Violência sexual intra-familiar infantil à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente e legislação penal

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O presente artigo tem por finalidade visualizar como a violência sexual infantil intra-familiar tem sido tratada pela legislação brasileira.

RESUMO

O presente artigo tem por finalidade visualizar como a violência sexual infantil intrafamiliar tem sido tratado pela legislação brasileira. Perante a vigente conjuntura, apresentou o seguinte tema como o Estado intervém, por meio de ordenamento jurídico penal, na situação da violência sexual infantil intrafamiliar? Preliminarmente as hipóteses deste artigo consistem em saber que a violência sexual intrafamiliar atinge crianças e adolescentes de formas refinadas e exige para seu enfrentamento, a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente e demaislegislações infraconstitucionais para solução desta problemática garantindo a proteção integral dos direitos referentes a Criança e o Adolescente. Que o Estado intervém por meio políticas públicas bem como programas de proteção para combater a violência sexual, tal como o crime de estupro de vulnerável. E ainda tende-se preocupar-se com os dramáticos índices de crescimento da violência sexual infantil, e suas diferentes formas de manifestações. Desta feita, o referido estudo tem por objeto verificar como a temática é tratada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelas legislações pertinentes acerca do tema, analisando-se as medidas de proteção e as sanções aplicáveis ao agente abusador que, em tese, teria o dever de garante.

 Palavras chave:Violência sexual intrafamiliar. Estatuto da Criança e do Adolescente. Proteção.

ABSTRACT

This article aims to visualize how child sexual violence within the family has been treated by Brazilian law. Given the current situation, he presented the following theme as the state intervenes by means of criminal law, the situation of child sexual abuse within the family? Preliminarily the chances of this article are to know that intrafamily sexual violence affects children and adolescents of refined forms and demands for its resolution, the implementation of the Statute of Children and Adolescents and other infra-constitutional legislation to solve this problem by ensuring the full protection of the rights related Children and Adolescents. The state intervenes through public policies and protection programs to combat sexual violence, such as the vulnerable crime of rape. And still tend to worry about the dramatic growth rates of childhood sexual violence and its various forms of manifestation. This time, this study's purpose is to see how the issue is handled by the Statute of Children and Adolescents and the relevant legislation on the subject, analyzing the protection measures and penalties applicable to the abuser agent which, in theory, would the duty to guarantee.

Keywords: Sexual violence intrafamily. Child and Adolescent Statute.Protection

1INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por finalidade visualizar como a violência sexual infantil intrafamiliar tem sido tratado pela legislação brasileira. Perante a vigente conjuntura, faz o seguinte questionamento: Como o Estado intervém, por meio de ordenamento jurídico penal, na situação da violência sexual infantil intrafamiliar?

Preliminarmente como hipóteses tem-se a saberque a violência sexual intrafamiliar infantil atinge crianças e adolescentes de formas refinadas e exige para seu enfrentamento, a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente e demais legislações infraconstitucionais para solução desta problemática garantindo a proteção integral dos direitos referentes a Criança e o Adolescente. Que o Estado intervém por meio políticas públicas bem como programas de proteção para combater a violência sexual, tal como o crime de estupro de vulnerável. E ainda tende-se preocupar-se com os dramáticos índices de crescimento da violência sexual infantil, e suas diferentes formas de manifestações.

            A pesquisa bibliográfica se baseia em livros para que fosse possível o desenvolvimento do presente artigo, a fim de que houvesse a devida análise acerca do tema, além de pesquisa em leis, internet em links, jurisprudências, artigos online e dados de pesquisas relacionados com o assunto tratado.

            O tema proposto se justifica no análise dos instrumentos que o Estado possui para proteção da criança e do adolescente vítimas de violência sexual no âmbito da própria família, buscando as normas de proteção nos ordenamentos específicos, auxiliando a criança e ao adolescente, bem como a sociedade e a comunidade em geral, por ser tratar de problema social.

