Ato libidinoso com menores

conceituação e críticas

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29/10/2016 às 12:25
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5.Do paradigma psicanalítico

A sexualidade não é atributo essencial humano, todas as criaturas viventes fazem uso dela para se reproduzirem e prosperem sua espécie, obviamente nem todos da mesma forma. No reino animal o tipo de reprodução mais comum é a sexuada, ou seja, a união dos gametas se dá através da cópula. Não é novidade que algumas espécies de animais são dotadas de peculiares sensações ao vivenciar sua sexualidade. Estas sensações, sem dúvidas reforçativas, geram grande prazer aos praticantes.

A espécie humana faz parte deste grupo de animais, e como tal, desenvolveu formas inúmeras de experimentar as sensações incríveis da sexualidade. E para entendê-la sob a ótica psicanalista, é necessário primeiramente estabelecer uma definição de sexualidade.

Segundo Rycrotf (1975), em psicologia o estudo da sexualidade aponta a referência de impulsos, padrões de comportamento, emoções e sensações observadas ou inferidas como sendo intrinsecamente vinculadas à atividade reprodutiva. Já segundo a concepção de Feller (1978), a sexualidade em um sentido mais estrito aplica-se aos mecanismos fisiológicos destinados a assegurar a reprodução da espécie. Em sentido mais amplo é toda organização da vida afetiva que esta em causa.

Não obstante, de acordo com Laplanche e Pontalis (2008), na experiência e na teoria psicanalítica, o termo sexualidade não designa apenas às atividades e ao prazer, que dependem do funcionamento do aparelho genital. Mas toda uma série de excitações e de atividades presentes desde a infância que proporcionam um prazer irredutível à satisfação de uma necessidade fisiológica fundamental. O autor exemplifica que estas excitações podem ser encontradas na respiração, na alimentação, nas atividades excretoras e, é claro, na relação sexual.

Laplanche e Pontalis (2008) profere que o estudo da sexualidade não se resume ao coito sexual, entende-se que a sexualidade é um termo amplamente abrangente:

 

Se partirmos da visão comum de definir a sexualidade como um instinto, isto é, como um comportamento pré-formado, característico da espécie, como um objeto – parceiro do sexo oposto – e uma meta – união dos órgãos genitais no coito – relativamente fixo, percebemos que ela só muito imperfeitamente explica fatos fornecidos tanto pela observação direta como pela análise (LAPLANCHE; PONTALIS, 2008, p. 477).

 

Nota-se o comportamento sexual humano é demasiadamente vasto. E foi graças ao legado da Psicanálise que hoje se tem essa visão ampla. Nos primeiros estudos sobre sexologia foram utilizadas as concepções reducionistas de sexualidade, onde esta se resumia à procriação. Graças ao moralismo da época havia muito preconceito nos estudos sexuais e psicopatológicos (REICH, 1995). Para os autores antecedentes do legado freudiano, tudo era hereditário e biológico; a libido era encarada apenas como desejo durante o coito; e os estudos anatômicos dos órgãos sexuais eram extremamente vagos em relação aos hormônios. Freud abriu caminho para um estudo científico da sexualidade humana.

A sexualidade humana não deve ser encarava com seu início após a puberdade. De acordo Haire (1972), Freud defendia a sexualidade se iniciava na infância, o próprio processo de amamentação é uma etapa sexual da vida do indivíduo, tanto para a mãe quanto para o bebê. Para Freud é, sobretudo a existência de uma sexualidade infantil, que atua desde o princípio da vida, que vem ampliar o campo daquilo que os psicanalistas chamam de sexuais.

A sexualidade infantil abrange não somente o comportamento manifestado sexualmente que ocorre na infância, mas também todo o prazer derivado das zonas erógenas e todas as manifestações dos instintos componentes (Rycroft, 1975). Em relação à sexualidade na infância, Laplanche e Pontalis (2008) menciona que a sexualidade na criança não diz respeito apenas à existência de excitações ou de necessidades genitais precoce, mas também de atividades aparentadas com as atividades perversas do adulto, na medida em que põem em jogo as zonas corporais que não são apenas as zonas genitais.

