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As teorias da pena e sua evolução histórica

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Resumo:


  • As penas evoluíram de formas de vingança privada e intervenção divina para um sistema onde o Estado é responsável por aplicá-las, visando a retribuição, prevenção e ressocialização do infrator.

  • O Código Penal de 1940, ainda em vigor, reflete a adoção da teoria unitária da pena, que busca tanto a retribuição pelo delito quanto a prevenção de futuros crimes e a ressocialização do delinquente.

  • Diferentes teorias penais buscam justificar a aplicação de penas pelo Estado, variando entre as teorias absolutas, que veem na pena uma forma de retribuição pelo crime, e as relativas, que focam na prevenção de novos delitos e na ressocialização do criminoso.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. TEORIAS PENAIS

É imprescindível ressaltar a existência de três teorias que amparam e esclarecem o objetivo da pena, sendo essa, resultante de conduta ilícita, antijurídica e culpável, e atribuída ao infrator da lei penal, ou seja, é considerado um modo do Estado aplicar a norma, com efeito, ao caso concreto. Duas das teorias fazem do Estado o órgão legítimo à sua aplicação em proveito da segurança jurídica, da defesa e paz social, por meio da restrição de liberdade do indivíduo - são as absolutas e as relativas - e também há aquela que desconsidera a eficácia da pena e então subestima sua legitimação, como é o caso da teoria mista.

Inicialmente, a teoria absoluta ou retribucionista, cujo conceito deriva da premissa de que a pena possui funções de castigo e repressão, e com raiz navingança, espécie mais primitiva de utilização da pena, foi empregada na Idade Antiga e na Idade Média e possuía como paradigmao princípio da Lei de Talião – “olho por olho, dente por dente”

De forma compreensível, manifesta Juarez Cirino dos Santos:

A sobrevivência histórica da pena retributiva – a mais antiga e, de certo modo, a mais popular função atribuída à pena criminal – parece inexplicável: a pena como expiação de culpabilidade lembra suplícios e fogueiras medievais, concebidos para purificar a alma do condenado; a pena como compensação de culpabilidade atualiza o impulso de vingança do ser humano, tão velho como o mundo. (SANTOS, 2005, p. 4).

Para a aludida teoria, cuja origem advém do idealismo alemão e com ateoriade Kant, a pena é nada mais que um modo de retribuir - tanto num caráter divino, jurídico ou moral - ao indivíduo para compensar o ato ilícito e mal que foi causado a uma pessoa em particular ou à sociedade por ele anteriormente,considerando que o ser humano é possuidor de um livre arbítrio hábil para fazer escolhas, entre elas delinquir ou ser obediente às regras sociais.

A pena é baseada meramente na retribuição, na expiação, na reparação ou na compensação do mal advindo do crime e a sociedade é defendida por meio de sua aplicação. É denominada de absoluta, pois o propósito da pena é independente e não se vincula a qualquer efeito social, ou seja, a pena apenas é imposta e aplicada pelo fato do indivíduo ter cometido um delito, jamais seria necessária se o intuito fosse de impulsionar outro bem.

Ainda segundo Kant (apud MIRABETE, 2002, p. 244), a pena deriva de um imperativo categórico e mesmo que a sua imposição não traga benefício nem para o condenado e nem para a comunidade ela deve ser aplicada pela simples ocorrência do delito. Para o filósofo, a pena era uma forma de prática obrigatória e incondicionada, considerada então, como uma necessidade moral, podendo assim ser chamada de teoria da retribuição moral.

Considerando que a pena é um mal justo que penaliza o mal injusto ora praticado, expõe Mirabete:

Dizia Kant que a pena é um imperativo categórico, consequência natural do delito, uma retribuição jurídica, pois o mal da pena, do que resulta a igualdade e só esta igualdade traz a justiça. O castigo compensa o mal e dá reparação à moral. O castigo é imposto por uma exigência ética, não se tendo que vislumbrar qualquer conotação ideológica nas sanções penais. Para Hegel, a pena, razão do direito, anula o crime, razão do delito, emprestando-se à sanção não uma reparação de ordem ética, mas de natureza jurídica. (MIRABETE, 2002, p.244).

