11. Os custos da cobrança
A base fiscal é constituída pelo conjunto das actividades económicas e dos recursos que são tributados.
O alargamento da base tributável através da ampliação da rede de contribuintes não significa necessariamente maiores receitas, uma vez que os custos de cobrança têm de ser tidos em consideração . Qualquer tentativa de ampliar a rede de impostos tem de analisar se as receitas adicionais serão superiores aos custos de cobrança. Os alvos principais devem ser aqueles que beneficiam de preferências fiscais, aqueles que utilizam abusivamente os preços de transferência para alterar os lucros e as indústrias extractivas.
12. Benefícios fiscais
Nos termos do artigo 9.º da Lei de Bases do Sistema Tributário, os benefícios fiscais são medidas de carácter excepcional e tendencialmente temporárias que impedem ou reduzem a tributação, a manifestação da capacidade contributiva e prosseguem objectivos extrafiscais, nomeadamente de orientação da economia e considerados de interesse público relevante.
Os benefícios fiscais podem revestir a forma de isenção, redução de taxas, dedução à matéria colectável e a colecta, amortizações e reintegrações aceleradas e quaisquer outras formas favoráveis ao sujeito passivo.
Em relação a questão dos benefícios fiscais, situamo-nos como Rogério Ossemane , é preciso que esteja claro que os benefícios fiscais representam um custo para o país. O facto de um projecto trazer vários benefícios líquidos para o país não justifica automaticamente a concessão de benefícios fiscais. Só fará sentido incorrer em custos fiscais se a obtenção desses benefícios for dependente da concessão dos benefícios fiscais.
Num país que apresenta défices crónicos nas suas contas públicas, a concessão de incentivos fiscais não pode ser feita de ânimo leve. Para que o país esteja em condições de analisar a relevância dos incentivos fiscais, antes da sua concessão é necessário desenvolver um conhecimento mais profundo da quantidade e qualidade dos recursos que o país possui, o seu valor de mercado (actual e tendências futuras) e os interesses e dificuldades dos potenciais investidores.
O mesmo autor acrescenta que este conhecimento do valor, a riqueza do país é, em si, um factor de atracção do investimento, ao mesmo tempo que permite o aumento do poder negocial do país. Quando aliado a uma maior clareza do que o país pretende e pode obter da exploração das suas riquezas ao longo do tempo, permite simultaneamente expandir os benefícios da sua exploração (por exemplo, usando a informação sobre as tendências do valor da produção no mercado para determinar o melhor momento para autorizar a exploração de determinado recursos) e reduzir os custos fiscais (por exemplo, quanto mais rentável for o produto no mercado, menos relevante se torna a concessão de incentivos fiscais).
Ademais, os incentivos fiscais, mesmo que relevantes na atracção de investimento, não devem perder o seu foco nos objectivos estratégicos de promoção de emprego, aumento e diversificação da produção e exportações, formação da mão-de-obra, desenvolvimento tecnológico, etc. Para tal, não basta tomar a decisão da sua concessão num determinado momento. É fundamental que o sistema de concessão de incentivos fiscais esteja ligado a um sistema de monitoria de desempenho determinante para a continuidade dos incentivos e os moldes da sua concessão. Este sistema não só permitiria reduzir os custos fiscais para o país como funcionaria como um mecanismo para estimular impactos mais positivos dos projectos em relação a indicadores estratégicos de desenvolvimento.
Vale, a propósito ter presente o ensinamento de Martin Brownbridge para quem “a eficácia dos incentivos fiscais como forma de ultrapassar obstáculos ao investimento depende das condições e características de investimento do país anfitrião. De uma forma geral, é melhor identificar os obstáculos efectivos ao investimento e procurar resolvê-los de forma directa”. Enfrentar obstáculos não fiscais pode ser uma opção mais eficaz para atrair investimento do que procurar igualar os incentivos fiscais concedidos por outros países, especialmente se isso resultar numa corrida descendente à medida que os países competem por investimentos e nenhum deles recolhe daí impostos significativos.
13. O problema da evasão e elisão fiscal
A fraude e a evasão fiscais limitam a capacidade de o Estado aumentar as suas receitas e pôr em prática a sua política económica. As estimativas revelam que dezenas de milhões de meticais estão colocadas em paraísos, muitas vezes não declarados e não tributados, o que diminui as receitas fiscais nacionais. A adopção de medidas decisivas para minimizar a fraude e a evasão fiscais poderia gerar milhares de milhões de meticais de receitas adicionais para o orçamento público.
A fraude e a evasão fiscais são também um desafio para a justiça e a equidade. A equidade é uma condição essencial para que as necessárias reformas económicas sejam social e politicamente aceitáveis. A carga fiscal deve ser distribuída de modo mais uniforme, assegurando que todos, tanto os trabalhadores, como as empresas multinacionais que beneficiam do mercado único, como os particulares ricos com contas em paraísos fiscais, contribuem com a sua quota-parte para o equilíbrio das finanças públicas. A justiça e a equidade também implicam a criação de sistemas de tributação melhores e mais justos.
Um artigo publicado no Caderno de Economia e Negócios do Jornal Notícias, edição de 6 de Dezembro de 2013, traz um alerta do CIP sobre a adopção de estratégias cada vez mais robustas de evasões robustas pelas multinacionais .