De acordo com Haire (1972), o lugar ocupado pelo jogo no erotismo dos adultos suscitou já uma vasta literatura. Mas foi somente após os estudos de Freud que os psicólogos e pedagogos começaram a se preocupar com os jogos infantis já marcados pela sexualidade. Em relação isso, Costa (1986) assegura que com o desenvolvimento cognitivo da criança, esta passa a explorar seu corpo e o corpo das pessoas a sua volta. Os jogos sexuais representam, nessa fase, a precoce busca de uma identidade sexual. 

Como já citado, após o início da puberdade os jogos sexuais infantis, que até então tinham função de auto-descoberta, perdem sua função. O adolescente já conhece seu corpo e, consequentemente, suas áreas de prazer. O que ele mais quer agora é procurar alguém que lhe sacie.

Dessa forma, pode-se notar no comportamento social do homem, que a sexualidade entre os jovens nem sempre se limita a interação entre eles. Sendo seres ávidos por novas experiências a buscar de uma figura mais velha, como fonte para seus impulsos, torna-se inevitável.

A sexualidade é um processo contínuo e inerente da espécie humana latu sensu. Mas ao considerar apenas os aspectos meramente reprodutores, chega-se a conclusão que este depende de um processo de maturação do indivíduo. Esta maturação se inicia com a puberdade, que na sociedade ocidental determina o amanhecer da adolescência.

Em relação ao relacionamento sexual do púbere com outro indivíduo mais velho, ainda permanece uma grande questão: até que ponto esta experiência estaria influenciando seu desenvolvimento normal de forma negativa, ou seja, qual a linha tênue entre a consequência patológico e a normal?

 Essa foi, sem sombra de dúvidas, a questão que o legislador formulou para si mesmo, ao imaginar o conceito de corrupção de menor e violência presumida. Obviamente, a resposta que recebeu de si, foi a que lhe inspirou a criação da norma dos mesmos crimes, atribuindo idade de quatorze a dezoito anos para o delito de corrupção de menores, e violência presumida, estupro de vulnerável, nos agentes com menos de quatorze anos.  

Para esta questão, é necessária uma discussão sobre o normal e o patológico. Como lembra Marcelli (2008), a discussão entre o normal e o patológico é mais filosófica do que médica. Associar o normal à média é, primeiramente, confundir o anormal e a anomalia. Não existe uma definição simples do que é normal. Freud (apud, MARCELLI, 2008), considerava que a única diferença entre o neurótico sadio e o doente residia na intensidade de pulsões, nos conflitos e nas defesas.

Neste pensamento, não existe um patamar exato do surgimento da patologia. Para a psiquiatria, o patológico e a normalidade estão mais ligados em como o indivíduo do que com a doença propriamente dita. Dessarte, o que define o surgimento da patologia é como o indivíduo vivencia aquele sintoma.

No que se refere a relação entre o adulto e o adolescente, vai se tornar patológica e consequentimente prejudicar o desenvolvimento psicológico do adolescente, caso este não saiba como lidar com seus sentimentos a respeito do caso. Obviamente, isto ocorre na hipótese de um relacionamento sexual sadio, onde o adulto respeito os limites fisiológicos e psicológicos do menor.

Não há dúvidas de que no caso de violência física ou psicológica os danos causados à vítima são muito mais evidentes. Embora isto dependa de cada indivíduo e do contexto em que ocorreram, as vivências de violência tendem causas mais danos psicológicos. Quanto mais nova for a vítima, menor é a capacidade dela de elaborar a situação de forma saudável.

