A geração da energia elétrica e as irregularidades no consumo

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Este artigo ilustra o desenvolvimento da energia elétrica no país,entre a sua geração e a sua chegada ao usuário final, as práticas irregulares ocorridas exercidas com o objetivo de burlar o consumo,bem como a percepção do usuário acerca do serviço.

INTRODUÇÃO

Nossa sociedade seria impensável sem eletricidade pois ela é um recurso considerado essencial e indispensável para a vida humana, o que o torna um tema fundamental de investigação e análise. Ela revolucionou os costumes e a economia, levando o desenvolvimento aonde chega. Configura-se como um dos pré-requisitos ao crescimento industrial e ao bem estar. A viabilidade do crescimento do Brasil está atrelada a uma matriz energética disponível para satisfazer as necessidades de uma população em crescimento.

Sucede-se partir daí alguns embates que são travados entre as concessionárias do serviço público de distribuição de energia e os consumidores, pois há um preço a ser pago pela prestação do serviço e não são todos os que estão dispostos a pagar, ou mesmo não possuem condições financeiras para tal, sendo que alguns recorrem a expedientes ilícitos, conhecidos como “gatos”, termo popular para designar o furto de energia elétrica.

Fica evidente que tais furtos geram incalculáveis prejuízos, que infelizmente são repassados aos demais consumidores através do aumento no valor da conta de luz. A resolução normativa nº414/2010, estabelecida pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL ampara à atuação das concessionárias de serviços de energia elétrica no combate as irregularidades no consumo e apresenta as medidas jurídicas e administrativas para coibir as práticas de irregularidades no consumo de eletricidade.

A metodologia utilizada nesta pesquisa, quanto aos meios, foi a bibliográfica com uso de doutrina e texto legal e, quantos aos fins, foi qualitativa.


1. O SURGIMENTO DA ENERGIA ELÉTRICA NO BRASIL

De acordo com Gomes e Vieira (2009) a energia elétrica surgiu no Brasil, em 1880, simultaneamente ao início de seu uso comercial no estrangeiro, sendo a princípio limitado a alguns serviços públicos e à atividade fabril. Ao final de 1890, existiam apenas algumas empresas de energia elétrica que faziam a prestação de serviços públicos locais e empresas de energia para determinados fins fabris, que eram locais e independentes,

Com a queda da Monarquia e a implantação da República em 1889, a Constituição Federal de 1891 estabeleceu um novo regime jurídico-legal, tendo como princípio básico no setor elétrico o direito de acessão, tornando as jazidas minerais, as quedas de água e todos os recursos hídricos em geral como acessórios à propriedade da terra (GOMES e VIEIRA, 2009).

A proclamação da República tornou o país uma federação composta por Estados com ampla autonomia administrativa, também estendida aos municípios. A demanda pela iluminação pública não acompanhava os recursos financeiros a disposição da administração para a efetivação deste serviço de forma adequada e satisfatória, o que levou à instituição do regime de concessões para prestação de serviços públicos, que em sua grande maioria, outorgadas pelas próprias prefeituras, em contratos de longa duração, até 90 anos, e com garantias financeiras por parte do Estado (GOEKING, 2010).

A extensão dos investimentos necessários para a construção dos grandes sistemas de geração de energia elétrica superava o poder financeiro e a disponibilidade dos recursos tecnológicos existentes no país para que os municípios, assim como, os pequenos empresários locais pudessem desenvolver tal setor. Assim grandes grupos financeiros nacionais se aliaram a grupos de capital estrangeiro para a montagem desses sistemas no Brasil (SAES, 2009).

Com a crise econômica mundial de 1930, o governo federal adotou medidas políticas de desenvolvimento interno, que provocaram profundas alterações no setor elétrico, através do Decreto nº 24.643, de 10 de julho de 1934, denominado Código de Águas.

As principais mudanças foram a distinção entre a propriedade do solo e a propriedade das quedas de água e outras fontes hidráulicas para efeito de exploração ou aproveitamento industrial; a atribuição à União do poder de conceder ou autorizar o aproveitamento da energia hidráulica; a fiscalização federal sobre o setor hidrelétrico, com o objetivo de assegurar serviços adequados, fixar tarifas razoáveis e garantir estabilidade financeira das empresas (FADEL, 2009, p. 50).