Ademais, destaca Ferrajoli:

As doutrinas absolutas ou retributivistas fundam-se todas na expressão de que é justo “transformar mal em mal”. Trata-se de um princípio com origens seculares, e que está à base daquele arcaico instituto, comum a todos os ordenamentos primitivos, que é a “vingança de sangue”. (FERRAJOLI, 2010, p.236).

No sentido dessa teoria, seu escopo é a punição do condenado, que responde com outro mal ao delito por ele praticado. Não se leva em consideração o fato de ressocializá-lo, nem reeducá-lo e muito menos garantir sua dignidade e sequer reparar o dano que foi causado pela delinquência, visto que a pena é aplicada na transgressão da lei, objetivando unicamente a realização de justiça, sem preocupação com a pessoa do delinquente.

Sobre o aludido, Magalhães Noronha afirma:

As absolutas fundam-se numa exigência de justiça: pune-se porque se cometeu crime (punitur quia peccatum est). Negam elas fins utilitários à pena, que se explica plenamente pela retribuição jurídica. È ela simples conseqüência do delito: é o mal justo oposto ao mal injusto do crime. (NORONHA, 2000, p. 223).

Ainda no que se refere, Cita GamilFöppel que:

Finalmente, é de se observar que, para as Teorias absolutas, é absolutamente indispensável que seja aplicada a sanção penal. Deixar de executar uma sentença representaria, para os adeptos da corrente, uma renúncia ao Direito e à Justiça. (FOPPEL, 2004, p.13).

Em diferente interpretação acerca do caráter da pena, Hegel, diante dateoria da retribuição jurídica, afirma que a pena não é considerada simplesmente como um mal, e sim é como o modelo de restauração da ordem jurídica uma vez infringida. Para ele, a justiça se concretiza através de um princípio valorativo moldável, respaldando-se em aspectos da lesão concreta e em acontecimentos da sociedade.

O supracitado filósofo também concebe a pena como sendo a negação da negação, uma vez que o crime é como a negação do direito, e a pena, então, é a negação do crime.

Nessa perspectiva, Paulo Queiroz afirma:

Convém dizer que, tanto em KANT quanto em HEGEL, a justificação da pena é uma justificação ‘idealista’. Significa dizer que o direito penal de que aí se trata não é o direito como ele é, histórica e praticamente, mas como deve ou deveria ser, idealmente falando. Daí porque, ainda que tal fundamentação do direito de punir não tenha correspondência na realidade jurídica, nem por isso tal teorização perde o seu significado e o seu valor. (QUEIROZ, 2005, p.19).

Há que se destacarem aspectos positivos quando se percebe a garantia dada ao cidadão em relação aos possíveis abusos que poderiam ser causados pelo Estado na aplicação da pena, uma vez que a punição é proporcional à gravidade do fato e também à culpa do autor.

Contrário à garantia supracitada,ressalta-se o fato de definir o modo como se deve castigar (o “como” castigar), omitindo quais as condutas a serem utilizadas e quando tais serão aplicadas. É certa a dúvida e inquietação a respeito da compensação de um mal pelo outro.

Sobre o caráter retributivo, Gilberto Ferreira explana que:

A pena é justa em si e sua aplicação se dá sem qualquer preocupação quanto a sua utilidade. Ocorrendo o crime, ocorrerá a pena, inexoravelmente. O importante é retribuir com o mal, o mal praticado. (FERREIRA, 2000, p. 25).

Diante do exposto, é proficiente dizer que a prisão do condenado é resultante do próprio ato ilícito por ele praticado, deixando em evidência o poder estatal através do exercício do “jus puniendi” (direito de punir), evidenciando o aspecto de um Estado guardião.Logo, a teoria parte de um preceito social-negativo e se contradiz com qualquer esforço de ressocialização da pessoa delinquente, opondo-seao intuito da prevenção.