2Violência sexual Intrafamiliar infantil

A violência contra crianças e adolescentes quase se confunde com a própria existência da humanidade. A fragilidade e vulnerabilidade, inerentes à parca idade, acabam sendo tratados como objeto de satisfação pessoal e sexual de adultos.

            Apesar da crescente preocupação em exterminar ou, ao menos, mitigar essas situações abusivas em desfavor das crianças, nota-se que elas ainda sofrem pela exposição a diversas formas de violência, as situações mencionadas tratam de: violência física, mascarada como um tipo de punição; violência psicológica, utilizada como um modo de imposição de medo e culpa; a negligência, quando não se permite o acesso a cuidados básicos como saúde, higiene e educação e, por fim a violência sexual.

Em recente notícia, o Superior Tribunal de Justiça (2016), afirmou que tem caminhado para combater a prática de atos de violência sexual contra crianças e adolescentes.

Já é pacífico no âmbito do tribunal o entendimento de que, para a configuração do estupro de vulnerável, basta que a intenção do agente seja a satisfação sexual e que estejam presentes os elementos previstos naquele dispositivo, “objetivando a reprimenda ali contida a proteção da liberdade, da dignidade e do desenvolvimento sexual”, conforme aponta o ministro Gurgel de Faria[3](SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:Jurisprudência contribui para inibir crimes contra dignidade sexual infantil, 2016)

2.1 Situação da violência sexual intrafamiliar infantil

O abuso sexual intrafamiliar infantil, como outras formas de violência, tem caráter transgeracional, ou seja as sequelas deixadas são tão graves que o menor provavelmente se comportará de maneira semelhante com seus filhos, assim passando para as futuras gerações.

Neste sentido, “Criança e o adolescente são, por excelência, seres vulneráveis tendo em vista que estão vivenciados um processo de formatação e transformação física e psíquica’’, (SILVA, 2012. p.6).

O que se depreende é que a violência sexual intrafamiliar, é uma das mais devastadoras possíveis à criança. No entanto, geralmente, ela existe num contexto de diversas formas de violência, quando os pais ou responsáveis negligenciam aos seus cuidados. É, o que ocorre na maioria dos casos em processo no Brasil.

Não há dúvida de que,o abuso sexual praticado no ambiente familiar constitui ilícitos civis e penais, o agressor deve ser responsabilizado pelos danos causados à criança e ao adolescente. No âmbito civil a punição poderá ser o pagamento das despesas de tratamento da vítima como psiquiatras, psicológicos, educadores e até mesmo para suprir as necessidades materiais, sendo que no penal a prática do abuso sexual contra o menor é punido com pena de reclusão de 06 (seis) a 10 (dez) anos.

2.2Índice de crescimento

Os dados no Brasil são alarmantes, vez que recente pesquisa mostra que mais de 17,5 mil crianças e adolescentes podem ter sido vítimas de violência sexual no Brasil no ano 2015, sendo aproximadamente 50 por dia; tais dados são referentes às denúncias feitas ao Disque Denúncia Nacional, o Disque 100.

Segundo Vilela, Flávia (2016, apud MOURA, 2016, p.01) Temos de participar das ações direcionadas a esse grave problema, mobilizando os vários setores da sociedade e proteger nossas crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. É um problema grave, que precisa ser enfrentado de forma sistemática trazendo maior visibilidade[4]

Estudando separadamente o Estado do Rio de Janeiro há dados de que no ano de 2014, ocorreram 810 denúncias de abuso sexual e 801 de exploração sexual. O Núcleo de Violência Doméstica (NVD), do Disque-Denúncia, traz dados de pesquisa referente a 2015 que indicam que houve redução de 30% nas denúncias sobre esses assuntos, sendo 558 sobre abuso sexual e 574 sobre exploração sexual. Embora tenha havido certa redução o número de casos de exploração sexual infantil em relação ao de abuso registrou aumento de quase 3%.  Recentemente, nos quatro primeiros meses de 2016, o NVD registrou 77 denúncias sobre abuso.