Em 1939 foi instituído o Conselho Nacional de Águas e Energia Elétrica (CNAEE) um dos primeiros órgãos de planejamento econômico do país, responsável em organizar os planos de interligação de usinas e sistemas elétricos, regulamentar o Código de Águas, analisar todas as indagações tributárias relativas à indústria de energia elétrica. A regulamentação das usinas termelétricas no país aconteceu por meio de sua integração às disposições do Código de Águas, pelo Decreto-Lei nº 2.281, de 05 de junho de 1940 (FADEL, 2009, p. 50).

Com o de objetivo construir uma grande usina hidrelétrica no nordeste brasileiro para atender as regiões que eram atendidas pelas usinas termelétricas de forma precária, foi criada a Companhia Hidrelétrica do São Francisco em 1945 através do Decreto-Lei nº 8.031 de 1945 (CHESF,2014).

Durante a década de 1950 os Estados passaram a construir suas próprias distribuidoras de energia elétrica, tendo em vista, que as empresas estrangeiras já não respondiam de forma satisfatória a grande demanda do país ocasionada pelo crescimento urbano e industrial. Era necessário realizar investimentos mediante capital público e desta forma foi criado o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), em 1952, para atuar no setor de infraestrutura e subordinado ao Ministério da Fazenda (CHESF, 2014).

Em 1957 a Central Elétrica de Furnas S/A foi criada para enfrentar a crise da região Sudeste. Com o intuito de realizar estudos, projetos, construção e operação de usinas produtoras e linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica criou-se em 1961 as Centrais de Elétricas Brasileiras S/A, a Eletrobrás (FURNAS, 2014).

As ações das empresas controladas pela AMFORP - American & Foreign Power foram compradas após o golpe de 1964 pelo Governo Federal. A política de energia elétrica no país passou a ser traçada pelo Ministério de Minas e Energia e executada pela Eletrobrás. Decisivamente a visão de integração de planejamento no setor elétrico começou a se desenvolver com a consolidação de empresas regionais, como Furnas, CHESF e a Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG). O modelo energético estatal foi bem sucedido na medida em que propiciou a expansão do setor elétrico e o desenvolvimento do parque industrial do país (FADEL, 2009).

Com o objetivo de transferir para a iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público, contribuir para a redução da dívida pública foi criado o Programa Nacional de Desestatização, através da Lei nº 8.031 de 12 de abril de 1990 que procurava reestruturar profundamente o setor elétrico (VIOLA, 2010).

Em 1996 institui a Agência Reguladora de Energia Elétrica com a finalidade de fiscalizar e fiscalizar o setor elétrico. Em 1998 foi estabelecido por meio de da Lei nº 9.648/98 a previsão das privatizações da Eletrobrás e de suas subsidiárias CHESF, Eletronorte – Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A; Eletrosul – Centrais Elétricas do Sul S/A e Furnas (AGÊNCIA, 2014).

Em 2001, o Brasil enfrentou o maior racionamento de energia de sua história, tanto em intensidade como em abrangência. Durante nove meses, a população precisou reduzir os gastos em 20% para evitar o colapso na oferta de energia elétrica. A falta de investimentos em novas geradoras e linhas de transmissão, aliada à falta de chuvas, que baixou o nível de água nos reservatórios das usinas hidrelétricas, fez o governo federal, no segundo mandato do então presidente Fernando Henrique Cardoso, implantar o rigoroso programa de racionamento nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste e parte da região Norte.

Se inicialmente causou transtornos, o racionamento também criou novos hábitos na população. As lâmpadas incandescentes, por exemplo, foram trocadas pelas fluorescentes, mais econômicas; as primeiras irão desaparecer do mercado até 2016. O brasileiro adotou selos de eficiência energética e passou a prestar atenção no gasto de cada aparelho elétrico. O país voltou a investir em energia, linhas de transmissão e novas formas de geração.