Mediante o exposto sobre a teoria, a inerente relação entre o fato criminoso e a penalidade imposta cooperou para o surgimento do princípio da culpabilidade, norteador do direito penal. Sobre isso, acredita Jorge de Figueiredo Dias:

E aqui reside justamente o mérito das doutrinas absolutas: qualquer que seja o seu valor ou desvalor como teorização dos fins das penas a concepção retributiva teve — histórica e materialmente — o mérito irrecusável de ter erigido o princípio da culpabilidade em princípio absoluto de toda a aplicação da pena e, desse modo, ter levantado um veto incondicional à aplicação de uma pena criminal que viole a eminente dignidade da pessoa humana. (DIAS, 1999, p. 93).

Diversamente, detentora de aspectos humanitário, social, racionalista e utilitário, a teoria relativa, também chamada de preventiva ou utilitarista, aderena aplicação da pena o objetivo de evitar delitos e prevenir crimes, não possuindo uma finalidade a si mesma. Tal teoria advém do caráter humanista, com concepções utilitaristas e associadas ao liberalismo.

Considerando os fins dessa teoria, Prado alega que:

As teorias relativas encontram o fundamento da pena na necessidade de evitar a prática futura de delitos (punitur ut nepeccetur) – concepções utilitárias da pena. Não se trata de uma necessidade em si mesma, de servir à realização da Justiça, mas de instrumento preventivo de garantia social para evitar a prática de delitos futuros. Isso quer dizer que a pena se fundamenta por seus fins preventivos gerais ou especiais. Justifica-se por razões de utilidade social (PRADO,2004,p. 490).

Diferenciando as teorias relativa e absoluta, afirmaFerrajoli:

São teorias absolutas todas aquelas doutrinas que concebem a pena como um fim em si própria, ou seja, como ‘castigo’ ‘reação’, ‘reparação’ ou, ainda, ‘retribuição’ do crime, justificada por seu intrínseco valor axiológico, vale dizer, não um meio, e tampouco um custo, mas, sim, um dever ser meta-jurídico que possui em si seu próprio fundamento. São, ao contrário, ‘relativas’ todas as doutrinas utilitaristas, que consideram e justificam a pena enquanto meio para a realização do fim utilitário da prevenção de futuros delitos. (Direito e razão, p. 204).

A teoria relativa é dividida em prevenção geral, que possui como objetivo a punição do sujeito, intimidando-o, como lição aos demais, sendo direcionada à sociedade em geral, baseando-se principalmente na coação, e a prevençãoespecial, cuja função é ressocializadora e atinge somente a pessoa do criminoso, sendo justa somente a pena necessária.

Tomaz M. Shintati preconiza quanto as finalidades da prevenção especial e da prevenção geral:

A pena tem ainda uma finalidade de prevenção, que constitui a dimensão social da sanção. Finalidade de prevenção especial: a pena visa à ressocialização do autor da infração penal, procurando corrigi-lo. Finalidade de prevenção geral: o fim intimidativo da pena dirige-se a todos os destinatários da norma penal, visando a impedir que os membros da sociedade pratiquem crimes. (SHITANTI, 1999, p. 184).

Acrescenta-se também sobre a prevenção geral na qual há aspectos que são importantes serem brevemente dissertados: tal prevenção é tida como uma ameaça de um mal quando há o cometimento de um ato ilícito, sendo destinada a todos que são afetados pela lei penal; e por possuir uma natureza educativa, ela age ameaçando, por intermédio da pena, quando há lesão em bens jurídicos considerados essenciais, ou seja, ela inibe o indivíduo que está pré-disposto a delinquir.

Há a teoria da prevenção geral negativa ou prevenção por intimidação – caráter negativo que foi o primeiro a ser reconhecido historicamente –fundada na repressão psicológica e que pressupõe a possibilidade de limitar e conter o cometimento de delitos, acreditando que estes existem por motivação psicológica. É a forma tradicional de reação ao delito.

