Tema bastante controverso, a redução da maioridade penal vem conquistando um número cada vez maior de adeptos, que, pressionados pela sensação generalizada de insegurança, veem a sua implantação como a única solução imediatamente possível para a diminuição da criminalidade praticada entre menores infratores.
Inicialmente, tem-se que o conceito de inimputabilidade, no qual se inserem os menores de 18 (dezoito) anos, deveria ser revisto. Vige desde o século XIX a teoria, conforme o sistema biológico, de que crianças e adolescentes não possuiriam o desenvolvimento intelectual e psicológico completo, necessário e essencial para a responsabilização criminal nos termos do Código Penal.
Considerando-se as transformações ocorridas com a sociedade, em que os jovens têm maior acesso às informações e participam de forma cada vez mais autônoma das diversas relações sociais, ter-se-ia por inescusável o conhecimento da lei, é dizer, daquilo que é ou não lícito.
O Direito, como fato social, que se origina na sociedade, visa satisfazer às necessidades da própria. Adequando-se à realidade atual, o jovem possuiria plena capacidade intelectiva, não só para compreender a reprovabilidade de determinadas condutas, mas para ser responsabilizado de acordo com a gravidade delas.
Tanto é assim, que o Código Civil, em seu art. 4º, I, prevê a capacidade relativa da pessoa com 16 (dezesseis) anos completos, permitindo-lhe casar, continuar atividade empresária já iniciada, dispor de seu patrimônio em testamento, ser emancipado, dentre outras hipóteses. Não bastasse, a Constituição Federal, vide art. 14, autoriza que os menores púberes (com 16 anos), possam exercer o direito de voto. Ora, seria inconcebível a presunção de capacidade intelectiva para tais atos e sustentar que os jovens infratores não possuem plena consciência dos ilícitos porventura cometidos.
Com efeito, continuar a repetir tais discursos seria desconsiderar a mutação constante da sociedade, e fechar os olhos para o elevado número de crimes cometidos por menores, acobertados pela certeza da impunidade.
A impunidade, certamente, seria a causa precípua da ocorrência, cada vez maior, de ilícitos entre os adolescentes.
Certos de que se capturados não sofrerão restrição de liberdade por não mais de 03 (três) anos, os jovens infratores ver-se-iam atraídos por essa vantagem, que a despeito de sua finalidade inicial, qual seria, de proteger crianças e adolescentes, teria se transformado em verdadeira causa motivadora à prática de novos ilícitos.
É dizer, a impunidade, além de constranger, desrespeitar e violar os direitos das vítimas de crimes cometidos por menores infratores, incentivaria a prática de novos ilícitos, bem como a formação de novos infratores.
Outrossim, não seria tão relevante, tendo em vista a necessidade imediata da reprimenda estatal à criminalidade, a discussão prospectiva se a redução da maioridade diminuiria ou não o índice de criminalidade, apesar de que existiriam robustos elementos que assim confirmassem. Isso porque, haveria a necessidade concreta, atual e iminente, de que houvesse eficaz reprimenda a ilícitos praticados por menores.
O elevado índice da criminalidade e o aumento da crueldade com que seriam cometidos tais ilícitos exigiria uma punição por parte do Estado prática e eficaz, sob pena da vida em sociedade tornar-se insustentável.
Seria desarrazoado que menores infratores, com plena consciência do ilícito cometido, não viessem a ser responsabilidades conforme a gravidade de seus atos. Tal possibilidade, vista em apartado às maiores discussões sobre o assunto, beiraria à injustiça, em seu conceito mais vocabular.
Justo seria, portanto, a aplicação do sistema biopsicológico, onde fosse possível a aferição da capacidade compreensiva da ilicitude do ato praticado através de laudo médico.
Em sendo atestada a plena capacidade, e respeitado o devido processo legal e a ampla defesa, os menores infratores poderiam responder, se o caso, ao cumprimento de pena em unidades carcerárias pelo tempo previsto para cada tipo penal.
Entretanto, é sabido que as unidades carcerárias, além de não permitirem a ressocialização, atuariam como verdadeiras escolas do crime. Assim, semelhantemente às divisões ocorridas entre as populações carcerárias femininas e masculinas, impor-se-ia a criação de um sistema carcerário diferenciado, apto para receber menores infratores, de modo a não submeter tais menores, que fazem jus à proteção estatal, às piores condições de cumprimento de pena, nos termos do inciso XLVIII, art. 5º, da Carta Republicana, segundo o qual “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”.
A respeito da internação, espécie mais grave de medida socioeducativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, aplicada para crimes como homicídios, latrocínio ou estupro, onde há a restrição de liberdade do indivíduo, seria latente a desproporcionalidade e incompatibilidade de tal reprimenda com a gravidade do crime, bem como a inutilidade do “caráter ressocializador” esperado da pena.
Com efeito, inexistiria inconstitucionalidade da Proposta de Emenda à Constituição n. 171/93, visto que o art. 228 da Carta Republicana, segundo o qual “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”, ao reduzir a idade de 18 (dezoito) para 16 (dezesseis) anos, não estaria abolindo e sequer reduzindo direitos e garantias individuais, mas tão somente readequando a norma jurídica à realidade social.
Os direito individuais são, em sua essência, direitos adquiridos historicamente, para barrar os abusos do Estado, razão pela qual o Constituinte originário objetivou protegê-los, erigindo-os a cláusulas pétreas. Sucede que o Direito, a par da sociedade, é mutável, e constituído de premissas lógicas que o justifique. Assim, não haveria supressão de direito fundamental acaso fosse proposta emenda tendente a abolir a indenização por erro judiciário se vivêssemos em uma sociedade ideal em que o Poder Judiciário não cometesse erros[1].
Como se verifica, são muitos os argumentos aptos a sustentar a possibilidade de redução da maioridade penal, não se sabe ao certo se válidos ou não. A única certeza, no entanto, é que são oriundos do clamor de uma sociedade amedrontada com a crescente onda de violência entre os jovens.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
GONZáLEZ, Rodrigo Stumpf. A inimputabilidade penal do adolescente: Controvérsias sobre a idade. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, X, n. 46, out 2007. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2256>. Acesso em nov 2016.
[1] Art. 5º, LXXV. O Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.