A atual punibilidade aplicada ao psicopata homicida na política criminal brasileira

10/01/2017 às 04:02
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A psicopatia é um tema de diversas controvérsias entre doutrinadores, psiquiatras e psicólogos, tanto quanto sua nomenclatura quanto sua atual punibilidade no sistema penal brasileiro. Sendo o Artigo a explanação de como o psicopata vem sendo tratado.

Atualmente na justiça brasileira o portador de psicopatia pode seguir dois caminhos distintos, a pena privativa de liberdade ou a medida de segurança. A elaboração dos quesitos referentes à ao sujeito ser determinado imputável ou semi-imputável é realizada com embasamento na conclusão do laudo pericial detalhado, o Conselho de Sentença reconhecerá ou não a diminuição prevista no parágrafo único do art. 26 do Código Penal.

Eduardo Szklarz (2009) na matéria feita para a revista Super Interessante aduz a cerca do julgamento:

Em geral, o psicopata pode seguir dois caminhos na Justiça brasileira. O juiz pode declará-lo imputável (tem plena consciência de seus atos e é punível como criminoso comum) ou semi-imputável (não consegue controlar seus atos, embora tenha consciência deles). Nesse segundo caso, o juiz pode reduzir de um a dois terços sua pena ou enviá-lo para um hospital de custódia, se considerar que tem tratamento. 

 

O juiz poderá, na dosimetria da pena, reduzir a pena de um a dois terços, em conformidade com o parágrafo único do artigo citado, ou aplicar a ele a medida de segurança.

Conforme disposto, o psicopata, caso considerado semi-imputável, não lhe é aplicada diretamente as penas dispostas no artigo 32 do Código Penal.

De forma majoritária pela doutrina e jurisprudência, o psicopata é considerado um ser semi-imputável, sendo a ele aplicado o parágrafo único do art. 26 do Código Penal, que traz uma redução da pena de um a dois terços ou a medida de segurança, dependendo do fato concreto.

Entretanto, quando inexiste um laudo técnico do perito, que comprove a psicopatia, o sujeito responde como imputável, ou seja, em um presídio comum, tendo em vista que no Brasil ainda não foi criado um presídio especial para portadores de psicopatia.

Enfim, quando não constatada a psicopatia por descaso, ou quando determinada a redução disposta no art. 26 do Código Penal, será aplicado ao sujeito a pena.

Em decorrência do sistema vicariante, em relação ao semi- imputável o magistrado aplicará apenas uma das espécies de sanções penais ao caso concreto, ou seja não é permitido a cumulação de penas conforme o antigo sistema duplo- binário admitia.

Nucci (2014, p.257) alerta quanto à averiguação do psicopata

É preciso muita cautela, tanto do perito, quanto do juiz, para averiguar as situações consideradas limítrofes, que não chegam a constituir normalidade, pois que personalidade antissocial, mas também não caracterizam a anormalidade a que faz referência o art. 26.

 

 Portanto, o magistrado, quando constatar a psicopatia em determinado agente, deve se ater aos laudos psiquiátricos detalhadamente, determinando a realização de um exame, conhecido como PCL, psychopathy checklist para verificar grau de possível psicopatia, no entanto esse teste não é utilizado com frequência no âmbito jurídico Brasileiro.

René Ariel Dotti (2004, p. 522) nos traz a diferença entre a pena e a medida de segurança:

A pena pressupõe culpabilidade; a medida de segurança, periculosidade. A pena tem seus limites mínimo e máximo predeterminados (CP, arts. 53, 54, 55, 58 e 75); a medida de segurança tem um prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, porém o máximo da duração é indeterminado, perdurando a sua aplicação enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade (CP, art. 97, §1º). A pena exige a individualização, atendendo às condições pessoais do agente e às circunstâncias do fato (CP, arts. 59 e 60); a medida de segurança é generalizada à situação de periculosidade do agente, limitando-se a duas únicas espécies (internação e tratamento ambulatorial), conforme determinado pelo art. 96 do Código Penal. A pena quer retribuir o mal causado e prevenir outro futuro; as medidas de segurança são meramente preventivas. A pena é aplicada aos imputáveis e semi-imputáveis; a medida de segurança não se aplica aos imputáveis. A pena não previne, não cura, não defende, não trata, não ressocializa, não reabilita: apenas pune o agente.