Outro estado brasileiro que apresenta altos índices de abuso sexual infantil registrados é aBahia. Somente em 2016, nos quatro primeiros meses, foram registradas 441 denúncias de abuso ou exploração sexual contra crianças e adolescentes.Casos de abuso sexual são comuns em todas as classes sociais no Brasil. Entretanto, as classes com maior poder aquisitivo procuram mais ajuda e realizam denúncias com maior frequência, o que auxilia não só na solução do problema em relação ao abuso, como também no tratamento das sequelas deixadas.

Apesar do Estatuto da Criança e do Adolescente ter sido confeccionado para impor políticas publicas de proteção, a realidade do Brasil é de que ainda cresce o número de crianças que sofrem abuso sexual, sendo a maioria delas no seio familiar. Por ser um problema social grave hánecessidade de uma políticas publica mais eficiente como a criação de uma aparato policial para investigação e, ainda, programas de assistência que possam cuidar das crianças e sua família.

Portanto, assim como tantos problemas sociais no País, a solução do abuso sexual infantil necessita que a norma penal seja mais rigorosa na proteção à criança e os cuidados com asfamíliaspadecentes.

3INTERVENÇÃO DO ESTADO

A violência sexual é presenciada principalmente dentro dos lares, onde a vítima recebe agressões físicas, psicológicas e sexuais, ficando até mesmo sujeita a abandono e negligência por partes dos seus responsáveis. Diante dessas constatações tão assustadoras e, considerando-se a dificuldade em apurar tais condutas, eis que ocorrem clandestinamente, em seu ambiente familiar, onde, em tese, as crianças e adolescentes deveriam sentir-se protegidos, torna-se assim imprescindível a intervenção do Estado e prevenção contra vítimas tão frágeis e vulneráveis.

Sendo assim a violência sexual intrafamiliar ganha, hoje, papel de destaque na sociedade por demonstrar a fragilidade da instituição familiar. A criança abusada sexualmente por um dos membros do seu núcleo familiar vê destruir diante de si toda a concepção de família e de civilização, vez que os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.

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Da mesma forma dispõe o art. 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente 

Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência (BRASIL, 2015. p. 1027)

            Caso o pai ou a mãe abusar do seu dever para com seus filhos, seja, por omissão ou comissão, desviar da finalidade de seus deveres, ou exceder em seus atos e por consequência violar os direitos do filho, os pais abusadores podem ter suspenso seu poder familiar ou mesmo perder dependendo do caso.A perda do poder familiar pode ocorrer nos casos em que os pais castigam imoderadamente o filho, deixa o filho em abandono, pratica atos contrários à moral a aos bons costumes e incidir reiteradamente nas condutas que levam a suspensão do poder familiar.

Nesse sentido no art.92 inciso II do Código Penal  prevê um efeito específico, que é a perda do poder familiar, tutela e curatela, no caso de crime doloso e com pena de reclusão, contra os filhos, tutelados e curatelados.

Neste contexto as hipóteses de perda do pátrio familiar pode-se relacionar a atos abusivos praticados pelos pais, tutores, curadores à criançavitima de abuso sexual, de maus tratos, negligências ou mesmo pais que foram condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja a pena exceda a dois anos de prisão, ou a autoridade  judiciária poderá suspender o poder familiar.

Outro aspecto a ser levado em consideração, e que está diretamente ligado à comunicação e punição do abuso, é a confiança que o agressor pedófilo ganha do núcleo familiar. Dada a variedade de formas de violência sexual, é fácil manter os abusos em segredo por muito tempo e, lamentavelmente, muitas vezes é difícil puni-lo. Como se vê:

