Fundamentando a teoria da responsabilidade objetiva, SÍLVIO RODRIGUES in Direito Civil, Volume IV, Editora Saraiva, 19ª Edição, São Paulo, 2002, p. 10, assevera:
“Na responsabilidade objetiva a atitude culposa ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois, desde que exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não culposamente.
A teoria do risco é a da responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele."
No mesmo norte, CARLOS ROBERTO GONÇALVES in Comentários ao Código Civil, Volume XI, Editora Saraiva, São Paulo, 2003, p. 07, escreve:
"Responsabilidade civil é, assim, um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário."
Assim, a responsabilidade civil do Estado é sempre objetiva, ante a teoria do risco administrativo: a responsabilidade civil do Estado por atos comissivos ou omissivos de seus agentes, é de natureza objetiva, ou seja, dispensa a comprovação de culpa.
Ainda sobre a teoria do risco do risco adminsitrativo, esclarece HELY LOPES MEIRELLES:
“A teoria do risco administrativo faz surgir a obrigação de indenizar o dano do só ato lesivo e injusto causado à vítima pela Administração. Não se exige qualquer falta do serviço público, nem culpa de seus agentes. Basta a lesão, sem o concurso do lesado. Na teoria da culpa administrativa exige-se a falta do serviço; na teoria do risco administrativo exige-se, apenas, o fato do serviço. Naquela, a culpa é presumida da falta administrativa; nesta, é inferida do fato lesivo da Administração.
"[...]
Tal teoria, como o nome está a indicar, baseia-se no risco que a atividade pública gera para os administrados e na possibilidade de acarretar dano a certos membros da comunidade, impondo-lhes um ônus não suportado pelos demais. Para compensar essa desigualdade individual, criada pela própria Administração, todos os outros componentes da coletividade devem concorrer para a reparação do dano, através do erário, representado pela Fazenda Pública. O risco e a solidariedade social são, pois, os suportes dessa doutrina, que, por sua objetividade e partilha dos encargos, conduz à mais perfeita justiça distributiva, razão pela qual tem merecido o acolhimento dos Estados modernos, inclusive o Brasil, que a consagrou pela primeira vez no art. 194 da CF de 1946.
Advirta-se, contudo, que a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova da culpa da Administração, permite que o Poder Público demonstre a culpa da vítima para excluir ou atenuar a indenização. Isto porque o risco administrativo não se confunde com o risco integral. O risco administrativo não significa que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa, apenas e tão-somente, que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximirá integral ou parcialmente". (Direito administrativo brasileiro. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 611-612).
E complementa o doutrinador RUI STOCO:
"Não se pode deslembrar que a responsabilidade do Estado se assenta no risco administrativo e independe de prova da culpa, bastando que se demonstre o nexo causal entre o acidente e o dano.
Aliás, sequer se exige a prova de culpa do servidor causador do dano.
Em casos que tais o ônus da prova é invertido: ao Estado é que compete provar a existência de uma das causas de exclusão da responsabilidade, como a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou a força maior". (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994. p. 282).
Demais disso, a própria Constituição Republicana consagrou tal entendimento, asseverando no bojo do §6º do art. 37 que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
Em relação aos atos comissivos, isto é, aquele em que há uma ação positiva, a responsabilidade é objetiva, circunstância que não desonera o autor do ônus de demonstrar o "nexo causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano, bem como o seu montante”.
Comprovados esses dois elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar.
Para eximir-se dessa obrigação incumbirá ao Estado comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade da vítima, subsiste a responsabilidade objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da indenização" (Hely Lopes Meirelles, Direito administrativo brasileiro, Malheiros, 2007, 33ª ed., p. 660; REsp n. 38.666, Min. Garcia Vieira).
Recentes julgados da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal afirmam que a "responsabilidade objetiva prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal abrange também os atos omissivos do Poder Público" (AgRgAI n. 766.051, Min. Gilmar Mendes, julg. em 14.06.2011; AgRgRE n. 607.771, Min. Eros Grau, julg. em 20.04.2010).
Seja objetiva ou subjetiva, o certo é que a responsabilidade do Estado "não vai ao extremo de lhe ser atribuído o dever de reparação de prejuízos em razão de tudo que acontece no meio social" (José dos Santos Carvalho Filho, Manual de direito administrativo, Lumen Juris, 2007, 19ª ed., p. 504).
Nessa esteira, na ementa do acórdão relativo ao Recurso Extraordinário n. 109.615-2, inscreveu o Ministro CELSO DE MELLO:
"Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 – RTJ 71/99 – RTJ 91/377 – RTJ 99/1155 – RTJ 131/417).
O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias – como o caso fortuito e a força maior – ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 – RTJ 55/50)".
Em relação ao nexo causal, eis que surge a teoria da causalidade adequada. Sobre a perquirição acerca do nexo de causalidade, SÉRGIO CAVALIERI FILHO leciona:
“Esta teoria [da causalidade adequada], elaborada por Von Kries, é a que mais se destaca entre aquelas que individualizam ou qualificam as condições. Causa, para ela, é o antecedente não só necessário mas, também, adequado à produção do resultado. Logo, nem todas as condições serão causa, mas apenas aquela que for a mais apropriada para produzir o evento.
(...)
Não basta, como observa Antunes Varela, que o fato tenha sido em concreto, uma condição sine qua non do prejuízo. É preciso, ainda, que o fato constitua, em abstrato, uma causa adequada do dano. Assim, prossegue o festejado Autor, se alguém retém ilicitamente uma pessoa que se aprestava para tomar certo avião, e teve, afinal, de pegar um outro, que caiu e provocou a morte de todos os passageiros, enquanto o primeiro chegou sem incidente ao aeroporto de destino, não se poderá considerar a retenção ilícita do indivíduo como causa (jurídica) do dano ocorrido, por que, em abstrato, não era adequada a produzir tal efeito, embora se possa asseverar que este (nas condições em que se verificou) não se teria dado se não fora o ato ilícito. A ideia fundamental da doutrina é a de que só há uma relação de causalidade adequada entre o fato e o dano quando o ato ilícito praticado pelo agente seja de molde a provocar o dano sofrido pela vítima, segundo o curso normal das coisas e a experiência comum da vida (Obrigações, Forense, pp. 251-252).
Assim, em resumo, o Estado responde objetivamente pelo dano, desde que comprovados o nexo causal entre o fato lesivo e o dano, bem como o seu montante.