 Essa prática foi acolhida por inúmeros países europeus na década de 70, podendo ser mencionados a Alemanha e a França. Neste último País, a exclusão do crédito tributário era precedida de um procedimento confidencial, instaurado no âmbito do Ministério das Finanças, no qual o exportador "negociava" a exclusão pretendida e fornecia, em obediência ao Código Geral de Impostos, o "nome, prenome, função e endereço do beneficiário" do pagamento (Christophe Guettier, La Loi Anticorruptión, Paris, Éditions Dalloz, 1993, p. 40). Nos Estados Unidos da América, esse tipo de comportamento foi proibido com a edição do Foreign Corrupt Practices Act de 1977, cuja Seção 162 (Internal Revenue Code) dispõe que os pagamentos efetuados a funcionários estrangeiros não poderão ser deduzidos nos casos em que a legislação do país de origem desses últimos os considerem ilegais. Esse diploma aperfeiçoou o sistema americano, que já contava com a lei sobre organizações corruptas e negócios ilícitos (RICO Racketeer Influenced and Corrupt Organizations, 18 U.S.C. Secs. 1962 e ss.), que buscou combater a máfia, e com a lei que autorizava o confisco das vantagens auferidas com o suborno (18, U.S.C. Sec. 3.666). Em 1997, quase 40 países integrantes da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico subscreveram a Convenção de luta contra os subornos a funcionários públicos estrangeiros em transações comerciais de caráter internacional e que recomendava não fossem permitidas quaisquer reduções, em matéria tributária, das importâncias pagas a título de suborno.

23 Na Espanha, a diretiva redundou na edição da Lei nº 19, de 28 de dezembro de 1993, que impôs inúmeras obrigações às instituições financeiras. No caso de descumprimento, a depender da gravidade da conduta, que pode ser grave ou muito grave, são previstas as sanções de advertência privada, advertência pública, multa, suspensão do empregado responsável pela prática indevida, inabilitação para o exercício de funções em instituições financeiras e revogação da autorização para operar. Essa Lei foi regulamentada pelo Real Decreto nº 925, de 9 de junho de 1995.

24 Tratase de Convênio composto por 13 artigos: art. 1º) elenca inúmeras condutas que consubstanciam fraude contra os interesses financeiros das Comunidades Européias e dispõe sobre a obrigação de os Estados membros trasladalas ao direito penal interno; art. 2º) necessidade de as sanções penais serem efetivas, proporcionais e dissuasórias, devendo ser prevista, ao menos em relação à fraude grave, penas privativas de liberdade que possam dar lugar à extradição, sendo admissível, quanto às fraudes leves, sanções mais brandas; art. 3º) consagra a responsabilidade penal dos dirigentes de empresa, com poderes de decisão ou controle, ainda que a fraude seja praticada por uma pessoa submetida a sua autoridade, desde que atue em nome da empresa; art. 4º) estabelece regras de competência para a persecução das infrações; art. 5º) o Estado membro que não conceda a extradição deve adotar as medidas necessárias à coibição das infrações, ainda que praticadas fora do seu território; art. 6º) estabelece regras de cooperação quanto à investigação das infrações penais, ao cumprimento de diligências judiciais e à execução das sanções aplicadas; art. 7º) veda, ressalvadas algumas exceções (v.g.: fatos que constituam crime contra a segurança ou outros interesses essenciais do Estado membro e ilícito praticado por funcionário de Estado membro que importe em descumprimento das obrigações do cargo sendo afastada a incidência das exceções no caso de processamento ou deferimento do pedido de extradição), a persecução do mesmo fato em Estados membros diferentes nos casos em que a sanção já tenha sido cumprida, esteja em vias de ser executada ou não possa ser executada segundo as leis do Estado que a impôs; art. 8º) dispõe sobre a competência do Tribunal de Justiça da União Européia; art. 9º) consagra a possibilidade de os Estados membros adotarem disposições cujo alcance seja maior que aquelas do convênio; art. 10) dispõe sobre o dever de comunicação, à União Européia, dos textos adotados no âmbito do direito interno em cumprimento ao convênio; art. 11) trata da entrada em vigor do Convênio, o que ocorrerá noventa dias após a notificação pelo Estado membro que, em último lugar, implemente, no âmbito do direito interno, as medidas necessárias à sua adoção; art. 12) contempla a possibilidade de adesão por outros Estados que venham a se tornar membros da União Européia; e art. 13) o depositário do Convênio será o SecretárioGeral do Conselho da União Européia.