PENAL E PROCESSUAL. ABUSO SEXUAL CONTRA NETA DA COMPANHEIRA. NEGATIVA DE AUTORIA. VALOR PROBANTE DA PALAVRA DA VÍTIMA. DEPOIMENTO INFANTIL NÃO CORROBORADO POR PROVAS IDÔNEAS. ABSOLVIÇÃO COM BASE NO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REO. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA CONFIRMADA. 1 RÉU ACUSADO DE INFRINGIR EM CONTINUIDADE DELITIVA O ARTIGO 217-A DO CÓDIGO PENAL, EIS QUE TERIA PRATICADO ATOS LIBIDINOSOS CONTRA NETA DE SUA COMPANHEIRA, COM APENAS OITO ANOS DE IDADE, ACARICIANDO SUA GENITÁLIA POR DIVERSAS VEZES E PRATICANDO CUNILÍNGUA. 2 A PROVA NOS CRIMES SEXUAIS CONTRA CRIANÇA NÃO AUTORIZA A CONDENAÇÃO QUANDO ESTRIBADA EXCLUSIVAMENTE NO DEPOIMENTO DO INFANTE, HAJA VISTA A SUGESTIBILIDADE, TENDÊNCIA À FANTASIA E INCAPACIDADE DE COMPREENSÃO DOS FENÔMENOS HUMANOS, ESPECIALMENTE NOS ASSUNTOS DA SEXUALIDADE. A JURISPRUDÊNCIA JÁ CONSIGNOU QUE FATORES PSICOLÓGICOS TORNAM DEFICIENTES OS TESTEMUNHOS INFANTIS, A SABER: A) A IMATURIDADE ORGÂNICA DO INFANTE IMPLICA A IMATURIDADE FUNCIONAL, OCASIONANDO DESENVOLVIMENTO PSÍQUICO INCOMPLETO; B) A IMAGINAÇÃO: ATUA DE FORMA DÚPLICE, COMO MEIO DE DEFESA (MENTIRA DEFENSIVA OU INTERESSEIRA) OU DE SATISFAÇÃO DE DESEJOS (BRINQUEDOS FANTASIOSOS); C) SUGESTIBILIDADE ACENTUADA DAS CRIANÇAS POR VOLTA DOS CINCO ANOS DE IDADE, ATINGINDO O ÁPICE EM TORNO DOS OITO ANOS, QUANDO ENTRA EM DECLÍNIO. CONSIDEREM-SE, AINDA, FATORES MORAIS QUE TORNAM TESTEMUNHOS INFANTIS DEFICIENTES, COGITANDO-SE DE UMA IMATURIDADE MORAL. A MORALIDADE NÃO É UM FATOR INATO, PORÉM ADQUIRIDO PELA CRIANÇA COM BASE EM ESTÍMULOS AMBIENTAIS E PRESSÕES EXTERNAS. DE TUDO SE CONCLUI QUE O TESTEMUNHO INFANTIL, MALGRADO AS SÉRIAS RESTRIÇÕES QUE LHE SÃO FEITAS, HÃO QUE SER ANALISADAS DENTRO DO CONTEXTO DAS DEMAIS PROVAS COLHIDAS. 3 AS INCONGRUÊNCIAS NOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS IMPEDEM UM JUÍZO DE CERTEZA ACERCA DO COMETIMENTO DO CRIME. EM CASOS DE DÚVIDA QUANTO À AUTORIA DO DELITO, DEVE SER APLICADO O VETUSTO, PORÉM ATUAL, PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. MANTÉM-SE A ABSOLVIÇÃO. 4 APELAÇÃO DESPROVIDA [5](Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios- Apelação Criminal APR 2009 01 1 188408-9
0162227-50.2009.807.000, Relator : Des. George Lopes leite, Data de Julgamento: 21/03/2012,  1ª Turma Criminal, Data de Publicação: 16/04/2012, DJ-e Pág. 302)

3.1 A legislação penal no abuso sexual infantil intrafamiliar

Não se pode olvidar que a violência sexual é mascarada das mais diversas formas possíveis. E, quando a vítima é uma criança, as circunstâncias para que sejam ainda mais imperceptíveis são facilitadoras.

Desta forma, muitas das vezes a atuação do Judiciário e do Ministério Público da Infância e Juventude, bem como do próprio Conselho Tutelar, cuja atuação é sempre mais direta, acaba sendo dificultada. A problemática do abuso sexual infantil é justamente essa, acontece no seio familiar.