 

Entende-se que tem como fundamento para a aplicação da pena a culpabilidade do agente, e o fundamento para a aplicação da medida de segurança a periculosidade do agente. As penas deverão ser aplicadas aos agentes imputáveis e semi-imputáveis, e as medidas de segurança deverão ser aplicadas aos agentes inimputáveis excepcionalmente aos semi-imputáveis.

A pena é a consequência penal imposta pelo estado, dando efeito ao seu ius puniendi, quando alguém comete um fato típico, ilícito e culpável. (GRECO, 2014, p. 477).

A pena, segundo Damásio, consiste em uma “sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico” (2014, p. 563).

Com relação a finalidade tem-se que se trata de uma retribuição ao delito praticado e a prevenção com relação a novos crimes, vejamos o entendimento de Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 337):

 O caráter preventivo da pena desdobra-se em dois aspectos, geral e especial, que se subdividem em outros dois. Temos quatro enfoques: a) geral negativo, significando o poder intimidativo que ela representa a toda a sociedade, destinatária da norma penal; b) geral positivo, demonstrando e reafirmando a existência e eficiência do Direito Penal; c) especial negativo, significando a intimidação ao autor do delito para que não torne a agir do mesmo modo, recolhendo-o ao cárcere, quando necessário e evitando a prática de outras infrações penais; d) especial positivo, que consiste na proposta de ressocialização do condenado, para que volte ao convívio social, quando finalizada a pena ou quando, por benefícios, a liberdade seja antecipada.”.

 

Ou seja, na prevenção geral o fim da pena é intimidador, sendo destinado para toda a sociedade visando impedir a pratica de crimes. E na prevenção especial, o autor do crime é retirado do meio social, de modo que ele seja corrigido e impedido de praticar outros delitos.

 

PENA PRIVATIVA DE LIBERADE

A pena privativa de liberdade, vem sendo aplicada desde os tempos primitivos, como uma espécie de ensejar viabilidade no processo. Todavia a partir do século XIX a prisão passou a ser a resposta do Estado contra os crimes. Acreditavam de forma otimista que a pena seria capaz de reabilitar o delinquente. No entanto muitas críticas surgiram, visto que o modo repressivo, não obteve êxito em ressocializar o delinquente. 

Deste modo elucida Bittencourt (2014, p. 611) ao citar que “grande parte das críticas e questionamentos que se faz à prisão se refere à impossibilidade – absoluta ou relativa – se obter algum feito positivo sobre o apenado”. Quanto aos psicopatas o efeito seria de maior intensidade, como cita França (2004, p. 425): “há até quem os considere penalmente responsáveis, o que reputamos como um absurdo, pois o tratamento repressivo e punitivo a esses indivíduos revelar-se-ia nocivo, em virtude de convivência maléfica para sua ressocialização”.

A pena privativa de liberdade como o próprio nome aduz, priva o sujeito condenado, recolhendo-o à prisão, influenciando no seu direito de ir e vir.

O nosso código penal prevê dois tipos de penas privativas de liberdade, sendo a reclusão e detenção. Sendo que a pena de reclusão inicialmente deve ser cumprida em regime fechado ou semiaberto, e a detenção, inicialmente cumprida em regime semiaberto ou aberto, conforme disposto no artigo 33 do Código Penal.


Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

§ 1º - Considera-se:

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.

§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.

 

 De acordo com Rogério Grecco (2014, p. 489):

A pena privativa de liberdade vem prevista no preceito secundário de cada tipo penal incriminador, servindo à sua individualização, que permitirá a aferição da proporcionalidade que a sanção que é cominada em comparação com o bem jurídico por ele protegido.