2. A ENERGIA ELÉTRICA E O SEU PERCURSO

A geração ou produção de energia elétrica compreende todo o processo de transformação de uma fonte primária (recurso natural) em eletricidade, forma secundária, sendo que no Brasil, a maior parcela da geração é efetuada por hidrelétricas (REIS, 2006, p.30).

Os principais processos de transformação usados para a geração de eletricidade são:

  • a) a conversão de energia mecânica em elétrica por meio do uso de turbinas hidráulicas (mobilizadas por quedas d’água, marés) e cata-ventos (movidos pelo vento) para ligar geradores elétricos;

  • b) conversão direta de energia solar em elétrica por meio de células fotovoltaicas;

  • c) conversão de energia térmica, gerada por combustão (da energia química), fissão nuclear, energia geotérmica ou pelo sol, em energia mecânica pela utilização de máquinas térmicas (turbinas e motores) que ligam geradores elétricos;

  • d) conversão da energia gerada por reações químicas, como no caso das células a combustível.

Depois de produzida, a eletricidade é conduzida através de linhas e torres de transmissão de alta tensão até chegar às subestações onde a voltagem é diminuída e a mesma se integra nas estruturas chamadas de redes de distribuição, formada por postes, cabos e transformadores. Durante todo o caminho, a energia está sujeita a interrupções de raios, tempestades, ventos fortes e quedas de árvores que podem atingir o sistema, causando a suspensão da transmissão. A necessidade de manutenção ou de ampliação da rede também ocasiona paradas programadas (REIS, 2006, p.30-31).

Para alcançar o destinatário, a tensão percorre as redes de distribuição sendo que as mesmas se confundem com a própria topografia das cidades, ramificando-se ao longo das ruas e avenidas para conectar fisicamente o sistema de transmissão. Antes de chegar aos equipamentos elétricos do consumidor a energia elétrica passa pelos equipamentos de medição instalados pela concessionária de serviço, ou seja, o medidor de energia elétrica, também chamado de contador de luz, que é um equipamento eletromecânico ou eletrônico fabricado para medir o consumo de energia elétrica (AGÊNCIA,2014).

A partir desse momento tem início a relação contratual entre a concessionária e o usuário do serviço de fornecimento de energia elétrica.

2.1. O Serviço Público e a Prestação do Fornecimento de Energia Elétrica

O conceito de serviço público não se encontra regulado expressamente na Constituição Federal de 1988, porém, da leitura do art. 175, conclui-se que serviços públicos são todos aqueles prestados pelo Poder Público, seja diretamente ou indiretamente, mediante concessão ou permissão.

De acordo com Meirelles, serviço público é todo aquele prestado pela administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado (2014, p. 90).

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A lei 8.078/1990, que vem a ser o Código de Defesa do Consumidor, conceitua serviço no § 2º do art. 3º como qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes de caráter trabalhista.

Já o art.22, também do Código de Defesa do Consumidor, dispõe o seguinte: os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Com tal definição compreende-se que o Estado deve sempre ter como meta que o serviço público é prestado para o público, e que qualquer outro prestador de serviço público deverá prestá-lo da mesma maneira, atendendo os princípios legais do direito público.

2.2. Os Princípios Reguladores do Serviço Público

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 175, parágrafo único, inciso IV, estabelece que a lei ordinária deve dispor sobre a obrigação de manter o serviço público adequado, seja ele executado diretamente pelo Estado ou por delegatário. Nos termos do art. 6º, § 1º, da Lei de Concessão e Permissão, serviço público adequado é aquele prestado com regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia e modicidade tarifária.

O princípio da regularidade exige do prestador de serviço público tão somente o respeito às regras, normas e condições preestabelecidas para esse fim, ou que lhe sejam aplicáveis. Assim, por exemplo, as unidades consumidoras devem receber energia elétrica dentro dos padrões de tensão determinados pela agência reguladora. Pelo princípio da continuidade, o prestador de serviço público deve executá-lo de maneira permanente, deixando-o ininterruptamente à disposição do usuário. Admite-se a interrupção temporária, desde que, efetue aviso prévio aos respectivos usuários, salvo as hipóteses de emergência, quando a comunicação for impossível (MEIRELLES, 2014; DI PIETRO, 2014).