Não obstante o Código Penal (2015), traz a figura do estupro de vulnerável elencada em seu artigo 217-A, da qual trata-se adiante, a violência sexual infantil muitas vezes inicia-se com a pornografia infantil. E desta figura delitiva o Estatuto da Criança e do Adolescente trata com eficiência.

É sabido que pornografia infantil é vendida e difundida na internet. O agente do crime de estupro possui esse tipo de conteúdo em suas mídias, e muita das vezes atrai crianças inocentes para que se deixem fotografar. Pensando nisto, foi editada a Lei 11.829 de 2008 que inseriu mais seis figuras típicas no rol do “Título VII - Dos Crimes e das Infrações Administrativas”, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

A norma visa punir tanto aquele que alicia a criança para produzir o conteúdo pornográfico, quanto o que detém este conteúdo.  Trata-se de efetiva cadeia de segmentos para consecução do filme, no qual se enquadra o aliciador, o produtor, o vendedor e o consumidor deste tipo de mercadoria.

Conforme Greco (2015, p.277) “o elemento subjetivo desses delitos, além dolo pode-se visualizar no proveito indevido para si ou para terceiro.”

Neste tocante, tanto é repudiado o abuso sexual intrafamiliar, que inclusive sobre crimes das conjecturas há aumento de pena para aquele se vale de parentesco ou relações domésticas para tal fim.

3.2Do Estupro de Vulnerável

A fim de punir de formar mais grave aquele que se aproveita da situação de vulnerabilidade, tanto pela ausência de consentimento intrínseca, porém muitas vezes facilmente obscurecida, quanto pela fraqueza psicologia e física da vítima, nasceu esta figura típica específica.

Em verdade, se trata de um tipo autônomo, cujas penas são mais rigorosas, uma vez que o sujeito passivo é indivíduo que não possui capacidade de discernimento sobre seus atos e consequências da sexualidade, ou até mesmo quem não pode por qualquer outra razão resistir, e não tem liberdade de agir.

O termo vulnerável vem do latim vulnerabilis e significa lesão, corte ou ferida exposta, sem cicatrização, com risco de infecção, demonstrando assim a fragilidade ou a incapacidade do indivíduo diante de situações específicas.

Já na concepção de Nucci (2009, p. 829) “a vulnerabilidade contida no artigo 217-Atrata-se da capacidade de compreensão e aquiescência no tocante ao ato sexual”. Por isso, continua, na essência, existindo a presunção de que determinadas pessoas não têm a referida capacidade para consentir.

De acordo com Greco (2011, p. 528), “a Lei 12.015/2009 convencionou denominar estupro de vulnerável, justamente para identificar a situação de vulnerabilidade em que se encontra a vítima”.

É deveras importante mencionar que o Estatuto diferencia criança de adolescente. E para tanto conceitua como criança o menor até 12 anos e adolescente o menor de 12 a 18 anos de idade. Houve a necessidade de criar essa diferenciação para a regulamentação de alguns institutos, como a incidência de medida socioeducativa e a necessidade da autorização da viagem.

Em verdade a interpretação que se faz da norma aqui, é que a faixa etária de 12 a 14 anos quando ocorre à puberdade deve ser protegida para o desenvolvimento físico, intelectual e emocional saudáveis. Compreendendo que a introdução precoce na vida sexual poderia prejudicar tais setores, comprometendo o desenvolvimento do adolescente.

No entanto, na concepção jurídico-penalista do crime de estupro de vulnerável conceitua assim o indivíduo menor de 14 anos de idade, em que pese não seja considerado como criança Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos: pena - reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. (BRASIL, 2015, p.543)

3.3Estatuto da criança e do adolescente

            Ao longo da história observa-se imensa falta de proteção jurídica em relação à violência praticada contra crianças. São muitos os casos de agressão – física e moral– tais como abandono, espancamento, violência sexual e psicológica. Ressalta-se que tais agressões muitas vezes são cometidas pelos próprios familiares.

