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Em busca de uma concepção científica do inquérito policial

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10/11/2016 às 14:15
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Conclusão:

Ante todo o exposto, portanto, em nossa conceituação, o Inquérito constitui um caderno investigativo elaborado sob a presidência do Delegado de Polícia, o qual configura exercício direto da persecução penal do Estado, tendo como fulcro, através da coleta e construção metodológica de provas e elementos de prova acerca da autoria e materialidade delitiva, deslindar como os fatos com efeito se deram e gerar um piso mínimo capaz de sustentar e justificar a incidência de uma futura ação penal em face do cidadão.

Não se pode conceber que o trabalho da investigação policial continue a ser relegado aos subúrbios da doutrina processualista brasileira, merecendo pouca (ou quase nenhuma) atenção em poucas páginas nos grandes manuais da matéria.

Para tanto, é preciso valorizar o árduo trabalho realizado pelas Polícias Judiciárias do país, que, em geral com parcos recursos, operam suas atividades voltadas para elucidação das mazelas que turbam a paz social e a ordem pública, trilhando caminho o único e possível dentro da Democracia Constitucional: a mais absoluta legalidade. 

Ser policial é exercer diariamente ofício de devoção ao cidadão brasileiro e à Democracia. Dedicação esta que não pode nunca permitir que haja desvio de finalidade ou à condução ao favorecimento de qualquer das partes envolvidas na relação processual.

Entretanto, há que se impor à pesquisa policial rigor semelhante ao praticado nas investigações científicas. É certo que estamos tratando de cearas distintas, porém, o atributo da discricionariedade do Inquérito Policial permite o não engessamento dos atos, de modo que incumbe à Autoridade Policial, presidente do feito,  a opção da condução deste pelas sendas que melhor levarem ao seu objetivo: a obtenção dos elementos de prova que indiquem a existência de um fato criminoso e sua autoria.

A metodologia é a escolha das etapas a serem usadas para alcançar um objetivo, de forma  minuciosa, detalhada, rigorosa e exata de toda ação desenvolvida. Ora, este não é basicamente o que a Polícia Judiciária realiza no curso do Inquérito Policial? O Inquérito é uma pesquisa como outra qualquer, daí o motivo pelo qual o uso da metodologia dos trabalhos científicos podem auxiliar muitíssimo na sua execução escorreita.

Não estamos propondo a invenção da roda, ao longo da carreira todo Delegado de Polícia desenvolve seus métodos e abordagens próprias para o trato com determinadas espécies criminais, contudo, estes profissionais, quando em contato com novas técnicas de perquisição, podem apurar ainda mais a sua obtenção de resultados.

Eis a relevância do constante estudo, em prol do desenvolvimento pessoal, da valorização da carreira e pela busca da efetividade dos fins a que se destina a Polícia Judiciária.

Como na parábola do entre dois lenhadores, em que o jovem lança desafio contra o outro, mais velho, sobre quem cortaria a maior quantidade de árvores, demonstrando maior habilidade no manuseio do machado. Entre uma árvore e outra, do reflorestamento, o jovem via na maior parte das vezes o seu adversário sentado. Certo da vitória, o jovem voltava às árvores e sentia piedade do velho. No final do dia constatou-se que o velho tinha cortado muito mais árvores que o jovem. Surpreso o jovem disse: “Mas como é que pode? Quase todas as vezes em que olhei, você estava descansando!”. O velho, então, respondeu: “- Eu não estava descansando. Eu estava afiando o machado.”

Portanto, é hora de afiar o machado...


REFERÊNCIAS:

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Notas

[1] PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL. INEXISTÊNCIA: “(...) Os princípios do contraditório e da ampla defesa não se aplicam ao inquérito policial, que é mero procedimento administrativo de investigação inquisitorial” (STJ, 5ª T., rel. Min. Gilson Dipp, j. 27-5-2003, DJ, 4 ago. 2003, p. 327).PROCESSUAL PENAL. RECURSO DE “HABEAS CORPUS”. TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. INEXISTÊNCIA DE JUSTACAUSA: “Inexiste constrangimento ilegal na abertura de inquérito policial para apuração de crime de falso ideológico, mormente quando os elementos informativos obtidos geram justificada suspeita da configuração do delito. Sendo o inquérito policial mero procedimento administrativo preparatório para a ação penal, tem por objeto a apuração do fato tido como delituoso e a respectiva autoria, não devendo ser obstados pela restrita via do habeas corpus, para que não se incorra no risco de coactar as atividades da Polícia Judiciária e do Ministério Público. Recurso improvido” (RHC 74-SP, 5ª T., j. 27-9-1989, rel. Min. Flaquer Scartezzini, RSTJ, 9/109).

[2] http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/03/biologo-diz-que-alga-indica-presenca-de-mizael-em-represa.html

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Sobre o autor
Sandro Vergal

Delegado de Polícia Civil do Estado de São Paulo, Professor Universitário e de Cursos Preparatórios, Mestre em Direitos Sociais, Difusos e Coletivos, pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal, pós-graduando em Balística.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VERGAL, Sandro. Em busca de uma concepção científica do inquérito policial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4880, 10 nov. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/53642. Acesso em: 26 abr. 2024.

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