Da admissibilidade e prescrição da ação monitória em títulos de crédito.

Demanda contra a Fazenda Pública e a possibilidade de citação ficta e revelia

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Discute-se a respeito da natureza da ação monitória, sua prescritibilidade e aplicabilidade em face da Fazenda Pública.

Resumo: A ação monitória, presente na Lei n° 9.079, de 14/07/1995, é uma espécie de ação capaz de transformar um simples título de crédito prescrito em uma obrigação de execução forçada para pagamento de uma quantia certa em dinheiro. Basicamente, o procedimento monitório (ou de injunção), trata-se de uma ação, em que, por meio de provas em escrito, o juiz expede um mandado monitório contra o réu podendo, este último, exercer o contraditório por meio de embargos. Pelo mandado monitório, é auferido ao réu um prazo para que, este último, pague a dívida. Não havendo o pagamento da dívida no devido prazo, segundo o disposto no art. 1.102-C do CPC, tal mandado ganha força executiva após o termino desse prazo. Todavia, existe uma certa divergência doutrinaria e mesmo normativa quanto aos prazos para prescrição ou decadência do mandado monitório, o qual, prescrevendo, recebe força executiva. Sem falar que, além da divergência quanto aos prazos, há discussão doutrinária quanto ao ajuizamento de ação monitória contra a Fazenda Pública, podendo esta se tornar revel ou não na relação jurídica que envolve ação de execução forçada do mandado.

Palavras-chave: Ação monitória. Mandado monitório. Prazos prescricionais. Fazenda Pública.

Sumário: 1. Nota Introdutória; 2. Noções básicas da ação monitória; 2.1 Contexto histórico, características, formação e natureza jurídica da ação monitória; 3. Prescrição dos títulos de crédito e da ação extrajudicial no procedimento monitório; 4. Ajuizamento da ação monitória contra a Fazenda Pública; 4.1 Possibilidade da citação por edital e confissão ficta contra órgão público.


1. NOTA INTRODUTÓRIA

A chamada ação monitória presente e regulada na Lei n° 9.079, de 14/07/1995, trata-se de um procedimento, semelhante e equiparado ao Direito italiano, que engloba dois ritos com suas devidas possibilidades, são eles: o rito ordinário cognitivo e posteriormente (caso não haja embargo do réu) o rito de execução forçada. Tal ação é cabível à títulos de crédito que possuem comprovantes documentais, porém, não possuem força executiva por conta de suas prescrições, ou seja, a ação monitória “compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma de dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel” (THEODORO JR., 2014).

Basicamente, o procedimento monitório se trata de uma ação, em que, o credor (autor), por meio de provas escritas, entra com o pedido em rito ordinário. O juiz se valendo de verossimilhança perante as provas escritas do autor expedirá o mandado monitório (ou de injunção) o qual dará um prazo de pagamento ao devedor (réu), podendo, este último, em exercício ao contraditório, responder à demanda com embargos. Nesse sentido, é dado um prazo, não para a defesa do réu, mas para reconhecimento da dívida por parte do devedor ou, caso não reconheça, entrar com embargo e interromper o mandado reconfigurando um processo de conhecimento do caso. Ficando o réu inerte e possivelmente revel diante desse prazo, precluindo este último, o mandado de injunção ganhará força executiva e, por meio do art. 1.102-C do CPC, o título constituir-se-á em título executivo judicial.

Todo esse procedimento garante ao autor celeridade processual abreviando o caminho para se chegar na execução. Todavia, a doutrina traz divergências quanto aos prazos prescricionais e possível decadência dos títulos de crédito da ação monitória, assim como, também, na admissibilidade da aplicação do procedimento monitório contra a Fazenda Pública do Estado sendo que, esta última, só admite pagamento perante o mecanismo do precatório. Além da questão de demandar ação contra o Poder Público (se é possível ou não), questiona-se a possibilidade da citação por edital a tais órgãos além da confissão ficta e corrimento dos efeitos da revelia.