É inevitável que do jeito que segue hoje o mundo com a eliminação das barreiras que entravavam os fluxos de pessoas e capitais, o desenvolvimento das tecnologias e das comunicações tiveram como efeitos, entre outros, o aparecimento da concorrência fiscal entre os diversos países e o aumento da evasão fiscal internacional. Este facto confronta os países afectados pela erosão das suas bases tributárias com a necessidade de estabelecer um equilíbrio entre, por um lado, defender e reconstituir a sua base tributável e, por outro, evitar que uma carga fiscal elevada afaste os agentes económicos e o investimento do seu país.
É assim que se tem assistido a reformas dos sistemas fiscais tradicionais, concebidos num contexto de economia fechada, com destaque para o alargamento da base tributável e a redução das taxas dos impostos.
Por outro lado, se é verdade que a redução das taxas de tributação tem o condão de reduzir ou eliminar os diferenciais de carga fiscal que originam desvios de capital, de investimentos ou de rendimentos tributáveis, rivalizando na concorrência fiscal global, pode ser considerada positiva, tem, no entanto, as suas consequências inerentes a perdas de receitas necessárias ao equilíbrio orçamental.
Pensamos porém que se essas medidas servirão para sustentar uma degeneração de rendimentos num plano imediato – com a queda das receitas fiscais – no plano posterior, permitirão o alargamento da base tributária, pois mais sujeitos passivos preferirão cadastrar-se e cumprir as suas obrigações fiscais por o valor dos tributos ser sustentável.
14. Conclusão
A estrutura fiscal de um país é o conjunto de tributos associados às suas respectivas bases de cálculo e de alíquota. As alterações na estrutura fiscal podem provocar impacto sobre a arrecadação das receitas tributárias em consequências de extensão ou redução da base tributária.
Variações na base tributária podem ter um efeito positivo sobre a arrecadação se elas significarem um aumento da base. Um exemplo disso seria o fim de determinados benefícios fiscais como os concedidos sobretudo aos megaprojectados e as entidades ligadas a indústria extractiva. O fim dos benefícios fiscais é entendido como um alargamento da base, pois um número maior de contribuintes passa a ser alcançado pela norma tributária. Por outro lado, a criação de um benefício fiscal traz efeitos negativos sobre a arrecadação, já que reduz o número de contribuintes que a norma tributária visa alcançar.
No que diz respeito à taxa de incidência, ela, no geral, tem um efeito positivo sobre a arrecadação. Dizemos “no geral” porque o resultado de um aumento da taxa depende do impacto que tal aumento terá no sistema nas rubricas do investimento, do consumo e da poupança. A tendência é que o aumento das taxas de incidência, significando menor disponibilidade monetária na posse dos contribuintes vai inibir, consoante o caso, o investimento, o consumo ou a poupança, ao mesmo tempo que poderá restringir a base tributária. E, mais, contribuirá proporcionalmente para a elisão e evasão fiscal.
Os países de modo geral têm de ser cautelosos na forma como aumentam a proporção dos impostos no rendimento nacional, especialmente aqueles onde já há um esforço fiscal elevado. A solução raramente reside no mero aumento das taxas fiscais. Muitas vezes, é melhor baixar a carga fiscal enquanto se eliminam as isenções e se amplia a base tributária a novos contribuintes. Existe um limite, porém, para a quantidade de impostos que a administração fiscal consegue recolher, mesmo sendo a mais eficaz. Para os países com um elevado nível de impostos, o principal caminho para alargar a quota fiscal é a ampliação da base tributária através do desenvolvimento do sector privado. A existência de uma tributação justa, eficaz e eficiente é uma condição crucial para o desenvolvimento, mas uma reforma fiscal (não obstante dever ser uma prioridade) não é um substituto para uma agenda eficaz de desenvolvimento.
E, verdade seja dita, os agentes económicos desenvolvem hoje actividades em áreas fiscais que lhes sejam favoráveis, já não presos à dimensão do território ou da nacionalidade. E, por favorabilidade, entenda-se áreas de alíquotas fiscais baixas…
Bibliografia
ACIS, O Quadro Legal para Impostos em Moçambique, n.º 1, Maputo, 2011
IBRAIMO, Ibraimo, O Direito e a Fiscalidade: Um Contributo para o Direito Fiscal Moçambicano, Arte C, Maputo, 2002
CHUVA, António et al., Colectânea de Legislação Aduaneira, CFJJ, Maputo, 2007
MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, Boletim de Estatísticas Tributárias, Autoridade Tributária, Edição Zerv. Séries anuais: 2006-2011
OSSEMANE, Rogério, Desafios de Expansão das Receitas Fiscais em Moçambique, IESE, Maputo, 2009
SERRA, Carlos, História de Moçambique, Volume 1, Livraria Universitária, Maputo, 2000
USAID, Revisão do PARPA II - Sistema Tributário em Moçambique, Volume I, Nathan Associates Inc., 2009
Legislação
Constituição da República de Moçambique
Lei nº 2/2006, de 22 de Março (Lei Geral Tributária)
Lei nº 15/2002, de 26 de Junho (Lei de Bases do Sistema Tributário)
Lei n.º 1/2006, de 22 de Março (Cria a Autoridade Tributária de Moçambique)
Lei nº 33/2007, de 31 de Dezembro (Aprova o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares)
Lei nº 34/2007, de 31 de Dezembro (Aprova o Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas)
Lei nº 5/2009, de 12 de Janeiro (Cria o Imposto Simplificado para Pequenos Contribuintes)
Lei nº 32/2007, de 31 de Dezembro (Aprova o Imposto sobre o Valor Acrescentado)
Lei nº 17/2009, de 10 de Setembro (Aprova o actual Código do Imposto sobre Consumos Específicos)