25 Esse Convênio é integrado por 16 artigos: art. 1º) estabelece o conceito de funcionário, gênero que engloba os funcionários comunitários e nacionais; art. 2º) define o crime de corrupção passiva, que se consuma com o recebimento de vantagem ou com a mera promessa; art. 3º) define o crime de corrupção ativa; art. 4º) dispõe que a prática de crimes de corrupção por altas autoridades nacionais será perquirida de modo similar àquele relativo às autoridades da Comunidade Européia; art. 5º) dispõe que, sem prejuízo das medidas disciplinares, as sanções penais cominadas aos crimes de corrupção, além de poderem ser idênticas àquelas, o que reflete a independência entre as instâncias, deverão ser proporcionais e dissuasórias, incluindo, ao menos em relação aos casos graves, penas privativas de liberdade que podem dar lugar à extradição (o que não exclui, sequer, os nacionais); art. 6º) consagra a responsabilidade penal dos dirigentes de empresa, com poderes de decisão ou controle, ainda que o crime de corrupção seja praticado por uma pessoa submetida a sua autoridade, desde que atue em nome da empresa; art. 7º) estatui diretrizes para a fixação da competência do órgão jurisdicional; art. 8º) dispõe sobre a extradição, inclusive de nacionais; art. 9º) estabelece regras de cooperação quanto à investigação das infrações penais, ao cumprimento de diligências judiciais e à execução das sanções aplicadas; art. 10) veda, ressalvadas algumas exceções (v.g.: fatos que constituam crime contra a segurança ou outros interesses essenciais do Estado membro e ilícito praticado por funcionário de Estado membro que importe em descumprimento das obrigações do cargo), a persecução do mesmo fato em Estados membros diferentes nos casos em que a sanção já tenha sido cumprida, esteja em vias de ser executada ou não possa ser executada segundo as leis do Estado que a impôs, sendo garantida, nas hipóteses em que a persecução seja admitida, a detração da pena já cumprida; art. 11) consagra a possibilidade de os Estados membros adotarem disposições cujo alcance seja maior que aquelas do convênio; art. 12) dispõe sobre a competência do Tribunal de Justiça da União Européia; art. 13) trata da entrada em vigor do Convênio, o que ocorrerá noventa dias após a notificação pelo Estado membro que, em último lugar, implemente, no âmbito do direito interno, as medidas necessárias à sua adoção; art. 14) contempla a possibilidade de adesão por outros Estados que venham a se tornar membros da União Européia; art. 15) somente admite a formulação de reservas quanto ao art. 7º, cláusula 2 (normas de competência) e ao art. 10, 2 (situações que justificam a persecução de um mesmo fato mais de uma vez); e art. 16) o depositário do Convênio será o SecretárioGeral do Conselho da União Européia.

26 Além da pena privativa de liberdade, a condenação pela prática das infrações penais constantes do Corpus Juris, a depender da gravidade, pode ensejar a divulgação do decreto condenatório em publicações da União Européia, a impossibilidade de receber subsídios, a vedação de contratar com o Poder Público, a proibição de exercer função pública por até cinco anos e a perda dos bens auferidos com o ilícito (art. 14 Penalties and measures).