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Feuerbach, expoente da teoria, alega serem úteis os instrumentos de natureza “psicológica” quando utilizados pelo Estado com fim de impedir a violação do Direito e intimidando o indivíduo a novamente delinquir. Tal teoria utiliza a lógica que a incidência da pena seria menor quanto maior fosse sua quantidade aplicada; em outras palavras, quanto maior fosse a pena imposta, maior também seria a intimidação sofrida pelos delinquentes. No entanto é passível de crítica visto que a mesma contrasta com o fundamental princípio da dignidade da pessoa humana ao extrapolar a aplicação da pena com sua real e devida necessidade, fazendo do delinquente um “objeto” de intimidação dos outros. É considerável destacar que não é capaz de supor absolutamente o efeito dessa prevenção, visto que pode interferir de modo influente no homem médio, contudo pode não ter influência em outros tipos de criminosos.

Porventura, há apreciações a serem feitas sobre essa teoria: primeiro em relação ao alcance do poder punitivo do Estado, que com o raciocínio de assustar o indivíduo para evitar os crimes é exageradamente extensa a possibilidade de atos que serão puníveis criminalmente, ficando clara a propensão dessa teoria a disseminar um pânico estatal, ainda pelo fato da teoria não listar os critérios que serão alvos da intimidação, havendo como consequência um aumento exagerado das penas em delitos mais graves ou que sejam mais frequentes, dando a entender a ineficácia do fim intimidativo E segundo BARREIROS (2008, p. 5) “quem pretende intimidar mediante a pena tenderá a reforçar esse efeito, castigando tão duramente quanto possível”.

Outra crítica é difícil consentir que a imposição de uma pena a alguém colabora para que as outras pessoas não pratiquem atos criminosos.

Kant já dizia que o ser humano não pode ser utilizado como meio:

Uma pena fundada exclusivamente na prevenção geral infringe o princípio da dignidade da pessoa humana, uma vez que utiliza o indivíduo como meio para a consecução de fins sociais meramente utilitários, de duvidosa eficácia. (PRADO, 2008, 494).

Ainda com relação às críticas recebidas por essa teoria:

[...] aplicando-se as penas a seres humanos em nome de fins utilitários ou pragmáticos que pretendem alcançar no contexto social, elas transformariam a pessoa humana em objeto, dela se serviriam para a realização de finalidades heterônimas e, nesta medida, violariam a sua eminente dignidade. (NERY, 2005, 3).

Considerando a intimidação não ser a única forma de prevenção geral, tem-se o caráter positivo, a teoria da prevenção geral positiva ou de integração, através da conscientização social da norma e de atitudes demonstrativas de respeito às normas fundamentais e ao Direito. Para a supracitada teoria, o infrator potencial e o delinquente não são os destinatários da pena, mas o cidadão comum que cumpre as leis e normas sociais, como também a opinião pública, ambos os alvos da teoria pela necessidade de intensificar a confiança do cidadão após conviver cotidianamente com delitos.

No tocante ao caráter positivo da prevenção geral que pretende uma incorporação da moral e dos valores sociais, Paulo de Souza Queiroz disserta que:

Para os defensores da prevenção integradora ou positiva, a pena presta-se não à prevenção negativa de delitos, demovendo aqueles que já tenham incorrido na prática de delito; seu propósito vai além disso: infundir, na consciência geral, a necessidade de respeito a determinados valores, exercitando a fidelidade ao direito; promovendo em última análise, a integração social.(apud GRECO, 2007, p. 488).

Sobre a teoria,Zaffaroni e Batista assinalam:

A partir da realidade social, essa teoria se sustenta em mais dados reais que a anterior. Segundo ela, uma pessoa seria criminalizada porque com isso a opinião pública é normalizada ou renormalizada, dado ser importante o consenso que sustenta o sistema social. Como os crimes de “Colarinho Branco” não alteram o consenso enquanto não forem percebidos como conflitos delituosos, sua criminalização não teria sentido. Na prática, tratar-se-ia de uma ilusão que se mantém porque a opinião pública a sustenta, e convém continuar sustentando-a e reforçando-a porque com ela o sistema penal se mantém: ou seja, o poder a alimenta para ser por ela alimentado. (ZAFFARONI e BATISTA, 2003, p. 122).