Já o princípio da eficiência consiste na organização racional dos meios e recurso humanos, materiais e institucionais para a prestação de serviços públicos de qualidade em condições econômicas de igualdade dos consumidores. O princípio da segurança, consiste em assegura a integridade física e moral de todos os indivíduos, sejam eles usuários do serviço público, seus trabalhos ou quaisquer outros.

Em virtude do princípio da atualidade, a prestação do serviço público deve incluir a modernidade das técnicas, dos equipamentos e das instalações, além de promover sua conservação, melhoria e expansão, conforme a Lei das Concessões nº 8.987/95.

Pela força do princípio da generalidade, também conhecido como princípio da universalidade, o prestador de serviço público está obrigado a expandi-lo ao máximo, atendendo, na medida do possível, a todos que apresentem condições técnicas para recebê-los, sem exclusão das populações de baixa renda e das áreas de baixa densidade populacional, incluindo a zona rural.

O princípio da cortesia determina que o usuário seja tratado com civilidade, de forma zelosa e cordial, com vistas à viabilização da defesa de seus interesses. A fixação de um preço justo possibilitando a operação dos serviços dentro dos padrões reguláveis e acessíveis ao usuário, atende-se o princípio da modicidade tarifária.


3. AS ATRIBUIÇÕES DA AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL.

Ao entregar a execução de serviços públicos à iniciativa privada, por intermédio de concessões e permissões, o Estado se liberta da demanda por investimentos que é imposta pela expansão do serviço. A iniciativa privada, por fim, investe seu capital na atividade de prestação de serviços públicos, para ganhar a prestação pecuniária em troca do investimento injetado.

Essa transmissão não retira do Poder Concedente a titularidade do serviço e o obriga a manter o equilíbrio financeiro do contrato. Para alcançar o objetivo de manter o equilíbrio das obrigações contratadas, entre o interesse público e o particular das concessionárias, são criadas as agências reguladoras, no caso do serviço de energia elétrica foi criada a ANEEL- Agência Nacional de Energia Elétrica (AGÊNCIA, 2014).

A ANEEL é uma autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério de Minas e Energia, e é o órgão regulador e fiscalizador das atividades do setor elétrico brasileiro, tem como atribuição fixar tarifas e padrões de qualidade, estimulando a eficiência econômica dos agentes e a universalização do serviço de atendimento de energia elétrica, bem como evitar abusos comerciais e técnicos por falta de concorrência no setor elétrico nacional. Ela realiza licitações e concede autorizações para a geração, transmissão, faz a defesa dos consumidores, monitora comportamentos anti-competitivos, equaciona conflitos entre os agentes dentre outras atribuições (AGENCIA, 2014).

A Aneel firma com as empresas privadas contratos de concessão de distribuição de energia onde são estabelecidas as regras da prestação do serviço e definidos os parâmetros de desempenho e atuação quanto a: tarifa cobrada, regularidade, continuidade, segurança, atualidade e qualidade dos serviços e do atendimento prestado aos consumidores e usuários. O não cumprimento dos parâmetros acordados resulta em penalidades (AGÊNCIA, 2014).

3.1. A Resolução normativa 414/2010 da ANEEL e as Irregularidades no Consumo de Energia Elétrica.

A Resolução Normativa 414, de 09 de setembro de 2010 da Agência nacional de energia elétrica, estabelece as condições gerais de fornecimento de energia elétrica bem como trata sobre os direitos e deveres do consumidor de energia elétrica, cujas disposições devem ser observadas pelas distribuidoras e consumidores. Esta resolução substituiu a Resolução 456/2000, atualizando-se perante a legislação setorial, sem mencionar as mudanças tecnológicas que revolucionaram os procedimentos aplicados à medição, leitura, faturamento e combate às perdas comerciais de energia elétrica (ROCHA, 2011, p 108).