 


Conclusão

O comportamento sexual representa em primeira veemência um aspecto primordial para a existência do homem. A despeito disso, além da função reprodutora, existem impulsos libidinais presentes na sexualidade que são vivenciados pela criança desde a gênese. Tais sensações têm função principal de recompensar o ego com prazer. Não é equívoco que a busca pelo desejo se torne uma necessidade tão estimada. O alívio para o desconforto do desejo somente cessa, e temporariamente, quando o indivíduo encontra seu objeto de desejo e nele despeja toda sua volúpia.

Os valores religiosos, culturais e preceitos éticos essenciam o Direito. Este por sua vez representa o superego estatal, a mão castradora dos comportamentos e desejos proibidos, que representou para o homem a restrição de sua conduta espontânea. O fenômeno do ato libidinoso com menor nada mais é do que um exemplo de conduta presente na humanidade, a qual deve ser analisada com mais atenção, atentando-se a realidade fática.

Asseverar a respeito de um assunto tão polêmico requerer muito cuidado, ainda mais quando se está falando em uma sociedade diariamente bombardeada por escândalos de violência contra a sexualidade e inviolabilidade da criança e do adolescente. De maneira nenhuma esta pesquisa tem por objetivo influenciar o rigor com que os órgãos públicos vêem lidando com estes casos nefastos.

Não obstante, como objetivo principal deste trabalho, tendo em vista tudo o que foi discutido a respeito dos inúmeros aspectos da sexualidade humana, pode-se observar a equivocada premissa do legislativo ao tratar da presunção de violência contra o menor como um conceito absolutamente derradeiro. Mormente por meio da teoria psicanalista, nota-se a real necessidade de uma ótica mais cuidado ao se analisar esta questão.

Após tais apontamentos, conclui-se que, tendo em vista a realidade e contexto social a qual o homem está inserido, afirmar categoricamente na incapacidade do desenvolvimento psicológico dos adolescentes para expressarem sua sexualidade vai contra a própria essência humana. Destarte, tendo em vista a idiossincrasia humana e as diversidade sociais e culturais, as quais o homem está inserido, preza-se por um Direito  mais atento às atuais demandas.

 


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Sobre o autor
Felipe Adaid

Advogado e consultor jurídico em Direito Penal e Direito Penal Empresarial no Said & Said Advogados Associados. Foi Diretor de Gerenciamento Habitacional da Secretaria de Desenvolvimento Social e Habitação e Primeiro Secretário do Conselho de Habitação do Município da Valinhos, SP. Mestre em Educação e Políticas Públicas pela PUC Campinas. Ingressou em primeiro lugar no mestrado e foi contemplado com a bolsa CAPES durante os dois anos de curso. Cursou disciplinas de pós-graduação na Unicamp. É especializando em Direito Penal, Processo Penal e Criminologia, pela PUC Campinas. Na graduação, tem 5 semestres de créditos no cursos de Psicologia, também pela PUC Campinas. Durante a graduação de Direito também foi bolsista de iniciação científica, CNPq, e foi monitor em diversas disciplinas, tanto no curso de Direito como no curso de Psicologia. Foi membro do grupo de pesquisa Direito à Educação do Programa de Pós-Graduação da PUC Campinas. É corretor de revistas científicas pedagógicas e jurídicas. É autor de 11 livros, sendo 3 ainda em fase de pré-lançamento, e organizador de outros 10 livros, além da autoria de 44 capítulos de livros publicados no Brasil, no Chile e em Portugal. É autor de mais de 100 publicações científicas, entre artigos científicos, resenhas e anais, nacionais e internacionais. Ademais, também escreve periodicamente ensaios e artigos para jornais e blogs. No âmbito acadêmico, suas principais bases teóricas são: Foucault, Lacan, Freud, Dewey e Nietzsche. Por fim, tem interesse sobre os seguintes temas: Direito, Direito Penal, Criminologia, Psicologia, Psicologia Forense, Psicanálise, Sexualidade, Educação e Filosofia.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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