Projetando a função da pena como necessária para preservação da ordem social ou então ela seria um mal inútil, e admitindo que a vigência da norma se legitima através da aplicação da pena, Jakobs acrescenta:

Prevenção geral porque pretende-se produzir um efeito em todos os cidadãos; positiva, porque esse efeito não se pretende que consista em medo diante da pena, e sim em uma tranquilização no sentido de que a norma está vigente, de que a vigência da norma, que se viu afetada pelo fato, voltou a ser fortalecida pela pena. (JAKOBS, 2003, p. 35).

Destarte, a teoria da prevenção especial pode ser subdividida também em negativa e positiva, no entanto seu viés principal é obstar o acontecimento de novos delitos e evitar a reincidência recaindo sobre o indivíduo infrator comobjetivo de intimidar os demais ao demonstrar as penalidades e consequências após a prática do delito. Observa-se aqui o foco na pessoa do condenado, e não mais na sociedade.

Os adeptos a essa teoria dizem medidas ao invés de pena, pois essa última acarreta a capacidade racional ou a liberdade do indivíduo e parte de uma definição geral de igualdade, já a medida presume ser o delinquente um sujeito perigoso e impõe a ele tratamentos conforme sua periculosidade.

De acordo com Von Liszt, o principal expoente da teoria, a ressocialização, que é o objetivo da pena, é realizada por três meios: pela intimidação, que é a pena tida como uma advertência para o possível criminoso; a ressocialização, quando o delinquente pratica crimes reiteradamente e por fim, o asseguramento, último e extremo meio, pois se utiliza do isolamento.

É evidente a existência de críticas em relação à mencionada teoria, pois ao buscar a ressocialização, muitos veem que ela faz dessa busca como o seu fim principal e até mesmo único, mas que omite a existência de uma imposição legal que já acontecera antes disso. E ainda, como a teoria adere a um caráter ressocializador, há a questão que permeia sobre a necessidade, ou não, de que todo delinquente deve, precisa ou pode ser ressocializado.

Acrescenta-se sobre a prevenção especial e ademais seu caráter ressocializador, o qual é a definição da natureza positiva da teoria, através da punição do indivíduo para que ele não volte a delinquir após cumprimento da sanção, propondo uma intervenção favorável ao condenado e capacitando-o ao convívio social sem acusá-lo ou apoderar de sua autonomia e invadir sua personalidade.

A vertente negativa da teoria da prevenção especial, também direcionada ao delinquente, como na teoria positiva, mas seu eixo principal é a neutralização do indivíduo, por meio de sua exclusão, destruição física ou psíquica e segregação, a fim de proteger a sociedade de novos crimes, ação essa chamada de inocuização, segundo Fran Von Liszt , devendo a pena amedrontar o criminoso.

Uma definição clara de prevenção especial negativa é dita por Carolina de Mattos Ricardo:

A prevenção especial negativa funda-se na ideia de intimidação a partir da neutralização do apenado, que fica fora de circulação e percebe que sua ação tem uma consquência jurídica, o que evitaria o cometimento de novos ilícitos penais. (RICARDO, 2007, p. 4).

A propósito, considerada como a doutrina predominante na atualidade, a teoria unitária, mista ou eclética, é definida pelo seu caráter dualista da pena, sendo justa e útil conjuntamente, ao prevenir novos crimes e ainda ressocializar o delinquente, e em razão disso, vale sustentar uma miscigenação existente nessa, frente às teorias explanadas anteriormente, valendo-se essa de dois objetivos agora unificados, a punição e a prevenção, além de, como já dito, aderir ao ideal de ressocialização.