Ou seja, uma conduta delitiva considerada grave receberá como consequência natural uma pena mais grave, sendo a detenção utilizada para delitos reputados como de menor gravidade. É necessário discorrer acerca da diferença entre detenção e reclusão, Nucci (2014, p. 347) nos traz cinco diferenças entre as penas de reclusão e detenção, quais sejam:

a) a reclusão é cumprida inicialmente nos regimes fechado, semiaberto ou aberto; a detenção somente pode ter início no regime semiaberto ou aberto (art. 33, caput, cp); b) a reclusão pode acarretar como efeito da condenação a incapacidade para o exercício do pátrio poder (atualmente, denominado, pelo código civil, poder familiar), tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos a esse tipo de pena, cometidos contra flho, tutelado ou curatelado (art. 92, ii, cp); c) a reclusão propicia a internação nos casos de medida de segurança; a detenção permite a aplicação do regime de tratamento ambulatorial (art. 97, cp); d) a reclusão é cumprida em primeiro lugar (art. 69, caput, cp); e) a reclusão é prevista para crimes mais graves; a detenção é reservada para os mais leves, motivo pelo qual, no instante de criação do tipo penal incriminador, o legislador sinaliza à sociedade a gravidade do delito. 

A grande problemática encontrada em relação a punição de um psicopata, está ligada diretamente no fato de que esse sujeito é incapaz de assimilar a punição como uma forma de atingir a função da pena, qual seja ressocialização do condenado, pois ele não se arrepende.

Nesse sentindo Odon Ramos Maranhão (1995, p. 88) cita “ a experiência não é significativamente incorporada pelo psicopata (anti-sociall). O castigo, e mesmo o aprisionamento, não o modificam”, uma das características do psicopata, a ausência de aprendizado com a punição, o que faz com que o simples confinamento se torne inútil, em face das funções de punitivas e ressocializadoras da pena, sendo que, quando finalizarem o cumprimento da pena, retornarão a cometer novos delitos.

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É importante ressaltar que esses indivíduos conforme já citado são extremamente manipuladores de manipular as pessoas, que esses indivíduos possuem Ilana Casoy (2002, p. 26) afirma, “quando são capturados, rapidamente assumem uma máscara de insanidade alegando múltiplas personalidades, esquizofrenia, black-outs constantes ou qualquer coisa que o exima de responsabilidades”.

Dentro dos presídios geralmente agem de duas formas, de um lado apresentam bom comportamento, denominados preso exemplar, afim de obter o benefício da progressão de regime, porem, do outro lado prejudicam os outros presos relevando-se nocivo tanto para a sociedade, quanto para o sistema prisional.

Eduardo Szklarz (2009) na matéria feita para a revista Super Interessante afirma:

Como não há prisão especial para psicopata no Brasil, ele fica com os criminosos comuns. Por saber que a pena poderá ser reduzida caso se comporte, bem, se passa por preso-modelo. Mas, por baixo dos panos, ameaça os outros presos, lidera rebeliões. Prejudica a reabilitação dos presos comuns, que passam a agir cruelmente para sobreviver. 

Nesse mesmo sentindo Hilda Morana (2002, p. 2) quanto ao perfil dos psicopatas diz que são “adequados para se tornar os chefões da cadeia e os líderes de rebeliões. Podem transformar os outros 80% dos presos em massa de manobra. ‘Além de recriarem o inferno na cadeia, atrapalham a ressocialização dos detentos que podem ser recuperáveis”. Ou seja, prejudicando a massa comum da carceragem.

No mesmo compasso Trindade (2012, p. 178) expõe:

Os psicopatas necessitam de supervisão rigorosa e intensiva, sendo que qualquer falha no sistema de acompanhamento pode trazer resultados imprevisíveis. Assim, as penas a serem cumpridas por psicopatas devem ter acompanhamento e execução diferenciada dos demais presos, uma vez que não aderem voluntariamente a nenhum tipo de tratamento, sendo que, quando aderem, é com a finalidade de se obter benefícios e vantagens secundárias.

Deste modo, tendo em vista a capacidade camaleônica do psicopata de enquadrar nas regras, quando conveniente, motivados por interesses secundários, podem auferir com facilidade benefícios durante o cumprimento da pena.