Para as concessionárias as irregularidades no consumo de energia são chamadas em seus relatórios como perdas comerciais. Do ponto de geração até o usuário final, a energia elétrica sofre dois tipos de perdas, as técnicas e as não técnicas. Devido à grande extensão territorial do país, a distância entre o parque de geração e os grandes centros de consumidores, os cabos condutores de energia elétrica sofrem com o aquecimento provocado pela passagem da corrente, nesse percurso ocorrem às perdas técnicas devido ao efeito joule, que consiste no aquecimento de um condutor, que ao ser percorrido por uma corrente elétrica, provoca a transformação de energia elétrica em energia térmica (ROCHA, 2011, p.109).

. Já as perdas não técnicas, conhecidas como perdas comerciais, têm as irregularidades no consumo de energia como os principais fatores de extravio de energia elétrica; e que, em algumas regiões do país o percentual chega a 39% (ROCHA, 2011, p.110).

A administração direta através da Resolução Normativa nº 414/2010 proveu as concessionárias da faculdade de atuarem no combate as irregularidades feitas pelos usuários com a finalidade de burlar o real consumo de energia registrada nos equipamentos de medição, pois tais atos são nocivos ao setor elétrico brasileiro.

Irregularidades no consumo de energia elétrica são um fator determinante na fixação de tarifas e da necessidade de investimento em novos empreendimentos de geração de energia, pois quanto maior as perdas comerciais, mais energia deverá ser gerada e injetada no sistema, sendo que uma parte será efetivamente consumida, faturada e paga e a outra será dissipada nos condutores, desviada, não medida ou não paga

De acordo com Amorim, dentre as formas mais comuns de irregularidades cometidas por usuários do serviço são o desvio de energia, ou seja, a ligação direta feita antes do contador de luz. Nela o usuário, que está cadastrado no sistema da concessionária, adota mecanismos que impedem o registro real de consumo de sua unidade consumidora. Já as ligações clandestinas, constituem-se em uma ligação direta de um determinado imóvel à rede elétrica da concessionária, ou algum ponto anterior a medição de outra unidade consumidora, em benefício de pessoa não cadastrada no sistema (2011, p.80 - 83).

As fraudes se estabelecem a partir do momento em que há a adulteração do equipamento de medição, fazendo com que o mesmo fique fora do seu padrão original. O primeiro indício da fraude se dá pelo rompimento dos lacres, que têm por objetivo impedir o acesso aos componentes internos do equipamento.

Vale ressaltar que as irregularidades no consumo de energia não são práticas exclusivas de usuários com baixo poder aquisitivo, pois alcançam as mais diversas classes sociais bem como tipos de usuários do sistema, os consumidores, sejam eles residenciais, comerciais e industriais

O Código Civil de 2002, nos artigos 82 caput e 81, I estabeleceu que os bens móveis são suscetíveis de movimento próprio ou de remoção alheia, sem alterar sua substância econômica e que as energias que tenham valor econômico são consideradas bens móveis. Já sob a ótica do Código Penal, artigo 155, caput, cominado com o § 3º, dispõe que o usuário ao subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel, comete furto, e equipara-se a coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.

De acordo com entendimento jurisprudencial, o furto de energia e a fraude podem ser, de acordo com o caso em concreto, serem desqualificados para em estelionato, que possui menor potencial ofensivo:

Cidadão preso em flagrante, em uma academia de ginástica situada em bairro da citada urbe, a ele pertencente; que teria, durante lapso temporal impreciso, mas em torno de julho/2008, alterado relógio medidor do consumo de energia elétrica no estabelecimento. Estelionato positivado, eis que, no furto, o agente desvia a energia elétrica de sua fonte natural, fazendo uma ligação clandestina sem passar pelo medidor, e no delito em tela, o mesmo altera o dito relógio, mediante fraude, para que mostre resultado menor do que o jungido ao real consumo. Primariedade e bons antecedentes. Julgado guerreado obrado por dedicada Magistrada, no fixar das penas mínimas, do regime menos severo, e da citada substituição; devendo ser confirmado na plenitude. Recurso que se desprovê. Voto vencido.