27 A Ação Comum é composta de 10 artigos: art. 1º) define pessoa, pessoa jurídica e descumprimento das obrigações; art. 2º) define o crime de corrupção passiva no setor privado, que está associado ao recebimento de vantagem ou à promessa de recebêla, em razão de uma ação ou omissão relacionada ao exercício da atividade empresarial; art. 3º) define o crime de corrupção ativa no setor privado; art. 4º) necessidade de as sanções penais serem efetivas, proporcionais e dissuasórias, devendo ser prevista, ao menos nos casos graves, penas privativas de liberdade que possam dar lugar à extradição; art. 5º) dispõe sobre a responsabilidade das pessoas jurídicas, sem prejuízo da responsabilidade penal das pessoas físicas, em relação aos atos de corrupção praticados por pessoa que ostente um cargo de direção ou que ostente poder decisório, bem como sobre a responsabilidade dos subordinados em relação aos atos de corrupção ativa advindos do descumprimento do dever de vigilância que recai sobre os superiores hierárquicos; art. 6º) as pessoas jurídicas poderão estar sujeitas, dentre outras sanções de caráter penal ou administrativo, à exclusão do recebimento de vantagens ou ajudas públicas, à proibição temporária ou permanente de desenvolver atividades comerciais, à vigilância judicial e à medida judicial dissolutória; art. 7º) estatui diretrizes para a fixação da competência do órgão jurisdicional; art. 8º) dois anos após a entrada em vigor da Ação Conjunta, os Estados membros apresentarão propostas visando à sua efetividade e, três anos após a sua entrada em vigor, o Conselho da União Européia avaliará o seu cumprimento pelos Estados membros; art. 9º) a Ação Comum será publicada no Diário Oficial; e art. 10) entra em vigor na data da publicação.

28 O Convênio é composto de 42 artigos. Dentre outras disposições, estatui alguns conceitos (art. 1º) e um rol de condutas que devem ser tipificadas como infrações penais pelos Estados partes (corrupção no setor público, corrupção em transações internacionais, corrupção no setor privado, corrupção de organizações internacionais, tráfico de influências e lavagem de dinheiro arts. 2º usque 14).

29 A implementação do Convênio será monitorada pelo GRECO Group of States against Corruption (art. 14).

30 Dispõe o Convênio que os atos de corrupção devem sujeitar os envolvidos a penas privativas de liberdade, a extradição, a sanções pecuniárias e ao perdimento do que auferissem com o ilícito (art. 3, incisos 2 e 3). Além disso, poderiam os Estados partes, de forma adicional, cominar outras sanções cíveis ou administrativas. Por força desse Convênio, inúmeros Estados realizaram adequação em sua legislação penal. A Espanha, por meio da Lei Orgânica nº 3, de 11 de janeiro de 2000, alterou o Código Penal de 1995 para introduzir, após o Título XIX ("Delitos contra la Administración Pública"), o Título XIX BIS ("Delitos de corrupción en las transacciones comerciales internacionales"), constituído por um só artigo. O Brasil ratificou a convenção por meio do Decreto Legislativo nº 125, de 14 de junho de 2000, sendo posteriormente promulgada pelo Decreto nº 3.678, de 30 de novembro de 2000. Consoante o art. 1º, caput, desse último decreto, a convenção "deverá ser executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém", ressaltando, em seu parágrafo único, que "a proibição de recusa de prestação de assistência mútua jurídica, prevista no Artigo 9, parágrafo 3, da Convenção, será entendida como proibição à recusa baseada apenas no instituto do sigilo bancário, em tese, e não a recusa em decorrência da obediência às normas legais pertinentes à matéria, integrantes do ordenamento jurídico brasileiro, e a interpretação relativa à sua aplicação, feitas pelo Tribunal competente, ao caso concreto". Incorporada a Convenção ao direito interno, foi editada a Lei nº 10.467, de 11 de junho de 2002, que acresceu o Capítulo IIA, intitulado "Dos Crimes Praticados por Particular contra a Administração Pública Estrangeira", ao Título XI do Código Penal, sendo referido capítulo integrado por três artigos. Além disso, acresceu um inciso VIII ao art. 1º da Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre os "crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores".