A segunda problemática de cunho importantíssimo com relação ao cumprimento de pena privativa para os psicopatas é a reincidência criminal, pois não constitui a finalidade de prevenção especial da correção quanto a esses sujeitos principalmente. E visto que a maioria dos crimes bárbaros são cometidos por psicopatas, esse tema torna se um grande risco para a sociedade.

Sobre a reincidência, Ana Beatriz Barbosa (2014, p. 152) explica:

Estudos revelam que a taxa de reincidência criminal (capacidade de cometer novos crimes) dos psicopatas é cerca de duas vezes maior que a dos demais criminosos. E quando se trata de crimes associados à violência, a reincidência cresce para três vezes mais”.

Assim também, atesta Jorge Trindade (2009) que todas as medidas de reabilitação serão inúteis, pois a personalidade dos psicopatas o é imutável. Nesse sentido, afirma que eles iniciam a vida criminosa em idade precoce, sendo considerados indisciplinados no sistema prisional, apresentando uma resposta insuficiente nos programas de reabilitação, deste modo possuindo elevados índices de reincidência.

Por fim, tem-se que nos casos cometidos por indivíduos psicopatas a reincidência é exorbitante, tendo em vista a ineficiência das penas aplicadas, que são incapazes de modificar a sua visão sobre a realidade, apenas impedindo-os de cometer novos delitos enquanto estiverem encarcerados.

A Jurisprudência a seguir demonstra a aplicação de pena privativa de liberdade com redução prevista no ordenamento Penal Brasileiro:

APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. SEMI-IMPUTABILIDADE. CONDENAÇÃO. INSURGÊNCIA MINISTERIAL. ALEGAÇÃO DE ERRO OU INJUSTIÇA NO TOCANTE À APLICAÇÃO DA PENA. Verificada a reprimenda aplicada na origem, tem-se que a mesma não atendeu aos critérios da razoabilidade, necessidade e suficiência para a prevenção/reprovação do crime, motivo pelo qual a pena deve ser exasperada na primeira e na terceira fase. Ademais, considerando que o transtorno de personalidade anti-social não influenciou na capacidade de entendimento quanto à ilicitude do fato praticado; que inexistem outros comprometimentos patológicos; e que a parcial capacidade de autodeterminação também se deve ao uso voluntário de entorpecentes, desde a adolescência; é de rigor a aplicação da minorante do parágrafo único do art. 26 do Código Penal, na fração de um terço (1/3). APELO MINISTERIAL PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70041554122, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rosane Ramos de Oliveira Michels, Julgado em 29/01/2013).

 

No caso em tela, trata-se de Marco Aurélio Onantshenko que praticou o crime de homicídio qualificado por motivo torpe contra Maria da Conceição Alves Vieira de 73 anos, situação em que o sujeito desferiu diversas facadas em seu tórax e pescoço de forma cruel, causando um sofrimento extremo a vítima, ocasionando assim sua morte. O laudo pericial demonstrou uma conduta indiferente e insensível pelos sentimento alheios, evidenciando baixa tolerância a frustrações considerando-o como portador de psicopatia (transtorno de personalidade antissocial). Portanto sua pena foi reduzida em um terço conforme previsto no art. 26 do Código Penal.

 

MEDIDA DE SEGURANÇA 

Anteriormente, no Código Penal de 1940 o Brasil adotava sistema duplo binário para aplicar as penas, que de maneira sucinta consistia em aplicar de maneira cumulada tanto a pena privativa de liberdade, quanto a medida de segurança se necessário. Ocorre que com a reforma do Código Penal em 1984, o sistema de aplicação de penas mudou, tornando-se Vicariante, podendo ser chamado também de unitário, em que no o juiz deverá aplicar de forma alternativa as penas ao réu.

As medidas de segurança é uma das espécies de sanção penal, possuem finalidade diversa da pena, pois se destinam a cura e tratamento, como uma maneira de prevenção.