             Na vigência do Código de Menores, não havia a distinção entre a criança e adolescente (havia apenas a denominação “menor”). Este panorama passou a modificar-se com o implemento das garantias fundamentais na Constituição Federal, posteriormente com a entrada em vigor do ECA.

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (BRASIL, 2013, p.11)

Ao editar a norma, o legislador tencionou colocar em evidência a questão da proteção da Criança e do Adolescente. Em que pese, assegure o direito à vida, à saúde e a dignidade da pessoa humana, de forma geral, é de se notar que um indivíduo em formação merece maior proteção dada sua vulnerabilidade.

E é esta a perspectiva do Estatuto da Criança e do Adolescente, perceptível em todos seus dispositivos, mesmo em relação às medidas socioeducativas. Ressalta-se que até mesmo estas não têm cunho punitivo, mas sim educativo, deressocializar o jovem infrator.

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária ( BRASIL, 2013, p.12)

Nesta conjectura é de fácil compreensão os motivos que ensejam ao Estatuto tornar os pais e responsáveis pela criança e adolescente seus guardiões, não na acepção jurídica do termo, mas em seu sentido mais amplo. Exemplo é a responsabilidade que os pais têm de prover a educação aos filhos, estando sujeitos à multa quando estes se evadem do âmbito escolar.

3.4Aplicações do Estatudo da Criança e do Adolescente e legislações infraconstitucionais.

            A Lei n.º 8.069/90, mais conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, foi fruto de uma ampla negociação com a sociedade civil, o ECA é uma norma que tornou a legislação infraconstitucional brasileira compatível comoparadigma introduzido pela Constituição Federal de 1998, prima pela proteção integral e pelo melhor interesse das pequenas vítimas, garantindo a prioridade absoluta dos direitos fundamentais dos destinatários do referido estatuto.

Tal postura é plenamente perceptível no artigo 227 do diploma legal. Como se nota:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 2013, p.64)

             O Estatuto da Criança e do Adolescente, foi traçado por essa gestão legal e orientada por regulamentos proposta na Declaração Universal dos Direitos da Criança e na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, aprovados pela Organização das Nações Unidas (ONU). A norma foi ratificada, sem rejeição, em 13 de julho de 1990.A lei reconheceu crianças e adolescentes como sujeito de direito, como titulares de direitos e não meros tutelados.

            No entanto, lamentavelmente, é crescente o número de crianças que vivenciam diversas formas de violência física, psicológica e sexual, até porque apesar do estatuto ser firme na proteção à criança, percebe-se a necessidade de norma mais preventiva que combativa.

           

3.5Proteção integral dos direitos

Pode-se conceituar proteção integral como sistema em que crianças e adolescentes figuram como titulares de interesses subordinantes, frente a família à sociedade e do Estado, ou seja imposição de obrigações aos mesmos entes, colocando a criança e o adolescente como sujeito ativo das relações jurídicas.

Sendo assim, as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente passaram portanto, a tratar do direito material, administrativo, do criminal representado pela própria previsão de tipos penais. O Estatuto surgiu dentro os denominados “novos direitos”, no qual rompeu com o conservadorismo injusto inadequado do “menor”, e, para a garantia e proteção desses menoristas, foram criados os crimes e as infrações administrativas, que visam coibir as condutas que atentassem contra os direitos da criança e do adolescente.

Segundo Ferreira, Daniel (2001, apud ISHIDA, 2014, p. 10) define infração como: “o comportamento voluntário violador de norma de conduta que o contempla, que enseja a aplicação no exercício da função administrativa, de uma direta e imediata consequência jurídica, restritiva de direito, de caráter repressivo.”

4Enfrentamento

            Tendo por base que o ordenamento funciona em face das garantias de direito fundamental às crianças e ao adolescente, o Estatuto faz com que União, Estados e Municípios convirjam para a criação de programas e políticas públicas que as viabilizem.