31 Tal recomendação foi expedida em 23 de maio de 1997: "The Council, (...) I. Recommends that those Member Coutries which do not disallow the deductibility of bribes to foreign public officials reexamine such treatment with the intention of denying this deductibility. Such action may be facilitated by the trend to treat bribes to foreign officials as illegal".

32 Dentre as práticas sugeridas com o fim de aumentar a transparência e diminuir a corrupção, estão: acesso dos cidadãos às informações financeiras do Poder Público, necessária apresentação de contas pelos funcionários dos organismos financeiros estatais, imperativa publicidade das decisões relacionadas à política financeira; transparência no exercício da função pública e definição de responsabilidades e objetivos dos bancos centrais. Um exemplo de materialização das diretivas veiculadas pelo Código de boas práticas do FMI é a Lei de Responsabilidade Fiscal brasileira, de 4 de maio de 2000, que, entre outras medidas, em inúmeros preceitos estimula a ideologia participativa (arts. 48, 51, 56, § 3º e 67).

33 "(...) Member Sates, individually and through international and regional organizations, taking actions subject to each State''s own constitutional and fundamental legal principles and adopted persuant to national laws and procedures, commit themselves: (...) 7. To examine establishing illicit enrichment by public officials or elected representatives as na offence."

34 O Brasil ratificou a Convenção em 25 de junho de 2002 (DecretoLegislativo nº 152), sendo ela posteriormente promulgada pelo Decreto nº 4.410, de 7 de outubro de 2002 (DOU de 08/10/2002), sofrendo pequena alteração redacional por força do Decreto nº 4.534, de 19 de dezembro de 2002. A única reserva feita à Convenção referese ao art. XI, 1, c ("art. XI. "1. A fim de impulsionar o desenvolvimento e a harmonização das legislações nacionais e a consecução dos objetivos desta Convenção, os Estados Partes julgam conveniente considerar a tipificação das seguintes condutas em suas legislações e a tanto se comprometem: (...) c. toda ação ou omissão realizada por qualquer pessoa que, por si mesma ou por interposta pessoa, ou atuando como intermediária, procure a adoção, por parte da autoridade pública, de uma decisão em virtude da qual obtenha ilicitamente, para si ou para outrem, qualquer benefício ou proveito, haja ou não prejuízo para o patrimônio do Estado." Segundo o art. 1º do Decreto nº 4.410/02, a convenção "será executada e cumprida tão inteiramente como nela se contém". Em outros países, a ratificação da Convenção foi muito mais célere: na Argentina, por exemplo, tal se deu com a Lei nº 24.759, sancionada em 4 de dezembro de 1996 e promulgada em 13 de janeiro de 1997 (B.O. de 17/01/1997).

35 Vide art. I.

36 Vide art. VIII.

37 Vide art. XII.

38 Vide art. XV.

39 Vide art. XVI.

40 Vide art. XXII.

41 Vide art. XXIV.

42 Vide art. XXVI.

43 Esse diploma legal aperfeiçoou e deu continuidade às ações que buscavam moralizar a vida política, econômica e financeira na França. Anteriormente a ele, já haviam sido editadas inúmeras leis com idêntico objetivo: a) leis que buscavam regulamentar o financiamento dos partidos e das campanhas eleitorais (Lei Orgânica nº 88226 e Lei nº 88227, de 11/03/1988, JO de 12/03/1988, p. 3.288, concernentes à transparência financeira da vida política; Lei nº 9055, de 15/01/1990, JO de 16/01/1990, p. 639, que tratava da limitação das despesas eleitorais e do esclarecimento do financiamento das atividades econômicas); b) Lei nº 89531, de 02/08/1989, JO de 04/08/1989, que reformou os poderes da Comissão de Operações da Bolsa; c) Lei nº 90614, de 12/07/1990, JO de 14/07/1990, JO de 14/07/1990, p. 8.329, concernente à repressão à lavagem de dinheiro originário do tráfico de entorpecentes; e d) Lei nº 913, de 03/01/1991, JO de 05/01/1991, p. 236, que dispunha sobre o controle das contratações públicas.