Luis Regis Prado (2006, p.690) traz a lume o conceito de medida de segurança:

 

As medidas de segurança são conseqüências jurídicas do delito, de caráter penal orientada por razões de prevenção especial. Consubstanciam-se na reação do ordenamento jurídico diante da periculosidade criminal revelada pelo delinquente após a prática de um delito. O objetivo primeiro da medida de segurança imposta é impedir que a pessoa sobre a qual atue volte a delinqüir a fim de que possa levar uma vida sem conflitos com a sociedade.

 

Deste modo trata-se de uma forma de sancionar com caráter preventivo e curativo, de maneira que o autor de um fato típico e antijurídico, sendo ele semi-imputável ou inimputável, receba um tratamento adequado, evitando que cometa outro injusto. (NUCCI, 2014, p. 527).

 A medida de segurança não é aplicada aos sujeitos imputáveis, tendo em vista que a este serão aplicadas as penas, já as inimputáveis e semi-imputáveis à medida de segurança.

Cezar Bittencourt (2014, p. 859)  traz a lume:

Atualmente, o imputável que praticar uma conduta punível sujeitar-se-á somente à pena correspondente; o inimputável, à medida de segurança, e o semi-imputável, o chamado fronteiriço, sofrerá pena ou medida de segurança, isto é, ou uma ou outra, nunca as duas, como ocorre no sistema duplo binário.

 

Assim sendo, segundo o autor, ao semi-imputável é aplicada alternativamente a pena ou a medida de segurança. Sendo as condições pessoais determinantes. Caso seu estado pessoal não demonstrar a necessidade de internamento ou tratamento ambulatorial, receberá a pena, com redução prevista pelo art. 26, parágrafo único, do Código Penal.

 É importante ressaltar a diferença entre a pena e a medida de segurança, apesar de ambas constituírem uma sanção penal. No entanto, a fundamentação da aplicação da pena reside na culpabilidade do agente, já a medida de segurança baseia-se na periculosidade do sujeito.

Damásio de Jesus (2014, p.539) traz as principais diferenças entre pena e medida de segurança:

a) as penas têm natureza retributiva – preventiva; as medidas de segurança são preventivas;

b) as penas são proporcionais à gravidade da infração; a proporcionalidade das medidas de segurança fundamenta-se na periculosidade do sujeito;

c) as penas ligam-se ao sujeito pelo juízo da culpabilidade (reprovação social); as medidas de segurança, pelo juízo de periculosidade;

d) as penas são fixas; as medidas de segurança são indeterminadas, cessando com o desaparecimento da periculosidade;

e) as penas são aplicáveis aos imputáveis, e aos semi-responsáveis; as medidas de segurança não podem ser aplicadas aos absolutamente imputáveis” .

 

Existem três pressupostos para aplicação da medida de segurança, sendo eles: fato praticado ser típico punível; periculosidade do agente e ausência de imputabilidade plena. Vejamos o entendimento doutrinário a cerca dos pressupostos citados.

Luis Regis Prado (2006, p. 692) elucida:

 

Primeiro dos requisitos para a aplicação de medida de segurança é a pratica, pelo agente, de um fato punível. A prática de um delito como pressuposto de aplicação das medidas de segurança funciona como um critério limitativo, com intuito de afastar a imposição de medidas de segurança pré-delitivas por razões de segurança jurídica.

 

Deste modo é indispensável a pratica de um crime, tornando impossível de ser aplicado caso exista alguma excludente de criminalidade, excludente de culpabilidade (como erro de proibição, coação irresistível e obediência hierárquica, embriaguez completa fortuita ou por força maior). (BITENCOURT, 2014, p. 860).

O segundo pressuposto é a periculosidade do agente, devendo está ser comprovada, e não somente presumida. Podendo ser definida como um “estado subjetivo mais ou menos duradouro de antissociabilidade. É um juízo de probabilidade – tendo por base a conduta antissocial e a anomalia psíquica do agente – de que este voltará a delinquir.” (BITENCOURT, 2014, p. 860).