            Os órgãos de apoio, como o Conselho Tutelar, fazem concretizar estes fundamentos, dando suporte prático ao Estado. Sendo assim, sempre que houver violação no aspecto envolvendo à criança a ameaça de seus direitos, o Conselho Tutelar através de seu conselheiro intercede aplicando as medidas de proteção cabíveis a menor e a sua família.

           

A doutrina da proteção integral e o princípio do melhor interesse são duas regras basilares do direito da infância e da juventude que devem permear todo tipo de interpretação dos casos envolvendo crianças e adolescentes. Trata-se da admissão da prioridade absoluta dos direitos da criança e adolescente (ISHIDA, 2015, p.2).

                Ainda, há de falar em um aparato social e institucional para acolher as famílias vitimadas, no Brasil torna dificultoso pois no máximo há casas de abrigo, que em geral funcionam precariamente, e, muitas das vezes ao receber a criança causa-lhe um dano maior do que a separação da família, a criança ao invés de sentir-se protegida ela acaba sentindo-se punidas.

4.1Políticas públicas e programas de proteção

Primeiramente, acredita-se que a melhor forma para o combate do abuso sexual infantil é a informação. Por diversas vezes, às crianças podem apresentar receios para que haja a denúncia, com medo de que sofra retaliações, ou ainda pode haver dificuldade de entender o que está acontecendo e que tal ato, o abuso, trata-se de algo errado e ilícito. Assim, tem-se que campanhas para a divulgação devem ser realizadas com frequência, seja na escola, na comunidade e pelas mídias. 

O governo apresenta em seu sítio eletrônico uma campanha, pouco divulgada, para que haja a devida denúncia, pela internet e pelo telefone, conforme pode ser verificado:

Todos os dias milhares de meninos e meninas têm seus direitos violados no Brasil. Em períodos de grande movimentação turística no país, como as Olimpíadas e Paralimpíadas de 2016, crianças e adolescentes ficam mais vulneráveis e aumentam os riscos para a ocorrência de violações.[6]

Segundo a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, há um acréscimo de 30% nas denúncias que chegam ao Disque 100 em períodos de grandes eventos, conforme identificado na Copa das Confederações de 2013, na Copa do Mundo de 2014, na Jornada Mundial da Juventude 2013 e Jogos Mundiais dos Jogos Indígenas 2015.

Para mobilizar a sociedade a ficar alerta e denunciar qualquer situação suspeita, foi lançada a campanha “Respeitar. Proteger. Garantir - Todos Juntos pelos Direitos de Crianças e Adolescentes”. O objetivo é engajar a todos nas tarefas de prevenir e combater as violações de direitos, especialmente as mais recorrentes:

•           Trabalho infantil;

•           Exploração sexual infantil;

•           Uso de álcool e outras drogas por crianças e adolescentes;

•           Crianças em situação de rua; e

•           Desaparecimento6 (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA. SECRETARIA ESPECIAL DE DIREITOS HUMANOS. Crianças e Adolescentes)

Para o combate e melhora da situação das crianças e adolescentes é necessário que sejam feitas as denúncias, para isso basta procurar o Conselho Tutelar da localidade em que a vítima reside, delegacias especializadas como a Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV) e Delegacia de Proteção à Criança e Adolescente (DPCA), autoridades policiais ou ligar para o Disque Denúncia Nacional, o Disque 100, que se encontra vinculado à Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.

No Estado de São Paulo, precisamente na capital, há o Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual (CEARAS), que lida principalmente com casos referentes ao incesto, onde há o oferecimento de atendimento em relação à saúde mental das famílias que tenham realizado denúncia judicial referente ao abuso sexual praticado entre seus membros.

5CONCLUSÃO

Conclui-se que o Estado intervém,através das implantações de políticas públicas, entretanto, grande parte dos casos não são levados a conhecimento dos responsáveis e das autoridades, permanecendo a criança sem a devida atenção e tratamento adequado o que gerando a elas gravíssimas consequências ao seu desenvolvimento físico e mental e, os abusadores sem punição necessária. É preciso que haja a instrução da criança e de sua família para que se extinga o pacto silencioso que há acerca do assunto e que os direitos no Código Penal e especialmente no Estatuto da Criança e do Adolescente se cumpram.