O Código Penal brasileiro em seu artigo 59 confirma o caráter unitário que domina no presente momento: "Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime."

Romeu Falconi preconiza no tocante à referida teoria:

Os adeptos das teorias denominadas UNITÁRIAS utilizam-se de alguns dos pressupostos de cada uma das Escolas anteriormente referidas. Para estes, o ideal é a pena de duplo escopo, visando ao reaproveitamento social daquele que um dia delinquiu. A isso chamamos de “teorias mistas”. Aceitam a pena como “retribuição”, pois o criminoso praticou ato lesivo; não citam a pena apenas como “prevenção”, mas como meio próprio de reeducação do criminoso. (FALCONI, 2002, p. 250).

No tocante às falhas existentes na teoria apontada, sob o ponto de vista de Juarez Cirino dos Santos:

A crítica jurídica e criminológica sobre as teorias unificadas da pena criminal afirma que os defeitos das teorias isoladas não desaparecem com a reunião de funções (a) de compensar ou expiar a culpabilidade, (b) de corrigir e neutralizar o criminoso e (c) de intimidar autores potenciais de manter/reforçar a confiança no Direito. Por exemplo, completar a função de retribuição com a função de prevenção especial ou geral, significa admitir a insuficiência da retribuição sob forma de prevenção etc. Além disso, a admissão de diferentes funções da pena criminal, determinada pela cumulação de teorias contraditórias e reciprocamente excludentes, significa adotar uma pluralidade de discursos legitimantes capazes de racionalizar qualquer punição pela escolha da teoria mais adequada para o caso concreto. (SANTOS, 2005, p. 34).

Acrescenta-se também Bittencourt (2011, p. 113) com o parecer de ClausRoxin sobre a teoria unificadora que “a simples adição não só destrói a lógica imanente à concepção, como também aumenta o âmbito de aplicação da pena, que se converte assim em meio de reação apto a qualquer emprego”.

Em suma, o intento da teoria unitária é a aplicação de uma pena, quando necessária, mas que seja justa ao indivíduo delinquente. Faz-se por bem ser justa por atentar sobre a proporcionalidade - da gravidade do delito e a culpabilidade do autor-, devendo a pena prevenir novos crimes como também a readaptação do criminoso ao convívio social.


CONCLUSÃO

A origem da pena ocorreu em um período de ampla necessidade de sua aplicação aos indivíduos infringentes das normas e regras de convivência das sociedades da época. As circunstâncias nas quais se dava sua execução foram desde as “tradicionais” vinganças – divina,privada e pública – quando, nos tempos modernos, seu caráter se baseia, sobretudo, na conformidade com a previsão legal, a qual não viola princípios inerentes à pessoa humana, além da busca pelo caráter ressocializador do delinquente e do ideal de prevenção de novos crimes perante a sociedade.

Poder-se-ia afirmar que na doutrina brasileira foi adotada a teoria unitária, mista ou eclética da pena, não predominando, hierarquicamente, a prevenção e nem a retribuição, mas ambos os fatores coexistem em uma só previsão jurídica.

No entanto, hodiernamente, pensamos na dificuldade de se afirmar claramente apenas uma finalidade para as penas, uma vez que a violação à norma jurídica também se remete à sociedade e esta, preza por ver o delinquente pagando pelo delito cometido, não podendo abandonar fielmente a natureza retributiva da pena. Mas, punir o indivíduo sem reeducá-lo ou ressocializá-lo, ideais esses ainda não eficazes por diversos fatores alheios a esse assunto, não seria eficiente, assim, nota-se que é preciso a punição juntamente com o princípio educativo, para uma eficaz recuperação do criminoso e juntamente a prevenção de novos delitos.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Sobre os autores
Bruna Nascimento Machado

Graduanda em Direito na Universidade do Estado de Minas Gerais - Unidade Frutal/MG.

Fábio Ruz Borges

Atualmente é Delegado de Polícia Civil do Estado de Minas Gerais. Mestrando em Direito pela UNIVEM. Graduado em Direito pelo Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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