Por fim tem se o ultimo pressuposto que trata da ausência de imputabilidade plena, atualmente o agente imputável não pode receber a aplicação de medida de segurança, somente os inimputáveis e semi-imputáveis de forma excepcional, “só estará sujeito a medida de segurança na hipótese de exigência de especial tratamento curativo (art. 98, CP), enquanto aos inimputáveis se aplica, de regra, medida de segurança (art. 26, caput, CP)”. (PRADO, 206, p. 693).

Quanto a medida de segurança o código penal dispõe:

Artigo 96: As medidas de segurança são:

I- Internação em hospital de custodia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado;

II- Sujeição a tratamento ambulatorial.

Artigo 97: Se o agente for inimputável, o juiz determinará sua internação (art.26). Se, todavia, o fato previsto como crime for punível com detenção, poderá o juiz submetê-lo a tratamento ambulatorial. 

Os artigos apresentam as duas espécies de medida de segurança sendo elas a detentiva que consiste na internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou outro estabelecimento adequado e a restritiva que consiste na sujeição ao tratamento ambulatorial.

A espécie detentiva é aquela em que o agente é internado em hospital de custódia e recebe tratamento psiquiátrico, não havendo esses lugares disponíveis, será cumprida em outro estabelecimento adequado. Podendo ser aplicada tanto aos inimputáveis quanto aos semi-imputáveis. (BITENCOURT, 2014).

Já a modalidade restritiva o agente fica sujeito ao tratamento ambulatorial, situação em que são oferecidos cuidado médicos.

Cezar Roberto Bittencourt (2014, p. 861) posiciona-se:

O tratamento ambulatorial é apenas uma possibilidade que as circunstâncias pessoais e fáticas apontarão ou não a sua conveniência. A punibilidade com pena de detenção, por si só, não é suficiente para determinar a conversão da internação em tratamento ambulatorial, sendo necessário examinar as condições pessoais do agente para constatar a compatibilidade ou incompatibilidade com a medida restritiva. Se as condições forem favoráveis, a substituição se impõe. Não é a imputabilidade ou semi-imputabilidade que norteará a aplicação de uma ou de outra medida de segurança, e sim a natureza da pena privativa de liberdade aplicável, que se for de detenção permite a aplicação de tratamento ambulatorial, desde que as condições pessoais recomendem.

Segundo esse autor, não basta apenas à punibilidade com pena de detenção para aplicar o tratamento ambulatorial, e sim suas condições pessoais, que devem ser favoráveis, possibilitando assim a aplicação dessa medida.

Segundo a previsão do nosso Código Penal (Art. 97, §1 e 2), a medida de segurança tem duração indeterminada, que perdurará enquanto não for constatada a cessação da periculosidade do agente. Assunto que gera grande debates entre diversos autores contemporâneos, a lei dispõe apenas o prazo mínimo, que é de um a três anos. Existem quatro correntes a respeito do limite temporal para o cumprimento da medida de segurança.

Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 533) traz a lume de forma clara as correntes:

a)         Tem duração indefinida, nos termos do disposto no art. 97, § 1.º, Código Penal;

b)         Tem a mesma duração da pena privativa de liberdade aplicada. O sentenciado cumpre, internado, o restante da pena aplicada;

c)         Tem a duração máxima de 30 anos, limite fixado para a pena privativa de liberdade.

d)         Tem duração do máximo em abstrato previsto como pena para o delito que deu origem à medida de segurança.

 

 O Supremo Tribunal Federal manifestou-se sobre o assunto, aduzindo que as medidas de segurança devem observar o limite máximo de duração de 30 (trinta) anos para internação em hospital de custódia para tratamento psiquiátrico.

Nesse sentido, decidiu o STF:

“1. A prescrição de medida de segurança deve calculada pelo máximo da pena cominada ao delito atribuído ao paciente, interrompendo-se-lhe o prazo com o início do seu cumprimento. 2. A medida de segurança deve perdurar enquanto não haja cessado a periculosidade do agente, limitada, contudo, ao período máximo de trinta anos. 3. A melhora do quadro psiquiátrico do paciente autoriza o juízo de execução a determinar procedimento de desinternação progressiva, em regime de semi-internação (HC 97621/RS, Rel. Min. Cezar Peluso, 2ª T., j. 2/6/2009).

 

Rogério Greco (2014, p. 689) traz a lume:

 Apesar da deficiência do nosso sistema, devemos tratar a medida de segurança como remédio, e não como pena. [...] Mas não podemos liberar completamente o paciente se este ainda demonstra que, se não for corretamente submetido a um tratamento médico, voltará a trazer perigo para si próprio, bem como para aqueles que com ele convivem.

Como vislumbrado, segundo a jurisprudência acima colecionada, o agente portador de doença mental deverá permanecer internado (medida de segurança) enquanto não for cessada a periculosidade do agente, contudo está estará limitada pelo período máximo de 30 (trinta) anos.

O exame para verificação da cessação da periculosidade pode ser aplicado no fim do prazo mínimo fixado na sentença, e podendo ser refeito de ano em ano. Esse exame legal é obrigatório. O juiz da execução pode determinar, por meio de oficio, a qualquer tempo, a repetição do exame. (Bittencourt, 2014, p. 868)

Este exame determina se o sujeito está apto ou não para retornar ao convívio com a sociedade. Contudo, tendo em vista que conforme aduzido, a psicopatia não possui cura, resta explicito que a periculosidade do referido sujeito nunca cessará, permanecendo em hospitais de custódia por pelo menos 30 anos.

Não há tratamento para psicopatas, tendo em vista serem incuráveis, e desprovidos de doença. No entanto, muitos são submetidos a este tipo de sanção por tratar-se de sujeitos com altíssima periculosidade.

 

 URGENTE NECESSIDADE DE UMA POLÍTICA CRIMINAL ESPECÍFICA

 

No atual sistema penal brasileiro, conforme já mencionado, aos psicopatas que cometem determinado crime são impostas a pena privativa de liberdade podendo ser integral ou reduzida de um a dois terços ou a medida de segurança (sistema unitário).

O desenvolvimento de uma política criminal especifica para os psicopatas, composto de meios efetivos de punição e controle para estes indivíduos, teoricamente seria um meio eficaz para reduzir os crimes de homicídios geralmente bárbaros praticados por esses indivíduos.

No entanto, insta salientar que, infelizmente, o sistema judiciário e a legislação penal brasileira não oferece nenhuma previsão normativa para tratar a respeito da psicopatia, tendo em vista que debates nos Tribunais de Justiça do Brasil, Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal são ínfimos. Isto posto, outro fato relevante que é evidente no Brasil, é a carência diferenciação legal entre os criminosos psicopatas e criminosos, como já ocorre na Austrália e Canadá, bem como em alguns estados americanos.

Em entrevista ao Correio Brasiliense, Ana Beatriz Barbosa (2012) afirma:

Criminosos psicopatas não podem ser recuperados nem com tratamentos psicológicos e, que nesses casos, a melhor solução seria a prisão perpétua. “Acho pouco provável que alguém que faça isso possa ter algum tipo de recuperação ou de arrependimento. Em países como a Austrália e o Canadá, e em alguns estados americanos, há diferenciação legal entre os criminosos psicopatas e os não psicopatas”, justifica. Ela defende mudanças na lei para que o Brasil também passe a adotar essa postura.

É notório que o psicopata é um sujeito manipulador, sedutor e esperto. Razão disso, inserir esse sujeito a presídios comuns é ineficaz na ressocialização do psicopata. Dentro de presídios, o psicopata se sobressai aos demais detentos com o objetivo de conseguir uma fuga. Sendo que boa parte das rebeliões são lideradas por psicopatas, sendo que sempre se eximem da culpa, visto que possuem um comportamento exemplar. Por isso, é imprescindível analisar de maneira cautelosa a melhor forma de sancionar os psicopatas. Os psicopatas são incapazes de aprender com a sanção penal.