O objetivo da pesquisa foi alcançada pois através desta foi possível identificar que o Estado deve dar a tutela jurisdicional a qualquer tipo de entidade familiar pois trata-se de estrutura importantíssima para a sociedade e até mesmo para o próprio ente Estatal, pois o sujeito é formado no seio familiar, mas isso só será possível com um trabalho de estrutura familiar, cultura e principalmente moral, especialmente em um País que há um costume de descumprir a legislação, o que torna mais dificultoso o êxito de um direito positivo. Buscar a efetivação dessa tutela é imprescindível. O problema é, pois, fazer com que os direitos das Crianças e dos Adolescentes sejam respeitados, fazendo-se indispensável, para isso, a ação do Estado e de toda a sociedade.

REFERÊNCIAS

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MEDICINA USP. CEARAS. Centro de Estudos e Atendimento Relativos ao Abuso Sexual. Disponível em: <http://www.usp.br/cearas/>. Acesso em: 03 Ago. 2016.

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NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal:3. ed. rev. atual. eampl. 2. tir. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:Jurisprudência contribui para inibir crimes contra dignidade sexual infantil Disponível em:<http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/Not%C3%ADcias/Not%C3%ADcias/Jurisprud%C3%AAncia-contribui-para-inibir-crimes-contra-dignidade-sexual-infantil> Acesso em: 03 Ago.2016.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS.Apelação CriminalAPR 2009 01 1 188408-9
0162227-50.2009.807.0001.Apelante(s) :Ministério Publico do Distrito Federal e Territórios, Apelado(s): E.J.C.C, Relator : Des. George Lopes Leite ata de Julgamento: 21/03/2012,  1ª Turma Criminal, Data de Publicação: 16/04/2012, DJ-e Pág. 302)Disponível em: <http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21506871/apr-apr-1622275020098070001-df-0162227-5020098070001-tjdf> Acesso em: 29 Ago. 2016.

VILELA, Flavia. Denúncias de violência sexual contra crianças chegam a quase 50 por dia. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2016-05/denuncias-de-violencia-sexual-chegam-quase-50-por-dia>. Acesso em: 03 Ago. 2016.


[3]SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:Jurisprudência contribui para inibir crimes contra dignidade sexual infantil Disponível em:<http://www.stj.jus.br/sites/STJ/default/pt_BR/Comunica%C3%A7%C3%A3o/Not%C3%ADcias/Not%C3%ADcias/Jurisprud%C3%AAncia-contribui-para-inibir-crimes-contra-dignidade-sexual-infantil> Acesso em: 03 Ago.2016.

[4]VILELA, Flavia. Denúncias de violência sexual contra crianças chegam a quase 50 por dia. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2016-05/denuncias-de-violencia-sexual-chegam-quase-50-por-dia>. Acesso em: 03 Ago. 2016.

[5]TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS.Apelação CriminalAPR 2009 01 1 188408-9
0162227-50.2009.807.0001.Apelante(s) :Ministério Publico do Distrito Federal e Territórios, Apelado(s): E.J.C.C, Relator : Des. George Lopes Leite ata de Julgamento: 21/03/2012,  1ª Turma Criminal, Data de Publicação: 16/04/2012, DJ-e Pág. 302) Disponível em:<http://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21506871/apr-apr-1622275020098070001-df-0162227-5020098070001-tjdf> Acesso em: 29 Ago. 2016.

[6]MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA. SECRETARIA ESPECIAL DE DIREITOS HUMANOS. Crianças e Adolescentes. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/criancas-e-adolescentes>. Acesso em: 03 Ago. 2016.

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Sobre as autoras
Juliana Andrade Juvêncio

Aluna do curso de direito da Faceca

Cristiane Gonçalves Teixeira de Paiva

Professora Mestra Curso de Direito da Faceca.

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