0008880-12.2008.8.19.0061.TJRJ.Apelação. 1ª ementa. DES. Luiz Felipe Haddad - Julgamento: 11/08/2011 - quinta câmara criminal.

Em outra situação,

Furto de energia elétrica laudo pericial raspagem da engrenagem desclassificação. Estelionato. Furto de energia. Art. 155, § 3º e 4º, inciso II, do CP. Condenação. Pena de 02 anos de reclusão em regime aberto, substituída por duas restritivas de direitos e 24 DM. Recurso defensivo pela reforma integral do r. decisum, buscando a absolvição do réu em razão do pagamento do débito, extinguindo-se, assim, sua punibilidade, ou da atipicidade da sua conduta em razão do princípio da bagatela ou, por fim, da insuficiência de prova para sua condenação. A materialidade do delito foi demonstrada através do registro de ocorrência, laudo de exame de local e documentação ofertada pela lesada em consonância com os demais elementos de prova carreados aos autos. Autoria comprovada. O apelante mediante fraude obtinha vantagem indevida - maior quantidade por menor pagamento - em prejuízo da lesada, que apesar de estar ciente de que fornecia energia elétrica ao réu foi induzida a erro. Caracteriza-se, todavia, o tipo penal do estelionato e não o crime de furto mediante fraude, diante da conclusão do laudo pericial descrevendo a raspagem da engrenagem. Recurso parcialmente provido para desclassificar a conduta para o art. 171. do Código Penal, adequando-se as penas aplicadas.

0174101-96.2009.8.19.0001 – Apelação.1ª ementa. DES. Suely Lopes Magalhães - julgamento: 03/08/2011 - oitava câmara criminal

Podemos considerar que o usuário que se beneficia da energia elétrica sem efetuar o devido pagamento do serviço prestado incorre em enriquecimento sem causa, sendo tal conduta vedada no art. 884. Código Civil de 2002, que dispõe que aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.

Após a fiscalização realizada pela concessionária, serão levantados os valores referentes às diferenças do consumo médio de energia e os valores efetivamente pagos durante o período não contabilizado estipulado na apuração e que não pode ultrapassar a 36 meses de prestação do serviço, ou seja, este é o limite para a cobrança de valores não apurados e não cobrados. Após constatação da irregularidade, realização de apuração dos valores a serem recuperados e formalização de processo administrativo a concessionária abre vistas para o usuário para que o mesmo, através de recurso administrativo tenha direito à ampla defesa e ao contraditório (BRASIL, 2014).

Tais perdas provocam impacto não somente nas concessionárias de serviço, mas também na sociedade como um todo, já que ao produzir, distribuir a energia elétrica e não receber o valor correspondente o prejuízo será rateado pela concessionária com a sociedade.

Outras consequências das irregularidades nas ligações são as sobrecargas, pois a rede elétrica é dimensionada para suportar uma demanda de energia elétrica calculada conforme a potência instalada em cada unidade consumidora, logo o aumento do consumo ultrapassa a carga dimensionada para a rede e uma interrupção no circuito elétrico poderá ocorrer.

A sobrecarga no sistema elétrico causa interrupção no serviço pois, ela supera a carga prevista, a capacidade de condução dos cabos e o aquecimento dos mesmos. Nessa situação o sistema elétrico entende que existe um problema, então, este se aciona o sistema de segurança contra sobrecarga, que se abre para prevenir a ocorrência de um curto-circuito (ROCHA, 2011, p.130).

Outro revés consiste na interrupção de fornecimento do serviço e descontinuidade na tensão adequada, provocando o funcionamento incorreto dos equipamentos domésticos de seus respectivos usuários.

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Sobre as autoras
Danielle Oliveira Alves

Advogada, trabalha na concessionária Manaus Energia

Carla Torquato

Doutora em Função Social do Direito - FADISP. Coordenadora do Grupo de Estudos de Direito de Águas (GEDA/UEA). Professora da Universidade do Estado do Amazonas.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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