44 Art. 2º da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

45 As atribuições do TRACFIN foram ampliadas pelos arts. 72 e 73 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

46 Art. 6º da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

47 Arts. 7º usque 17 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

48 Arts. 20 usque 29 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

49 Arts. 30 usque 37 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

50 Vide, respectivamente, arts. 38 usque 50 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

51 Arts. 51 usque 71 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

52 Arts. 72 usque 81 da Lei nº 93122, de 29/01/1993.

53 Em 28 de junho de 2002, período em que o País estava eufórico com a participação da seleção brasileira no campeonato mundial de futebol, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 6.295/02, que introduzia alteração no art. 84 do CPP determinando que a prerrogativa de foro assegurada a determinados agentes na esfera criminal prevaleceria no âmbito cível em relação às ações de improbidade. Essa estranha alteração, que inseria na lei adjetiva penal normas de competência de natureza cível, na forma em que foi concebida, sequer seria submetida a votação no plenário, permitindo o seu imediato encaminhamento ao Senado. Os parlamentares, no entanto, acostumados com uma realidade diferente daquela em que vivemos hoje, não contavam com a enérgica indignação dos mais diversos setores da sociedade, que, pouco a pouco, não mais vêem a desonestidade e a máfé com ares de normalidade. Roberto Romano, professor de ética e filosofia na Unicamp, em artigo intitulado "Contra o foro privilegiado dos políticos", publicado na Folha de São Paulo de 16/07/02, seguindo o pensamento de Rousseau, assim se pronunciou: "se o governo recebe do soberano as ordens que dá ao povo, para que o Estado esteja num bom equilíbrio, é preciso, tudo compensado, que haja igualdade entre o produto ou a potência do governo tomado em si mesmo e o produto ou a potência dos cidadãos, que são soberanos de um lado e súditos de outro. Os atos que geram mais poder aos governantes e desequilibram a igualdade do Estado destroem a base política. Se os dirigentes usam artifícios legais para fugir da igualdade e usurpam o poder soberano, eles diminuem a majestade do Estado e negam a universal força de constrangimento legítimo. Quando os administradores agem assim, o grande Estado se dissolve, formandose um outro no seu interior, composto só pelos membros do governo, e que é para o resto do povo apenas seu senhor e seu tirano" ("Do Abuso do Governo e de Sua Inclinação para Denegar"). No Brasil, a reunião dos políticos que hoje exije para si o estatuto de República autônoma, superior à dos cidadãos, representa pequena minoria. Mas ela causa estragos consideráveis, como neste ensaio para outorgar foro privilegiado aos governantes. Até 9 de agosto (data limite para colheita das assinaturas necessárias e interposição de recurso para o plenário), saberemos se aumentou o número dos cidadãos da república, ou o condomínio particular dos políticos. As oposições e mesmo os que apoiam os dirigentes, mas são democratas, podem afastar o golpe. Caso contrário, em pouco tempo o Brasil será um imenso Espírito Santo, um Estado que prova, de modo cabal, o que significa o privilégio dos administradores, em detrimento dos contribuintes". Lamentavelmente, o projeto terminou por ser convertido na Lei nº 10.628/02, o qual teve a sua inconstitucionalidade suscitada perante o Supremo Tribunal Federal.

54In Sylvino Gonçalves, "Rui Barbosa: coletânea forense para os estudantes de direito, Igualdade perante a Lei, Rio de Janeiro: Casa de Rui Barbosa, 1959, p. 99.

55Apud Flávia Piovesan, in Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, São Paulo: Max Limonad, 1996, p. 288.

56Justitia nº 110/140.

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Emerson Garcia

Membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARCIA, Emerson. A corrupção.: Uma visão jurídico-sociológica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 323, 26 mai. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5268. Acesso em: 20 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos