O significado da expressão “negar seguimento” no NCPC

20/02/2017 às 15:22

Resumo:


  • O relator podia negar seguimento a recurso nos casos de inadmissibilidade, improcedência, prejudicialidade ou confronto com súmula ou jurisprudência dominante no CPC/1973.

  • No NCPC, a expressão "negar seguimento" foi substituída por "agravo interno" antes da Lei nº 13.256/2016.

  • A Lei nº 13.256/2016 reintroduziu a expressão "negar seguimento" para casos específicos de REsp e RE, atribuindo ao presidente ou vice-presidente do tribunal a competência de julgá-los no mérito.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A expressão “negar seguimento” foi ressuscitada pela nova Lei, mas só será empregada quando o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em caso de interposição de RE ou REsp, os admita, mas lhes negue provimento.

Para bem se compreender a matéria da epígrafe, aconselhável dividi-la em três períodos. O primeiro, abrange o da vigência do CPC/1973. Os segundo e terceiro abarcam o NCPC antes e depois da Lei nº 13.256/2016.

No CPC revogado, a locução aparecia no caput do art. 557: “O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante (...)”. Como se vê, o relator em quatro casos poderia agir assim. Em dois deles, não conhecia do recurso (isto é, sequer lhe apreciava o mérito, em virtude da falta de um dos requisitos de admissibilidade); e nos outros dois, conhecia do recurso, mas lhe negava provimento. Examinemos mais de perto as quatro situações que se ofereciam ao relator para negar seguimento ao recurso. Antes, porém, cabe dizer que negar seguimento é um termo de fácil entendimento. O relator, como se sabe, é quem uma vez sorteado tomará o primeiro contato com o recurso (vale o mesmo para os casos das ações de competência originárias dos tribunais, como, por ex., a ação rescisória) relativamente aos outros juízes integrantes do colegiado a que ele pertence, e que será o órgão responsável pelo julgamento. Os recursos chegados ao tribunal obedecerão a um trâmite previsto na lei processual. Haverá em primeiro lugar a distribuição por sorteio eletrônico. Ela fixará o relator (art. 930 NCPC). Depois, os autos ser-lhes-ão conclusos (art. 931) e caberá a ele ordenar, dirigir e aprontar o recurso para julgamento a ser feito, em regra, pelo órgão colegiado que ele integra.

Negar seguimento a recurso é pura e simplesmente impedir que seja apreciado pelo colegiado; relator nota que, caso contrário, será perda de tempo. E em atenção ao princípio da economia processual tranca o trâmite do recurso. No CPC/1973 estava habilitado a agir dessa maneira nas quatro hipóteses elencadas no caput do art. 557. Se o recurso fosse manifestamente inadmissível (por exemplo, se não foi preparado na origem, seria desaconselhável permitir sua ida à sessão de julgamento; atentaria contra o princípio supra mencionado). Diga-se o mesmo para os casos em que o recurso estivesse prejudicado ou, como também se diz, tivesse perdido seu objeto. (Por recurso prejudicado deve se entender aquele que supervenientemente perdeu seu objeto. Havia por parte do recorrente interesse no julgamento. Mas, em virtude de certos acontecimentos posteriores, esse interesse desapareceu. Por exemplo, § 1º do art. 1.018 do NCPC ou art. 529 do CPC/1973.)

Nessas duas situações, o juiz relator sequer conhecia do recurso e justamente por isso, negava-lhe seguimento. Nos outros dois casos, a decisão denegatória era por motivo de mérito. O recurso era conhecido, mas o relator negava-lhe provimento. Quando isso ocorria? Quando o recurso fosse [manifestamente] improcedente ou se a tese jurídica nele contida estivesse em franca oposição a jurisprudência de tribunal superior ou de segunda instância, inclusive e principalmente a compendiada nas respectivas Súmulas. No contexto do CPC/1973, o recurso cabível contra tal decisão era o previsto no § 1º do art. 557, denominado meramente de agravo. Seria dirigido ao próprio relator e julgado pelo colégio. O prazo de interposição era exíguo (cinco dias) e dispensavam-se contrarrazões.

No NCPC, antes da Lei nº 13.256/2016, a locução de que aqui tratamos foi banida. Por mais que se lesse, relesse ou treslesse o novo diploma, ela não aparecia. Isso não quer dizer, todavia, que se retiraram os poderes do relator de apreciar unipessoalmente recursos. Ainda poderá não conhecer, negar ou dar provimento a eles (art. 932). Mas o legislador da primeira versão do Código preferiu não repetir a locução “negar seguimento”. Manteve o mesmo recurso contra essas decisões. Porém, adotou a nomenclatura oficiosa: agravo interno (art. 1.021).

A Lei nº 13.256/2016 redimiu a expressão. Ela figura agora no art. 1.030, nº I. E inova frente ao direito anterior, conforme será visto mais adiante.

Em caso de interposição de recurso especial (REsp) e/ou extraordinário (RE), uma vez recebida a petição recursal, a secretaria do tribunal a quo abrirá vista ao recorrido. Com ou sem contrarrazões os autos serão conclusos ao presidente ou vice-presidente que poderá (ou melhor: que deverá) negar seguimento ao recurso nas hipóteses das letras a e b do inciso I do art. 1.030, em um total de três. A saber: 1ª) se o RE discutir “questão constitucional à qual o STF não tenha reconhecido a existência de repercussão geral (RG)”; 2ª) se o RE for “interposto contra acórdão que esteja em conformidade com o entendimento do STF exarado no regime de RG”; 3ª) se o RE ou o REsp “for interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do STF ou STJ, respectivamente, exarado no regime de julgamento de recursos repetitivos”.

Se no CPC/1973 (em sua última versão) a inadmissão de RE e/ou REsp desafiava recurso de agravo [nos próprios autos], e se no NCPC (em sua primeira versão) o exame de admissibilidade ficava a cargo do tribunal ad quem (art. 1.030, in fine), a novidade criada pela Lei nº 13.256/2016 é ousada: ao presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido foi dada competência de julgá-los no mérito, tarefa absolutamente proibida anteriormente. E se isso ocorrer, o recurso indicado para impugnar a decisão é agravo interno (art. 1.021 c/c o § 2º do art. 1.030), que cabia apenas para as hipóteses de decisão monocrática de relator de recurso.

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Se em vez de julgar o RE ou o REsp no mérito, o presidente ou vice-presidente inadmiti-los, o recurso cabível já não será agravo interno, mas o agravo   ─sem denominação específica─   do art. 1.042 (§ 1º do art. 1.030).

Em suma, a expressão “negar seguimento” foi ressuscitada pela nova Lei, mas só será empregada quando o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em caso de interposição de RE ou REsp, os admita, mas lhes negue provimento.

Pode ocorrer que na mesma decisão, o presidente do tribunal recorrido negue seguimento ao recurso em relação a determinada questão levantada pelo recorrente e não o admita frente a outra questão (por exemplo, o recorrente quer rediscutir matéria probatória, contrariando a súmula  nº 7 do STJ). Cabem dois recursos: agravo interno contra a primeira decisão; e agravo do art. 1.042 contra a segunda (de inadmissão), o que obrigará ao recorrente redigir duas petições recursais distintas.        

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Sobre o autor
Celso Anicet Lisboa

Professor de Direito Processual Civil na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Advogado com escritórios no Rio de Janeiro (RJ) e em São Paulo (SP).

Informações sobre o texto

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