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O princípio da legalidade e a fixação de anuidades pelos conselhos federais

21/10/2016 às 11:39
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Não cabe ao conselho de fiscalização profissional fixar ou majorar, sem parâmetro legal, o valor das contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas.

O princípio da legalidade eleva a lei à condição de veículo supremo da vontade do Estado.

A lei é uma garantia, o que não exclui, como bem se avisa, a necessidade de que ela mesma seja protegida contra possíveis atentados à sua inteireza e contra possíveis máculas que a desencaminhem de sua verdadeira trilha.

Necessário expor, ainda que em poucas palavras, o princípio da legalidade no direito penal, no direito administrativo e no direito tributário.

Diante do princípio da legalidade do crime e da pena, pelo qual não se pode impor sanção penal a fato não previsto em lei, é inadmissível  o emprego da analogia (forma de autointegração da lei) para criar ilícitos penais ou estabelecer sanções criminais.

A única fonte direta do direito penal é a lei, diante do princípio da reserva legal.

O princípio da legalidade está inscrito no artigo 1º do Código Penal, reserva legal, no sentido de que “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal”.

Assim se tem na Constituição Federal, no artigo 5º, XXXIX, quando se dispôs que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

Na linha já traçada na Declaração de Direitos Humanos e do Cidadão, de 1789, e que foi insculpido na Constituição de 1824, e dela não saiu mais, só a lei pode ser fonte geradora do ilícito penal. Excluem-se destarte quaisquer outros casos de idêntica hierarquia ou, a fortiori, de hierarquia inferior.

Além da anterioridade da lei, como princípio trazido no artigo 5º, XXXIX, referenciado, da Constituição, da reserva legal, há que se mencionar a tipicidade. Com efeito, não  basta que a lei acene com descrições abstratas ou esfumadas do fato delituoso. É preciso que o comportamento seja descrito em todas as suas minúcias, dando lugar a uma suficiente especificação do tipo do crime. Daí porque, repita-se, não se aceita analogia em sede de direito penal.

As penas e as medidas de segurança devem ser previstas em lei.

Pelo princípio da legalidade alguém só pode ser punido se, anteriormente ao fato por ele praticado, existir uma lei que o considere como crime. Mesmo que o fato agrida a moral, danoso, não haverá possibilidade de se punir o autor, sendo irrelevante a circunstância de entrar em vigor uma lei que, posteriormente, o preveja como crime.

O princípio da legalidade é a base de sustentação do direito penal.

Na esfera administrativa discutem-se as características do princípio da legalidade.

O princípio da legalidade da função executiva, de que a legalidade da Administração é simples aspecto, desdobra-se nos princípios da preeminência da lei e o princípio da reserva de lei.

O princípio da preeminência da lei, princípio da legalidade em sentido amplo, fórmula negativa ou regra da conformidade, traduz-se na proposição de que cada ato concreto da Administração é inválido, se e na medida em que contrária uma lei material.

Por sua vez, o princípio da reserva de lei, princípio da legalidade em sentido restrito, surgiu originalmente com o sentido de que cada ato concreto da administração que intervém na liberdade ou propriedade do cidadão, carece de autorização de uma lei material, mas veio mais tarde a evoluir no sentido de exigir a mesma autorização para todo e qualquer ato administrativo, ainda que, de forma direta, não contendesse na aludida esfera privada dos particulares.

Entende-se pela experiência doutrinária que,  se o princípio da preeminência da lei representa muito mais a defesa da própria ideia de generalidade numa fase de evolução do poder administrativo concebido essencialmente como uma ampla esfera de autonomia ou mero âmbito da licitude,  o princípio da reserva legal desempenha uma função de garantia dos particulares contra as intervenções do poder.

Na doutrina alemã, do que se lê das observações de Peters, Huber, Wolff e Forsthoff, o princípio da legalidade reveste no direito administrativo o seu conteúdo mínimo de uma simples regra de preeminência da lei. Assim no direito administrativo brasileiro há o entendimento  de que apenas se exija uma reserva de lei no que se diga respeito à criação de deveres, de conteúdo positivo ou negativo. A Constituição dita: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”(artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal).

Fala-se em reserva de lei material e reserva de lei formal. No primeiro caso, basta que a conduta da Administração seja autorizada por uma norma geral e abstrata, seja ela a lei constitucional (norma paratípica), a lei ordinária (norma típica primária) ou mesmo o regulamento (norma típica secundária). No segundo caso, torna-se necessário que o fundamento legal do comportamento do órgão executivo seja um ato normativo dotado com força de lei, de ato provido de órgão com competência legislativa normal e revestido da forma externa legalmente prescrita.

A atividade administrativa que não se traduza na criação de limites à liberdade pessoal ou patrimonial dos cidadãos apenas se encontra submetida à regra da preeminência da lei.

No direito administrativo, há uma reserva relativa de lei formal, porém, no que concerne ao direito tributário, a trilha é a reserva absoluta de lei formal.

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Toda a conduta em sede de direito tributário será norteada e se fundamentará na lei, de que seja o seu pressuposto necessário.

Asim, o direito administrativo se contenta com uma simples reserva de lei material, baseado no item generalidade, novidade, próprios de um perfil normativo.

Todavia, no direito tributário, há o entendimento, uma vez que é intensa a intervenção da administração na propriedade, na renda, nos serviços, na circulação de bens industrializados ou não, por parte dos cidadãos, que essa intervenção estatal se dê dentro das garantias da lei formal, pois, como disse o juiz Marshall: “the power to tax involves the power to destroy”, como se viu no caso Mc Culloch v. Maryland, e, H. 316.

Isso porque toda vez que se tratar de limitação de direitos fundamentais a lei é imprescindível.

Nessa linha de pensar, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 704292, no qual os ministros decidiram que não cabe ao conselho de fiscalização profissional fixar ou majorar, sem parâmetro legal, o valor das contribuições anuais devidas por pessoas físicas ou jurídicas. Na sessão do dia 19 do corrente mês de outubro de 2016,  o Plenário seguiu a proposta do relator, ministro Dias Toffoli, quanto à fixação da tese de repercussão geral e rejeição do pedido de modulação de efeitos da decisão.

A tese de repercussão geral fixada é a seguinte: “É inconstitucional, por ofensa ao princípio da legalidade tributária, lei que delega aos conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas a competência de fixar ou majorar, sem parâmetro legal, o valor das contribuições de interesse das categorias profissionais e econômicas, usualmente cobradas sob o título de anuidades, vedada, ademais, a atualização desse valor pelos conselhos em percentual superior aos índices legalmente previstos”.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. O princípio da legalidade e a fixação de anuidades pelos conselhos federais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4860, 21 out. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/53031. Acesso em: 22 dez. 2024.

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