O presente tema, tem como justificativa, o objetivo de esclarecer e analisar constantes discussões em torno da ação monitória, assim como outros institutos, como o da prescrição e possível decadência da mesma. Dentro dessa temática, irá ser buscado a apresentação do conceito e das principais características da ação monitória e seu devido procedimento na transição dos ritos de conhecimento e execução.

Partindo das disposições e regulamentos da ação monitória do ordenamento jurídico brasileiro aufere-se também, para esclarecer as divergências em torno da citação por edital e dos mandados monitórios contra os órgãos públicos, as devidas jurisprudências do STJ e demais tribunais que julgaram casos semelhantes.

Nesse sentido, o trabalho de pesquisa em questão, mostra-se de interesse pessoal e acadêmico para melhor entender e apreciar a ação extrajudicial do procedimento monitório na cadeira universitária de Títulos de Crédito lecionada pelo professor especialista Humberto Oliveira.

Este trabalho tem sua pesquisa e estruturação baseada em pesquisas bibliográficas que discutem os mesmos assuntos a respeito do instituto da ação monitória, além de doutrinas mais específicas quanto ao tema que envolve a problemática do paper. E claro, quanto aos objetivos, a pesquisa é classificada como exploratória, uma vez que tentará dissecar o tema em prol dos objetivos listados. Em relação a seus procedimentos, abrange a natureza bibliográfica, recorrendo a teóricos e suas respectivas obras a respeito da temática.


2. NOÇÕES BÁSICAS DA AÇÃO MONITÓRIA.

De acordo com Emmanuel Gustavo Haddad, a ação monitória se trata de um instituto novo constituído em nosso Direito Processual Civil que fora criada na “Lei n° 9.079/95 e incorporada no Código de Processo Civil, no Livro IV, Dos Procedimentos Especiais, do Capítulo XV” (HADDAD, 2006). A criação da ação monitória provém da busca de meios processuais de exercer uma tutela jurisdicional com maior celeridade e economia, em que, “um dos motivos de sua criação foi à preocupação dos processualistas com um valor fundamental, ínsito à tutela dos direitos, imprescindível à efetividade do processo” (HADDAD, 2006). Tal ideia, baseia-se no conceito básico da ação monitória, em que, trata-se de um direito certo acionado pelo titular do crédito prescrito. Emmanuel Gustavo ainda afirma:

A busca da efetividade do processo, principalmente com a redescoberta do Poder Judiciário pela sociedade brasileira a partir desta década, representa um desafio para o Poder Judiciário e para nos operadores do direito e juristas. Cientificamente, o processo civil é examinado em face de suas fórmulas e de sua celeridade, ou seja, de seus procedimentos, somados a sua utilidade obtendo uma tutela jurisdicional, com a finalidade de ter sua pretensão satisfeita. Sob o ângulo da celeridade e do resultado útil, a finalidade passa a ser debatida como algo ineficiente. Aliás esperamos que a procedimento ordinário seja superado, em face de sua morosidade e complexidade, que o tornam inadequado em uma sociedade como a nossa. Desta forma, o legislador brasileiro identificando os princípios matrizes da celeridade e efetividade, introduziu recentemente na sistemática processual civil a ação monitória, com a promulgação da L. 9.070/95, acrescentando o Cap. XV, sob a rubrica "Da ação monitória", com a inclusão do art. 1.102, a, b e c[38], no Livro IV, Título I do CPC. (HADDAD, 2006).

Nesse sentido, a ação monitório, como um procedimento especial, trata-se de um instituto capaz de garantir celeridade ao processo. Isto, pois, ainda segundo Emmanuel Gustavo, esse procedimento é baseado em provas escritas que garantem verossimilhança suficiente para promover o exercício do direito tutelado pelo mandado monitório. Afirma o autor que, “o art. 1.102 a, a ação monitória é cabível nos casos em que o autor reclama pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou bem móvel determinado, tendo como base prova escrita sem eficácia de título executivo”, ou seja, baseando-se em provas em escrito, o instituto da ação monitória poderá garantir ao titular, do título de crédito prescrito, um meio de receber sua prestação do réu, sem ter que enfrentar a morosidade de um processo de conhecimento em fase ordinária (HADDAD, 2006).

2.1 Contexto histórico, características, formação e natureza jurídica da ação monitória.

Segundo André Luiz Maranhão, o instituto da ação monitória tem sua origem na Itália e foi fruto de uma ideia de facilitar algumas funções sociais do processo. Essa facilidade proporciona ao autor uma maior celeridade para o seu provimento jurisdicional, em que, dessa forma, evita-se as delongas causadas pelo procedimento ordinário, que acarreta a chamada crise ou falência do sistema judicial e processual civil brasileiro, bem como, não retirando do réu o contraditório pleno, exercido por intermédio da interposição dos embargos do devedor (MARANHÃO, 2010).

De acordo com Emmanuel Gustavo Haddad, a ação monitória Italiana, denominada “procedimento d´ingiunzione”, tem a função de tutelar determinados direitos de crédito, em que, “como procedimento monitório documental, haja vista que se exige do autor a comprovação do crédito alegado, limitando o procedimento somente aos “créditos de importância determinada em dinheiro ou coisas fungíveis, e entrega de bem móvel determinado” (HADDAD, 2006). Ou seja, para o direito italiano, a ação monitória seria um meio ou via alternativa de ação condenatória, em que, por meio de um mandado expedido pelo juiz, cria-se uma ordem de pagamento de quantia certa ou coisa móvel no prazo de 20 (vinte) dias dando ao réu apenas duas opções: opor-se “contra o mandado ou submetendo a execução forçada” (HADDAD, 2006).

Nesse sentido, e voltando ao direito brasileiro, consoante Humberto Theodoro, a lide em torno da ação monitória é “superficial”, ou seja, os motivos de oposição do réu perante a pretensão do demandante são praticamente inexistentes pelo fato da natureza da relação de direito material em que se funda a pretensão do autor é reconhecida pelo réu, sendo quase desnecessário contestá-la (THEODORO JR. 2014).

No procedimento especial da ação monitória, para Humberto Theodoro, o credor propõe ação que pretende, com base em provas escrita e sem força de título executivo, “pagamento de soma de dinheiro, entrega de coisa fungível ou determinado bem móvel”, em que, o autor, em fase de rito ordinário, pedi ao juiz a expedição de um mandado de injunção (monitório) para que a dívida seja saldada dentro do prazo que fora estabelecido em lei. Após citação do réu, este receberá prazo, não para contestar mas, para entrar com embargos (eventualmente) ou simplesmente pagar a dívida, caso não o faça, o juiz o declarará revel e o prazo para o pagamento prescrevendo, fará com que o rito passe a ser de execução forçada ganhando o título força executiva segundo art. 1.102-C do CPC (THEODORO, 2014). Esclarece Theodoro ainda:

O ato judicial parte de convencimento liminar e provisório de que o credor, pela prova exibida, é realmente titular do direito subjetivo que lhe assegura a prestação reclamada ao réu. Daí ser possível, desde logo, ordena-lhe que proceda o pagamento, tal coo se faz no despacho da petição inicial da ação de execução por título extrajudicial. Como, todavia, não há, ainda, título executivo, não é possível, ainda, cominar ao réu a sanção da penhora ou apreensão de bens. [...] A diferença, porém, entre o procedimento comum de cognição e o procedimento monitório está em que o contraditório, naquele, é instaurado obrigatoriamente pelo autor; enquanto, no último, o contraditório é de iniciativa do réu (por meio de embargos) e, acima de tudo, é meramente eventual. [...] Se, destarte, o réu não se interessar pelo aforamento dos embargos, não se instaurará contraditório algum e, de plano, o credor terá acesso ao processo de execução, por simples decurso de prazo e em consequência da preclusão do direito do devedor embarcar a ação monitória. (THEODORO, 2014, p. 324-345).

Dessa forma, complementa Emmanuel G. Haddad que, a natureza jurídica da ação monitória aderida no Brasil se difere da constituída na Itália, pois, no direito processual civil brasileiro, o mandado monitório é diferente da ação condenatória. “Desta forma, a ação monitória é uma das espécies do processo de conhecimento, de cunho condenatório, mas sem confundir com a ação condenatória”. A diferença está nos efeitos e no procedimento tomado entre as duas ações, em que: na ação monitória, há um mandado inicial, sendo este, o mandado monitório, o qual produz efeitos imediatos e provisórios; já, na ação condenatória, não há um provimento de efeito imediato; outra diferença se dá pela forma de procedimento, em que, na ação monitória se constitui em rito especial e a ação condenatória se dá apenas em rito ordinário e sumário (HADDAD, 2006).

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3. PRESCRIÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO E DA AÇÃO EXTRAJUDICIAL NO PROCEDIMENTO MONITÓRIO.

Para melhor entender a transição da ação monitória em ação de execução forçada, necessário se apresenta entender quando se é possível recorrer ao instituto da ação monitória em relação aos títulos de créditos. Segundo Marcelo M. Bertoldi e Marcia Carla Pereira Ribeiro, “a ação cambial com o objetivo de executar o cheque sem provisão de fundos prescreve em 6 meses, contados da expiração do prazo de apresentação do título” (BERTOLDI; RIBEIRO, 2008), sendo tal prazo de apresentação do cheque, será de 30 dias quando se tratar da mesma praça seguido dos 6 meses para prescrever e 60 dias mais 6 meses quando o cheque for de outra praça, segundo o disposto no art. 59 da Lei dos Cheques. Exceção a esta regra se dá com os cheque pré-datados, em que, a contagem do prazo prescricional dessa espécie de cheque só “tem início a partir da data de apresentação do cheque ao sacado, mesmo que a data do título seja posterior à sua apresentação” (BERTOLDI; RIBEIRO, 2008).

Segundo Marcelo Colombelli Mezzomo, no decorrer do prazo prescricional da ação monitória, o qual pode variar de acordo com as espécies de títulos, permite-se auferir, segundo o ordenamento atual, possibilidades do título ser objeto de execução, “se presentes os pressupostos para tanto” (MEZZOMO, 2008). A grande dúvida que paira está na questão de qual espécie de título pode ser veiculada à ação monitória após prescrito o prazo que lhe concedia força executiva.

Ainda no pensamento de Marcelo Colombelli, este afirma que, sendo as espécies de títulos de créditos, regidos pela ação monitória, sendo de dívidas líquidas constantes de instrumentos públicos ou particular, entende-se por interpretação do Código Civil atual que, segundo art. 206, parágrafo 3º, inciso IV, o prazo de prescrição dos títulos de crédito são os mesmos dos títulos de obrigações cambiárias, ou seja, o prazo, por lei, é de 3 anos para se mover ação monitória (MEZZOMO, 2008). Isso significa que, tais títulos, sendo eles de ações cambiais, prescrevem em 6 meses, estando prescritos, possuem 3 anos para ajuizar o procedimento monitório, e elucida, o autor, ainda mais:

Logo, a prescrição em caso de títulos de crédito deve ser contada em duas etapas. A primeira se inicia com o vencimento e refere-se a uma pretensão executiva, com prazo da lei especial ou de três anos, ex vi do artigo 206, parágrafo 3º, inciso VIII,do CC. [...]Surge então, novo prazo prescricional, desta feita não relativo à obrigação cambiária, mas à obrigação de restituição, em relação a qual o título de crédito é, em relação ao feito monitório movido, mera prova material, e não fonte de obrigação. Prescrito o título, incontinenti inicia-se o lapso prescricional da pretensão de reaver o valor escudada na vedação ao enriquecimento indevido, a qual terá prazo de três anos. (MAZZOMO, 2008).

Já em relação ao prazo prescricional da ação monitória, para configuração da força executiva sobre o título, existe uma divergência doutrinária e jurisprudencial para o tempo exato a ser estabelecido. De acordo com Marco Túlio R. Carvalho, após passado o período de 6 (seis) meses, o cheque perde sua força de título executivo extrajudicial, sendo, então, possível a propositura de ação monitória para resgatar o crédito. Todavia, o prazo prescricional (ou decadencial) dessa ação monitória, para que o mandado de injunção seja exercido como execução forçada, não possui um período determinado na doutrina brasileira (CARVALHO, 2012), como ainda afirma o autor:

Há divergência doutrinária e jurisprudencial a respeito do prazo prescricional após a perda de sua força executiva para o ressarcimento judicial de cheque prescrito, suscitando dúvidas quanto à necessidade do transcurso de biênio, triênio, quinquênio ou decênio, ou seja, dois, três, cinco ou dez anos para a consumação do lapso prescricional. No entanto, o posicionamento majoritário da doutrina e jurisprudência se dirige no sentido da adoção do prazo de cinco anos atrelado à ação monitória [...]A legislação especial, qual seja, a Lei do Cheque (Lei nº 7.357/1985) especificamente no artigo 61, estatuiu que o prazo prescricional da ação de locupletamento sem causa seria de dois anos quando não houvesse o pagamento do cheque, a contar da perda de sua força executiva [...] A fundamentação quanto ao prazo de três anos diz respeito ao entendimento que seria considerado como enriquecimento sem causa, submetendo ao prazo constante do artigo 206 §3º inciso IV do Código Civil. [...] Quanto ao prazo quinquenal, este lastreia-se no artigo 206 §5º inciso I, com referência à pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular. [...] O prazo decenal diz respeito à corrente cujo entendimento seria quanto ao não cabimento em qualquer das hipóteses, aplicando supletivamente o artigo 205 do Código Civil Brasileiro. (CARVALHO, 2012).

Nesse sentido, existem vários prazos que, são eles: de 2 (dois) anos, 3 (três) anos, de 4 (quatro) anos, de 5 (cinco) e de 10 (dez) anos. Porém, sobre o entendimento majoritário da doutrina e da jurisprudência, o prazo de prescrição é de 5 anos, em que, na jurisprudência do STJ, afirma-se:

[...] caso o portador do cheque opte pela ação monitória, como no caso em julgamento, o prazo prescricional será quinquenal, conforme disposto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil e não haverá necessidade de descrição da causa debendi. 4. Registre-se que, nesta hipótese, nada impede que o requerido oponha embargos à monitória, discutindo o negócio jurídico subjacente, inclusive a sua eventual prescrição, pois o cheque, em decorrência do lapso temporal, já não mais ostenta os caracteres cambiários inerentes ao título de crédito.

(STJ, REsp 926312/SP, Ministro Luís Felipe Salomão, 17/10/2011).


4. AJUIZAMENTO DA AÇÃO MONITÓRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA.

Entendido a questão referente a admissibilidade da espécie de título de credito que, mesmo prescrito, pode ser recobrado por meio de ação monitória fazendo-o, por ordem judicial, executável mais uma vez, questiona-se agora a admissibilidade de tal ação contra a Fazenda Pública. Para Antonio Darienso Martins, ao citar José Rogério Cruz, afirma que o procedimento monitório traçado em execução por quantia certa contra a Fazenda Pública não se amolda, ou seja, seria impraticável emitir ordem de pagamento por meio de ação monitória à Fazenda Pública, pois, “basta atentar-se para a regra do inc. II do art. 730 do CPC, impositiva do "pagamento na ordem de apresentação do precatório", para concluir-se pela inadmissibilidade do procedimento monitório em face da Fazenda Pública” (CRUZ apud MARTINS, s/d). Além disso, completa Humberto Theodoro Jr. que, “a Fazenda Pública tem a garantia do duplo grau de jurisdição obrigatório, a ser aplicado em qualquer sentença que lhe seja adversa” (THEODORO JR, 2014).

Entretanto, conclui Humberto Theodoro, que, conforme jurisprudência do STJ (Súmula n° 339/STJ), é cabível a ação monitória contra a Fazenda Pública afirmando que, pela aplicação dos artigos 1.102-A e 1.102-C, CPC, é possível adaptar o regime especial das execuções ao art. 730 do CPC (THEODORO JR, 2014). Segundo acordão do REsp. 281.483/RJ, o STJ ainda afirma:

Embora perte da doutrina irresigne-se contra expedição initio litis do mandado de pagamento ou de entrega de coisa contra o Estado, tal argumento deve sofrer atenuações em sua interpretação. Nada impede que a Fazenda reconheça o seu débito e efetue a obrigação exigida pelo credor, cumprindo voluntariamente a ordem injuntiva, sem desrespeitar o sistema do precatório. [...] Se rejeitados os embargos, após submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição, prossegue-se a execução, em caso de quantia certa [...] em obediência ao sistema dos precatórios previsto no art. 100 da CF/88. [...] Se a Fazenda não apresentar embargos, constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial. [...] Na conversão do mandado de pagamento em título. (THEODORO JR. 2014, p. 353-354).

Também complementa André Luiz Maranhão que, acompanhado de uma doutrina majoritária, afirma não ver “incompatibilidade na utilização da ação monitória contra a Fazenda Pública, posto que tanto o procedimento monitório quanto o ordinário possibilitam o exercício da cognição plena desde que a Fazenda Pública ofereça embargos”, pois, segundo o autor, não há qualquer razão para se distinguir entes públicos de privados, sendo que, a impossibilidade de se ajuizar ação monitória contra a Fazenda Pública seria um ferimento ao princípio da isonomia (MARANHÃO, 2010).

4.1 Possibilidade da citação por edital e confissão ficta contra órgão público.

Segundo Rafael Fernandes Maciel, o procedimento monitório consta subsidiariamente no livro I, do CPC, não havendo qualquer norma que impeça a constituição de uma citação edilícia referente a ação monitória. “Mesmo porque, inexiste qualquer vedação legal. O Livro IV, Título I, Capítulo XV, que trata da ação monitória não prevê qualquer óbice à esta modalidade citatória, utilizando-se então, subsidiariamente as normas que concernem ao procedimento ordinário, como supra dito, previsão do artigo 272, parágrafo único” (MACIEL, 2002). Todavia, afirma André Luiz Maranhão que, em doutrina minoritária, a citação por edital não seria possível por conta de que a citação ficta, que pode gerar a revelia, “acarreta a transladação do procedimento monitório em execução, devendo dessa forma, ser realizada sempre por oficial de justiça” (MARANHÃO, 2010). Porém, esta é uma doutrina minoritária, sendo que, a doutrina majoritária firma no entendimento que, como o Código de Processo Civil não traz nenhum impedimento, então qualquer forma de citação é permitida ao procedimento monitório (MARANHÃO, 2010).

Entretanto, segundo Antonio Darienso, não havendo qualquer impedimento legal para às formas de citação por edital no procedimento monitório e, caso não haja resposta do réu, presumir confissão ficta e inclusive gerar revelia à parte (MARTINS, s/d), tal citação não poderia causar os mesmos efeitos contra a Fazenda Pública. Além disso, completa Humberto Theodoro Jr. que, “a Fazenda Pública tem a garantia do duplo grau de jurisdição obrigatório, a ser aplicado em qualquer sentença que lhe seja adversa” (THEODORO JR, 2014). Afirma, ainda, que a Fazenda Pública não se sujeita ao precatório sem prévia sentença e, por conta do processo ter de prosseguir de forma ordinária, não prevalece a confissão ficta e muito menos a revelia sobre tal órgão público (THEODORO JR, 2014).

Isto, pois, se dá pelo fato dos órgãos públicos estarem protegidos pelo princípio do duplo grau de jurisdição que, de acordo com Humberto Theodoro Jr, “na conversão do mandado de pagamento em título executivo, por falta de embargos à monitória, não fica inibida a reapreciação, na execução do art. 730, da dívida do Tribunal” (THEODORO JR, 2014, p. 354). Ou seja, pelo fato de estar resguardada sobre a possibilidade de sempre poder reapreciar a ação ajuizada contra ela (Fazenda Pública), haverá sempre a prerrogativa do “Estado de que contra ele não prevalece a regra da confissão ficta e a incidência dos efeitos da revelia” (THEODORO JR, 2014, p. 354), tratando-se de direito indisponível.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Partindo do pressuposto de que a ação monitória se trata de um instituto capaz de garantir ao seu titular direito de receber o crédito pelo qual lhe pertence como legítimo credor na relação, conclui-se que, tal procedimento, mesmo possuindo divergências quando aos prazos de prescrição e sua admissibilidade contra órgão públicos, não deixa de ser um meio processual que garante celeridade e economia em diversos sentidos jurisprudenciais às partes processuais.