Neste sentido contexto, Jorge Trindade (2012, p. 178) aduz:

Os psicopatas necessitam de supervisão rigorosa e intensiva, sendo que qualquer falha no sistema de acompanhamento pode trazer resultados imprevisíveis. Assim, as penas a serem cumpridas por psicopatas devem ter acompanhamento e execução diferenciada dos demais presos, uma vez que não aderem voluntariamente a nenhum tipo de tratamento, sendo que, quando aderem, é com a finalidade de se obter benefícios e vantagens secundárias.

Em contrapartida, a medida de segurança possui natureza preventiva, objetivando evitar a reincidência de um criminoso que possua um alto grau de periculosidade, gerando assim, um risco no convívio social.

Nesta sistemática, entende-se que para que seja cessada a periculosidade do agente e sua realocação no convívio em sociedade, é necessário que se tenha ocorrido a cura do paciente, de modo a ser afastada ou controlada sua patologia a ponto de verificar que este sujeito é capaz de conviver em sociedade.

É preciso enfatizar que o psicopata não é um doente mental, e sim um indivíduo que possui sua personalidade drasticamente alterada. Resta evidente que a periculosidade do psicopata não cessará com o tratamento prestado em seu internamento em hospital de custódia. Ficando claro que a finalidade de proteger a sociedade, bem como a cura do sujeito é inviável.

O despreparo das ciências da saúde a respeito do tratamento e o entendimento de maneira aprofundada aos psicopatas torna a sociedade vulnerável a esses indivíduos, nesse sentido Ana Beatriz Barbosa Silva (2014, p.186) traz a lume:

Senhoras e senhores, não trago boas-novas. Com raras exceções, as terapias biológicas (medicamentos) e as psicoterapias em geral se mostram, até o presente momento, ineficazes para a psicopatia. Para os profissionais de saúde, este é um fator intrigante e ao mesmo tempo desanimador, uma vez que não dispomos de nenhum método eficaz que mude a forma de um psicopata se relacionar com os outros e perceber o mundo ao seu redor. É lamentável dizer que, por enquanto, tratar um deles costuma ser uma luta inglória.

Portanto, considerando suas peculiaridades e a completa rejeição por tratamento contra esse transtorno antissocial, fica evidente a necessidade de medidas adequadas e voltadas para os portadores de psicopatia, atentando se as garantias constitucionais, qual seja a dignidade da pessoa humana. Mas que em contrapartida não deixe a sociedade vulnerável e insegura, sempre que um psicopata retorne a coabitação.

Diante do exibido, coloca-se a imposição de uma política criminal estruturada e prevista exclusivamente para o sujeito psicopata, munido de meios efetivos para o controle e a contenção do mesmo. Ao passo que para o judiciário o psicopata pode ser sancionado com pena reduzida ou medida de segurança já demonstram que essas medidas são totalmente opostas, visto que não há distinção para o sistema político penal atual entre os psicopatas e criminosos tidos como comuns.

A aplicação do Psychopathy Checklist (PCL), já mencionado, proporcionaria a identificação dos portadores de psicopatia no atual sistema penal brasileiro, desassociando dos demais criminosos e disponibilizando agentes tecnicamente preparados, para lidar com os mesmos.

Tem se que o assunto é complexo, em outros países como Estados Unidos e Canadá, em pesquisas avançadas sobre o assunto, o professor e procurador Alexandre Magno (2008) orienta:

Não há um consenso sobre o que deve ser feito. Há consenso, porém, no sentido de que algo deve ser feito. Alguns estados norte-americanos contam inclusive com leis específicas sobre criminosos psicopatas. Enquanto isso, nós, crente absolutos na inata bondade humana, continuamos a conviver com 46.000 homicídios anuais e com personagens que já estão tornando-se lendários: o "bandido da luz vermelha", o "maníaco do parque", o "Chico picadinho", o "Champinha" e tantos outros, anônimos, que continuam a cometer seus crimes, dentro e fora da prisão, antes, durante e depois do encarceramento.

Desta forma, compreende se que por se tratar de um sistema intricado a busca de uma possível solução pode parecer um tanto quanto quimérica, contudo, o problema ocorre e nos acompanha cotidianamente, demanda, assim, a fundação de uma política criminal especifica a esses

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