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A ilegalidade da Resolução do Comitê Gestor do Refis nº 19/2001

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5. Deturpação do Benefício Fiscal

Na sua essência, a questão diz respeito ao instituto da compensação tributária, e neste prisma, consolidou a Lei n. 9.964/00 ser uma faculdade do contribuinte optante a compensação de multa e juros com prejuízos fiscais e bases de cálculo negativas da CSLL, próprios ou de terceiros. Faculdade esta geradora de um direito subjetivo, exceção à regra das demais modalidades de compensação tributária onde há previsão para a compensação de ofício pelo próprio órgão administrativo. A resolução inverteu a faculdade que foi atribuída por lei ao contribuinte optante, desvirtuando-a para uma obrigação e impondo ao contribuinte o detrimento de ter o seu prazo de parcelamento diminuído e a impossibilidade de transferir créditos para terceiros. A resolução vai de encontro às próprias regras do parcelamento especial, consistente na repactuação de dívidas vencidas. Vale dizer, dívida vencida transmutada em vincenda com exigibilidade suspensa conforme determina o CTN.

A atitude da administração pública se torna ainda mais comprometida ao constatar-se que a própria Lei n. 9.964/00 expressou ser causa de exclusão a utilização indevida de prejuízo fiscal e base negativa, que se caracteriza, no conceito do programa, como sendo a cessão de crédito inexistente, o que garante ao fisco uma atitude comissiva frente a tentativa ilícita de transferência. No entanto, malograr o contribuinte optante a inversão da faculdade, faz a administração pública insurgir-se contra o próprio princípio da moralidade. É desta forma que a CFRB determina que ninguém está obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (inciso II do art. 5o) e neste prisma, percebe-se que a administração pública também anulou este princípio constitucional. A primazia do direito deve ser venerada e buscada, evitando-se tanto a locupletamento ilícita como o uso de arbitrariedades pelos agentes administrativos.

Assim, no limiar da pesquisa jurídica e na busca pela correta exegese do ordenamento pátrio, argumentos extrajurídicos devem ser esquecidos, mas, mesmo que se argumentasse eventuais ilicitudes nos procedimentos, nada encontraríamos senão a verificação prática de que, tanto num quanto noutro caso (compensação contra débitos do cedente ou cessionário) os valores seriam baixados do sistema fazendário, não caracterizando qualquer prejuízo ao erário. Pelo contrário, mesmo admitindo-se a resolução do Comitê Gestor do Refis como legal e constitucional, estaríamos diante da exaltação da presunção da má-fé.


6. Considerações Finais

Sem a pretensão de esgotar o tema e apenas com o objetivo de fomentar a discussão das problemáticas atinentes aos optantes pelo Refis, programa recebido como divisor de águas na solução da dívida tributária, é forçoso concluir-se que a Resolução do Comitê Gestor do Refis n. 19/01 é manifestamente ilegal e inconstitucional, principalmente por:

  1. Restringir via ato normativo (e por via oblíqua ferir o princípio constitucional da hierarquia das leis) um benefício fiscal devidamente criado por lei e regulamento por decreto;

  2. Macular o princípio da segurança jurídica ao manifestar entendimento interpretativo retroativo prejudicial, ferindo frontalmente a Lei n. 9.784/99;

  3. Ferir o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, constitucionalmente garantido;

  4. Por inverter a faculdade de compensar, transmutando-a em obrigação de compensar e descaracterizando o próprio instituto do parcelamento especial.

Assim, se torna ilegal e inconstitucional qualquer tentativa de denegação das compensações realizadas nos exatos termos preconizados pela lei, decreto e instrução normativa, ensejando, no caso concreto, a defesa judicial competente.


Notas

1 Art. 99. O conteúdo e o alcance dos decretos restringem-se aos das leis em função das quais sejam expedidos, determinados com observância das regras de interpretação estabelecidas nesta Lei.

2 Art. 111. da Lei n. 5.172, de 25/10/1966.

3 Direito Administrativo Brasileiro, 26a ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2001, p. 174.

4 Art. 100, inciso I da Lei n. 5.172, de 25/10/1966.

5 RE 136.889/SP.

6 ADIn 311-9/DF DJU 14/09/1990.

7 Manual de Direito Constitucional, Tomo V, Coimbra, 1997, p. 211.

8 Op. cit., p.217

9 Art. 106. da Lei n. 5.172, de 25/10/1966.

10 Curso de Direito Constitucional Tributário, 16a ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2001, p. 304.

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Sobre os autores
Rodrigo Girolla

advogado tributarista do escritório Martinelli Advocacia Empresarial

Celso Meira Junior

advogado tributarista do escritório Martinelli Advocacia Empresarial

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GIROLLA, Rodrigo ; MEIRA JUNIOR, Celso. A ilegalidade da Resolução do Comitê Gestor do Refis nº 19/2001. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 330, 27 mai. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5273. Acesso em: 25 dez. 2025.

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