Sobre o entendimento majoritário da doutrina e mesmo sobre o entendimento jurisprudencial, a ação monitória, como medida processual especial, tem todas as características capazes de promover e resguardar o direito do credor legítimo a receber seu crédito do título prescrito. Isto, pois, essa relação jurídica envolve direito líquido e certo provido de verossimilhança em prova escrita, sendo quase ou de difícil oposição por parte do réu devedor. Nesse sentido, não importa se o prazo de prescrição ou decadência para conversão do mandado de segurança em título de execução forçada não seja firmado doutrinariamente, o que importa é que, na ação monitória, a devida prestação jurisdicional ao autor-credor será, por pagamento sem embargos ou por revelia, reafirmado.

Também, conclui-se que, não havendo possibilidade de auferir citação por edital ou a promoção de confissão ficta por parte de órgão públicos em favor de particulares, a doutrina majoritária e a jurisprudência já firmaram entendimento que a ação monitória é possível contra a Fazenda Pública, bastando que os requisitos do instituto sejam respeitados. Dessa forma, caso haja direito lesado por órgão público contra um particular, pode-se entender que, para maior celeridade processual e em respeito ao princípio da isonomia, entre outros direitos fundamentais, é possível ajuizar ação monitória contra tais entes públicos.


REFERÊNCIAS

BERTOLDI; RIBEIRO, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

BRASIL. STJ. 4ª turma. REsp 926312 SP 2007/0035619-0, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 20/09/2011, Dje de 17/10/2011. São Paulo, SP. Disponível em:< https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/21061191/recurso-especial-resp-926312-sp-2007-0035619-0-stj> acesso em: 10 de maio 2015.

CARVALHO, Marco Túlio Rios. Ações cambiais e prazos prescricionais de títulos de crédito. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 out. 2012. Disponivel em: <https://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.40079&seo=1>. Acesso em: 09 maio 2015.

HADDAD, Emmanuel Gustavo. A ação monitória no direito brasileiro. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, IX, n. 35, dez 2006. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1489>. Acesso em: 09 maio 2015.

MACIEL, Rafael Fernandes. Possibilidade de citação por edital na ação monitória. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/2995/possibilidade-de-citacao-por-edital-na-acao-monitoria> acesso em: 16 de mar. 2015.

MARANHÃO, André Luiz. Aspectos polêmicos da ação monitória na processualística civil brasileira. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n. 78, jul 2010. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8111>. Acesso em mar 2015.

MARTINS, Antonio Darienso. Da ação monitória (procedimento monitório). Disponível em: https://br.monografias.com/trabalhos/acao-monitoria-procedimento-monitorio/acao-monitoria-procedimento-monitorio3.shtml acesso em: 19 de mar. 2015.

MEZZOMO. Marcelo Colombelli. LAPSO PRESCRICIONAL: Prescrição da ação monitória dos títulos de crédito. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2008-dez-07/prescricao_acao_monitoria_titulos_credito>. Acesso em: 17 de mar. 2015.

THEODORO JR. Humberto. Curo de Direito Processual Civil – Procedimentos especiais – vol. III – Rio de Janeiro: Forense, 2014.

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Sobre os autores
Alexander Barbosa F. dos Santos

Bacharel em direito pela Unidade de Ensino Superior Com Bosco (UNDB). Advogado licenciado. Assessor jurídico no Tribunal de Justiça do Maranhão.

Wenderson da Silva Martins

Aluno do 9º período, Vespertino, do Curso de Direito, da UNDB.

Humberto Oliveira

Professor, Esp., orientador.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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